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Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 907 40 Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita Mirna Reni Marchioni Tedesco Apesar de ser o dia-a-dia da clínica fonoaudiológica, o trata- mento dos distúrbios do aprendizado da leitura e escrita implicam num grande desafio. A escrita é uma das formas mais elevadas da linguagem, que vai além da decodificação gráfica, tarefa por si só extremamente complexa. Implica na compreensão de que conjuntos de traços visuais possuem valores simbólicos. Discorrer sobre suas altera- ções, talvez seja a tarefa mais árdua no campo da fonoaudiologia, considerando as controvérsias terminológicas e os diferentes princípios das linhas de tratamento. Sem mencionar, ainda, a grande dificuldade no estabelecimento dos terrenos das áreas afins: pedagogia, psicologia e fonoaudiologia, papéis que muitas vezes se confundem, dependendo da concepção que se tem do problema. Partindo destas colocações, seria pretensioso demais desejar que este capítulo fosse decisivo para o estabelecimento de verdades imutáveis sobre o assunto. Gostaríamos contudo que, a partir da discussão de alguns conceitos, pudéssemos possibilitar uma reflexão crítica sobre os critérios de diagnóstico e tratamento dos distúrbios de leitura e escrita. 908 Fonoaudiologia Prática DIAGNÓSTICO Concepção de distúrbio Em relação ao aprendizado da leitura e da escrita, a necessi- dade de um processo diagnóstico é determinada pela existência de sintomas e sinais de alterações que comprometam, num sentido estrito, a forma, e, num sentido amplo, a funcionalidade da comunicação gráfica. O rumo deste diagnóstico será determinado a partir da concepção que se tem de distúrbio. Assim, de maneira simplista, pode restringir-se a comprovação da presença de trocas grafêmicas, tão conhecidas e freqüentes, e da posterior determi- nação da causa e da natureza das mesmas. Entretanto, sem que se ignore a presença destes sintomas clássicos, a partir da consideração das dimensões biológica, cognitiva e social da aprendizagem, o diagnóstico pode seguir caminhos mais reflexi- vos, ocupando-se em verificar o real valor simbólico que a leitura e a escrita assumem no momento em que afloram as alterações que motivaram o processo. As controvérsias diagnósticas foram geradas a partir das diferentes concepções de distúrbio de leitura e escrita. Os primeiros relatos literários sobre o assunto tiveram seu início em meados do século XIX, época em que os transtornos da linguagem foram relacionados aos comprometimentos do hemis- fério cerebral esquerdo. Nesta época, em função das inúmeras descrições das alterações da linguagem em afásicos, as dificulda- des de leitura e escrita apareciam vinculadas à presença de alterações orgânicas, sendo encontradas em diversos trabalhos literários com a denominação de alexia, dislexia e cegueira verbal. No início do século XX, uma série de estudos fazem referên- cias a um novo quadro clínico, dissociado dos quadros afásicos, que a princípio denominou-se cegueira verbal congênita. Somen- te após a 1ª Grande Guerra, surgia a convicção da existência de perturbações do aprendizado acadêmico. Sob o ponto de vista tradicional, estes distúrbios específicos de aprendizagem foram rotulados como dislexias, disgrafias e discalculias. Posteriormente, a dislexia foi considerada como constitucio- nal ou genética, sendo denominada dislexia específica de evolu- ção. A dislexia também esteve relacionada a algumas das chama- das síndromes psicomotoras, pelo fato de muitas vezes encon- trar-se associada a alterações comportamentais como hiperativi- dade e perseveração. Na tentativa de descaracterizar um quadro sindrômico, partin- do ainda de uma visão organicista, muitos autores convencidos da complexidade do problema adotaram um termo mais amplo – distúrbio de aprendizagem – no qual a dislexia pode ser incluída. Dentro deste prisma, JOHNSON & MYKLEBUST observaram diferen- ças nas manifestações do distúrbio, encontrando crianças com Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 909 deficiências no aprendizado da leitura ou no uso da linguagem escrita, que revelavam outras alterações como hiperatividade, deficiências na aquisição da palavra falada, em soletração, no cálculo, julgamento de distância, tamanho, altura e comprimento, sem que pudessem, entretanto, determinar sintomas comuns que caracterizassem uma única síndrome. Pouco depois, QUIRÓS & SCHRAGER, que anteriormente ado- tavam o termo dislexia, passaram a valorizar os propósitos práti- cos do prognóstico e do tratamento dos distúrbios de aprendiza- gem, classificando-os clinicamente como primários e secundá- rios. Nos distúrbios primários estariam comprometidas as aquisi- ções especificamente humanas: língua, linguagem, leitura, escri- ta e cálculo matemático. Os distúrbios primários de aprendizagem seriam resultado de compensações de disfunções cerebrais e de deficiências perceptuais (especialmente auditivas e visuais) ou de deficiências nas aferências posturais (especialmente vestibu- lares e proprioceptivas). Nos distúrbios secundários de aprendizagem, os aspectos específicos seriam uma conseqüência de anormalidades senso- riais, neurológicas, psíquicas e circunstanciais (quadros