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PORTUGUÊS INSTRUMENTAL AULA 06 CONCURSOS PÚBLICOS - 01 Muitos concursos públicos exigem que o candidato disserte1 sobre algum assunto específico. Talvez esta não seja uma tarefa das mais fáceis, contudo se o aluno possuir um embasamento a respeito da organização textual é bastante provável que ele obtenha um desempenho satisfatório. Um concurso não exige, obviamente, que o candidato escreva uma obra-prima da literatura, mas sim um texto que seja agradável de ler, que seja claro, escrito numa linguagem correta para a ocasião e, principalmente, que 1 Aqui talvez seja importante relembrar os tipos de textos: 1) Dissertação: Argumentar a respeito de um determinado tema. Exemplos: monografias, redação, texto de opinião. 2) Narração: relatar fatos reais ou fictícios, contar uma história. Exemplo: romances, contos, depoimentos. 3) Descrição: descrever um ambiente, uma situação ou um objeto; orientar, instruir. Exemplo: Manual de instruções, Descrição de aparelhos eletrônicos, etc ) seja inteligível. O exame da OAB, por exemplo, exige que o candidato responda as questões de forma discursiva e fundamente suas respostas. O conteúdo da dissertação precisa ser convincente, rico tanto na escolha das palavras quanto das informações, pois não há coisa mais frustrante para quem lê do que encontrar apenas repetições de ideias padronizadas ou repetitivas (ex: “quem acredita sempre alcança”, “a Amazônia é o pulmão do mundo”, “todo político é ladrão”, etc). Entretanto, por mais criativo que seja o texto ele jamais poderá fugir do tema proposto, pois isto corresponderia a um problema de falta de unidade e de objetividade, o que é considerado uma falta grave, podendo até mesmo levar a banca a desconsiderar a redação do candidato. Pois de nada adianta um texto escrito com perfeição gramatical se ele não desenvolve o tema. A dissertação começa na sua cabeça, bem antes de ir para o papel, portanto tome muito cuidado ao interpretar aquilo que está sendo exigido, este é um dos momentos mais importantes do processo de escrita. É imprescindível que se leia tudo com atenção, várias vezes de preferência, para identificar exatamente o que a banca espera de você. Vejamos um exemplo: Digamos que em uma prova, após um texto motivador, apareça a seguinte questão: “Qual é a sua opinião a respeito da atividade ilegal de determinadas madeireiras na Amazônia brasileira?” É bastante tentador para o candidato, que ele disserte sobre a beleza e a importância da Amazônia para o planeta (quem sabe até diga que a Amazônia é o pulmão do mundo). Há também a possibilidade de que ele argumente a respeito de que a Amazônia é um tesouro nacional e que ela não pode ser surrupiada por outros países (“muito menos pelos EUA!” diria aquele mais exaltado). Enfim, estas são ideias bastante difundidas a respeito deste tema e de tão recorrentes aos poucos elas vão se tornando repetitivas. Elas podem até aparecer ao longo do texto, contudo não se pode perder de vista a proposta central que é, na verdade, a atividade ilegal das madeireiras, qual é o problema (ou a solução, se assim for a sua opinião) que elas causam à região e, por extensão, ao mundo inteiro. Identificar o tema proposto corretamente é sinal de que boa parte do trabalho já está feita. Agora a preocupação fica por conta de como este texto será estruturado. Tão importante quanto apresentar um conteúdo rico e não fugir do tema, é o respeito às normas da língua culta. Mas não pense na gramática como aquele conjunto de regras difíceis, quase impossíveis de serem decoradas e com nomenclaturas estranhas que chegam a dar medo. Na verdade, há vários outros fatores que devem ser apreciados quando o objetivo é alcança ruma boa numa redação. Vejamos uma breve análise de alguns pontos fundamentais: 1 - Escrever com correção As bancas examinadoras tendem a dar um peso elevado aos deslizes gramaticais, o que pode levar um aluno à reprovação. A melhora maneira de evitar estes deslizes e ler. Ler muito, ler sempre, ler vários tipos de textos: jornais, revistas, blogs, textos teóricos, literatura, poesias e até bula de remédio. O importante é ler. Muitas das regras gramaticais (grafia de palavras, acentuação, etc) são muito difíceis de serem decoradas, então acabamos evitando os erros apenas porque conseguimos armazenar uma “memória gráfica” destas palavras, ou seja, eu consigo me lembrar que ciência tem acento circunflexo no “e” porque já li e escrevi estas palavras inúmeras vezes ao longo da minha vida e não apenas porque eu aprendi que toda proparoxítona2 é acentuada. O aluno também deve estar atento aos erros mais frequentes: 2 Proparoxítona é que a palavra cuja antepenúltima sílaba da é a mais forte: Ex: