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UCG - CIVIL VI - Introdução ao Direito de Família

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS 
 
 
CIVIL VI – DIREITO DE FAMÍLIA 
Prof. Maria Aparecida de Bastos 
 
 
INTRODUÇÃO AO DIREITO DE FAMÍLIA1 
 
 Nos diversos direitos positivos dos povos e mesmo em diferentes ramos de 
direito de um mesmo ordenamento, podem coexistir diversos significados de família. 
 
 Como regra geral, porém, o Direito Civil moderno apresenta uma definição mais 
restrita, considerando membros da família as pessoas unidas por relação conjugal ou 
de parentesco. O direito de família estuda, em síntese, as relações das pessoas unidas 
pelo matrimônio, bem como daqueles que convivem em uniões sem casamento; dos 
filhos e das relações destes com os pais, da sua proteção por meio da tutela e da 
proteção dos incapazes por meio da curatela. O direito de família possui forte conteúdo 
moral e ético. O casamento ainda é o centro gravitador do direito de família, embora as 
uniões sem casamento tenham recebido parcela importante dos julgados nos tribunais, 
nas últimas décadas, o que se refletiu decididamente na legislação. 
 
Desse modo, importa considerar a família em um conceito amplo, como 
parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza 
familiar. Nesse sentido, compreende os ascendentes, descendentes e colaterais de 
uma linguagem, incluindo-se os ascendentes, descendentes e colaterais do cônjuge, 
que se denominam parentes por afinidade ou afins. Nessa compreensão, inclui-se o 
cônjuge, que não é considerado parente. Em conceito restrito, família compreende 
somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder. Nesse 
particular, a Constituição Federal estendeu sua tutela inclusive para a entidade familiar 
formada por apenas um dos pais e seus descendentes, a denominada família 
monoparental, conforme disposto no § 4º do art. 226: "Entende-se, também, como 
entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes." 
 
Pode ainda ser considerada a família sob o conceito sociológico, integrado pelas 
pessoas que vivem sob um mesmo teto, sob a autoridade de um titular. 
 
 
Lineamentos Históricos 
 
No curso das primeiras civilizações de importância, tais como a assíria, hindu, 
egípcia, grega e romana, o conceito de família foi de uma entidade ampla e hierárquica, 
retraindo-se hoje, fundamentalmente, para o âmbito quase exclusivo de pais e filhos 
menores, que vivem no mesmo lar. 
 
No estado primitivo das civilizações o grupo familiar não se assentava em 
relações individuais. As relações sexuais ocorriam entre todos os membros que 
integravam a tribo (endogamia). Posteriormente, na vida primitiva, as guerras, a 
carência de mulheres e talvez uma inclinação natural levaram os homens a buscar 
relações com mulheres de outras tribos, antes do que em seu próprio grupo. Os 
historiadores fixam nesse fenômeno a primeira manifestação contra o incesto no meio 
 
1 texto extraído do livro “Direito de Família” – Sílvio de Salvo Venosa, 4ª edição, 2004) 
social (exogamia). Nesse diapasão, no curso da história, o homem marcha par.a 
relações individuais, com caráter de exclusividade, embora algumas civilizações 
mantivessem concomitantemente situações de poligamia, como ocorre até o presente. 
Desse modo, atinge-se a organização atual de inspiração monogâmica. 
 
A monogamia desempenhou um papel de impulso social em benefício da prole, 
ensejando o exercício do poder paterno. A família monogâmica converte -se, portanto, 
em um fator econômico de produção, pois esta se restringe quase exclusivamente aos 
interiores dos lares, nos quais existem pequenas oficinas. Essa situação vai-se reverter 
somente com a Revolução Industrial, que faz surgir um novo modelo de família. Com a 
industriali zação, a família perde sua característica de unidade de produção. Perdendo 
seu papel econômico, sua função relevante transfere-se ao âmbito espiritual, fazendo-
se da família a instituição na qual mais se desenvolvem os valores morais, afetivos, 
espirituais e de assistência recíproca entre seus membros (Bossert-Zannoni, 1996:5). 
 
