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Semana 3 Classificação dos atos jurisdicionais

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Classificação dos atos jurisdicionais
Prof. Dra. Adriana Geisler
2016.1
I – Considerações gerais:
Podem ser: 
I.1 - Despachos de mero expediente:
Atos ordinários do processo (destinados ao impulso do processo)
Sem qualquer carga decisória
Não possuem natureza recursal / caracterizam-se pela irrecorribilidade
Podem ensejar correição parcial (medida de caráter administrativo-disciplinar oponível contra atos de magistrado praticados por erro de procedimento (error in procedendo). 
Ex.: Situação que pode ensejar correição parcial: inversão tumultuária (eg. deferimento de oitiva de testemunhas arroladas pelo assistente de acusação quando já tinha iniciado a oitiva das testemunhas de defesa)
Ex.: determinação de que seja o réu citado; de que sejam arroladas as testemunhas arroladas; vista às partes para que se manifestem sobre desistência de testemunhas; aprazamento de audiências, etc..
	
I.2 - Decisões: pronunciamentos que produzem sucumbência, resolvendo incidentes processuais ou pondo fim ao processo.
Classificações:
A) Quanto ao recurso cabível (sobretudo nas hipóteses em que a lei não é expressa a respeito): 
a.1) Sentenças definitivas de condenação ou de absolvição (stricto sensu): 
Possuem carga decisória plena (julgam o mérito da causa em todos os seus aspectos), pondo fim no processo e absolvendo ou condenando o réu, depois de todas as etapas do procedimento. 
Geram sucumbência, podendo ser sempre impugnadas  recurso cabível: apelação (art. 593, I e III, do CPP) 
OBS.: A decisão que decide a imputação de crime político não admite apelação, mas recurso ordinário constitucional para o STF (art. 102, II, b)
• Absolutórias: 
	- Próprias: aquelas que julgam improcedente a acusação, importando em reconhecimento da plena inocência do réu.
	- Impróprias: as que absolvem o réu com imposição de medida de segurança em razão do 	reconhecimento da sua inimputabilidade total ao tempo do fato (art. 386, VI, 2ª. parte, e §único, 	III, do CPP)
OBS.: a decisão que absolve sumariamente o réu em julgamento antecipado do processo não possui natureza de sentença stricto sensu, pois surge incidentalmente no processo, embora tenha sido tratada como tal no art. 416, do CPP
Requisitos formais (art. 381 e seguintes, do CPP): ausência torna viciada a decisão (de uma simples irregularidade até a inexistência do ato):
▪ Relatório (art. 381, I e II): 
 Resumo dos principais etapas do procedimento e dos incidentes, ressalvada a hipótese do art. 81, §3, da Lei 9099/1995); 
 Ausência: nulidade absoluta (art. 564, IV, do CPP)
Sobre a exigência de identificação das partes (art. 381, I, do CPP): exceto nos processos iniciados por meio de denúncia (a impessoalidade é característica do MP; o promotor não fala em nome próprio) X ação penal intentada mediante queixa: referencia ao nome do querelante é obrigatória, sob pena de nulidade.
Sobre a exigência de exposição sucinta da acusação e da defesa: causa de nulidade
OBS.: se às teses das partes forem apreciadas na fundamentação: não há que se falar em nulidade se não estiver concretamente demonstrado o prejuízo (art. 563, do CPP).
▪ Motivação: 
 Raciocínio lógico realizado pelo juiz (art. 93, IX, da CRFB/1988 e art. 381, III e IV, do CPP);
 Deve abranger tanto matérias de fato (autoria e materialidade) quanto à jurídicas (tese da acusação e da defesa, ainda que não necessariamente sem a necessidade de resposta individualizada/ importa análise contextualizada)
 Deve indicar os dispositivos de lei incidentes no caso concreto (ausência importa em nulidade absoluta, salvo se houver referência implícita aos artigos) Exceção: Tribunal do Juri; 
OBS.: deve se ater ao objeto do processo, não podendo implicar em julgamento citra (não analisa todos os fatos articulados na denúncia ou queixa, importando em nulidade sanável (mediante a oposição de embargos declaratórios)
▪ Dispositivo (ART. 381, V, do CPP): conclusão da sentença, indicando os respectivos dispositivos legais
 Sentença condenatória: deve consignar o tipo legal em que inserida a conduta criminosa pela qual o réu está sendo responsabilizado. 
