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AT 1 2 32 S U M Á R IO 3 INTRODUÇÃO 4 UNIDADE 1 - Conceituações básicas: estado, governo, administração pública, direta e indireta, autarquias, serviços públicos 4 1.1 Estado 4 1.2 O Estado Brasileiro 4 1.3 Governo 4 1.4 Administração 5 1.5 A Administração Pública 6 1.6 A Classificação da Administração Pública 7 1.6.1 Administração pública direta 7 1.6.2 Administração pública indireta 9 1.6.3 Serviços públicos 10 UNIDADE 2 - As escolas e teorias do pensamento administrativo 11 2.1 Teoria da Burocracia 12 2.2 Teoria da Decisão 14 2.3 Teoria dos Sistemas 14 2.4 Teoria da Contingência 17 UNIDADE 3 - Os modelos da administração pública no brasil 17 3.1 Modelo Patrimonialista 18 3.2 Administração Pública Burocrática 20 3.3 Administração Pública Gerencial 24 UNIDADE 4 - Os princípios constitucionais da administração pública 24 4.1 Princípio da Legalidade 25 4.2 Princípio da Impessoalidade 25 4.3 Princípio da Moralidade 26 4.4 Princípio da Publicidade 27 4.5 Princípio da Eficiência 27 4.6 Outros Princípios Constitucionais Explícitos 29 4.7 Princípios Constitucionais Implícitos 30 UNIDADE 5 - O estado de bem-estar, a nova administração, sua crise e as reformas da administração do estado brasileiro 30 5.1 O Estado de Bem-Estar 32 5.2 As crises e as reformas da Administração Pública 36 5.3 A nova administração Pública 40 REFERÊNCIAS 2 33 INTRODUÇÃO Falar em Administração Pública de imediato nos remete à coisa pública e a um sem número de áreas que são geridas pelo administrador público. A administração pública nada mais é que um conjunto de órgãos, setores e agentes que tem a nobre missão de as- segurar a satisfação das necessidades básicas da população ou da coletivida- de, sendo a saúde, educação, assistência social, esportes, lazer, habitação, sane- amento básico, segurança e obras, algu- mas dessas necessidades. Para que a administração funcione plenamente, evidentemente é primor- dial um administrado competente, pla- nejamentos adequados, projetos viáveis, agentes comprometidos e o bom uso da máquina e do dinheiro público. Assim, esta apostila vem com o obje- tivo de proporcionar subsídios àqueles que estão enveredando pelos caminhos públicos e aos que lá já se encontram, atualizar e aprofundar os principais con- ceitos que permeiam a administração pública. Serão apresentadas e discutidas as principais escolas do pensamento ad- ministrativo e a evolução dos modelos de administração pública, bem como elenca- dos os princípios constitucionais que re- gem a Administração Pública. Esperamos contribuir significativa- mente com o aumento de conhecimento e que as reflexões críticas sobre as cri- ses e reformas sofridas pela administra- ção desde meados do século XX, levem a perceber o quão importante é para a população, uma administração pautada na transparência, na seriedade e no com- prometimento com a coisa pública. Ao final do módulo, encontram-se re- ferências bibliográficas complementa- res, as quais servirão de subsídio para ampliar, enriquecer e sanar as lacunas dos conhecimentos adquiridos que por ventura foram deixadas ao longo do tra- balho. 4 54 UNIDADE 1 - Conceituações básicas: estado, governo, adminis- tração pública, direta e indireta, autarquias, serviços públicos Para falarmos em Administração Pública inicialmente precisamos entender o que é Estado e Governo, os quais levam à neces- sidade de uma administração especializada. 