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Ética na Saúde

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1.Conceitos e modelos de Ética.
Introdução.
Iniciaremos nossos estudos estabelecendo a diferença entre os conceitos de ética e moral. Veremos como, apesar de estarem intimamente relacionados, estes conceitos possuem diferenças bem definidas. 
Em seguida, faremos um breve histórico do desenvolvimento histórico da Ética nas sociedades ocidentais. Veremos suas origens na Grécia antiga, a evolução para a ética cristã e em seguida para a chamada ética moderna que perdurou dos séculos XVI ao século XIX. 
Por fim, analisaremos a ética contemporânea, profundamente influenciada pela globalização e pelos sistemas econômicos e o relativismo ético, produzido pelo novo modelo de ciência e algumas de suas características.
O termo ética deriva de éthos, que significa modo de ser, e, por isto, define-se com frequência a ética como a doutrina dos costumes ou hábitos adquiridos pelo homem. Aristóteles tornou a ética uma disciplina autônoma no domínio da filosofia moral. Para ele, o campo ético deveria investigar as características do bem, da perfeição e da felicidade que são atribuídas ao homem, com o fim de ajustá-los à orientação prática da conduta humana. Ele considerava que toda “ação humana está orientada para a realização de algum bem, ao qual estão unidos o prazer e a felicidade”.
A conceituação de moral, por sua vez, abrange os costumes, ou seja, representa o conjunto das regras de conduta admitidas numa época ou por um grupo de homens. Ela distingue-se do que é investigado no campo ético, na medida em que “este último domínio se ocupa de uma moral ligada aos fatos, incorporando valores aceitos pelos homens ao se inter-relacionarem socialmente” (SKLAR: 2008). Seguindo este sentido, a ética pode ser compreendida, como propõe Sánchez Vázquez (2002, 23), de “teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade”.
O ato moral, portanto, provocado por um ser humano real e contextualizado historicamente, deve ser avaliado sob o código moral que vigora na sociedade daquele que promoveu a ação.
 Ética Grega.
Antes de Aristóteles, encontramos precedentes para a constituição de uma ética filosófica. Entre os pré-socráticos, por exemplo, Heráclito utiliza o vocábulo éthos para situar a condição do homem “como aquela que necessita de um lugar” ou “morada”, definindo um “modo de estar” no mundo (KIRK, RAVEN, SCHOFIELD:1994). Demócrito mostra a virtude sob a busca de um equilíbrio interno diante do movimento das paixões. O saber e a prudência seriam, assim, essenciais, pois ensinariam ao homem de que modo ele deveria viver, conseguindo a felicidade.
A reflexão ética autônoma no mundo grego aparece apenas com Sócrates que, combatendo os sofistas, acreditou na estabilidade das leis, dos princípios verdadeiros e universais das normas, conferindo a elas um valor intrínseco. A partir dele, o termo ética se afasta tanto do sentido originário de morada quanto de equilíbrio das paixões, tal como Heráclito e Demócrito respectivamente entendiam. Este avanço foi possível sob a elaboração de um método, denominado maiêutica, que levasse os diversos cidadãos a uma vida virtuosa.
Com Aristóteles, a ética torna-se uma disciplina filosófica. Sua filosofia critica o dualismo ontológico de Platão, isto é, a separação dos mundos sensível e inteligível. Para Aristóteles, existe uma correlação entre ser e bem. O bem se relaciona com a essência de cada coisa.  O objeto da ética consiste em investigar as características do bem, da perfeição e da felicidade que são atribuídas ao homem, com o fim de ajustá-los à orientação prática da conduta humana. Segundo Aristóteles, o homem deve contentar-se com o ser e o bem que possui, pois está limitado, essencial e temporalmente, pela sua substância mortal e corruptível. O conceito de realidade, assim, condiciona a formulação da ética aristotélica, dominada por um relativismo radical. Ele considera que toda ação humana está orientada para a realização de algum bem, ao qual estão unidos o prazer e a felicidade.
Aprofundando a busca de conhecimentos universais, Platão atribui à formação de conceitos socráticos não só um valor mental, lógico e abstrato, mas um valor também ontológico (parte da Filosofia que estuda o ser em si), considerando-os objetos de pensamento e situados numa dimensão superior ao universo físico percebido pelos sentidos. Desta maneira, a realidade fica dividida, para ele, em dois mundos distintos e contrapostos: um, superior, invisível, eterno e imutável das ideias subsistentes, outro, físico, visível, material, sujeito à transformação. A ética platônica gira em torno da aspiração dos homens à felicidade.
 Ética cristã e moderna.
A transformação do cristianismo na religião oficial de Roma no século IV trouxe novos sentidos para as doutrinas éticas gregas. O período medieval caracteriza-se por uma profunda fragmentação econômica e política, devido ao surgimento de duas classes que marcam o regime feudal: os senhores feudais, donos absolutos de terras ou feudos, e os camponeses e servos, os quais eram vendidos e comprados com as terras às quais pertenciam e que não podiam abandonar. Nesse quadro, a religião garante certa unidade social, pois a política depende da Igreja exercendo um forte poder espiritual e centralizando integralmente a vida intelectual. Sob essas circunstâncias, “a moral concreta, efetiva, e a ética – como doutrina moral – estão impregnadas (...) de um conteúdo religioso que encontramos em todas as manifestações da vida medieval” (SÁNCHEZ VÁZQUEZ: 2002,275-276). 
Nesse período, os pensadores cristãos conceberam uma nova ética que encontra em Deus os princípios da vida moral.
A esta nova ética denomina-se teonomia (théos, em grego, significa Deus). Estes pensadores aproveitaram as doutrinas gregas das virtudes e da correspondência do bom ao verdadeiro, agregando-as ao corpo de uma ética cristã, negando, por outro lado, fundamentos éticos naturalistas e hedonistas, incompatíveis com as ideias morais cristãs. Considerando, ainda, que o homem é um peregrino que se prepara para uma vida futura ultraterrena, rejeitaram a busca da felicidade (eudemonia) que caracterizou grande parte do pensamento grego. Ironicamente, no entanto, a ética cristã de igualdade é lançada no momento histórico em que os homens conhecem as maiores desigualdades: a divisão entre escravos e homens livres, ou entre servos e senhores feudais.
Vázquez (1972, 277), no entanto, ressalta que a ética cristã medieval “não condena está desigualdade social e chega, inclusive, a justificá-la. 
A igualdade e a justiça são transferidas para um mundo ideal, enquanto aqui se mantém e sanciona a desigualdade social”. Podemos afirmar que a formulação conceitual da ética cristã herda conceitos platônicos e aristotélicos, submetendo-os a um processo de cristianização, que transparece nas éticas de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino. Para o primeiro, a ascensão da alma que em Platão se eleva do mundo sensível ao inteligível, transforma-se na elevação até Deus, cujo fim é o êxtase místico ou felicidade. Para o segundo, retomando Aristóteles, destacam-se a contemplação e o conhecimento que dela decorre; São Tomás de Aquino se afasta, no entanto, da divisão das virtudes e da ética como doutrina dos costumes quando afirma que o fim supremo do conhecimento é Deus, entendido como o maior bem objetivo, cuja posse gera felicidade, um bem subjetivo.
A história da ética ganha um novo rumo, entre os séculos XIV e XVI (Renascimento) a partir da valorização do homem nas ciências e nas artes. Retomam-se algumas tendências éticas antigas no início da Renascença, demarcando-se o início do que se conhece como ética moderna (séculos XVI-XIX). Este período é marcado pela criação de uma nova sociedade que substitui a ordem feudal da Idade Média, sob uma série de mudanças. No plano econômico, há o incremento de forças produtivas em função do desenvolvimento científico, mediante uma perspectiva científica mais prática (Francis Bacon). No plano social, temos o aparecimento de uma nova classe social – a burguesia– inicialmente na França (com a Revolução Francesa, 1789), desenvolvendo-se, no século seguinte, principalmente na Inglaterra. Como consequência, vemos a implantação de um sistema em que o trabalhador, ao trocar sua força de trabalho por um salário, não é dono dos meios de produção; esses passam ao domínio da classe burguesa que, ao vender as mercadorias produzidas pelos trabalhadores, atribui um sobrevalor ao produzido, obtendo uma mais-valia ou lucro: o capitalismo.
No plano espiritual, há a perda do papel de guia atribuído à Igreja Católica, pois a religião deixa de ser a forma ideológica dominante.
Separam-se, em linhas gerais: razão/fé, natureza e homem/Deus, Estado/Igreja. A dimensão humana coloca-se, portanto, no centro da filosofia, ciência, arte, política, e, também, da moral. Dominando a maior parte dos pensadores modernos, a questão da origem das ideias morais desponta nos séculos XVI-XVII. Nicolau Maquiavel chamou atenção sobre o papel da ação política – visando a sobrevivência de um grupo, não de indivíduos isolados – na formação dos conceitos éticos.
Thomas Hobbes defende a tese de que o homem é antissocial, comportando-se sempre para satisfazer seu interesse pessoal e absorvendo aquilo que é bom ou vantajoso para si: egoísmo ético. Baruch Espinosa buscou na correspondência alma-corpo fundamentos de uma ética voltada para o exercício da liberdade, afirmando que são os homens que causam as paixões, não que estas devam estar subjugadas à razão ou vice-versa.