 Ausência: causa de nulidade sanável (pela referência ao nomem iuris do crime)
 Sentença absolutória: declinar o respectivo fundamento (dentre os incorporados aos arts. 386, 397 ou 415, do CPP). 
Importância: em determinadas hipóteses, a sentenças absolutórias elide a obrigação de indenizar – segurança para o reú; 
 Ausência: não implicará nulidade, se pelo teor da motivação, for possível deduzí-lo (art. 563, do CPP); 
▪ Autenticação (art. 382, VI, do CPP): oposição da assinatura do juiz, sob pena de tornar a sentença inexistente; 
OBS.: ver ainda art. 388, do CPP (rubrica) – STJ: “dado formal secundário”  simples irregularidade 
• Condenatórias: acolhem o pedido formulado na inicial acusatória, aplicando ao réu uma pena.
- Efeitos da sentença penal condenatória: ver quadro a seguir:
a.2) Decisões interlocutórias: 
Situam-se entre os despachos de mero expediente e as sentenças propriamente ditas (natureza residual):
Possuem carga decisória
Podem acarretar ou não a extinção do processo.
Natureza residual: procedimentos que não podem ser enquadrados nem como despachos de mero expediente, e nem como sentenças stricto sensu.
Podem ser simples ou mistas
• Simples (a maioria das decisões judiciais):
Resolvem incidentes processuais ou questões atinentes à regularidade formal do processo que venham a surgir antes da sentença, sem acarretar qualquer extinção, seja do processo ou mesmo de qualquer fase procedimental. 
Ex.: decretação da prisão preventiva; procedência da exceção de incompetência; desclassificação levada a efeito no tribunal do júri.
Para recordar: 
- Incidentes processuais: controvérsias atinentes a direito processual, levantadas durante o trâmite do procedimento principal, e que devem ser resolvidos antes da análise do mérito da causa (questão principal). A esse respeito ver, arts. 95 a 154, do CPP: exceções (art. 95 a 111); incompatibilidades e impedimentos (art. 112); conflito de jurisdição (arts. 113 a 117); restituição das coisas apreendidas (arts. 118 a 124); medidas assecuratórias (arts.125 a 144); incidente de falsidade (arts. 145 a 148); incidente de insanidade mental do acusado (art. 149 a 154).
- Recurso: recurso em sentido estrito (art. 581, do CPP) quando, evidentemente, houver previsão legal que respeite o caso concreto em análise) ou habeas corpus, mandado de segurança ou correição parcial.
Ex.: relaxamento de prisão  recurso em sentido estrito (art. 581, V, do CPP)
 indeferimento da habilitação do assistente  ver art. 273, do CPP (decisão irrecorrível) - mandado de segurança (entendimento consolidado)
• Mistas: 
Pronunciamento do juiz que ocorre antes da sentença final, possuindo, obviamente, carga decisória.
 
Acarretam a extinção do processo (provocando o respectivo arquivamento) ou põem fim a qualquer das etapas do procedimento, julgando ou não o mérito. 
Sempre impugnáveis (pois produzem sucumbência).
Recurso: recurso em sentido estrito, desde que haja previsão legal; não havendo, serão sempre apeláveis (art. 593, II, do CPP) 
Podem ser:
- Terminativas (decisões definitivas): ainda que não possuam natureza de sentença, põem fim ao processo ou procedimento. 
Ex.: rejeição da denúncia; impronúncia (juiz conclui que não há provas de materialidade ou indícios de autoria ou de participação para levar o acusado a julgamento perante o tribunal do júri), procedência das exceções de coisa julgada e de litispendência, absolvição sumária (arts. 397 e 415, do CPP); acolhimento das exceções de ilegitimidade da parte.
- Não terminativas (ou com força de definitivas): embora não acarretem a extinção do processo, põem fim a uma etapa do rito/procedimento: 
Ex.: pronúncia (único exemplo aceito pela unanimidade da doutrina), que extingue a primeira etapa do procedimento dos crimes
dolosos contra a vida (juditium acusationes)dando início à segunda fase do rito (judicium causae/ juízo da causa: julgamento pelo juri da acusação admitida em fase anterior)
B) Quanto à eficácia produzida pela decisão no sentido de admitir ou não a sua execução imediata:
• Executáveis: podem ser executadas imediatamente. 