pre-fe-RÊN-ci-a, ÁR-vo-re, DÚ-vi-da, etc ) Havia ou Haviam? O verbo “haver”, quando equivale ao sentido de “existir”, não admite flexão do verbo. Ou seja, nestas ocasiões ele não vai para o plural. Ex: Não havia muitos alunos na sala; Havia várias pessoas do lado de fora. O “haviam” só será utilizado quando for auxiliar de outro verbo e corresponder a “ter”. Ex. Os alunos já haviam sido (tinham sido) avisados; Eles haviam encorajado (tinham encorajado) o professor a desistir. Na fala mais popular é bastante comum ouvirmos que “não tinha alunos na sala”, “tinha muita gente lá fora”, etc. A tendência é que com o tempo esta forma acabe sendo incorporada ao padrão da língua, mas isto leva muito tempo, décadas talvez. Por enquanto estes exemplos são considerados Errados, pois em situações formais de comunicação, o verbo “ter” jamais poderá ser utilizado no sentido de “existir”, de “haver”. Ele assistiu o filme Aqui temos um erro de regência verbal. O verbo assistir, no sentido de ver, exige que se coloque uma preposição entre ele e o objeto: Ele assistiu ao filme, Ela assistiu a uma missa. Por que isso? Para que possamos diferenciá-lo do verbo assistir no sentido de cuidar, prestar socorro. Ex: “O médico assiste o (cuida do) enfermo” A mesma confusão de sentido ocorre quando utilizamos o verbo “puxar”. Puxar o pai (tirar ele do lugar). Puxar ao pai (herdar características). Me levaram embora Aqui o problema é de colocação pronominal. Os pronomes são divididos em: Pronomes retos – Eu, tu, ele, nós, vós, eles. Pronomes oblíquos – Me, mim, comigo, te, ti, consigo, nos, nas, o, a, lhe, etc. Os pronomes do caso reto servem para ocupar o lugar do sujeito da ação: Ela deu um soco na cara dele. Já os pronomes do caso oblíquos átonos (me, te, se, o, lhe, nos, vos, lhes) representam o complemento do verbo: Mandaram-me embora, Disseram-nos várias coisas. Sendo assim, a regra determina que JAMAIS uma frase poderá iniciar com um pronome oblíquo átono. Portanto são consideradas incorretas, do ponto de vista formal da língua, frases que utilizamos com freqüência, tais como “Me mande embora”, “Lhe entreguei a chave”, “Te amo”, etc. O correto seria “Mande-me embora”, Entreguei-lhe a chave”, “Amo-te”. Logicamente que estas formas tendem a cair em desuso, uma vez que dificilmente alguém substituirá o bom e velho “te amo”. Em Portugal os falantes ainda preservam a forma “culta” do pronome oblíquo, mas no Brasil, até mesmo a imprensa já está mais flexível com esta regra. Irei a festa comvocê Temos aqui um problema de acentuação. Quem vai, “vai a algum lugar”, portanto o verbo “ir” exige uma preposição. Já “festa” exige um artigo para defini-la como uma palavra do gênero feminino: “a festa”. Quando há o encontro destas duas palavras, a preposição a + artigo feminino (Irei a) + (a festa), temos a famosa “crase” = à. Portanto o forma correta é “Irei à festa com você”, “Não fui à missa”, etc. Lembre-se, a crase só ocorre antes de substantivos do gênero feminino, nunca antes de verbos e muito menos de palavras masculinas. Não há excessão a essa regra Grafia incorreta da palavra, o correto seria “exceção”. Este é um tipo de problema que só pode ser resolvido com hábito da leitura e com consulta a dicionários, sempre que houver dúvida. http://www.youtube.com/watch?v=NaQY3kqf3X4 A porta da cozinha, não tem fechadura. Erro de pontuação. Segundo a regra não se pode colocar uma vírgula entre o sujeito (A porta da cozinha) e o verbo (tem). Além do mais, com a vírgula no lugar errado a frase fica completamente estranha. Leia novamente, mas agora em voz alta, fazendo uma pausa na vírgula e perceba como a frase fica confusa. 2 – Escrever com simplicidade Nunca esqueça de que a pessoa que lê quer entender o texto que está diante dela. Sendo assim, procure ser simples, claro e objetivo. Evite utilizar palavras ou expressões apenas porque, na sua concepção, elas parecem bonitas e pomposas ou porque assim as pessoas vão perceber o seu domínio da língua, sua erudição, etc. Isso é uma bobagem sem tamanho. Os grandes escritores escreveram com simplicidade (sempre levando em consideração o contexto e a época em que os textos foram produzidos). Desta forma, um texto do século XIX pode nos parecer um pouco complexo hoje em dia, mas à sua época poderia ser considerado de relativa simplicidade. Grande exemplo é Willian Shakespeare (1564-1616), cujas peças sempre tiveram como público alvo as pessoas mais simples, o “povão” como costumamos dizer, às vezes pejorativamente, e isso nunca diminuiu a genialidade deste escritor. Neste sentido, procure empregar apenas termos cujo significado você tenha absoluta certeza e, mesmo assim, sem exagero. Download grátis: http://www.universia.com.br/cultura+/cultvox.jsp Neste link você encontra os livros