No século XVIII, marcado pelo movimento intelectual denominado de Iluminismo, exalta-se a capacidade que tem o homem de conhecer e agir por uma luz própria da razão. A este respeito, ressalta a obra de Immanuel Kant, para quem a consciência cognoscente ou moral é suscitada em um homem ativo, criador e legislador. Na Crítica da razão prática, e na Fundamentação da metafísica dos costumes, ele descobre princípios racionais na vida prática dos homens, compreendendo como certos costumes podem orientar as ações humanas. Segundo afirma, a vontade é verdadeiramente moral quando é regida por imperativos categóricos – referem-se a ações objetivamente necessárias, em que suas realizações estejam subordinadas tanto a fins quanto condições; a moralidade, neste sentido, diz respeito ao fundamento da bondade dos atos, averiguando em que consiste o bom.
A resposta kantiana: o único bem em si mesmo é a boa vontade, aquela que age por puro respeito ao dever, visando sujeição do homem à lei moral – autonomia humano-moral. O dever torna-se, nesse quadro, incondicionado ou absoluto, abrangendo algo que se estende a todos os seres humanos em quaisquer tempos ou condições.
Duas outras importantes contribuições para o domínio ético são encontradas ainda no século XIX: Friedrich Nietzsche e de Franz Brentano. O primeiro, analisando os valores da cultura europeia, os vê encarnados no cristianismo, socialismo e igualitarismo democrático e sustenta que são formas de uma moral a ser superada mediante a formulação de um ponto vista além do bem e do mal.
Já para Brentano, seria possível se estabelecer leis universais de caráter axiológico, na medida em que há um subjetivismo ético que se relaciona a uma teoria objetiva do valor. Este é enunciado sob atos de preferência (valorização) ou repugnância (desvalorização); assim, a experiência que algo seja bom inclui um aspecto subjetivo (para alguém) e a intenção que leva um homem a preferir algo.
 Ética contemporânea e relativismo ético.
As discussões sobre as questões a respeito do conceito de bem supremo, ou os debates sobre se o bem é o bem individual ou coletivo, se parte do particular para o geral ou vice-versa, tem encontrado certo consenso no sentido de que o bem só é possível quando compartilhado ao nível social. Assim, o ético se faz a partir do todo social e não a partir da ação individual.
Deste modo, torna-se necessária a noção de uma equidade cultural que possibilitaria a uniformidade de valores e consequentemente em uma única subjetividade de valores morais e sociais que uniformizasse também as expectativas e os desejos individuais. Caso contrário, esta posição seria utópica e desprovida de valor prático uma vez que o bem se relativiza a partir do valor cultural que o fundamenta como um bem próprio e típico do ponto de vista de uma dada Cultura. Estes ideais são diretos ou indiretamente a raiz do que se convencionou chamar de Globalização.
A Globalização tem tido diversos efeitos sobre os sistemas de organização das sociedades, seja ao nível econômico, seja ao nível ideológico e cultural. Dentre estes efeitos, destaca-se o aprofundamento de uma ética industrial na qual o desenvolvimento econômico se sobrepõe ao desenvolvimento social.
As atuais políticas governamentais têm pautado suas bases de atuação em critérios que desconsideram a necessidade de integração entre os diferentes níveis de desenvolvimento e negado os aspectos necessários à construção de um projeto social mais voltado para um futuro harmonioso nas relações sociais.
A Ecologia Social, integrando os estudos do homem e de seus ecossistemas através da compreensão da direta correlação entre natureza e cultura, demonstra que as relações deste com a sociedade passam necessariamente pela sanidade de suas relações não só com os demais membros de sua espécie, como também pelo modo relacional que estabelece consigo próprio e com seu ambiente. O esfacelamento deste conjunto inviabiliza qualquer tentativa de desenvolvimento.
Diversos autores, nos mais variados campos do conhecimento, têm ressaltado a importância de estabelecer-se uma relação ética com os recursos sociais, 
Humanos e naturais que reponha uma hierarquia de valores morais e filosóficos como parâmetros do desenvolvimento. Félix Guattari, em seu livro As três ecologias, alerta para as consequências daquilo que ele considera como “o império de um mercado mundial que lamina os sistemas particulares de valor, que coloca num mesmo plano de equivalência os bens materiais, os bens culturais, as áreas naturais. ” Para outros autores, os desenvolvimentos social e cultural estão mais diretamente associados à instituição de uma ética social.
Não há desenvolvimento social sem antes a formação de uma ética que baseie os pressupostos fundamentais de uma sociedade e, todo o problema do desenvolvimento, segundo estes autores, reside justamente na ausência desta ética por parte, não apenas dos governos, mas também do próprio modelo de ciência que arbitra o sistema teórico de sustentação das políticas governamentais.
Este relativismo ao qual Bookchin se refere, fundamenta-se nos desdobramentos de um novo modelo de ciência mais relativista que tem nas últimas décadas se firmado como a base teórica não apenas para o meio acadêmico, mas também, através dele, para a própria concepção de mundo e de sociedade. Este novo modelo, se como diz Bookchin, relativizou a ética, teve o mérito de libertar as ciências de uma perspectiva positivista de mensuração e “absolutismo” que nivelou teorias e ideologias sociais que equiparavam sociedades distintas por um único modelo econômico, político e social. A questão, portanto, reside em conhecer-se que modelo ético está sendo gerado nas sociedades modernas como consequência desta nova ciência e qual sua relação com o desenvolvimento. Pois, só através dele, compreenderemos os novos rumos do desenvolvimento social.
Ética e Moral estão diretamente associadas. Ambas dizem respeito ao modo como lidamos com o outro, aos costumes. A ética se constitui de princípios voltados para o bem comum. Ou seja, é a reflexão acerca dos princípios que irão nortear as relações humanas de modo justo e equânime. A moral, por sua vez, é o conjunto de hábitos, condutas e normas que constituem o padrão de um grupo social em determinada época, lugar ou mesmo classe social. Assim, moral são as normas de comportamento pertencentes a um grupo e ética os princípios norteadores destas normas, ou em outras palavras, os valores ideológicos que fundamentam a moral.
Desta forma:
Alguémé moral ou imoral na medida em que acata ou transgride as normas de seu grupo.
Alguém é ético ou antiético na medida em que fundamenta suas ações em princípios que consideram ou desconsideram a equidade, o respeito ao outro e a justiça. 
Por exemplo: Roubar é imoral (vai contra as normas de conduta de nossa sociedade). Roubar é imoral, porque consideramos que ninguém tem o direito de retirar o que é de outro contra a sua vontade (valor ideológico ético que fundamenta o comportamento moral).
2.Bioética – história e princípios básicos.
Podemos entender que a ética sofre mudanças em função de circunstâncias práticas que obrigam a readequação de valores e condutas. Veremos nesta aula, como a Segunda Guerra Mundial trouxe atrocidades tão marcantes sobre a vida que não apenas a ética precisou ser mais uma vez redefinida, como fez surgir um novo padrão ético associado diretamente a ações voltadas para a área da saúde e da preservação da vida: A Bioética.
Veremos como os avanços científicos influenciam nos processos éticos e como a Bioética se preocupa com a normatização de procedimentos que envolvem recursos de saúde e critérios de distribuição e aplicação destes recursos.
E de modo a fundamentarmos melhor nosso entendimento, veremos ainda alguns dos princípios básicos que fundamentam a aplicação da Bioética. Princípios que procuram nortear decisões importantes na área da saúde como, por exemplo, de que forma podemos avaliar a justificabilidade de efeitos colaterais negativos em procedimentos de saúde, quando podemos dispor de nossos órgãos, quando aplicar tratamentos alternativos ou experimentais e outros.
As bases filosóficas da Bioética começaram a ser mais bem definidas após a Segunda Guerra Mundial, quando o mundo ocidental, chocado com as práticas nazistas executadas pretensamente em nome da ciência, cria um código ético para normatizar os estudos e experiências relacionados a seres humanos. Deste episódio, fortalece-se também a ideia de que a ciência (ou qualquer outra forma de progresso) não pode ser mais importante que o homem. Assim, tecnologias e desenvolvimento técnico devem ser controlados para acompanhar a consciência da humanidade sobre os efeitos que eles podem ter, nos indivíduos, no mundo e na sociedade.
Oficialmente, o registro inicial do termo “Bioética” deu-se em 1971, no livro "Bioética: Ponte para o Futuro", do biólogo e oncologista americano Van R. Potter. Em sua origem, o termo é a conjugação das palavras gregas bios (vida) + ethos (relativo à ética) e sua concepção compreende o campo disciplinar compromissado com o conflito moral na área da saúde e da doença dos seres humanos e dos animais não humanos. 
O objetivo primordial da Bioética é discutir as questões relativas à vida e a saúde, principalmente as que surgiram a partir de inovações tecnológicas posteriores aos debates éticos tradicionais, sob um enfoque humanista e assim, evitar que estes debates se restrinjam a aspectos puramente tecnicistas, esquecendo-se de que tratamos de aspectos delicados e extremamente complexos.
A ética industrial decorrente da disseminação de valores capitalistas e da incessante busca por mais desenvolvimento tecnológico, estabeleceu nas sociedades ocidentais uma ideologia chamada de teoria utilitarista, através da qual a vida humana passa a ser concebida como objetivando a maximização da qualidade. Com isso, o debate ético sobre a sacralidade da vida humana começa a perder sentido em detrimento do quanto pode ser feito para que as pessoas em geral vivam mais e melhor.