Ex.: sentença absolutória proferida pelo juiz, que importa em imediata liberdade ao réu nos termos do art. 596 do CPP.
• Não executáveis: não admitem execução imediata, condicionando-se ao trânsito em julgado.
Ex1.: sentença condenatória (presunção de inocência: expedição da guia para a execução depois do trânsito em julgado)
Ex2.: decisão que extingue medida de segurança, viabilizando a desinternação ou liberação (art. 179, da LEP - Lei 7210/1984)	
C) Consideração da condição do órgão prolator:
• Decisões subjetivamente simples: proferidas por apenas um órgão monocrático;
Ex.: sentença condenatória proferida por juiz singular
• Subjetivamente plúrimas: provêm de um órgão colegiado homogêneo (Câmaras, turmas, grupos, e seções dos tribunais)
Ex.: acórdão que, julgando a apelação da defesa, absolve o réu.
• Subjetivamente complexas: resultam do pronunciamento simultâneo de mais de um órgão monocrático, prevalescendo o que for decidido pela maioria.
Ex.: julgamentos do Tribunal do Juri.
E) Decisões declaratórias e constitutivas e constitutivas negativas:
• declaratórias: se limitam a declarar uma situação jurídica preexistente. 
Ex.: decisão que reconhece a extinção de punibilidade pela morte do réu; pronunciamento que anula o procedimento penal em face da constatação de nulidade absoluta.
• constitutivas positivas: fazem surgir uma nova situação jurídica. Ex.: decisão concessiva da reabilitação criminal (do status de réu ao de reabilitado)
• constitutivas negativas: importam em desconsiderar um ato jurídico anterior, até então válido e eficaz. 
Ex.: Revisão Criminal (desfaz sentença com trânsito em julgado)
PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO E PRINCÍPIO DA CONSUBSTANCIAÇÃO. MUTATIO LIBELLI E EMENDATIO LIBELLI
- Institutos próprios da sentença condenatória e da decisão de pronúncia, implicando nova definição jurídica do fato. 
- É por meio deles que o juiz, ao sentenciar, atribui ao fato descrito uma capitulação (artigo) distinta daquela originariamente incorporada à denúncia ou à queixa. 
- Diferença entre as duas hipóteses: enquanto na emendatio libelli esta definição jurídica diversa não decorre do reconhecimento de circunstâncias das quais o réu não se tenha defendido, na mutatio libelli ocorre exatamente o contrário, isto é, o juiz acrescenta ao fato descrito circunstâncias ou elementos que, por não integrarem a descrição realizada na peça vestibular, não foram objeto de defesa no curso normal da marcha processual.
- O estudo desses institutos está intimamente relacionado a dois princípios básicos em matéria de sentença penal: primeiro, o princípio da consubstanciação, segundo o qual o réu defende-se dos fatos descritos na denúncia ou na queixa-crime e não da capitulação; e, segundo, o princípio da correlação da sentença, traduzindo-se este como a necessidade de amoldar a sentença aos fatos descritos na inicial acusatória.
• Art. 383, do CPP (Emendatio libelli) 
caput: o juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave.
A sentença está limitada apenas à narrativa feita na peça inaugural (princípio da correlação), pouco importando a tipificação legal dada pelo acusador.
Cabe ao juiz a correta descrição do fato, podendo o juiz emendar (emendatio) a acusação (libelli) para dar-lhe a classificação que julgar a mais adequada, mesmo que impondo pena mais severa. Trata-se de aplicação pura do brocardo jura novit curia, pois, se o juiz conhece o direito, basta narrar-lhe os fatos (narra mihi factum dabo tibi jus). 
Emendatio libelli : simples emenda na acusação, mediante correção na tipificação legal.
Não há necessidade de prévia vista à defesa, nem esta poderá alegar surpresa, uma vez que não se defendia da classificação legal, mas da descrição fática da infração penal. 