de Shakespeare e de diversos outros autores. Uma grande quantidade de palavras pouco conhecidas, ainda que corretas, costumam deixar o texto pesado, desagradável e muitas vezes William Shakespeare ininteligível. Não significa que elas jamais devam ser utilizadas, pois afinal, se elas existe é porque possuem alguma função. O importante é usá-las com moderação. Para terminar, vamos ler esta crônica do escritor gaúcho Luis Fernando Veríssimo, que trata justamente do fascínio que as pessoas desenvolvem por palavras desconhecidas. Defenestração (Luis Fernando Veríssimo) Certas palavras têm o significado errado. Falácia, por exemplo, devia ser o nome de alguma coisa vagamente vegetal. As pessoas deveriam criar falácias em todas as suas variedades. A Falácia Amazônica. A misteriosa Falácia Negra. Hermeneuta deveria ser o membro de uma seita de andarilhos herméticos. Onde eles chegassem, tudo se complicaria. - Os hermeneutas estão chegando! - Ih, agora é que ninguém vai entender mais nada… Os hermeneutas ocupariam a cidade e paralisariam todas as atividades produtivas com seus enigmas e frases ambíguas. Ao se retirarem deixariam a população prostrada pela confusão. Levaria semanas até que as coisas recuperassem o seu sentido óbvio. Antes disso, tudo pareceria ter um sentido oculto. - Alô… - O que é que você quer dizer com isso? Traquinagem devia ser uma peça mecânica. - Vamos ter que trocar a traquinagem. E o vetor está gasto. Plúmbeo devia ser um barulho que o corpo faz ao cair na água. Mas nenhuma palavra me fascinava tanto quanto defenestração. A princípio foi o fascínio da ignorância. Eu não sabia o seu significado, nunca lembrava de procurar no dicionário e imaginava coisas. Defenestrar devia ser um ato exótico praticado por poucas pessoas. Tinha até um certo tom lúbrico. Galanteadores de calçada deviam sussurrar no ouvido das mulheres: - Defenestras? A resposta seria um tapa na cara. Mas algumas… Ah, algumas defenestravam. Também podia ser algo contra pragas e insetos. As pessoas talvez mandassem defenestrar a casa. Haveria, assim, defenestradores profissionais. Ou quem sabe seria uma daquelas misteriosas palavras que encerravam os documentos formais? “Nestes termos, pede defenestração…” Era uma palavra cheia de implicações. Devo até tê-la usado uma ou outra vez, como em: - Aquele é um defenestrado. Dando a entender que era uma pessoa, assim, como dizer? Defenestrada. Mesmo errada era a palavra exata. Um dia, finalmente, procurei no dicionário. E aí está o Aurelião que não me deixa mentir. Defenestração vem do francês defenestration. Substantivo feminino. Ato de atirar alguém ou algo pela janela. Ato de atirar alguém ou algo pela janela! Acabou a minha ignorância, mas não a minha fascinação. Um ato como este só tem nome próprio e lugar nos dicionários por alguma razão muito forte. Afinal, não existe, que eu saiba, nenhuma palavra para o ato de atirar alguém ou algo pela porta, ou escada abaixo. Por que, então, defenestração? Talvez fosse um hábito francês que caiu em desuso. Como o rapé. Um vício como o tabagismo ou as drogas, suprimindo o tempo. - Defenestrações devem ser proibidas. - Sim um escândalo nacional. Ainda mais agora, com os novos prédios. - Com prédios de três, quatro andares, ainda era admissível. Até divertido. Mas daí para cima vira crime. Todas as janelas do quatro andares, ainda era admissível. Até divertido. Mas daí para cima vira crime. Todas as janelas do quarto andar para cima devem ter um cartaz: É proibido defenestrar. Os transgressores serão multados. Os reincidentes serão presos. Na bastilha, o Marquês de Sade deve ter convivido com notórios defenestradores. E a compulsão, mesmo suprimida, talvez ainda persista no homem,como persiste sua linguagem.O mundo pode estar cheio de defenestradores latentes. Quem entre nós nunca sentiu a compulsão de atirar alguém ou algo pela janela? A basculante foi inventada para desencorajar a defenestração. Toda a arquitetura moderna, com suas paredes externas de vidro reforçado e sem aberturas, pode ser uma reação inconsciente a esta volúpia humana, nunca totalmente dominada. Na lua-de-mel, numa suíte matrimonial no 17º andar. - Querida… - Mmmm? - Há uma coisa que preciso lhe dizer… - Fala, Amor - Sou um defenestrador. E a noiva, em sua inocência, caminha para a cama: Estou pronta para experimentar tudo com você! TUDO! Uma multidão cerca o homem que acaba de cair na calçada. Entre gemidos, ele aponta para cima e babulcia: - Fui defenestrado… Alguém comenda: - Coitado. E depois ainda atiraram ele pela janela? Agora mesmo me deu uma estranha compulsão de arrancar o papel da máquina, amassa-lo e defenestrar esta crônica. Se ela sair é porque resisti. Defenestração
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