 John Finnis e outros estudiosos da ética e da bioética que se contrapunham a esta abordagem, argumentam que a questão da maximização do prazer (ou da qualidade de vida) não pode se impor (como uma equação matemática) eticamente a aspectos morais e a valores mais amplos do que o prazer.
Segundo estes autores, temas como o aborto ou a eutanásia, não podem ser moralmente debatidos em termos de satisfatoriedade ou qualidade de vida. Ou, em outras palavras, não podemos sustentar a defesa do aborto simplesmente pelo fato de que a gestante se priva de situações ou gratificações em função da gravidez.  O que Finnis irá propor é uma Bioética fundamentada em aspectos filosóficos mais clássicos e moralmente sustentáveis.
Assim, para solucionar questões éticas práticas, decorrentes de conflitos e controvérsias da interação humana e de suas práticas médicas ou científicas, a bioética se fundamenta em uma tríplice atuação: (1) descritiva, voltada para a  descrição e análise destes conflitos; (2) normativa, com relação a tais conflitos, no duplo sentido de proscrever os comportamentos que podem ser considerados reprováveis e de prescrever aqueles considerados corretos; e (3) protetora, no sentido de amparar, na medida do possível, todos os envolvidos em alguma disputa de interesses e valores, priorizando, quando isso for necessário, os mais “fracos” (Schramm, F.R. 2002. Bioética para quê? Revista Camiliana da Saúde, ano 1, vol. 1, n. 2 – jul/dez de 2002 – ISSN 1677-9029, pp. 14-21).
Para objetivar estas atuações, a Bioética se sustenta em alguns conceitos básicos:
1. O princípio do duplo efeito: uma situação frequente é a ocorrência de uma determinada ação que acarreta em dois efeitos concomitantes, um bom e outro mau. Apesar de buscarmos o primeiro resultado, ele sempre trás consigo um efeito colateral indesejável, porém inseparável. O que fazer nestas situações? Desistir do efeito positivo em função do colateral ou aceitar os danos como consequências de um fim positivo? Como decidir sobre o que irá pesar mais? O principio do duplo efeito foi elaborado para estabelecer as condições pelas quais considera-se ética uma ação boa que promove efeitos negativos.
A primeira destas condições se refere ao fato de que a ação em si, não deve ser má. Isto significa dizer que o mal não pode ser meio para produção do bem, assim como um ato mau não pode ser moralmente aceito mesmo que produza benefícios. Desta forma, as consequências de um ato são diferentes do ato em si. O efeito negativo é aceito eticamente como consequência de um ato bom, mas nunca aceito como ato (negativo) em si. É apenas a reprodução do conceito moral tradicional pelo qual “o fim não justifica os meios”.
A segunda condição diz respeito à existência de uma proporcionalidade entre os efeitos colaterais negativos e os benefícios decorrentes da ação. Os benefícios precisam ser maiores do que os malefícios da ação. Um ato no qual os efeitos negativos sejam muito maiores do que o bem que ele possa acarretar não pode ser moralmente aceitável. Naturalmente que sempre haverá subjetividades e discordâncias relativas a esta avaliação de proporcionalidade, mas uma ação ética implica necessariamente nesta análise e (sempre que possível) em um consenso de valor entre as partes envolvidas.
2. O princípio da totalidade: Este princípio se origina do sistema psicológico da Gestalt que sustenta que “o todo é mais do que a soma de suas partes”. Assim, as partes do corpo não podem ser compreendidas de modo dissociado da unidade física. Em outras palavras, isso significa dizer que não podemos dispor das partes de nosso corpo sem analisarmos o que isso irá promover em termos da preservação de nossa saúde geral. A amputação de um órgão ou parte do corpo, por exemplo, precisa ser justificada em função de um dano permanente que não possa ser alterado e que implique em prejuízos para a saúde geral do corpo. Ou, em situações de doação a terceiros, o quanto esta remoção irá ou não afetar as condições de saúde geral do doador (em termos de proporcionalidade ao bem produzido ao outro).
3.Meios ordinários e extraordinários de tratamento: Um procedimento padrão no tratamento de alguma enfermidade se traduz pela aplicação de medicamentos ou processos terapêuticos já amplamente testados, de acesso disponível e que possuem eficácia comprovada na produção de resultados. Este tipo de procedimento, chamamos de meios ordinários (comuns).
Existem, no entanto, situações em que estes procedimentos não logramêxito, nestes casos, é preciso lançar mão de procedimentos que ao contrário dos primeiros, são muitas vezes caros, produzem efeitos colaterais indesejáveis e ainda assim, não tem sua eficácia plenamente comprovada. São os chamados meios extraordinários.
Naturalmente que esta distinção é decorrente de uma condição temporal, na medida em os avanços tecnológicos rapidamente podem transformar um meio extraordinário em ordinário. Esta avaliação, mesmo que sabidamente relativa ao momento presente, é extremamente importante do ponto de vista ético, na medida em que só se justifica a aplicação de um meio extraordinário se os meios ordinários já tiverem sido tentados e demonstrados sua ineficácia no caso em questão.
4.Justiça: Critérios de justiça estão diretamente associados aos aspectos éticos e não poderiam deixar de estar, também, vinculados à Bioética. A justiça é o conceito pelo qual cada um deve receber o que lhe é merecido por direito ou pela ação de seus atos. Assim, casos semelhantes devem ser tratados de modo semelhante e casos diferentes tratados de modo diferenciado. Dentre os padrões de aplicação dos critérios de justiça, temos a chamada justiça comutativa, que define padrões relativos à equidade nos mais variados tipos de trocas ou relações comerciais como, por exemplo, as formas de determinação de preços e salários. Temos a justiça retributiva que estipula sanções legais para a violação das leis e que determina os meios de garantia que o que é devido seja pago ou restituído.
Temos ainda, por fim, a justiça distributiva que regula a partilha de bens e benefícios sociais, garantindo a cada um o que lhe é devido na distribuição de um todo. Todos estes aspectos estão intrínsecos na aplicação da Bioética, mas a justiça distributiva, em particular, tem se demonstrado uma área bastante sensível, na medida em que a obtenção de recursos de saúde interfere diretamente em muitas questões e problemas inerentes à Bioética.
5. Santidade da vida humana: Como vimos, quando John Finnis se opõe à ética industrial, o objetivo central de sua crítica se localizava na restauração do conceito de sacralidade da vida humana. Não precisamos, necessariamente, considerar esta concepção sob um ângulo religioso, mas é importante percebemos que a vida é o valor maior a ser preservado. Desta forma, qualquer intervenção ou interferência produzida sobre ela, precisa obrigatoriamente ser avaliada em termos éticos e morais e deve ter o sentido de sacralidade como paradigma central de suas considerações. Muitos autores preferem o uso do termo dignidade da vida humana para se reportar a este sentido (em oposição ao sentido de santidade da vida).
Mais importante do que o termo utilizado ou o sentido filosófico dado, é a consciência da necessidade de respeito e preservação na aplicação de ações e direitos associados a este valor. Daniel Callahan identificou cinco elementos críticos no conceito de santidade (ou dignidade) da vida humana: 
Sobrevivência da espécie humana. 
Preservação das linhas familiares. 
O direito dos seres humanos terem proteção de seus companheiros. 
Respeito por escolhas pessoais e autodeterminação, que inclui integridade mental e emocional.
Inviolabilidade corporal: Meu corpo, com seus órgãos, sou eu mesmo.
3.Avaliação de risco e benefícios em pesquisas Biomédicas.
Avaliação de riscos e benefícios em pesquisas biomédicas. Estudaremos a evolução histórica dos mecanismos e principais legislações acerca do controle de riscos em pesquisas científicas que implicam na participação de seres humanos na área da saúde. Conheceremos não apenas os documentos internacionais como também as diretrizes e normatizações brasileiras a respeito destes procedimentos. Veremos a importância dos comitês de pesquisa institucionais e em que consiste sua atuação. Identificaremos ainda, alguns dos procedimentos éticos de avaliação de riscos e benefícios como o Princípio da Precaução e sua aplicação no controle de riscos e eventos adversos.
Surgimento da pesquisa biomédica.
Como vimos na aula anterior, em consequência dos abusos criminosos promovidos por experimentações nazistas no decorrer da Segunda Grande Guerra surgiu a Bioética, uma nova concepção ética voltada de modo mais direto aos aspectos associados à saúde e às pesquisas científicas que envolvessem seres humanos.
Uma das consequências impostas aos criminosos nazistas ao fim da guerra foi o chamado julgamento de Nuremberg. Mundialmente conhecido, este foi constituído por um tribunal militar internacional que efetuou os julgamentos dos primeiros criminosos de guerra (dentre eles 20 médicos) e ocorreu entre 1945 e 1946 na cidade alemã de Nuremberg. Em função deste julgamento, foi elaborado em 1947, o chamado Código de Nuremberg.
Objetivando eliminar futuros episódios semelhantes aos praticados pelos nazistas, o código de Nuremberg surge como um importante marco na história da ética envolvida em pesquisas médicas.
Em síntese, ele determinava que deveria haver consentimento prévio e voluntário de todos os sujeitos envolvidos em pesquisas e para garantir que não haveria indução à participação, os sujeitos deveriam receber informações sobre riscos, objetivos e procedimentos experimentais.
Determinava também que toda pesquisa deveria apresentar a possibilidade de resultados não alcançáveis por outros procedimentos não invasivos e exigia a realização de experimentos anteriores em animais.
Esta foi a primeira legislação moderna que visou o controle sobre atuações científicas de riscos em seres humanos.