anterior- mente descritos como dano cerebral, paralisia cerebral, retardo mental, desajuste social, etc.). Paralelamente à visão organicista dos autores clássicos, a teoria lingüística de Chomsky veio dar origem aos princípios da psicolingüística contemporânea, interferindo na visão que até então se tinha da aprendizagem humana. Tais princípios, come- çaram a promover mudanças no entendimento dos processos de aquisição da linguagem oral na criança e conseqüentemente nos processos do aprendizado da leitura e escrita. Dentro desta concepção, vários autores passam a levar em conta não somente as condições internas de aprendizagem, representadas pela integridade anatomofuncional e pelas condições cognitivas, mas também a valorizar as condições externas, representadas pelo campo de estímulos recebidos. Desta forma, o aspecto social da aprendizagem passa a ser a tônica da mudança de postura frente ao diagnóstico do que, até então, era tido, indiscutivelmente, como uma patologia da linguagem. A partir de então, foi estabelecida a divergência entre as diferentes linhas diagnósticas, sendo que, cada qual, dentro de sua concepção, passou a valorizar aspectos individuais para a determinação do distúrbio ou não-distúrbio. Considerando que na análise de uma população, os achados mais freqüentes determinam a normalidade, e, tendo em vista os atuais padrões sócio-econômico-culturais da população brasilei- ra, poderíamos afirmar que, dentro da concepção tradicional de distúrbio do aprendizado, no nosso país o normal é apresentar alterações de leitura e escrita. Por esta razão, a visão do apren- dizado não pode ser genérica para uma população que, apesar de fazer uso de uma mesma língua e de representá-la por meio de um 910 Fonoaudiologia Prática mesmo código gráfico, apresenta particularidades quando se levam em conta expectativas, costumes e necessidades indivi- duais, dependendo das comunidades nas quais se integra. A decisão do que denominar distúrbio do aprendizado da leitura e da escrita, portanto, deveria partir do conhecimento real das condições individuais de aprendizagem. A crítica aos atuais modelos diagnósticos reside no fato de que, os conhecimentos adquiridos sobre os distúrbios do apren- dizado da leitura e da escrita no decorrer do século foram sendo substituídos a partir da consciência de novos caminhos. A soma- tória de tais conhecimentos deve servir como fundamento para uma pesquisa que leve em conta todos os aspectos da aprendiza- gem, para que não se corra o risco de mais uma vez determinar- mosuma “síndrome”, seja ela orgânica ou social, para a qual não tenhamos respostas eficientes. Causas dos distúrbios do aprendizado O aprendizado da leitura e da escrita está vinculado a um conjunto de fatores, adotando como princípios o domínio da linguagem e a capacidade de simbolização. A análise pormenori- zada das manifestações de um suposto distúrbio deve pautar-se pelas condições internas e externas necessárias ao desenvolvi- mento deste aprendizado. Podemos dizer que as condições internas de aprendizagem definem o sujeito como um organismo, cuja integridade anatomo- funcional possibilita a percepção dos estímulos e um comporta- mento adequado frente aos mesmos, de acordo com as situações em que se apresentam. Por outro lado, as condições externas definem o campo de estímulos recebidos, onde o meio ambiente representa um papel fundamental no fornecimento destes estímulos, de forma que os mesmos sejam suficientes para garantir respostas ativas por parte do sujeito. A análise da combinação dos fenômenos biológicos e am- bientais fornece subsídios para uma investigação das variáveis originárias do distúrbio. Considerando que de início o diagnóstico é sempre uma hipótese, levantamos alguns fatores prováveis deste distúrbio, relacionando-os às condições internas e externas de aprendiza- gem, que podem evidenciar desde uma simples alteração na qualidade do aprendizado específico da leitura e da escrita, ou, de maneira genérica, revelar desvios nos processos de aprendiza- gem, que dentre suas manifestações secundárias, revelariam um distúrbio no aprendizado da leitura e da escrita. A) Integridade motora – A integridade do movimento é determinada por um processo seqüencial e seriado de ações neuromusculares que levam a uma mudança progressiva e gradu- al de posturas, posições e atitudes no espaço e no tempo. Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 911 Lesões ou desordens corticais de origem genética, neona- tal, traumática ou pós-encefálica podem determinar o apareci- mento de alterações motoras táxicas ou práxicas ou perceptuais gnósicas, que por vezes comprometem os processos cognitivos em diferentes graus, interferindo no desenvolvimento e abrangência da linguagem e conseqüentemente nos processos de leitura e escrita. B) Integridade sensorioperceptual – Por meio da integração sensorial a informação do meio ambiente é organizada e interpre- tada para o planejamento e execução da integração do indivíduo com este meio. Toda a integração passa de aferências sensoriais gerais para as específicas indo dos mecanismos somestésicos e vestibulares, responsáveis pela regulação integrativa postural e sensorial, aos mecanismos reguladores da audição e visão. Desta forma, distúrbios vestibulares