Em Roma, o poder do pater exercido sobre a mulher, os filhos e os escravos é 
quase absoluto. A família como grupo é essencial para a perpetuação do culto familiar. 
No Direito Romano, assim como no grego, o afeto natural, embora pudesse existir, não 
era o elo de ligação entre os membros da família. Nem o nascimento nem a afeição 
foram fundamento da família romana. O pater podia nutrir o mais profundo sentimento 
por sua filha, mas bem algum de seu patrimônio lhe poderia legar (Coulanges, 1958, v. 
1:54). A instituição funda-se no poder paterno ou poder marital. Essa situação deriva do 
culto familiar. Os membros da família antiga eram unidos por vínculo mais poderoso 
que o nascimento: a religião doméstica e o culto dos antepassados. Esse culto era 
dirigido pelo pater. A mulher, ao se casar, abandonava o culto do lar de seu pai e 
passava a cultuar os deuses e antepassados do marido, a quem passava a fazer 
oferendas. Por esse largo período da Antigüidade, família era um grupo de pessoas 
sob o mesmo lar, que invocava os mesmos antepassados. Por essa razão, havia 
necessidade de que nunca desaparecesse, sob pena de não mais serem cultuados os 
antepassados, que cairiam em desgraça. Por isso, era sempre necessário que um 
descendente homem continuasse o culto familiar. Daí a importância da adoção no 
velho direito, como forma de perpetuar o culto, na impossibilidade de assim fazer o filho 
de sangue. Não bastava porém gerar um filho: este deveria ser fruto de um casamento 
religioso. O filho bastardo ou natural não poderia ser o continuador da religião 
doméstica. As uniões livres não possuíam o status de casamento, embora se lhes 
atribuísse certo reconhecimento jurídico. O Cristianismo condenou as uniões livres e 
instituiu o casamento como sacramento, pondo em relevo a comunhão espiritual entre 
os nubentes, cercando-a de solenidades perante a autoridade religiosa. 
 
Por muito tempo na história, inclusive durante a Idade Média, nas classes 
nobres, o casamento esteve longe de qualquer conotação afetiva. O nascimento de 
filha não preenchia a necessidade, pois ela não poderia ser continuadora do culto de 
seu pai, quando contraísse núpcias. Reside nesse aspecto a origem histórica dos 
direitos mais amplos, inclusive em legislações mais modernas, atribuídos ao filho e em 
especial ao primogênito, a quem incumbiria manter unido o patrimônio em prol da 
unidade religioso-familiar. 
 
A ciência do direito demonstrou nos últimos séculos o caráter temporal do 
casamento, que passou a ser regulamentado pelo Estado, que o inseriu nas 
codificações a partir do século XIX como baluarte da família. 
 
 
Família Moderna. Novos Fenômenos Sociais 
 
 
 A célula básica da família, formada por pais e filhos, não se alterou muito com a 
sociedade urbana. A família atual, contudo, difere das formas antigas no que concerne 
a suas finalidades, composição e papel de pais e mães. 
 