Quase vinte anos depois, em 1964, foi criado pela Associação Médica Mundial, um novo e mais elaborado documento, conhecido pelo nome de Declaração de Helsinque. A Declaração passou no decorrer dos anos por diversas alterações e revisões, tendo sido a última, até o momento, efetuada em 2008, na 59ª Assembleia Médica Mundial, realizada em Seul na Coreia do Sul. A Declaração de Helsinque é considerada o mais atual e importante documento mundial sobre a ética em pesquisas na área da saúde e tem servido como base para quase que a totalidade de todos os procedimentos regulatórios sobre pesquisa biomédica.
Princípios básicos: Nos princípios básicos a declaração procura seguir os princípios gerais da Bioética, ressaltando os aspectos morais envolvidos nos procedimentos e experimentos científicos e na necessária proporcionalidade entre os riscos envolvidos e os benefícios advindos destas pesquisas.
Pesquisa clínica combinada com o cuidado profissional: Na parte referente à pesquisa clínica combinada com o cuidado profissional, o documento aborda a possibilidade da aplicação de meios extraordinários de tratamento (pesquisas experimentais) desde que previamente consentidos e que a pesquisa traga perspectiva de reversão da patologia do próprio paciente.
Pesquisa biomédica não terapêutica envolvendo seres humanos: No que diz respeito à pesquisa clínica não terapêutica, a declaração de Helsinque obriga o médico pesquisador a se responsabilizar pela saúde do paciente no qual os procedimentos experimentais são efetuados e considera que, apesar do necessário consentimento explicito, consciente e plenamente justificado do paciente, a responsabilidade sobre danos ou consequências é sempre do médico pesquisador. Podendo ainda o sujeito, objeto da pesquisa, cancelar seu consentimento ou solicitar seu encerramento a qualquer momento.
Estes princípios tratam da necessidade de serem seguidos critérios científicos aceitos pela comunidade científica internacional e da revisão ética e científica de toda pesquisa envolvendo seres vivos.
O primeiro documento brasileiro a tratar das questões éticas sobre pesquisas em seres humanos foi elaborada em 1988.
Atividade proposta.
Quando pensamos em proteção e/ou prevenção de riscos em pesquisas com seres humanos, em geral, consideramos prioritariamente os sujeitos da pesquisa, mas não podemos nos esquecer que, em muitos casos, também os pesquisadores sãoexpostos a riscos e precisam de proteção. Veja este caso que ficou mundialmente famoso:
A química Karen E. Wetterhahn, do Dartmouth College/USA, era uma pesquisadora de 48 anos que pesquisava sobre os efeitos dos metais pesados sobre moléculas e células. Durante um experimento, em agosto de 1996, ela acidentalmente foi exposta ao dimetilmercúrio, que é um composto incolor extremamente tóxico, raramente utilizado. Esta substância era considerada como padrão de controle nos testes que utilizam Ressonância Nuclear Magnética para verificar a ligação entre moléculas. A Dra. Wetterhahn era uma pesquisadora experiente e meticulosa. Durante este experimento, uma pequena quantidade desta substância respingou em sua luva de látex, quando transferia o material para um equipamento de Ressonância Nuclear Magnética. Como estava utilizando equipamento de segurança recomendado, não deu maior importância ao fato. A substância era permeável aos poros da luva e entrou em contato com a sua pele em questão de segundos. Ela ficou doente alguns meses após e faleceu em menos de um ano do ocorrido. Após a sua morte, seus colegas iniciaram uma série de testes e verificaram que o dimetilmercúrio atravessa o látex das luvas descartáveis em menos de 15 segundos.
Se consideramos o Princípio da Precaução, estudado na aula, o que podemos aprender com este lamentável episódio? Que procedimento não foi respeitado e o que deveria ter sido feito que poderia ter evitado esta morte trágica?
O Princípio da Precaução determina que não podemos considerar que uma ação não tenha riscos pelo fato destes não terem sido avaliados e que, portanto, diante da ausência de certeza cientifica confirmada da inexistência de riscos, devem ser tomadas todas as medidas necessárias no sentido de evitá-los. No caso em questão, como não se sabia a relação de permeabilidade do composto estudado em relação ao equipamento utilizado (luvas de látex), não deveria ter sido suposto segurança e sim, feitos experimentos que garantissem que o equipamento de fato protegia em relação àquela substância.
4.Transplante de órgãos e tecidos.
Transplante de órgão e tecidos. Nesta aula, pretendemos fazer uma rápida passagem pelos principais aspectos éticos que estão presentes nesta situação tão delicada do campo da saúde. Iniciaremos tratando do conceito de direitos fundamentais e em seguida, veremos os tipos de origens que podem ter os órgãos e tecidos destinados a transplantes.
Estudaremos os modos de obtenção destes órgãos e como a legislação trata desta questão e veremos alguns aspectos gerais da Bioética que estão intrinsecamente associados à situação de doação de órgãos.
 No encerramento, conheceremos como o Ministério da Saúde estabelece os critérios para elegibilidade de receptores e os estágios propostos por um dos mais importantes nomes da Bioética nacional para alocação destes órgãos e tecidos.
Atividade de sensibilização !
Sabemos que um dos maiores entraves técnicos que impedem os xenotransplantes (transplantes de órgãos entre espécies diferentes) é, além da infecção por vírus estranhos ao organismo humano, o imenso risco de rejeição por parte do receptor. Pesquisas recentes demonstram que o organismo receptor pode chegar a destruir o órgão implantado em menos de 24 horas. Assim, se seguirmos uma lógica simples, quanto maior a semelhança biológica entre os seres, menor o risco de infecções por vírus estranhos e menor também os riscos de rejeição do organismo.
Ora, então...
Por que órgãos de porcos e não de macacos são testados para transplantes em seres humanos?
Parece esquisito, mas isso ocorre porque há bastante semelhança física entre suínos e seres humanos. "Anatomicamente, órgãos como o fígado, o coração e o rim do porco são muito parecidos com os nossos", diz o cirurgião hepático Sérgio Mies, da Universidade de São Paulo (USP) e do hospital Albert Einstein, em São Paulo. Outra vantagem é que os porcos chegam à fase adulta muito mais rápido do que os macacos. Com apenas um ano, um porco já tem entre 60 e 80 quilos e pode ser doador, enquanto gorilas, que têm órgãos com um tamanho próximo ao do ser humano, só atingem a maturidade aos 7 anos - sem contar que boa parte dos primatas está em risco de extinção.
O transplante de órgãos e tecidos implica uma sequência de eventos que, desde a doação até a efetivação do transplante, abarca alguns direitos fundamentais pertinentes ao doador e ao receptor.
Estes direitos estão associados ao direito à vida, à formação dos direitos de personalidade, à integridade física e ao direito ao corpo, em particular, à liberdade de consciência e ao poder de dispor do próprio corpo.
s chamados direitos fundamentais estão de tal forma relacionados à dignidade e aos direitos essenciais da pessoa que são, inclusive, considerados como cláusulas inatingíveis por diversas constituições democráticas pelo mundo, ou seja, não podem ser alterados por legislações.
A questão dos transplantes frequentemente tangencia questões éticas relativas à experimentação no corpo humano, às decisões políticas relacionadas com a saúde, e, em sentido mais amplo provocam debates sobre estes direitos fundamentais.
Estes debates estão associados a aspectos que vão desde a origem dos órgãos e tecidos, até a forma de obtenção e ao tipo de procedimento realizado para o transplante.
Vamos começar pela origem dos órgãos destinados a transplantes. Existem basicamente três fontes de órgãos e tecidos utilizáveis. Este material pode ser coletado de:
Os xenotransplantes, por enquanto, são apenas uma possibilidade teórica.
Muitos estudos vêm sendo realizados no sentido de transplantar órgãos e tecidos entre espécies distintas. Os defensores desta técnica ressaltam os argumentos de que esta possibilidade diminuiria muito o tempo de espera por órgãos e muitas vidas poderiam ser salvas. Há, no entanto uma série de dificuldades técnicas que ainda precisam ser vencidas. A principal delas se refere às rejeições e à possibilidade de transmissão de vírus não humanos para os receptores. Além destas, há ainda aspectos éticos envolvidos como o direito ou não de humanos em utilizar-se de animais para fins de retirada de órgãos.
O alotransplante intervivos, naturalmente implica na utilização de órgãos e tecidos específicos e na necessidade de respeitar-se ao preceito ético da não maleficência do doador.
Isto é, não podemos promover uma doação se a mesma produzir no doador algum tipo de dano ou prejuízo a sua saúde geral. Estes aspectos já estavam dispostos na Lei 9.434/97 (Lei dos Transplantes) que estabelece em seu capítulo III, parágrafo 3, que:
“Só é permitida a doação referida neste artigo quando se tratar de órgãos duplos, de partes de órgãos, tecidos ou partes do corpo cuja retirada não impeça o organismo do doador de continuar vivendo sem risco para a sua integridade e não represente grave comprometimento de suas aptidões vitais e saúde mental e não cause mutilação ou deformação inaceitável, e corresponda a uma necessidade terapêutica comprovadamente indispensável à pessoa receptora.”
O alotransplante de doador cadáver é de fato o mais comumente utilizado para a grande maioria dos casos e a principal questão ética envolvida diz respeito ao critério de morte, na medida em que esta precisa ser atestada para que se promova a remoção do órgão.