Ex.: A denúncia narra que fulano empurrou a vítima e arrebatou-lhe a corrente do pescoço, qualificando como furto tal episódio. Nada impede seja proferida sentença condenatória por roubo, sem ofensa ao contraditório, já que o acusado não se defendia de uma imputação por furto, mas da acusação de ter empurrado a vítima e arrebatado sua corrente. Nesse caso, diz-se que houve uma simples emenda na acusação (emendatio libelli), consistente em mera alteração na sua classificação legal. 
- § 1º: “Se, em consequência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei”. Tornou, portanto, expressa a orientação contida na Súmula 337 do STJ: 
“É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva”. Desse modo, deverá o juiz, em tais casos, proceder de acordo com a Lei n. 9.099/95, a fim de que se possibilite a proposta da suspensão condicional do processo pelo Ministério Público, nas hipóteses em que esta seja possível (art. 89 da Lei).
- § 2º: Se em consequência da nova definição jurídica, o crime passar a ser de competência de outro juízo, os autos deverão a este ser remetidos; por exemplo, delito cuja competência seja dos Juizados Especiais Criminais, no qual será possível a realização da transação penal (art. 72 da Lei).
Três formas de emendatio libelli passíveis de aplicação pelo juiz diante do caso:
Emendatio libelli por defeito de capitulação: O juiz profere sentença condenatória ou decisão de pronúncia em conformidade exata com o fato descrito na denúncia ou na queixa, mas reconhece que tal fato amolda-se ao dispositivo penal distinto daquele que constou na inicial. 
Ex.: Denunciado o acusado por roubo, mas, por equívoco, capitulada esta infração na denúncia como o art. 147 do CP (crime de ameaça). Na sentença, o juiz poderá condenar o réu pelo crime descrito (roubo), esclarecendo, porém, que se trata de conduta que tem enquadramento no art. 157 do Estatuto
Repressivo, cuja pena, evidentemente, é maior do que a relativa ao artigo equivocadamente atribuído na denúncia.
2) Emendatio libelli por interpretação diferente: o juiz realiza interpretação diferente da que o fez o Ministério Público ou o querelante quanto ao enquadramento da conduta narrada.
Ex: Considere-se que tenha sido denunciado o agente por homicídio qualificado por meio cruel, por ter cortado a garganta de colega de cela enquanto este dormia, causando-lhe morte instantânea. Entendendo o magistrado que esse fato, tal como narrado, não configura a qualificadora do meio cruel (art. 121, § 2.º, III, CP), mas sim a qualificadora do uso de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido (art. 121, § 2.º, IV, CP), poderá reconhecer essa última circunstância independente de qualquer aditamento da inicial pelo Ministério Público. É que, nesse caso, a nova definição jurídica atribuída não terá sido decorrência de qualquer inovação ao fato descrito, mas sim de interpretação diversa quanto ao enquadramento desse mesmo fato.
3) Emendatio libelli por supressão de circunstância: neste caso, o juiz atribui nova capitulação ao fato imputado em razão da não constatação, pelas provas angariadas na fase instrutória, de elemento ou circunstância que estejam contidos na inicial. Há, aqui, modificação fática, mas não para acrescentar, e sim para subtrair circunstâncias do fato descrito, importando esta simples supressão na mudança de classificação jurídica (artigo). 
Ex: Denunciado o acusado por crime de roubo capitulado no art. 157 do CP, sobrevém, no curso da instrução, a prova de que não houve violência nem grave ameaça.
O juiz, suprimindo da inicial a referência à violência e à ameaça,
condena o réu por furto simples. Há, neste caso, emendatio libelli, já que o furto se encaixa na descrição do roubo (furto + violência/ameaça). Basta retirar de um roubo as circunstâncias “violência e grave ameaça” e já se tem caracterizada a subtração que tipifica o furto.
Questões para reflexão: 
1) E se a desclassificação provocada pela emendatio libelli importar em modificação de competência do juízo? 
Caberá ao juiz, fundamentadamente, realizar a desclassificação que caracteriza a emendatio libelli, sem, contudo, proceder ao juízo de condenação ou de absolvição. 
Essa decisão deverá ter sua fundamentação restrita à tipificação do crime, sem externar qualquer outro juízo de mérito e tampouco pronunciar-se acerca da condenação ou absolvição. 