A passagem da economia agrária à economia industrial atingiu 
irremediavelmente a família. A industrialização transforma drasticamente a composição 
da família, restringindo o número de nascimentos nos países mais desenvolvidos. A 
família deixa de ser uma unidade de produção na qual todos trabalhavam sob a 
autoridade de um chefe. O homem vai para a fábrica e a mulher lança-se para o 
mercado de trabalho. No século XX, o papel da mulher transforma-se profundamente, 
com sensíveis efeitos no meio familiar. Na maioria das legislações, a mulher alcança os 
mesmos direitos do marido. Transfigura-se a convivência entre pais e filhos. Estes 
passam mais tempo na escola e em atividades fora do lar. Os conflitos sociais gerados 
pela nova posição social dos cônjuges, as pressões econômicas, a desatenção e o 
desgaste dasreligiões tradicionais fazem aumentar o número de divórcios. As uniões 
sem casamento passam a ser regularmente aceitas pela sociedade e pela legislação. A 
nova família estrutura-se independentemente das núpcias. Novos casamentos dos 
cônjuges separados formam uma simbiose de proles. O controle e o descontrole de 
natalidade são facetas do mesmo fenômeno. Por isso, as emigrações étnicas para os 
países desenvolvidos criam novas células familiares, com novos valores, com 
dificuldade de assimilação para as primeiras gerações nas novas terras. Casais 
homoafetivos vão paulatinamente obtendo reconhecimento judicial e legislativo. Em 
poucas décadas, portanto, os paradigmas do direito de família são diametralmente 
modificados. O princípio da indissolubilidade do vínculo do casamento e a ausência de 
proteção jurídica aos filhos naturais, por exemplo, direito positivo em nosso 
ordenamento até muito recentemente, pertencem definitivamente ao passado e à 
História do Direito do nosso país. Atualmente, o jurista defronta com um novo direito de 
família, que contém surpresas e desafios trazidos pela ciência. 
 
De outra face, o desenvolvimento tecnológico demonstra hoje ser possível a 
certeza da paternidade biológica, a fecundação artificial, a clonagem de seres humanos 
etc. em questões que superam as mais imaginosas ficções científicas de passado bem 
próximo. 
 
 
Natureza Jurídica da Família 
 
 A doutrina majoritária, longe de ser homogênea, conceitua família como 
instituição. Como instituição, a família é uma coletividade humana subordinada à 
autoridade e condutas sociais. Uma instituição deve ser compreendida como uma 
forma regular, formal e definida de realizar uma atividade. Nesse sentido, família é uma 
união associativa de pessoas, sendo uma instituição da qual se vale a sociedade para 
regular a procriação e educação dos filhos. Sob a perspectiva sociológica, família é 
uma instituição permanente integrada por pessoas cujos vínculos derivam da união de 
pessoas de sexos diversos. Desse modo, como sociologicamente a família é sem 
dúvida uma instituição, o Direito, como ciência social, assim a reconhece e a 
regulamenta. 
 
 
Direito de Família 
 
 Beviláqua (1937:6) definiu de forma perene: 
 
“Direito de família é o complexo de normas, que regulam a celebração do 
casamento, sua validade e os efeitos, que dele resultam, as relações 
pessoais e econômicas da sociedade conjugal, a dissolução desta, as 
relações entre pais e filhos, o vínculo do parentesco e os institutos 
complementares da tutela e da curatela.” 
 
 Na definição do grande Beviláqua há que se acrescentar, hoje, as normas 
reguladoras das uniões sem casamento. É interessante observar que no passado 
qualquer referência jurídica à família tomava por base o casamento. Só mais 
recentemente a família foi observada pelos juristas sob prisma de instituição, 
abrangendo as uniões sem casamento e até mesmo as chamadas famílias 
monoparentais. A Constituição de 1988 ampliou, entre nós, o conceito de família, para 
reconhecer "como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e 
seus descendentes", bem como a união estável entre o homem e a mulher (art. 226). 
Destarte, a família é um gênero que comporta várias espécies (Pereira, 2003:8). 
 
O casamento, tal como o conhecemos, somente se estrutura na História quando 
o homem atinge determinado grau de cultura. A família preexiste à estruturação 
jurídica. 
 
O direito canônico, ou sob inspiração canônica, que regulou a família até o 
século XVIII e inspirou as leis civis que se seguiram, não era um direito civil na 
acepção técnica do termo. O direito de família canônico era constituído por normas 
imperativas, inspiradas na vontade de Deus ou na vontade do monarca. O casamento, 
segundo os cânones, era a pedra fundamental, ordenado e comandado pelo marido: 
 
“O pai transforma-se, assim, numa verdadeira fonte de criação de Direito, de 
normas de organização interna da família que se impõem aos dependentes. A 
vontade do pai é lei” (Diogo Leite de Campos. In: Teixeira, 1993:20). 
 