O Conselho Federal de Medicina, através da Resolução CFM 1480/97, alterou o critério de morte que anteriormente estava vinculado à falência cardiorrespiratória para a morte encefálica, possibilitando com isso, grande avanço na viabilidade e efetividade das doações. Assim, neste tipo de doação por cadáver, a questão, hoje, resume-se praticamente à forma de obtenção dos órgãos.
Neste aspecto, a questão ética mais premente, se refere ao questionamento da prevalência e manutenção da voluntariedade e da espontaneidade no ato de doar ou se considerar o princípio pelo qual o bem-comum está acima da vontade individual e, consequentemente, se aceita a apropriação de órgãos de cadáveres.
No bojo desta questão, reside o questionamentoacerca do fato de sermos ou não donos de nosso corpo. O que pode não ser uma questão tão simples quanto parece como vimos em nossa aula 2 nos princípios éticos da santidade da vida e da totalidade.
Ser dono implica na relação de posse o que, a princípio, só se estabelece em relação a coisas (objetos) e em poder dispor destes objetos em função exclusivamente de sua vontade. Não é assim que o corpo é concebido atualmente. As partes do corpo não podem ser dissociadas na noção integral de pessoa. Pertencem ao conjunto da nossa identidade. Não são coisas e muito menos podem ser utilizadas independentes da vontade.
As formas de obtenção de órgão são comumente distribuídas pelas seguintes modalidades:
Doação voluntária. Consentimento presumido. Manifestação compulsória ou abordagem de mercado.
A doação voluntária é aquela realizada através da vontade expressa do doador quando em vida. Até 1997, no Brasil, os órgãos só poderiam ser utilizados se a pessoa tivesse assim procedido. A partir daquele ano, a legislação brasileira substituiu a doação voluntária pelo consentimento presumido. Por esta modalidade presume-se que todo cidadão é um doador em potencial a menos que tenha expressado vontade contrária. Assim, se não há manifestação explicita da negativa de doação, as equipes de saúde podem proceder a retirada dos órgãos.
Em 1998, através de medida provisória e em 2001 promulgada pela Lei 10.211/2001(que alterou alguns dos dispositivos da Lei dos transplantes original de 1997) a legislação brasileira (houve ainda a Lei 11.633 de 2007 que incluiu um artigo na lei original sobre o direito a informação sobre os benefícios da doação de placenta e sangue do cordão umbilical) substitui este critério pelo do consentimento familiar, onde o cônjuge ou parente na linha sucessória assume a responsabilidade pela autorização da doação.
As duas demais modalidades, representam apenas propostas ainda não amplamente debatidas.
A chamada manifestação compulsória defende o conceito de que todo cidadão deve fazer formalmente a opção entre ser ou não um doador e a abordagem de mercado defende a possibilidade de incentivos financeiros à família do doador como forma de estimular as doações voluntárias.
De modo geral, podemos resumir os aspectos vinculados à questão da doação de órgãos a um conjunto de princípios éticos gerais, nos quais, se vinculam intrinsecamente as questões dos transplantes. São eles:
O princípio da intangibilidade corporal, que associa de modo absoluto o corpo à identidade pessoal, e assim, estende ao corpo do indivíduo (e às suas partes) os mesmos princípios de dignidade e indisponibilidade por terceiros que regem os direitos da pessoa. O sentido de integridade, portanto, fica compreendido sob a perspectiva da integridade pessoal ampla, não sendo possível separar o “eu físico” do psíquico, compondo ambos uma única identidade. Assim, intervenções no corpo são sempre interpretadas como intervenções na integridade pessoal.
O princípio da solidariedade, que considera que o ato de doar órgãos inclui-se na possibilidade que os indivíduos têm de sacrificar sua individualidade em detrimento do bem da comunidade (de outros), desde que estas doações não impliquem em comprometimento da vida ou da saúde geral da pessoa.
O princípio da totalidade (já visto na aula 2), que entende o corpo como uma unidade, sendo cada parte do mesmo avaliada de acordo com o todo. Assim, cada parte (membro, órgão ou função), só pode ser sacrificada em função da unidade do corpo, ou seja, desde que isso seja útil para o bem-estar de todo o organismo ou que em caso de doação a terceiros, não comprometa a integridade geral.
A estes princípios éticos gerais, somam-se ainda aspectos específicos que se traduzem em princípios do biodireito próprios para as situações de transplantes. Dentre eles, destacam-se:
O princípio da autonomia, pelo qual qualquer coleta de tecidos ou órgãos tem de passar pelo consentimento do doador.
O princípio da confidencialidade, pelo qual se preserva o direito do indivíduo doador em decidir qual a informação sua que autoriza a veiculação ao receptor e qual quer manter em anonimato.
O princípio da gratuidade, que estabelece que o órgão ou tecido apenas poderá ser dado e nunca vendido, visto que não se trata de objetos e sim partes da própria individualidade.  
Há, ainda, o princípio da não discriminação, em que a seleção dos receptores só pode ser feita mediante critérios médicos. O Ministério da Saúde, através do Sistema Nacional de Transplantes, estabeleceu na Portaria n.º 3.407 de 5 de agosto de 1998 o chamado sistema de lista única. Este sistema informatizado integra toda rede de saúde nacional e segue critérios de distribuição específicos para cada tipo de órgão ou tecido, alocando cada receptor em função de sua posição na lista de espera pelos critérios próprios do órgão ou tecido ao qual se candidatou.
Segundo José R. Goldim, a alocação dos órgãos para transplante deve ser feita em dois estágios. “O primeiro estágio deve ser realizado pela própria equipe de saúde, contemplando os critérios de elegibilidade, de probabilidade de sucesso e de progresso à ciência, visando à beneficência ampla. O segundo estágio, a ser realizada por um Comitê de Bioética, pode utilizar os critérios de igualdade de acesso, das probabilidades estatísticas envolvidas no caso, da necessidade de tratamento futuro, do valor social do indivíduo receptor, da dependência de outras pessoas, entre outros critérios mais.”  
5.Ética e Reprodução Humana.
Veremos nesta aula de que modo as novas tecnologias na área de saúde trazem, junto com seus inegáveis benefícios, uma série de novos problemas e questões éticas que necessitam ainda ser melhores exploradas.
Faremos um apanhado dos principais pontos de vista acerca do conceito de “início da vida humana” e analisaremos suas implicações em todos os temas relacionados à reprodução humana.
Conheceremos ainda alguns princípios da Bioética associados à reprodução humana assistida e as principais legislações a respeito deste tema.
Faremos algumas considerações a respeito das possíveis equivalências entre os aspectos éticos envolvidos na adoção e da reprodução assistida e encerraremos a aula com uma análise ética do aborto, atualmente um dos temas mais sensíveis e polêmicos da Bioética.
Novas tecnologias.
Sempre que a tecnologia avança, seja em que campo for, ela trás consigo outros fatores paralelos à evolução do conhecimento. O mais pragmático destes fatores está no próprio uso destas novas tecnologias. Assim como o laser pode ser usado para curar, pode também ser utilizado para fins bélicos. Não podemos confundir a tecnologia em si, com o uso que se fará dela.
Os frequentes avanços tecnológicos na área da saúde se, por um lado, têm propiciado imensos benefícios para a sociedade, por outro lado, têm também feito surgir novos problemas e questões éticas a serem discutidas e consideradas. Novas questões que surgem a partir de novas possibilidades de intervenção do homem sobre os fatos.
Assim tem sido em relação às alternativas de manipulação genética, no desenvolvimento de técnicas de transplantes e também nos aspectos relacionados à fertilização e reprodução humana. 
Estes procedimentos levantam não apenas questões éticas individuais, relativas aos direitos da pessoa e ao modo como pretendem se beneficiar destas tecnologias, mas também nos incitam às questões relativas à saúde coletiva, na medida em que, em geral, estas tecnologias vêm associadas a novos instrumentos de diagnóstico e tratamento e, por isso, implicam em princípios de justiça e alocação de recursos na área de saúde que, normalmente são escassos e caros.
Vida humana.
As questões éticas envolvidas nos procedimentos ligados à reprodução humana abarcam uma série de aspectos, mas seu conceito básico é: o objetivo da reprodução é a geração da vida.
O que pode ser considerado “vida humana”?
Em que momento a vida biológica deve ser reconhecida como pessoa?
Existem na literatura atual cerca de vinte diferentes critériospara o estabelecimento do início da vida humana.
Para a igreja Catóilica:
1987- A Igreja Católica possui um extenso documento intitulado “Instrução sobre o respeito à vida humana em suas origens e a dignidade da procriação em resposta a determinadas questões da atualidade”. Neste documento (Donum Vitae) datado de 1987, fica formalmente estabelecido que, pela perspectiva da Igreja, o início da vida humana se dá no momento em que ocorre a fecundação.
2008-Mais recentemente, em 2008, publica outro documento sobre aspectos de Bioética ligados à dignidade humana onde reforça este entendimento e considera como lícitas as tecnologias de fertilização que auxiliam os casais a procriarem desde que estas respeitem a preservação do ato procriativo em si e considera moralmente ilícitas as tecnologias que dissociam a procriação do ato sexual como a criogenia ou a fecundação “in vitro”.
Além da perspectiva eclesiástica há ainda outros critérios de abordagens mais direcionadas aos aspectos do desenvolvimento embrionário. Alguns destes critérios vinculam o início da vida humana:
Ao início dos batimentos cardíacos (3 a 4 semanas).