ou distúrbios auditivos e visuais periféricos ou centrais podem comprometer essa integri- dade. Dentro deste aspecto, maior destaque tem sido dado à audi- ção, vista como o canal principal de recepção de informações lingüísticas. A audiologia tem reconhecido que não somente as alterações condutivas e neurossensoriais determinam distúrbios de linguagem e aprendizagem, valorizando também o processa- mento das informações no decorrer da via auditiva. As alterações do processamento auditivo central têm sido amplamente estuda- das, visto que caracterizam muitas crianças que manifestam distúrbios de linguagem e do aprendizado da leitura e da escrita. Estas alterações têm sido essencialmente caracterizadas por um rendimento pobre em atividades que implicam em atenção, discri- minação, identificação figura-fundo, memória, análise-síntese, seqüências temporais e generalizações auditivas. Os exames audiológicos são imprescindíveis nas alterações de linguagem, assim como os testes específicos do processamento auditivo vêm sendo desenvolvidos e aplicados em maior escala nas alterações do aprendizado. C) Integridade sócio-emocional – Possibilidades reais que o meio oferece em termos de quantidade, qualidade, freqüência dos estímulos. Interessam nesse aspecto as características do ambiente, moradia, relações familiares, a escola e demais comu- nidades que o indivíduo freqüenta e o acesso aos canais de informação e ao lazer. A integridade sócio-emocional será estabelecida a partir das expectativas do indivíduo frente às relações travadas nos diferen- tes grupos sociais, procurando verificar o que o meio oferece no que concerne a suas ideologias e valores, não somente relaciona- dos à sua classe social, mas a seu grau de consciência e participação. Para a análise da aprendizagem e do aprendizado específico da leitura e da escrita importam, portanto, não somente os aspectos individuais de cada um dos ambientes, porém suas inter- 912 Fonoaudiologia Prática relações em termos de adequação com as expectativas e costu- mes primários do sujeito. Incidem sobre a análise do aprendizado a motivação do indivíduo e os meios utilizados para sua estimula- ção. Nesse sentido, as alterações do aprendizado relacionam-se à não-identificação do indivíduo com o meio e com a forma que este lhe transmite informações. Manifestação do distúrbio Levando-se em conta as condições internas e externas de aprendizagem e a partir das considerações iniciais do que deve- mos conceber como distúrbio, a análise pormenorizada das manifestações do mesmo torna-se indispensável para um diagnós- tico seguro. O aprendizado da leitura e da escrita está vinculado a um conjunto de fatores, adotando como princípios o domínio da linguagem e a capacidade de simbolização. A aquisição de cada sistema de símbolos pressupõe uma capacidade para integrar experiências e perceber suas representa- ções não-verbais de maneira a diferenciá-las por meio de um ou outro símbolo, e a partir de então atribuir-lhes significado e memorizá-los. Uma reflexão sobre a complexidade deste processo possibi- lita a compreensão da aquisição de um código gráfico pela criança. Justifica inclusive a determinação de sintomas comuns que caracterizam os quadros sindrômicos anteriormente descri- tos. Já que o desenvolvimento da linguagem é o ponto de partida para a simbolização, qualquer interferência em seu caminho poderá representar uma ameaça para o aprendizado do código gráfico. É por essa razão que as manifestações de alterações nos aspectos cognitivos da linguagem têm sido tão valorizadas. Para determinarmos “o quê”, “quando” e “quanto” temos de distúrbio, precisamos entender que as freqüentes alterações de esquema corporal, localização espacial, temporal e lateralidade citadas na literatura especializada no assunto são manifestações de alterações no processo de desenvolvimento da linguagem e como conseqüência, também do aprendizado específico da leitu- ra e da escrita. Sem perder de vista que estes aspectos da linguagem são de fundamental importância na avaliação, e muitas vezes, o ponto de partida para tratamento, não podemos ignorar que a suspeita de um distúrbio do aprendizado baseia-se nos parâmetros de uma leitura-escrita ideal, cuja organização seja determinada pela perfeição da forma e do conteúdo gráfico. No que concerne à leitura, o respeito à forma estará represen- tado por uma adequada decodificação dos símbolos gráficos em seqüência, respeitando-se o ritmo determinado pelos sinais de pontuação. A compreensão do significado do conjunto dos ele- mentos decodificados determina a adequação do conteúdo. Já em relação à escrita, a adequação da forma diz respeito à emissão gráfica de palavras, respeitando-se a relação entre os fonemas da língua e sua representação grafêmica de acordo com Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 913 as regras ortográficas. Além disso, implica numa organização no espaço-papel, determinada tanto por sua seqüência de acordo com a estrutura gramatical, quanto pela adequação da forma e tamanho dos grafemas,da distância entre os mesmos e da direção e sentido de seu traçado. A coerência na elaboração gráfica indica a adequação do conteúdo. Considerando que o avaliador deve levar em conta os diferen- tes momentos do aprendizado