 
Nesses preceitos, o casamento tinha caráter de perpetuidade com o dogma da 
indissolubilidade do vínculo, tendo como finalidade a procriação e criação dos filhos. A 
desvinculação do matrimônio da Igreja abriu caminho para a revisão dessa dogmática. 
 
O direito de família, ramo do direito civil com características peculiares, é 
integrado pelo conjunto de normas que regulam as relações jurídicas familiares, 
orientado por elevados interesses morais e bem-estar social. Originalmente, em nosso 
país, o direito de família vinha regulado exclusivamente pelo Código Civil. O Código 
Civil de 2002 procura fornecer uma nova compreensão da família, adaptada ao novo 
século. Seguindo o que já determinara a Constituição de 1988, o atual estatuto procura 
estabelecer a mais completa igualdade jurídica dos cônjuges e dos companheiros, do 
homem e da mulher. Da mesma forma, o vigente diploma civil contempla o princípio da 
igualdade jurídica de todos os filhos, independentemente de sua origem. Não mais se 
refere o Código ao pátrio poder, mas ao poder familiar, aquele que é exercido como um 
poder-dever em igualdade de condições por ambos os progenitores. 
 
Desse modo, o direito de família, por sua própria natureza, é ordenado por 
grande número de normas de ordem pública. Essa situação, contudo, não converte 
esse ramo em direito público. As normas de ordem pública no direito privado têm por 
finalidade limitar a autonomia de vontade e a possibilidade de as partes disporem sobre 
suas próprias normas nas relações jurídicas. 
 
No direito de família, a ordem pública prepondera dispondo sobre as relações 
pessoais dos cônjuges, relações entre pais e filhos, regimes matrimoniais, celebração e 
dissolução do casamento etc. Tal se deve ao interesse permanente do Estado no 
direcionamento da família como sua célula básica, dedicando-lhe proteção especial 
(art. 226, caput, da CF). 
 
Desse modo, embora o direito de família se utilize majoritariamente de normas 
imperativas para ordenar as relações entre seus membros, como afirma Guilhermo A. 
Borda (1993, v. 1:9), a pretensão de deslocar a família do direito privado representa um 
contra-senso. Não se pode conceber nada mais privado, mais profundamente humano 
do que a família, em cujo seio o homem nasce, vive, ama, sofre e morre. Desse modo, 
não há como se admitir o direito de família como direito público em um Estado 
democrático, porque cabe a ele tutelar e proteger a família, intervindo de forma indireta 
apenas quando essencial para sua própria estrutura. 
 
 
Características Preliminares 
 
O direito de família, por sua natureza, apresenta características que o afasta dos 
demais ramos do direito privado. A sociedade procura regular e tutelar a família da 
forma mais aceitável possível no tempo e no espaço. O Estado intervém na estrutura 
da família em prol da preservação da célula que o sustenta, em última análise. 
Ainda, cabe a ele estruturar os meios assistenciais e judiciais, legais e materiais 
para o acesso à Justiça, a fim de que o ideal da família seja obtido nas situações de 
conflito. Há, de plano, necessidade de especialização. O juiz e os tribunais de família 
devem possuir um perfil absolutamente diverso das cortes destinadas a dirimir conflitos 
patrimoniais. Avulta a importância nesse campo do mediador e da mediação, do juiz 
conciliador e dos corpos profissionais auxiliares das cortes, pedagogos, psicólogos, 
sociólogos e assistentes sociais. Não apenas os órgãos do Estado devem ser 
vocacionados para os conflitos de família, mas também do advogado é exigido perfil 
nesse árduo campo. O tradicional papel do advogado litigante cede lugar ao do 
advogado negociador, que juntamente com o juiz conciliador aponta ao interessado o 
modo mais convenientepara obter a solução do conflito que o aflige. 
 