 Ao surgimento da atividade do tronco cerebral (8 semanas).
Ao início da atividade neocortical (12 semanas). 
Ao surgimento dos movimentos respiratórios (20 semanas).
Ao aparecimento do ritmo sono-vigília (28 semanas). Há ainda quem defenda que o ser humano se caracteriza apenas a partir do surgimento da consciência e do “comportamento moral” (18 a 24 meses pós-parto).
Reprodução Assistida.
Independente da questão da gênese do ser humano, talvez o mais importante tema ético da atualidade no que se refere à reprodução, seja mesmo o debate sobre os procedimentos de reprodução assistida. J. Goldim relata que desde o século XVIII já existem relatos médicos sobre a tentativa de realização deste tipo de intervenção.
No entanto, apenas em 1978, com o nascimento de Louise Brown (que ficou notoriamente conhecida como o primeiro “bebê de proveta”) na Inglaterra, as técnicas de fertilização “in vitro” chegaram ao conhecimento do grande público e também ganharam mais interesse nas pesquisas médicas especializadas.
O nascimento desta criança foi de tal importância para o desenvolvimento cientifico e tecnológico na área da saúde que foi instituído na Inglaterra, em 1981, um comitê de investigação sobre fertilização humana e embriologia (Committee of Inquiry into Human Fertilization and Embriology), vinculado ao Ministério da Saúde britânico com o objetivo de desenvolver um relatório sobre as implicações éticas, sociais e legais provenientes da utilização desta nova biotecnologia.
O resultado deste comitê foi a publicação, três anos após sua instalação, do chamado Relatório Warnock (em referência a Mary Warnock, presidente do comitê). 
Grande parte dos aspectos da Bioética e do Biodireito atuais é pautada no texto deste relatório.
A partir da década de 90 as sociedades médicas mundiais passaram a inserir diretrizes éticas relativas às tecnologias de reprodução em suas normatizações. No Brasil, em 1992, o Conselho Federal de Medicina, seguindo as mais avançadas legislações mundiais e igualmente fundamentado no Relatório Warnock, instituiu com a Resolução CFM 1358/92, as Normas Éticas para Utilização das Técnicas de Reprodução Assistida. 
Atualmente, está em vigor a Resolução CFM 1957/2010 que revoga a anterior (após 18 anos) alterando alguns poucos aspectos, dentre os principais a substituição do termo “pré-embriões” por “embriões” e a introdução de um item que afirma que: “Não constitui ilícito ético a reprodução assistida post mortem desde que haja autorização prévia específica do (a) falecido (a) para o uso do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente”.
Uma série de ramificações temáticas de cunho ético está associada, de modo mais ou menos direto à questão da reprodução assistida. Existem aspectos éticos vinculados ao:
- Consentimento informado.
- Seleção de sexo da criança.
- A doação de espermatozoides, óvulos, embriões.
- A seleção dos embriões com bases na evidência da possibilidade de doenças congênitas.A maternidade substitutiva.
- A clonagem.
- A criopreservação de embriões.
- E muitos outros.
Ainda que em função de todos os avanços do Biodireito, tenhamos hoje uma legislação bastante rica em relação ao tema, as consequências éticas, legais e mesmo tecnológicas da fertilização in vitro; ainda precisam ser bem melhor definidas em muitos aspectos.
A questão da doação de gametas, por exemplo. 
A Resolução CFM 1957/10 institui que a doação deve preservar o anonimato entre receptores e doadores. O argumento principal é de que isso evitaria problemas futuros relativos às situações emocionais e legais com repercussões no desenvolvimento psicológico da criança. Esta perspectiva, no entanto, também não é consensual. Enquanto alguns especialistas acreditam que ela permite aos pais criar seus filhos exclusivamente em função de suas influências socioculturais, outros discordam e afirmam que o desconhecimento da origem genética interfere na completa percepção de sua identidade pessoal.
Em alguns países o anonimato não é obrigatório e, ainda assim, não há uma posição técnica definida em relação aos benefícios ou não deste sigilo para o desenvolvimento psicossocial da criança e/ou para o acompanhamento clínico de futuros problemas congênitos que venha a apresentar.
Outra questão associada à reprodução assistida envolve a possibilidade de gestação em casais homossexuais femininos. A legislação autoriza que mulheres utilizem sêmen doado para gestação independente da existência de vínculo familiar formal. 
Há, no entanto, intenso debate ético neste aspecto, que envolve o conceito de família, a admissão do casamento entre homossexuais e a equivalência de procedimentos para adoção e fertilização.
No Brasil, assim como em muitos outros países, a adoção de crianças por homossexuais tem sido admitida legalmente, o que indica também a tendência à aceitação da fertilização assistida para casais homossexuais femininos. Desta forma, por uma perspectiva ética, seria lícito estabelecer uma equivalência entre o que poderia ser chamado, segundo Goldim, de “fertilização legalmente assistida” (adoção) e a fertilização assistida pela concepção médica de intervenção clínica no processo.
As questões éticas envolvidas seriam então, fundamentalmente as mesmas:
Até onde deve ir a intervenção do Estado em adoções ou doações de gametas (espermatozoides óvulos) feitas de modo informal (algumas com forte apelo comercial)?
É moralmente ética a seleção de características físicas das crianças por parte dos futuros pais adotivos ou fertilizados?
Estes são apenas poucos exemplos das reflexões éticas envolvidas na questão da equivalência de procedimentos entre a adoção e a fertilização.
Aborto.
No sentido inverso da reprodução como criação da vida, o aborto se associa a ela pelo enfoque conceitual ou ideológico do princípio da vida humana e de quando a interrupção gestacional é simplesmente um procedimento clínico e quando passa a ser um crime contra a vida.
Existem condições previstas na legislação brasileira para a autorização de abortos legais (estupro e risco de vida materno) e propostas que flexibilizam estas condições estendendo-as à existência de anomalias fetais que implicam na possibilidade de doenças congênitas graves e irreversíveis (anencefalia, por exemplo).
Naturalmente que todas estas motivações ou condições, independente de aspectos legais, são profundamente conflitantes em termos éticos, pois implicam no direito a impedir o desenvolvimento da vida em função de critérios nem sempre absolutos.
O código penal brasileiro, que em seu artigo 128 desqualifica o aborto como crime em caso de gestação proveniente de estupro não especifica até que momento da gestação esta pode ser interrompida. Também não estabelece os procedimentos legais necessários para a qualificação comprovada do estupro.
Assim, a existência de um boletim de ocorrência policial contra um supostosujeito desconhecido pode facilmente promover uma autorização legal para o aborto. Isso, sem ainda considerarmos as mais de 3.000 liminares concedidas para o abortamento legal em função de anomalias fetais.
Os debates éticos a respeito do aborto estão longe de ser encerrados e tanto na esfera jurídica quanto filosófica dificilmente encontraremos consenso em um aspecto que depende tão diretamente de valores morais, religiosos e culturais.
O fato é que, existe uma premência neste tema que não pode aguardar as conclusões ideológicas dos debates. Esta premência é o imenso número de mulheres que todos os dias recorre a abortos em locais impróprios e profundamente arriscados do ponto de vista da preservação de sua própria integridade em função dos impedimentos legais de recorrerem ao sistema oficial de saúde.
Independente de qualquer valor, esta é uma realidade que não pode ser ignorada e que transforma a questão do aborto não apenas em um dos temas mais delicados e polêmicos da Bioética como também, cada vez mais, em uma questão de saúde pública.
6.Ética e Eutanásia.
Estudaremos agora o sentido de eutanásia e distanásia e veremos os principais argumentos em relação ao questionamento se estas ações podem ou não ser consideradas como éticas.
Utilizaremos um caso clássico de disputa judicial pelo direito à “boa morte” e analisaremos se este direito contradiz ou não os princípios básicos da atuação médica.
Conheceremos os tipos e as características da eutanásia quanto ao modo e quanto às responsabilidades e findaremos nossa aula com um breve comentário sobre a legislação a respeito do assunto, citando o Código de Ética Médica e a Declaração de Madri da Associação Médica Mundial.
Morte.
A consciência de que a morte é um evento natural e indubitável para os seres vivos, não diminui seu impacto sobre nós e sempre representa uma situação de extrema dificuldade para os profissionais de saúde que lidam com pacientes em condições terminais.
Uma série de questões éticas e morais afloram no contexto da terminalidade da vida, associadas a aspectos tão distintos quanto os direitos do paciente em relação à verdade sobre suas reais condições, os objetivos da atuação médica ou aos paradoxos entre a consciência e a legalidade.
Dentre estas questões, talvez a mais angustiante seja a de que se pode, ou deve o médico ajudar um paciente que sofre de modo irreversível, a morrer? Ou, em outras palavras, a eutanásia pode ser considerada uma ação médica ética?
Eutanásia.
A palavra “eutanásia” tem origem grega e representa, literalmente, “boa morte”. É comumente entendida como a prática pela qual o médico abrevia a vida de um paciente incurável.
Esta tem sido uma das questões da bioética e do biodireito mais complexas e discutidas, na medida em que, se a proteção da vida é um princípio básico do Estado, também são direitos básicos da pessoa o respeito à autonomia e à vontade próprias. 
Assim, o fato de alguém desejar encerrar com sua dor, antecipando sua morte iminente, ou o desejo de um ente querido em por fim ao sofrimento de alguém sem chances de recuperação também não pode ser simplesmente ignorado.