da leitura e escrita, elencamos as principais manifestações que devem ser valorizadas para a pes- quisa de um possível distúrbio. Manifestações de alterações no aprendizado da leitura e da escrita • DESVIOS DE FORMA 1. Trocas, omissões ou inversões grafêmicas – Também denominadas de disortografia. Dizem respeito às manifestações vistas como mais freqüentes nas crianças de idade escolar, representadas por trocas, inversões ou omissões de grafemas de diferentes naturezas. A compreensão de que existe uma relação entre as letras e os sons da fala é o modelo ideal do sistema alfabético. Entretanto, na língua portuguesa existem várias situações onde nem sempre existe uma correspondência única, acarretando confusões quan- to à escolha do grafema a ser decodificado ou simbolizado no ato da leitura e da escrita. Por este motivo, é aceitável que nos momentos iniciais do aprendizado, estas confusões caracteriza- das pelas trocas grafêmicas sejam bastante freqüentes. Contudo, em qualquer momento do aprendizado, uma investigação quanto à natureza destas confusões poderá fornecer indicativos da necessidade ou não de uma intervenção terapêutica. Desta forma, dentre os erros verificados podemos destacar: A) Trocas de natureza perceptual auditiva – Trocas de grafemas na representação de fonemas auditivamente semelhan- tes. Podem manifestar-se por trocas na representação gráfica de fonemas que se contrapõem pelo ponto ou modo articulatório, porém as mais freqüentes são as trocas pelo traço de sonoridade (f ´ v; p ´ b; t ´ d; c ´ g; x,ch ´ j,g). Pela dificuldade de percepção auditiva, podemos verificar tam- bém omissões de grafemas, sendo que os mais freqüentemente omitidos são os que representam os arquifonemas /R/, /S/, /N/ e /L. A dificuldade perceptual auditiva pode ter ainda como sinto- mas as inversões de grafemas ou de sílabas dentro da palavra ou até mesmo omissões silábicas. Considerando que estas trocas e omissões são vistas como de natureza auditiva, as mesmas podem, ou não, vir precedidas de alterações na fala. B) Trocas de natureza perceptual visual – Podemos verifi- car dois tipos de confusões na escolha dos grafemas a serem 914 Fonoaudiologia Prática representados. A primeira delas diz respeito às trocas caracteriza- das pela dificuldade na verificação de que diferentes grafemas podem corresponder a um mesmo fonema. Intimamente relacio- nadas à memória visual e, por vezes, ao domínio das regras ortográficas (x ´ ch; s ´ ss ´ c ´ ç ´ xc ´ sc; s ´ z ´ x; c´qu). O segundo caso relaciona-se às trocas visuais de grafemas de traçados semelhantes, cuja diferenciação é determinada pelo seu posicionamento em relação espaço-papel. Também denomina- das de inversões e reversões de letras (p ´ b; p ´ q; b ´ d; u ´ n). 2. Disgrafia – Alteração no formato, direção e/ou sentido do traçado dos grafemas que de qualquer forma comprometa a decodificação do produto gráfico. 3. Alterações no ritmo da leitura – Podem ser representadas pela leitura silabada, ou com velocidade diminuída, sem respeito aos sinais de pontuação. • DESVIOS NO CONTEÚDO DA LEITURA E DA ESCRITA Dificuldade de compreensão e elaboração gráfica – Diferen- temente do que deveria ocorrer, os desvios no conteúdo da elabora- ção gráfica são menos valorizados na identificação dos sintomas, e conseqüentemente no tratamento de um distúrbio do aprendizado da leitura e escrita. Isto porque, dentro do processo específico do aprendizado, os problemas de compreensão e elaboração gráfica não se manifestam até que a criança tenha adquirido um nível de leitura e escrita que vá além de palavras ou sentenças simples. Assim, diferentemente das alterações de forma que podem ser percebidas desde o seu início, a observação de alterações no conteúdo da linguagem escrita são identificadas mais tardiamente. Considerando que o real objetivo da escrita é o de possibilitar a comunicação de idéias por meio do código gráfico, deveríamos priorizar o conteúdo das emissões gráficas, desde o início da sua manifestação. Não devemos nos deter somente em como a criança estrutura suas frases, através do uso de uma seqüência que respeite a gramática ou a sintaxe, mas observar sua motivação e possibili- dades para receber ou representar graficamente uma idéia. Desta forma, o momento do aprendizado e a motivação para a escrita são fundamentais para a determinação de desvios que podem se manifestar pela dificuldade de compreender e repre- sentar desde os símbolos mais primitivos como figuras e dese- nhos, até a formalização gráfica propriamente dita, representada por palavras, frases ou textos. Manifestações de alterações no desenvolvimento da linguagem Dependendo da natureza do problema do aprendizado, as manifestações específicas podem ser precedidas ou ter origem a partir de suas relações com os seguintes aspectos de linguagem: • desorganização dos movimentos do corpo no espaço; • alterações na freqüência e ritmo dos movimentos corporais; Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 915 • dificuldade de identificação das posições e das relações espaciais traçadas entre o próprio corpo e as demais pes- soas e os objetos; • dificuldade de orientação e seqüência temporal; • dificuldade de percepção e representação não-verbal: ges- tos e expressões; • alterações nos