“O advogado, nesse caso, deve esforçar-se para fazer entender a quem se 
enfrenta por ocasião de um conflito familiar, que muito mais eficaz será o que as 
partes concordam do que o que o juiz imponha” (Bossert e Zannoni, 1996:19). 
 
Deve sempre ser lembrado pelo juiz e pelo advogado, bem como pelo membro 
do Ministério Público, que toda sentença decorrente de um conflito de família é parte de 
um trágico drama. Deve ser criado um amplo espaço de atuação para os mediadores. 
 
Por outro lado, nenhum outro campo do Direito exige mais do jurista, legislador, 
juiz, Ministério Público e advogado uma mente aberta, suscetível para absorver 
prontamente as modificações e pulsações sociais que os rodeiam. Quem não 
acompanha a evolução social certamente se conduzirá em desarmonia com as 
necessidades de seu tempo. A jurisprudência deve dar pronta e apropriada resposta 
aos anseios da sociedade. Exige-se do operador do Direito que seja pleno conhecedor 
da sociedade e do meio em que vive. Neste Brasil, não há como dirimir o conflito 
familiar da mesma natureza com idênticas soluções no meio rural e no meio urbano, na 
região norte e na região sul, nas pequenas e nas grandes comunidades etc. As 
questões de família abrem palco para o advogado e juiz conciliador e mediador. 
 
Como relatamos, trata-se do campo do direito mais bafejado e influenciado por 
idéias morais e religiosas. Os chamados direitos de família constituem na verdade um 
complexo de direitos e deveres, como o pátrio poder ou poder familiar. O direito de 
família está centrado nos deveres, enquanto nos demais campos do direito de índole 
patrimonial o centro orientador reside nos direitos, ainda que também orientados pelo 
cunho social, como a propriedade. 
 
Por conseguinte, o papel da vontade é mais restrito, pois quase todas as normas 
de família são imperativas. 
 
Como outro corolário, os direitos de família puros, regulados por norma cogente, 
são irrenunciáveis, como o direito a alimentos. Nos alimentos, a transação se limitará a 
seu valor. 
 
No mesmo diapasão, como veremos, os direitos derivados do estado de família 
são imprescritíveis. Assim, não prescrevem os direitos de pleitear alimentos e de pedir 
o reconhecimento de filiação, por exemplo. 
 
O direito de família disciplina a relação básica entre os cônjuges, se casados, ou 
entre companheiros, na ausência de núpcias. A sociedade conjugal tem proteção do 
Estado com ou sem casamento, nos termos de nossa Constituição de 1988. Delas 
decorrem também os direitos relativos à filiação e ao parentesco direto (membros de 
um mesmo tronco), ou por afinidade (relação do cônjuge com os parentes do outro 
cônjuge). Como modalidade de filiação, a adoção sofreu no curso de nossa história 
legislativa lenta, mas gradual, evolução. Além dessa regulamentação direta, a lei 
também se preocupa com normas de caráter protetivo da família, bem como 
previdenciárias, estas de direito público. 
 
Outra característica presente dos direitos de família, quando examinados sob o 
prisma individual e subjetivo, é sua natureza personalíssima. Esses direitos são, em 
sua maioria, intransferíveis, intransmissíveis por herança e irrenunciáveis. O pátrio 
poder ou poder familiar e o estado de filiação são irrenunciáveis: ninguém pode ceder o 
direito de pedir alimentos, ninguém pode renunciar ao direito de pleitear o estado de 
filiação. 
 
 
Direito da Família no Brasil. Constituição de 1988 
 
 Os Códigos elaborados a partir do século XIX. Naquela época, a sociedade era 
eminentemente rural e patriarcal. A mulher dedicava-se aos afazeres domésticos e a lei 
não lhe conferia os mesmos direitos do homem. O marido era considerado o chefe, o 
administrador e o representante da sociedade conjugal. Nosso Código Civil de 1916 foi 
fruto direto dessa época. Os filhos submetiam-se à autoridade paterna, como futuros 
continuadores da família, em uma situação muito próxima da família romana. 
 