Para entendermos melhor todas as implicações, éticas, políticas, sociais, morais e religiosas envolvidas, precisamos considerar alguns aspectos básicos. A atuação médica está fundamentada em dois pilares:
Se, nesses casos, considerarmos que a preservação da vida é o valor maior podemos incorrer na chamada “distanásia”. A manutenção artificial da vida possui implicações que vão desde os aspectos psicológicos conflitivos de familiares até a discussão política da utilização de recursos de saúde em pacientes incuráveis.
A questão ética a ser considerada é: A distanásia é mais ética do que a eutanásia? É válido estender a vida mesmo que a cura não seja possível e o sofrimento excessivamente penoso?
Naturalmente que, enquanto houver a mais remota possibilidade de reversão do quadro de morte inevitável deve-se sustentar a manutenção da vida, mas, em caso contrário, o que a ética determina é a priorização do segundo pilar: o alívio do sofrimento.
Poderíamos, então, considerar que aliviar o sofrimento, nesses casos compreendido como permitir ou antecipar a morte, no entanto, recai em uma outra grave questão: Quando desistir da vida? 
O americano Terry Wallis, após um acidente de carro, ficou 20 anos em estado de coma e retornou à consciência, voltando a falar e a recuperar movimentos do corpo. Certamente não é o tempo o padrão capaz de determinar esta resposta.
Bioética.
Princípios da Bioética, como a beneficência, a não maleficência, a autonomia e a justiça, seguem uma sequência determinada por condições de saúde e tratamento. Ou seja, em uma condição de tratamento normal e possibilidade de recuperação plena, evidentemente, o princípio prioritário é o beneficência e o tratamento, mesmo que implique em algum sofrimento, objetiva a preservação da vida.
Em condições, no entanto, em que a cura não é mais uma possibilidade, os objetivos precisam estar direcionados para a não maleficência, isto é, não causar dano ou dor desnecessários e sem justificativa.
Assim, a autonomia em recusar tratamentos, por exemplo, também precisa ser avaliada dentro desta perspectiva hierarquizada das condições de recuperação. Da mesma forma, o princípio da Justiça, na medida em que a utilização de recursos de saúde, como sabemos muitas vezes escassos e caros, em pacientes sem chances de recuperação por um longo período, implica aspectos sociais e econômicos que, apesar de delicados, também precisam ser considerados.
Tipos de eutanásia.
A eutanásia pode ocorrer de algumas formas distintas e, para cada uma destas formas, considera-se uma tipologia com características específicas.
“Eutanásia ativa”, onde é produzida uma ação que objetiva provocar deliberadamente a morte sem sofrimento. Com uma injeção letal, por exemplo.
Apenas três países no mundo (Uruguai, Holanda e Bélgica), atualmente admitem a prática legal da eutanásia ativa. Naturalmente que sem a anuência da Igreja.
“Eutanásia passiva” ou “ortotanásia”, se caracteriza pela interrupção de uma terapêutica que atuava na sustentação artificial da vida. A principal distinção entre com a eutanásia ativa é que nessa é cometida uma ação (injeção letal, por exemplo), enquanto que na eutanásia passiva há uma omissão como a não instalação de um procedimento terapêutico ou seu encerramento.
A eutanásia passiva e a de duplo efeito tem recebido maior condescendência tanto pela maioria das sociedades médicas quanto por correntes religiosas em função do princípio de “morte com dignidade”.
“Eutanásia de duplo efeito” é quando a morte é promovida indiretamente pelas ações médicas executadas com o objetivo de aliviar o sofrimento de um paciente terminal, como, por exemplo, a morfina que administrada para a dor pode provocar depressão respiratória e morte. 
Nestes casos, o objetivo da ação médica não é promover o óbito, mas assume-se seu risco em prol da amenização do sofrimento.
Outro tipo de classificação da eutanásia, diz respeito ao consentimento ou não do paciente ou de seus responsáveis legais para o ato. Este tipo de classificação está diretamente associado à questão do estabelecimento de responsabilidades sobre o ato.
Chama-se eutanásia voluntária, quando a morte provocada ocorre em atendimento a uma vontade explícita do paciente. A eutanásia voluntária é muito assemelhada ao conceito chamado de “suicídio assistido”. A distinção está no fato de que na eutanásia a ação é sempre realizada por outra pessoa, enquanto que no suicídio assistido a própria pessoa (mesmo que com auxílio de terceiros) executa a ação que a leva ao óbito.
Chama-se eutanásia involuntária, quando é provocada sem o consentimento do paciente quando este se encontra consciente e em condições de escolher e eutanásia não voluntária, quando é provocada sem que o paciente tenha manifestado seu desejo pelo fato de se encontrar sem condições de se expressar, normalmente em condições de coma ou no caso de recém-nascidos.Legislação.
Do ponto de vista legal, é importante frisar que no Brasil, o Conselho Federal de Medicina através do Código de Ética Médica (2009) em seu Artigo 41 explicita de modo claro a proibição de:
       “Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal.”
Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.
 OBS: Entende-se por ações terapêuticas obstinadas a prática da distanásia.
O CFM já havia, em 2006, aprovado a Resolução 1.805 que regulamentava e autorizava aos médicos a prática da ortotanásia (interrupção de terapêuticas que já não surtem mais efeitos em pacientes terminais) como forma de desestimular a distanásia (sustentação artificial da vida por tratamentos desproporcionais à condição de recuperação). 
A Justiça Federal, no entanto, entendeu que o Conselho de Medicina não teria autoridade para legislar em relação a esta questão e apenas em 2009 o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei 6.715 que exclui a ilicitude da ortotanásia do Código Penal desde que o médico possua o consentimento explícito do paciente ou de seu representante legal.
No final de 2010, a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados aprovou um substitutivo ao Projeto de Lei original incluindo a necessidade de avaliação do caso por junta médica. O texto final da lei, até o momento, ainda tramita no Legislativo.
Associação médica mundial.
Esta postura em relação à eutanásia e à ortotanásia também é a posição assumida pela Associação Médica Mundial. Em uma declaração publicada na 39ª Assembleia Médica Mundial em 1987 na Espanha (Declaração de Madri) e posteriormente reafirmada em 2005, na 107ª Seção do Conselho da Associação Médica Mundial na França, esta afirma que:
“Eutanásia, que é o ato de deliberadamente terminar com a vida de um paciente, mesmo com a solicitação do próprio paciente ou de seus familiares próximos, é eticamente inadequada. Isto não impede o médico de respeitar o desejo do paciente em permitir o curso natural do processo de morte na fase terminal de uma doença”.
Assim, sustenta-se a posição de que a eutanásia ativa é um ato que contraria os princípios éticos e deturpa a principal função médica de preservar a vida. 
A aceitação desta como uma postura médica implicaria autorização legal para matar o que dificilmente será aceito pela comunidade médica mundial, dentre outras razões, pelo fato de alterar os objetivos dos profissionais de saúde e comprometer, severamente, as relações de confiança entre os médicos e seus pacientes. 
No entanto, garante a legitimidade da suspensão de terapêuticas quando estas se mostrarem inúteis e estiverem apenas prolongando o sofrimento (ortotanásia).
7.Ética e Epidemias.
A alocação de recursos de saúde escassos em situações epidêmicas jamais será uma tarefa fácil ou isenta de pressões e conflitos. Apesar disso, precisamos estar preparados tecnicamente para aplicar critérios éticos nestas difíceis condições. Inicialmente, veremos como e porque, nestas circunstâncias, os direitos coletivos precisam suplantar os direitos pessoais. Analisaremos também, a importância de uma comunicação objetiva e clara pelos profissionais de saúde em seus comunicados. Conheceremos o Princípio da Precaução, originalmente concebido como base ética do Direito Ambiental, mas que pode muito facilmente se aplicar ao campo da saúde e como ele se integra perfeitamente a atuação preventiva em condições de risco à saúde pública. Finalmente, analisaremos os critérios de categorização dos recursos quanto à sua tipologia e identificaremos os principais critérios utilizados na priorização de recursos escassos na área da saúde.
Sistema éticos.
Os sistemas éticos devem considerar um delicado equilíbrio entre os direitos pessoais e a justiça social. 
Marx dizia que privilegiar as condições situacionais sem considerar os sujeitos e suas manifestações de vontade pessoal no entendimento ou análise dos processos históricos era um equívoco tão grande quanto entender determinadas tomadas de decisões pessoais sem levar em conta as condições históricas e temporais inerentes aos sujeitos.
Ou seja, do mesmo modo como não podemos analisar os eventos sem compreendermos as pessoas que os produziram, também não podemos compreender as ações pessoais sem entendermos os contextos históricos e temporais nas quais estas pessoas estão inseridas. Precisamos considerar que as possibilidades de atuação são sempre dependentes das condições do momento da ação.
Esta correlação entre condições situacionais e condutas, valores e direitos, também se reflete em termos éticos. Diversos documentos internacionais como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (adotada na Assembleia Geral das Nações Unidas – ONU – em 1948) e nossa própria Constituição de 1988, estão fundamentados nas garantias individuais, coletivas e transpessoais.
Os direitos individuais incluem a vida, a privacidade, a liberdade e a não-discriminação, entre outros. Todos estes direitos devem ser preservados. Contudo, em situações excepcionais como de uma epidemia (doença disseminada em larga escala local) ou pandemia (doença disseminada em escala mundial), estes direitos individuais podem ser suplantados pelos direitos coletivos.