Não havendo juízo de condenação ou de absolvição, esse pronunciamento não pode, obviamente, ser caracterizado como uma sentença stricto sensu, mas sim como uma decisão definitiva, sendo apelável nos termos do art. 593, II, do CPP. 
Transitada em julgado essa manifestação, deverá o juiz ordenar a remessa do processo ao juízo agora considerado competente, para que lá tenha prosseguimento (art. 383, § 2.º, do CPP). 
Ex.: É o caso, por exemplo, da desclassificação do crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei 11.343/2006) para a forma privilegiada de oferecimento eventual e gratuito (art. 33, § 3.º, da Lei 11.343/2006). Sendo este último de competência do Juizado Especial Criminal, após efetuar a desclassificação, caberá ao magistrado remeter o processo ao JECRIM, onde será realizada proposta de transação penal ou, não sendo esta viável, prolatada a sentença.
2) E se o crime para o qual foi operada a desclassificação provocada pela emendatio libelli tiver cominada pena mínima abstrata igual ou inferior a um ano, possibilitando, em consequência, a suspensão condicional do processo a que alude o art. 89 da Lei 9.099/1995? 
- Observe o quadro a seguir:
Ex.: Considere-se que tenha sido o réu denunciado por roubo praticado mediante violência real causadora de lesões corporais graves (art. 157, § 3.º, do CP – pena: 7 a 15 anos). Suponha-se que, no curso da instrução, venha a ficar comprovado que não houve qualquer subtração ou tentativa de subtração do patrimônio da vítima pelo réu, reclamando-se a desclassificação do crime descrito de roubo para lesões corporais graves (art. 129, § 1.º, do CP – pena: 1 a 5 anos). 
A hipótese, evidentemente, não importa em qualquer acréscimo de circunstâncias ao fato descrito, caracterizando-se como emendatio libelli (roubo = subtração + lesões corporais → portanto, ao defender-se de roubo, já se defendeu o réu do crime de lesões).
Se tivesse atribuído a denúncia, desde o início do processo, o crime de lesões graves, teria sido possível ao Promotor de Justiça propor ao acusado a suspensão condicional do processo a que alude o art. 89 da Lei 9.099/1995, pois a pena mínima cominada a tal infração é de um ano. Considerando, todavia, que a inicial atribuiu o delito de roubo, que tem apenamento mínimo de quatro anos, restou inviabilizada essa medida.
Para não causar prejuízo ao réu, impõe-se que o magistrado, ao receber conclusos os autos para a sentença, proceda à desclassificação do crime de roubo para lesões graves, restringindo-se, contudo, ao aspecto da correta tipificação da conduta, isto é, sem qualquer juízo acerca da condenação ou absolvição. 
Depois de realizada essa desclassificação, deverá o juiz determinar vista do processo ao Ministério Público para que se manifeste quanto à possibilidade de propor ao acusado o sursis processual de que trata o art. 89 da Lei 9.099/1995.
“Mutatio libelli” (Art. 384) e a Lei n. 11.719/2008:
Mutatio Libelli: modificação da descrição fática constante da inaugural; situação em que o juiz, condenando ou pronunciando o réu, atribui ao fato nova definição jurídica, mediante o acréscimo de circunstâncias não mencionadas na denúncia ou na queixa-crime. 
Implica o surgimento de uma prova nova, desconhecida ao tempo do oferecimento da ação penal, levando a uma readequação dos episódios delituosos relatados na denúncia ou queixa. 
Ex.: uma mulher é denunciada por homicídio doloso, acusada de matar um recém-nascido qualquer. Durante a instrução, descobre-se que a vítima era seu filho e que a imputada atuara sob influência do estado puerperal, elementos não constantes explícita ou implicitamente da denúncia. Por certo, não se cuida de mera alteração na classificação do fato, havendo verdadeira modificação do contexto fático. A acusação mudou, não sendo caso de apenas corrigir a qualificação jurídica.
- Nestes casos, como há evidente prejuízo ao acusado, não poderá ser o indivíduo condenado ou pronunciado pelo novo crime sem que adotadas, antes, as providências referidas no art. 384 do CPP: 
• Art. 384, caput, do CPP: “Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente”. 