processos de simbolização lingüística: dimi- nuição ou atraso na compreensão/emissão de fala, no tocante ao vocabulário e/ou estruturação; • alterações de memória auditiva e/ou visual; • dificuldade na percepção ou discriminação de estímulos auditivos relacionados à intensidade e altura tonal; • dificuldade na percepção ou discriminação de estímulos vi- suais; • dificuldade em análise-síntese auditiva ou visual; • alterações da percepção figura-fundo auditiva ou visual; • trocas ou omissões articulatórias. Anamnese Toda anamnese tem por objetivo a coleta de instrumentos gerais a partir da queixa, para posterior investigação e análise dos dados relevantes no processo de pesquisa diagnóstica. No caso especial dos distúrbios do aprendizado da leitura e da escrita, temos que ser muito mais cuidadosos em relação a alguns detalhes que possam parecer irrelevantes na pesquisa das de- mais patologias da linguagem. Um dos pontos mais importantes é o motivo da procura do fonoaudiólogo. No caso de uma suposta alteração no aprendizado da leitura e escrita, o que leva o paciente ou seus familiares a procurarem um diagnóstico e conseqüente tratamento fonoaudiológico? O motivo da procura nos dá uma idéia do objetivo do queixoso e traduz suas expectativas quanto ao tratamento. Este aspecto deve ser considerado na medida em que o paciente coloca o problema como seu ou imposto por outrem. Muito comuns são as situações em que o paciente é encaminha- do pela escola, e a família só decide pela procura de um atendimento por temor a represálias. Este é um ponto de grande importância, tanto para o diagnóstico como para o estabelecimento de um prognóstico, pois a falta de clareza na colocação da queixa sugere baixas expectativas e pouca colaboração no tratamento, uma vez que o paciente não enxerga o quadro como um problema. Assim, desde o contato inicial, faz-se necessário um esclare- cimento das correlações entre a queixa trazida pelo paciente e os possíveis comprometimentos a serem pesquisados, assim como devem ser esclarecidos todos os procedimentos do processo diagnóstico, destacando-se seus objetivos. Considerando que as crianças com distúrbios do aprendizado têm uma baixa auto-estima em função de seus fracassos escolares, 916 Fonoaudiologia Prática outro aspectofundamental é possibilitar sua presença e participa- ção nas entrevistas com seus pais. Com esta atitude, conseguimos evitar que sejam criadas fantasias em relação ao que será questio- nado pelo fonoaudiólogo e relatado pelos responsáveis, facilitando inclusive a percepção do real motivo de uma intervenção. Entretan- to, a decisão nessa participação deve ficar a cargo do paciente. A presença do sujeito na entrevista fornece indicativos de suas relações com os familiares, possibilitando inclusive a verificação de suas reações diante da verbalização do problema. Em relação aos aspectos formais, os questionamentos a serem realizados na anamnese não apresentam inovações. A partir da queixa e de sua história pregressa, devem ser discutidos os antece- dentes mórbidos, os antecedentes familiares, os dados gerais de desenvolvimento, o desenvolvimento de linguagem e de aprendiza- gem, os dados sobre o aprendizado específico. Devem ser funda- mentalmente analisadas as inter-relações da história trazidas pelos envolvidos no problema e as expectativas que o paciente e o seu meio criam a partir dela, para que posteriormente possamos buscar alternativas de intervenção adequadas, sejam elas concretizadas por meio de terapias fonoaudiológicas ou variações destas condu- tas convencionais. Avaliação da leitura e da escrita A partir de nosso posicionamento frente ao problema, parece evidente que somente a identificação das manifestações de alterações de leitura e escrita não são suficientes para a determi- nação da natureza de um suposto distúrbio. A avaliação de linguagem é imprescindível. Devemos ter clare- za de que o objetivo desta avaliação vai além da escolha de provas ou de testes específicos que determinem pontuações. O comporta- mento frente a situações reais de comunicação e a funcionalidade da linguagem são os elementos de maior importância diagnóstica. O ponto determinante para a escolha das estratégias de avaliação é o estigma do distúrbio. A criança cria uma auto- imagem negativa em virtude de seus fracassos escolares e, por temor a novas falhas, evita a execução de atividades formais de leitura e escrita, principalmente nas situações de avaliação. Por este motivo, o avaliador deve esclarecer o seu papel de terapeuta desde o processo diagnóstico, procurando promover, de início, atividades específicas menos formalizadas e, apesar disso, suficientes para contemplar o objetivo da avaliação. Levando em consideração os campos de interesse da criança, podemos fazer da conversa espontânea, dos jogos e das ativida- des gráficas informais, instrumentos interessantes para o início da avaliação, possibilitando maior descontração na execução poste- rior de provas formais, quando necessárias. Para que possamos relacionar as manifestações à natureza do problema, valorizamos os aspectos a serem pesquisados. Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 917 ESTRATÉGIAS/ OBSERVAÇÕESOBJETIVO/VARIÁVEISASPECTO Campos de interesse Direcionar a escolha das estratégias de avaliação • Idade • Sexo • Atividades de lazer • Atividades de vida diária Informações da anamnese e conversa espon- tânea Motor • Movimentação geral: observação da qualidade e quantidade dos movimentos intencionais e não intencionais considerando postura, equi- líbrio, coordenação e ritmo Movimentos espontâneos • Motricidade fina: observação da postura e qua- lidade dos movimentos de pulso, mão e dedos no ato da escrita Desenho e emissões gráficas espontâneas Cognitivo Movimentos espontâneos: esbarra em obje- tos? caminha na direção correta? • Percepção das posições do corpo em relação às demais pessoas a aos objetos: observação do conhecimento de direção, tamanhos e posições Reprodução de movimentos corporais, jogos que envolvam relações espaciais: colocar objetos em caixas, trilhas, labirintos, blocos lógicos, etc. • Orientação e seqüência temporal: observação das noções temporais Conversa espontânea, seqüêncialização de fi- guras; relatos do dia-a-dia; contar histórias a partir de figuras • Orientação da lateralidade: observação da mão preferencial e qualidade do movimento. Movimentação espontânea ao pegar objetos, amarrar sapatos, apontar lápis, escrever, etc. Sensorial auditivo • Percepção • Discriminação • Memória • Análise-síntese • Figura-fundo Identificação ou reprodução de sons produzi- dos pelo ambiente, pelo corpo, pela natureza Identificação ou reprodução de diferenças de altura, intensidade, duração, ritmo Memória para sons não-verbais e verbais Formar palavras a partir da emissão de sílabas Figura-fundo não-verbal e verbal Localização do estímulo auditivo: direita, es- querda, atrás, na frente Discriminação de fonemas ou sílabas diferen- tes e parecidas Reconhecimento de palavras parecidas Sensorial visual • Percepção • Discriminação • Memória • Análise-síntese • Figura-fundo Percepção de detalhes em figuras Discriminação de símbolos gráficos iguais, pa- recidos e diferentes Memória para estímulos visuais: três estímulos Quebra-cabeça Identificação de determinado elemento em fi- gura Leitura e escrita • Leitura • Emissão gráfica: Ortografia Direção e sentido dos traçados Posicionamento, tamanho e regularidade dos grafemas Uso da letra cursiva ou de imprensa Domínio de regras ortográficas Identificação de grafemas Leitura de palavras Leitura de histórias Emissões gráficas espontâneas Elaboração de história Cópia Ditado de palavras Ditado de textos Fala • Compreensão • Emissão: Aspectos fonológicos Sintaxe Vocabulário Consciência das irregularidades da língua Conversa espontânea, narrativa de fatos do dia-a-dia, respostas a perguntas, reação a afirmações absurdas Representação e externali- zação do pensamento • Intenção comunicativa • Meio de comunicação preferencial • Efetividade da comunicação Conversa espontânea: fala e gestos; emissões gráficas espontâneas; desenho, escrita Visomotor Direção e sentido do traçado Desenho e emissões gráficas espontâneas • Orientação do corpo no espaço: observação do conhecimento de direção, tamanhos e posi- ções 918 Fonoaudiologia Prática TERAPIA A partir do diagnóstico de um distúrbio do aprendizado da leitura e da escrita, o primeiro ponto a ser considerado é a conduta frente aos achados da avaliação. A razão que motivou o processo diagnóstico deve ser retomada, relacionando-a às eventuais alterações encontra- das, devendo ser explicitadas aos familiares e ao paciente, associadas às possíveis causas do distúrbio. A partir de então a busca de uma melhor conduta frente ao problema deve ser adotada. No caso da constatação da necessidade de um atendimento fonoaudiológico, o primeiro aspecto a ser considerado e a motiva- ção para a escrita, que só ocorre na medida em que a mesma assuma um significado para o paciente. Essa motivação é repre- sentada por uma necessidade real de se comunicar por meio do código gráfico, e, para que isto ocorra a escrita deve se tornar parte integrante de sua vida no fornecimento de informações; deve deixar de ser somente uma obrigação escolar, fornecendo elementos comunicativos essenciais. Dependendo da natureza das alterações, e, seguindo a linha de raciocínio da avaliação de linguagem, forneceremos alguns objetivos terapêuticos para o distúrbio do aprendizado da leitura e da escrita, levando o princípio da motivação. Atividades motoras Motricidade geral 1. Consciência global do corpo: andar, correr, saltar, rodar, etc. 2. Equilíbrio estático e dinâmico: ficar parado, ficar num pé só. 3. Dissociação de movimentos: reproduzir uma série de posi- ções de braços, pernas, mãos. 4. Jogos mímicos. Motricidade fina: específicas para as disgrafias 1. Atividades com as mãos e dedos: embaralhar cartas, abotoar e desabotoar, cortar, rasgar papel, manipularmarionetes, jogar bolas de gude, reproduzir movimentos dissociados dos dedos de uma mesma mão. 2. Pinturas e desenhos livres. 3. Pinturas dirigidas, procurando preencher todo o espaço do papel. 4. Execução de diferentes formas gráficas: linhas retas hori- zontais, verticais ou oblíquas, linhas circulares e formas geométricas. 5. Execução de símbolos gráficos a partir de modelos. Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 919 Atividades cognitivas 1. Espaciais: andar em cima de espaços demarcados, entrar e sair de compartimentos de diferentes tamanhos, passar por baixo ou por cima de obstáculos, mudar a direção ou o sentido dos movimentos corporais, colocar objetos de diferentes tamanhos em recipientes, imitação de movimen- tos corporais globais ou de membros superiores e inferio- res seguindo uma seqüência; 2. Temporais: reproduzir diferentes ritmos, criar ritmos, seqüencializar figuras, seqüencializar fatos a partir da apresentação de uma história. 3. Lateralidade: traçar linhas dividindo objetos simétricos verifi- cando sua igualdade e a relação lado direito e esquerdo, traçar linhas dividindo figuras do corpo humano, movimentar mem- bros superiores ou inferiores direito e esquerdo de maneira alternada, mudar de posição (frente e costas) enquanto movi- menta membros superiores e inferiores. Atividades de audibilização A) Identificação e discriminação auditiva 1. Localização auditiva: estímulos não-verbais e verbais em todas as posições: na frente, atrás, do lado direito, do lado esquerdo. 2. Identificação e discriminação de sons referentes à altura tonal e intensidade. 3. Discriminação de vozes conhecidas. 4. Identificação de sons ambientais e associações com sua fonte. 5. Discriminação entre sons ambientais iguais, parecidos e diferentes. 6. Discriminação entre sons da fala iguais, parecidos e dife- rentes. 7. Reconhecimento e discriminação de sons consonantais específicos. 8. Exercícios de rimas com palavras. B) Seqüência temporal e memória auditiva 1. Ritmo e seqüência. 2. Responder a ordens verbais (entoação). 3. Responder a ordens verbais com simbolização. 4. Seqüencializar sons ambientais. 5. Seqüencializar sons da fala. 6. Evocar seqüências a partir de símbolos. 7. Ordenar orações desordenadas. 8. Outros: aumentar frases. Rimas de ação. Músicas. 920 Fonoaudiologia Prática C) Percepção discriminativa Altura, intensidade, duração, ritmo. 1. Não-verbal – som isolado, pares, trios e combinações entre matizes. 2. Verbal – vogais, sílabas com fonemas parecidos, logatomas, pares mínimos. D) Percepção analítico-sintética 1. Não-verbal – seqüências de 3 a 4 estímulos a serem sintetizados num todo. 2. Verbal – recompor palavras fragmentadas por sílabas, ou frases fragmentadas por palavras. A partir destas (sílabas ou palavras), formar novas palavras ou frases. E) Percepção figura-fundo Não-verbal e verbal com ruído de fundo. F) Memória 1. Não-verbal – 2 a 4 estímulos. 2. Verbal – séries de palavras simples com aumento de complexidade. Aumento de ordens contidas em uma mesma mensa- gem verbal. Completar detalhes omitidos na segunda versão de uma história. Reconhecer palavras que integrem outras, por exemplo, soldado. Atividades de visualização 1. Identificação de diferenças em figuras. 2. Identificação de detalhes em figuras. 3. Discriminação de palavras com grafias iguais, parecidas e diferentes. 4. Discriminação de grafemas iguais, parecidos e diferentes. 5. Memória para seqüência de estímulos visuais: gestos, figuras, palavras. 6. Análise-síntese visual: recortar figura em 2 ou 4 partes e depois montá-la; quebra-cabeça; caça-palavras. 7. Discriminar figura-fundo visual. Atividades de estimulação da linguagem e da fala 1. Dramatizações. 2. Contar histórias, novelas, filmes. 3. Adivinhações. 4. Descrições. 5. Absurdos. Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 921 6. Opostos. 7. Categorias. 8. Funções. 9. Suposições. 10. Palavras com vários significados. 11. Derivados das palavras. Atividades de estimulação da leitura e da escrita A) Motivação para a leitura e elaboração gráfica Crianças com alterações no conteúdo da elaboração gráfica, necessitam de uma estimulação especial para que encontrem na escrita uma forma agradável de receber informações ou manifes- tar suas idéias. Ao estimulá-las, devemos levar em conta condi- ções indispensáveis para a sua motivação e envolvimento em atividades informais ou dirigidas: • Tomada de consciência do objetivo real da leitura. A criança deve ser levada a sentir a necessidade de ler, o que pode ocorrer por meio de jogos e atividades motivantes que requeiram a leitura de regras, partindo-se de representa- ções gráficas com aumento de complexidade de simboli- zação: figuras de ação, logotipos que identifiquem um pro- duto, palavras e frases. • A partir da análise do campo de estímulos do meio ambiente do indivíduo, fornecer diferentes materiais de leitura, prefe- rencialmente ilustrados, partindo sempre de conteúdos sig- nificativos e do interesse da criança: histórias, gibis, revis- tas, jornais, propagandas, embalagens, etc. • Valorização de qualquer tentativa espontânea de decodi- ficação ou produção gráfica. • Considerando que grande parte das crianças com alterações de forma (trocas, omissões, inversões de grafemas) temem escrever pelo seu histórico de desaprovações, enfatizar o valor do conteúdo de suas emissões gráficas procurando, de início, evitar correções de ortografia ou de gramática. B) Sugestões de atividades para o desenvolvimento do conteúdo gráfico • Estimular o desenho e a pintura, vistos como primeira forma de comunicação gráfica. • Editar a fala da criança (palavras ou frases) e solicitar uma leitura conjunta desta produção pode ser uma atividade motivante, considerando que a mesma pode reconhecer o conteúdo de sua verbalização, antecipando-se à decodificação e conferindo a produção gráfica do terapeuta. • Escrita conjunta de um tema pré-determinado, onde um cada desenha ou escreve uma palavra ou uma linha da composição. 