O Estado, não sem muita resistência, absorve da Igreja a regulamentação da 
família e do casamento, no momento em que esta não mais interfere na direção 
daquele. No entanto, pela forte influência religiosa e como conseqüência da moral da 
época, o Estado não se afasta muito dos cânones, assimilando-os nas legislações com 
maior ou menor âmbito. Manteve-se a indissolubilidade do vínculo do casamento e a 
capitis deminutio, incapacidade relativa, da mulher, bem como a distinção legal de 
filiação legítima e ilegítima. 
 
A partir da metade do século XX, o legislador foi vencendo barreiras e 
resistências, atribuindo direitos aos filhos ilegítimos e tornando a mulher plenamente 
capaz, até o ponto culminante que representou a Constituição de 1988, que não mais 
distingue a origem da filiação, equiparando os direitos dos filhos, nem mais considera a 
preponderância do varão na sociedade conjugal. A Lei nº 4.121, de 27-8-62, Estatuto 
da Mulher Casada, que eliminou a incapacidade relativa da mulher casada, inaugura 
entre nós a era da igualdade entre os cônjuges, sem que, naquele momento, a 
organização familiar deixasse de ser preponderantemente patriarcal. 
 
A batalha legislativa foi árdua, principalmente no tocante à emenda 
constitucional que aprovou o divórcio. 
 
Novos temas estão hoje a desafiar o legislador, como as inseminações e 
fertilizações artificiais, os úteros de aluguel, as cirurgias de mudança de sexo, os 
relacionamentos afetivos entre pessoas do mesmo sexo, a clonagem de células e de 
pessoas etc. A ciência evolui com rapidez e por saltos e hoje se esperam respostas 
mais rápidas do Direito, o que não ocorria no passado, quando as alterações eram 
quase exclusivamente de ordem sociológica, e, portanto, gradativas. 
 
A Constituição de 1988 consagra a proteção à família no art. 226, 
compreendendo tanto a família natural e a família adotiva. De há muito, o país sentia 
necessidade de reconhecimento da célula familiar independentemente da existência de 
matrimônio. 
 
Por outro lado, além da igualdade dos filhos, a igualdade de tratamento 
constitucional do marido e da mulher é elevada à condição de princípio normativo 
fundamental no direito de família. 
 
''proteção de todas as espécies de família (art. 226, caput); reconhecimento 
expresso de outras formas de constituição familiar ao lado do casamento, como 
as uniões estáveis e as famílias monoparentais (art. 226, §§ 3º e 4º); igualdade 
entre os cônjuges (art. 5º, caput, I, e art. 226, 5º); dissolubilidade do vínculo 
conjugal e do matrimônio (art. 226, § 6º); dignidade da pessoa humana e 
paternidade responsável (art. 226, § 5º); assistência do estado a todas as 
espécies de família (art. 226, § 8º); dever de a família, a sociedade e o Estado 
garantirem à criança e ao adolescente direitos inerentes à sua personalidade 
(art. 227, §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 7º); igualdade entre os filhos havidos ou não do 
casamento, ou por adoção (art. 227, § 6º); respeito recíproco entre pais e filhos; 
enquanto menores é dever daqueles assisti-los, criá-los e educá-los, e destes o 
de ampararem os pais na velhice, carência ou enfermidade (art. 229); dever da 
família, sociedade e Estado, em conjunto, ampararem as pessoas idosas, 
velando para que tenham uma velhice digna e integrada à comunidade (art. 230, 
CF)". 
 
 O Estatuto da Criança e do Adolescente veio regulamentar com minúcias, esse 
dispositivo constitucional, no âmbito de proteção e assistência, substituindo a lei 
anterior (Código de Menores, Lei nº 6.697/79). 
 