Ex1: Denunciado o acusado por receptação dolosa, surge no curso da instrução a prova de que se trata de receptação culposa. Considerando que tal desclassificação importa no reconhecimento de imprudência, negligência ou imperícia, circunstâncias estas não descritas na denúncia, não poderá o magistrado proferir sentença condenatória pelo crime culposo sem que tenham sido adotadas as providências do art. 384 do CPP, não importando o fato de que a receptação culposa seja crime ao qual é cominada pena inferior à do delito imputado. 
OBS.: Mas Não é tranquilo o entendimento de que na desclassificação do crime imputado na modalidade dolosa para a forma culposa ocorre mutatio libelli. No STF, por exemplo, já se decidiu que a desclassificação do crime de peculato doloso para peculato culposo não implica mutatio, mas sim emendatio, sendo dispensável a adoção prévia das medidas previstas no art. 384 do CPP32.
Ex 2: Denunciado o agente por crime de furto, demonstram os elementos angariados na fase instrutória que se trata de hipótese que autoriza a condenação por delito de roubo. Considerando que isto importa em reconhecer o juiz, na sentença, as elementares da violência ou grave ameaça, e que estas circunstâncias não foram mencionadas na denúncia, impõe-se aqui, ainda com mais razão (em vista de o novo crime ter pena superior ao imputado), a aplicação prévia do disposto no art. 384 do CPP, para que possa ser condenado o acusado pelo delito do art. 157 do CP.
- Aditamento necessário: caberá ao Ministério Público, uma vez encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, aditar denúncia ou queixa, no prazo de cinco dias, não atuando o juiz de ofício, o que viola o sistema acusatório.
- “Nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos”: não se admite que a acusação seja ampliada a novos fatos por meio do aditamento à denúncia (no caso, somente seria possível uma nova ação penal), uma vez que a mutatio accusationis se limita à “nova definição jurídica do fato” constante da imputação inicial. 
- O procedimento do art. 384 do Código de Processo Penal somente se aplica na hipótese de ação penal pública e ação penal privada subsidiária da pública, sendo inadmissível o juiz determinar abertura de vista para o Ministério Público aditar a queixa e ampliar a imputação, na ação penal exclusivamente privada, conforme clara redação do dispositivo (“... o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, ... Se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública...”).
- Impossibilidade da mutatio libelli na segunda instância: Súmula 453 do STF (editada antes do advento da Lei n. 11.719/2008, mas perfeitamente aplicável
à nova sistemática do CPP: “Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida explícita ou implicitamente na denúncia ou queixa”. 
O juiz ficará adstrito aos termos do aditamento, pois o MP é o dominus litis, definindo os termos da acusação. 
- Em determinadas situações (v. CPP, arts. 403, § 3 º, e 404), a audiência poderá ser cindida, dentre elas, quando ocorrer a hipótese de mutatio libelli.
§ 1º: Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código.
 
§ 2º: Ouvido o defensor do acusado no prazo de cinco dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento. 
§ 3º: Se, em consequência do aditamento, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei. Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos.
§ 4º: Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até três testemunhas, no prazo de cinco dias.
§ 5º: Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá: não pode o juiz condenar o acusado por qualquer crime por conduta diversa daquela apontada na denúncia ou na queixa sem a providência determinada pelo art. 384, sob pena de nulidade. 
Ex.: Já se decidiu que não é possível o juiz condenar o acusado de crime doloso por infração culposa, que exige a descrição da modalidade da culpa em sentido estrito (RT, 572/342, 640/387 e 646/313). 
Ex2.: Caso verifique o magistrado que os fatos criminosos comprovados são diversos daqueles descritos na inicial, não pode ele absolver de imediato o réu, mas agir na forma do art. 384. Caso o condene sem a adoção da providência prescrita, em regra é nula a decisão, pois o acusado tem o direito de saber qual é a nova acusação para que dela possa defender-se.
• Art. 385, do CPP: Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada, ressaltando-se que, tratando-se de agravante de natureza objetiva, isto é, relativa aos fatos, torna-se imprescindível esteja descrita, ainda que implicitamente, na denúncia ou queixa subsidiária, sob pena de quebra do princípio da correlação.

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