Em condições normais, os atendimentos de saúde, por exemplo, devem refletir direitos pessoais e posturas que podem não ser consideradas viáveis e oportunas em condições especiais. Neste tipo de situação a alteridade precisa se sobrepor à neutralidade e a ética impõe a consciência de que toda a sociedade é corresponsável, todos devem estar engajados em um mesmo esforço solidário, não por dever ou obrigação legal, mas por reconhecer que é este conjunto de ações que nos torna humanos. Em função disto, alguns direitos pessoais, como a liberdade de ir e vir, por exemplo, podem ser suprimidos se a pessoa doente precisar ser posta em regime de quarentena ou isolamento para não contaminar outras pessoas.
Entende-se que a saúde da população em larga escala é um bem maior do que a manutenção da liberdade de locomoção individual se esta implicar em risco aos demais. Da mesma forma, também não podemos considerar como quebra da privacidade individual, a comunicação compulsória das informações de pacientes acometidos por doença contagiosa às autoridades sanitárias, pois seu objetivo exclusivo é o controle epidemiológico. Ou seja, a regra básica em situações epidêmicas é a de que a manutenção dos direitos individuais fica sempre condicionada à preservação dos direitos coletivos.
Pânico.
Um dos primeiros e mais imediatos efeitos sociais em situações epidêmicas é o pânico que acomete a população em geral. O desconhecimento sempre nos faz superdimensionar os riscos de uma situação. Este é um mecanismo de defesa psicológico normal e o profissional de saúde, principal agente de informação nestas situações, precisa compreender esta ansiedade coletiva e atuar de modo a contribuir para a restauração da calma e da ordem pública.
A melhor forma de lidar com estas situações e tranquilizar as pessoas é através do esclarecimento das dúvidas mais frequentes e divulgação de informações claras, objetivas e em linguagem acessível ao público leigo. Se os riscos não forem corretamente dimensionados, certamente as ações de prevenção também não o serão.
Princípios Éticos.
Hans Jonas, filósofo alemão contemporâneo (falecido em 1993), fez importantes contribuições à Bioética em suas obras. Um de seus livros mais importantes foi “O Princípio da Responsabilidade” de 1979, onde expõe a necessidade de que os efeitos de nossas ações precisam ser sempre compatíveis com a permanência da vida humana.
Este princípio moral básico influenciou uma série de outros aspectos relativos à ética envolvida em pesquisas, em normas do direito ambiental e,naturalmente na saúde pública também. Um dos conceitos mais atuais e fortemente influenciados pelas ideias de Jonas é o Princípio da Precaução.
Em 1992, ocorreu na cidade do Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que ficou conhecida pelo nome de ECO 92. Nesta conferencia, foi formulado um importante documento, denominado de Agenda 21, no qual em seu anexo, consta o PRINCÍPIO 15:
“Com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades. Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação do meio ambiente”.
Se considerarmos o sentido geral deste princípio (e não o analisarmos apenas pela perspectiva do direito ambiental), veremos que ele trata essencialmente da relação entre o risco existente em uma ação e as medidas necessárias para prevenir os efeitos negativos advindos desta ação. Ou seja, na ausência de absoluta certeza científica sobre os riscos ou danos envolvidos em uma ação, é necessário que tomemos medidas eficazes preventivas de evitação de todas as possibilidades possíveis de danos. Assim, nenhuma medida preventiva em situações epidêmicas pode ser descartada sem que esteja absolutamente comprovada a ausência de sua necessidade.
Outro importante aspecto ético a ser considerado é o da alocação de recursos de saúde, que sempre se tornam escassos em relação à demanda em condições epidêmicas. Instalações sanitárias, equipamentos, medicamentos, recursos humanos especializados, precisam ter seus critérios de distribuição e priorização claramente definidos. Torna-se indispensável a conjugação citada no início da aula, entre critérios individuais e coletivos, pois se o critério individual considera o benefício que o tratamento resultará no sujeito doente, o critério coletivo implica na prevenção ou imunização de sujeitos ainda não contaminados, para que estes não venham a desenvolver a doença. Os profissionais de saúde acostumados a tomar decisões em suas rotinas, sabem que os aspectos éticos são fundamentais no processo decisório. A ética, no entanto, não se baseia em regras estanques, mas na busca pelo bem, pelo correto, pelo que é adequado em uma dada circunstância. Estes aspectos se tornam evidentes em situações de alocação de recursos escassos e não se pode decidir exclusivamente em função de fatos objetivos. Valores são componentes determinantes destas decisões. 
Ainda assim, ou apesar disso, não podemos também abrir mão de critérios de justiça neste processo decisório. E critérios de justiça tendem a ser mais objetivos e imparciais.
Critérios.
Dentre estes critérios, José R. Goldim indica a utilização de duas características básicas na classificação da tipologia dos recursos a serem utilizados.
A primeira destas características se refere ao fato de os recursos serem divisíveis ou não.
A segunda se refere ao fato de serem homogêneos ou heterogêneos em relação à clientela que deles necessita.
Estas categorias são normalmente analisadas em conjunto. Por exemplo: Medicamentos a serem distribuídos para um grupo de pacientes com a mesma patologia é um recurso homogêneo e divisível, na medida em que todos irão dividir o estoque do mesmo remédio. Já o estoque de sangue, é um exemplo de recurso que, apesar de ser divisível, pois muitos utilizarão o mesmo estoque, é heterogêneo, na medida em que nem todos terão necessidade dos mesmos componentes.Os leitos hospitalares são recursos indivisíveis homogêneos, pois apenas um paciente pode usufruir do mesmo recurso que todos necessitam por igual e um órgão a ser implantado em um paciente é um recurso indivisível e heterogêneo, na medida em que cada órgão atenderá a apenas um paciente e nem todos os pacientes podem se beneficiar do mesmo órgão.
Critérios de priorização.
Quanto aos critérios de priorização para utilização destes recursos, em geral, os mais comumente utilizados são:  
Igualdade de Acesso: Este critério, na forma como é proposto por Edmond Cahn, defende que do ponto de vista ético se um recurso não pode ser acessível a todos que dele necessitam, então não pode ser ofertado a ninguém. Esta perspectiva segue a lógica de que não seria ético salvar a vida de uns em detrimento das vidas de outras pessoas. Este critério é denominado como sendo a igualdade de acesso real. Já James Childress, em uma perspectiva diferente do mesmo critério, denominada de igualdade de acesso provável, considerar que a igualdade não estaria necessariamente na possibilidade de acesso do recurso a todos, mas na forma como as pessoas seriam escolhidas para se beneficiar destes recursos. Assim, defende a escolha através de sorteios, filas de espera e outras formas aleatórias de definição de beneficiados. (in J.R. Goldim - http://www.ufrgs.br/bioetica/acessoig.htm)
Benefício Provável: Fundamentado em dados estatísticos este critério considera a probabilidade que cada indivíduo em particular (microalocação) ou um grupo de indivíduos (macroalocação) tem em se beneficiar do recurso que está sendo disputado.
Efetividade: O critério orientado para o futuro, a efetividade prega que os recursos escassos devem ser alocados para aqueles pacientes que possam fazer o melhor uso para si (efetividade local) ou para os outros, especialmente a sociedade, como, por exemplo, a priorização a agentes de saúde e demais profissionais de serviços essenciais (efetividade global).
Merecimento: O critério do merecimento é voltado para o passado, para a vida pregressa de cada pessoa que necessita o recurso. Segundo este critério, os recursos devem ser alocados prioritariamente para pessoas que já demonstraram efetiva contribuição para a sociedade, como uma forma de agradecimento ou demonstração de sua importância ao grupo social.
Necessidade: O critério da necessidade vincula a disponibilização de recursos escassos àqueles que deles mais necessitam em uma condição presente. Ou seja, estabelece a prioridade aos que estão em estado de saúde mais grave, independente de qualquer análise referente ao custo desta intervenção ou mesmo à efetividade da terapêutica.
Estes e outros critérios visam dar alguma objetividade a um processo decisório de alocação de recursos de saúde em situações de escassez. Naturalmente que, apesar disso, esta jamais será uma tarefa fácil ou isenta de conflitos internos ou mesmo livre de pressões políticas ou econômicas.
O objetivo principal destes procedimentos é evidenciar justamente a complexidade destas ações, na medida em que tentativas de simplificação deste processo decisório, invariavelmente, implicarão em injustiças ou favorecimentos ilícitos e antiéticos.
8.Relaçãode equipe multidisciplinar em saúde.
Discutiremos os preceitos que compõem uma atuação interdisciplinar ética e responsável. Entenderemos a importância do respeito à autonomia de cada especialidade para que não ocorram conflitos ou desestabilidades nas relações entre os membros da equipe. Finalmente, conheceremos as habilidades cognitivas que precisam estar presentes em uma formação interdisciplinar através do relatório da UNESCO e como esta formação precisa estar centrada no princípio da integralidade, abarcado pelas ciências da saúde.
Conceituação.
Até a primeira metade do século XX, apenas quatro categorias profissionais estavam formalmente habilitadas para o exercício de atividades na área de saúde.
Hoje, o Conselho Nacional de Saúde, através da Resolução 287/98, reconhece 14 diferentes carreiras de nível superior neste setor:
São elas: Biomedicina, Biologia, Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Medicina, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia, Serviço Social e Terapia Ocupacional.
Além destas, há ainda diversas profissões formais de nível médio que participam ativamente desta área de atuação. Todos estes profissionais, oriundos das demandas provenientes

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