 
Estado de Família 
 
 No Direito Romano, o status familiae (o estado familiar), era importante para 
estabelecer direitos e obrigações. Estado de família é a posição e a qualidade que a 
pessoa ocupa na entidade familiar. No direito civil, portanto, o Estado considera a 
pessoa em si mesma e com relação àfamília. Disso decorre a definição do maior 
capaz, menor incapaz, casado, solteiro etc. Sob aspecto genérico, a profissão também 
pode ser considerada um atributo do Estado. 
 
O estado de família é um dos atributos da personalidade das pessoas naturais. 
É atributo personalíssimo. É conferido pelo vínculo que une uma pessoa às outras: 
casado, solteiro. Também pode ser considerado sob o aspecto negativo: ausência de 
vínculo conjugal, familiar, filho de pais desconhecidos. 
 
Esses vínculos jurídicos familiares são de duas ordens: vínculo conjugal, que 
une a pessoa com quem se casou, e vínculo de parentesco, que a une com as pessoas 
de quem descende (parentesco em linha reta), com as que descendem de um 
ancestral comum (parentesco colateral), com os parentes do outro cônjuge (parentesco 
por afinidade), além de com o parentesco adotivo. Desse estado de família decorem 
deveres e direitos disciplinados pelo direito de família com reflexos em todos os 
campos jurídicos (processual, penal, tributário, previdenciário etc.). 
 
O estado de família apresenta características distintas que se traduzem em: 
 
1. intransmissibilidade: esse status não se transfere por ato jurídico, nem 
entre vivos nem por causa da morte. É personalíssimo, porque depende da 
situação subjetiva da pessoa com relação à outra. Como conseqüência da 
intransmissibilidade, o estado de família também é intransigível; 
2. irrenunciabilidade: ninguém pode despojar-se por vontade própria de seu 
estado. O estado de filho ou de pai depende exclusivamente da posição 
familiar. Ninguém pode renunciar ao pátrio poder, agora denominado poder 
familiar, por exemplo; 
3. imprescritibilidade: o estado de família, por sua natureza, é imprescritível, 
como decorrência de seu caráter personalíssimo. Não se pode adquirir por 
usucapião, nem se perde pela prescrição extintiva; 
4. universalidade: é universal porque compreende todas as relações jurídico-
familiares; 
5. indivisibilidade: o estado de família é indivisível, de modo que será sempre 
o mesmo perante a família e a sociedade. Não se admite, portanto, que uma 
pessoa seja considerada casada para determinadas relações e solteira para 
outras; 
6. correlatividade: o estado de família é recíproco, porque se integra por 
vínculos entre pessoas que se relacionam. Desse modo, ao estado de marido 
antepõe-se o de esposa; ao de filho, o de pai, e assim por diante; 
7. oponibilidade: é oponível pela pessoa perante todas as outras. O casado 
assim é considerado perante toda a sociedade. 
 
Ações de Estado 
 
 As denominadas ações de Estado são aquelas nas quais a pretensão é de 
obtenção de um pronunciamento judicial sobre o estado de família de uma pessoa. Por 
exemplo, as ações de investigação de paternidade e negatória de filiação. Desse 
modo, as ações de estado são todas as que buscam proteger o estado de família de 
forma positiva ou negativa. Podem controverter a relação filial, conjugal ou de 
parentesco em geral. 
 
As ações de Estado puras não se confundem com as que visam ao exercício do 
estado de família. A ação de alimentos, por exemplo, exercita o direito do estado de 
filiação ou conjugal, mas não é uma ação de estado. Assim também as ações de 
guarda e regulamentação de visitas de filhos. Também não são ações de estado as de 
mera retificação do registro civil. 
 
Como decorrentes do estado de família, essas ações de estado guardam as 
mesmas características de intransmissibilidade, imprescritibilidade, irrenunciabilidade, 
sendo também personalíssimas.

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