922 Fonoaudiologia Prática • Sugerir a confecção de uma agenda ou diário onde a criança desenhe ou escreva coisas de seu interesse; por se tratar de um registro de caráter pessoal, não devemos ler as anota- ções feitas pela criança, valorizando somente o seu ato de escrever. • Substituir palavras em frases retiradas do contexto, onde sejam mantidas as estruturas gramáticas pode ser uma atividade divertida. Por exemplo, podemos sortear palavras previamente grafadas, para a substituição de determinados elementos da frase: A menina caiu da cadeira. a menina – a mulher, o homem, a boneca, etc. caiu da – sentou na, quebrou a, pintou a, etc. cadeira – árvore, escada, cama, etc. • preencher balões de diálogos em ilustrações; • completar ou aumentar frases; • criar títulos para histórias; • mudar o final de histórias. C) Atividades ortográficas Mais uma vez, a estimulação deve seguir os princípios da motivação. Antes da formalização desse trabalho, a criança deve ter consciência de que o mais importante é o conteúdo de sua comunicação gráfica. A correção da forma deve basear - se na escrita produzida a partir da necessidade de comunica- ção gráfica, determinada pelos diferentes contextos terapêu- ticos. Trocas e omissões de natureza perceptual auditiva Podem se manifestar na comunicação oral e na gráfica ou somente nesta última. Sucede o trabalho geral de audibilização: atenção, discrimina- ção, memória, análise-síntese, figura-fundo auditivas. As ativida- des específicas que abrangem esses aspectos devem ser repre- sentadas graficamente pelo terapeuta, pela criança ou por ambos. Sugestões: • Extrair e representar graficamente, a partir deatividades contextualizadas, palavras que se contenham o fonema omitido, ou um dos fonemas do par (ou pares), responsável pela dificuldade de discriminação (atenção, memória). • Evocar e criar listas de palavras que contenham este mesmo som (análise-síntese). • Formar novas palavras a partir da sílaba inicial, medial ou final das palavras evocadas, procurando incluir o fonema/ grafema em questão (análise-síntese). • Construir frases diferentes com as palavras extraídas do contexto (memória, análise-síntese, elaboração). • No caso da troca, proceder da mesma maneira com o outro fonema do par. Diagnóstico e Terapia dos Distúrbios do Aprendizado da Leitura e Escrita 923 • Contrapor as palavras levantadas, procurando característi- cas acústicas que diferenciem os fonemas que as com- põem, usando também as pistas táteis e cinestésicas (dis- criminação). • Discriminar auditivamente as palavras levantadas, associa- das aos seus respectivos grafemas. • Discriminar novas palavras que contenham os pares traba- lhados. • Proceder da mesma forma com os demais pares de dificul- dade. Trocas e omissões de natureza perceptual visual Sucede o trabalho geral de visualização: atenção, discrimi- nação, memória, análise-síntese, figura-fundo visuais. Suges- tões: • Possibilitar um contato visual repetitivo com as palavras que contenham os grafemas em questão: jogos de me- mória, loto de palavras, palavras derivadas, sorteio de palavras. • Depreensão de regras ortográficas a partir da evocação de palavras que contenham o mesmo som. O terapeuta escre- ve estas palavras e a criança deve procurar a diferença de grafia marcando as semelhantes por meio de uma mesma representação. Por exemplo, regra do s (posição inicial) e ss (posição medial e final): sapato passo passarinho solidão sino sono assustado sempre péssimo assunto • Criar listas de palavras a partir da depreensão das regras. • As trocas específicas da posição de grafemas (inversões, reversões) implicam no trabalho de desenvolvimento das noções de espaciais descritas anteriormente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Algumas das colocações feitas neste capítulo tiveram como objetivo fornecer subsídios para uma reflexão sobre as condutas frente aos distúrbios do aprendizado da leitura e da escrita e, acima de tudo, despertar o interesse para a busca de soluções mais efetivas para o seu diagnóstico e tratamento. De maneira alguma houve a pretensão de esgotar o assunto. Espera-se contudo que, as colocações ora feitas, possam servir de motivação para a procura de novos caminhos fonoaudiológi- cos, através de pesquisas e estudos mais aprofundados dos aspectos aqui levantados. 924 Fonoaudiologia Prática Leitura recomendada CONDEMARIN, M. & CHADWICCK, M. – A Escrita Criativa e Formal. Porto Alegre, Artes Médicas, 1987. FERREIRO, M. & TEBEROSKY, A. – Psicogênese da Língua Escri- ta. 3ª ed. Porto Alegre, Artes Médicas, 1990. JOHNSON, D.J. & MYKLEBUST, H.R. – Distúrbios de Aprendiza- gem. 2ª ed. São Paulo, Pioneira, 1987. LE BOULCH, J. – Educação Psicomotora. 2ª ed. Porto Alegre, Artes Médicas, 1988. PAIN, S. – Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem. Porto Alegre, Artes Médicas, 1985. SCHRAGER, O.L. – Lengua, Lenguage y Escolaridad. Buenos Aires, Panamericana, 1985. VIGOTSKII, L.S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. – Linguagem, Desen- volvimento e Aprendizagem. São Paulo, Ícone, 1988.
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