1.1 Estado O Estado existe quando possui três elementos essenciais: povo, território e governo soberano e tem como funções primárias, legislar, executar e fiscalizar, ou seja, precisa de três poderes que são o Legislativo (elabora as leis), Executivo (executa as leis, é uma função administra- tiva) e Judiciário (aplicador das leis). Estes três poderes são distintos, independen- tes e harmônicos entre si, conforme o art. 2º da nossa Constituição Federal de 1988 e conforme os preceitos estabelecidos por Montesquieu. Legislativo: é exercido por um sistema bicameral, o Congresso Nacional, composto pela Câmara dos Deputados e o Senado Fe- deral e a sua função é a elaboração das leis; Executivo: é exercido pelo Presiden- te da República com o auxílio dos Minis- tros de Estado e a sua função principal é a transformação da lei em fato concreto; e, Judiciário: é exercido pelo Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Jus- tiça, Tribunais Superiores e demais tribu- nais, cuja função é a aplicação coativa da lei nos casos de litígio. Embora falemos que a função do Exe- cutivo seja administrativa, os demais po- deres também desempenham essa fun- ção e ambos os três legislam e julgam, só que como funções secundárias. 1.2 O Estado Brasileiro O modelo de Estado vigente no Brasil é o federativo, as entidades estatais pos- suem autonomia administrativa e finan- ceira. São a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal. Federal: compõe-se do Poder Executi- vo, exercido pelo Presidente da República e auxiliado pelos Ministros de Estado ten- do ainda os Poderes Legislativo e Judiciá- rio (Conforme arts. 4° e 5° do Decreto-lei 200/67 de 27.02.67); Estadual: possui estrutura simétrica com a administração federal, sendo o Po- der Legislativo unicameral, o Poder Exe- cutivo exercido unipessoalmente pelo Governador de Estado, com o auxílio dos Secretários de Estado, e o Poder Judiciário; Municipal: possui apenas os Poderes Executivo e Legislativo. Possuímos ainda, as autarquias, as em- presas públicas, as sociedades de eco- nomia mista e as fundações. Estas serão conceituadas mais à frente. 1.3 Governo Governo é o conjunto de Poderes e ór- gãos constitucionais. É todo um complexo que fixa os objetivos do Estado, conduz a política dos negócios na área pública e mantém a ordem jurídica vigente. 1.4 Administração Administração, cujo termo vem do latim ad (direção para, tendência para) e minis- ter (subordinação ou obediência), nos leva 4 55 a inferir, pelo significado etimológico que é “aquele” que realiza uma função sob o co- mando de outra pessoa, e aquele que pres- ta um serviço” (CHIAVENATO, 1983, p.6). Devido às transformações sofridas ao longo dos tempos, passaremos a várias de- finições, sendo que algumas se harmonizam umas com as outras e até se completam. As que consideramos mais impor- tantes são: Fayol (1981, p.26) foi o primeiro a de- finir: ‘Administrar é prever, organizar, co- mandar, coordenar e controlar”. Para Taylor (1990, p.24) “O principal objetivo da administração deve ser o de assegurar o máximo de prosperidade ao patrão e, ao mesmo tempo, o máximo de prosperidade ao empregado”. Peter Drucker (1984, p.2) diz que “ad- ministrar é manter as organizações co- esas, fazendo-as funcionar”. Já para La- combe (2003, p.4), a essência do trabalho da administração é “obter resultados por meio das pessoas que o administrador co- ordena”. “Administrar significa assumir tarefas. Significa disciplina. Mas inclui também pes- soal. Cada realização da administração é a realização de um administrador. Cada fra- casso, é o fracasso de um administrador. São pessoas que administram, e não for- ças, e nem fatos. O descortino, a dedicação e a integridade dos administradores deter- mina se haverá administração ou (des)ad- ministração” (DRUCKER, 1984, p. xxiii). 1.5 A Administração Pública Agora sim, podemos conceituar e dis- correr sobre a Administração Pública e uti- lizaremos inicialmente, o entendimento de autores que falam com propriedade sobre a coisa pública e suas nuances, os quais transitam livremente pela mesma área. Walter Ceneviva (2003) nos oferece a conceituação mais simples e não menos objetiva que é “o conjunto de órgãos do Estadoencarregado de exercer, em bene- fício do bem comum, funções previstas na Constituição e nas leis”. Para Hely Lopes Meirelles (2007), reconhecido jurista e um dos doutri- nadores do Direito Administrativo: Em sentido formal, a Administração Pública, é o conjunto de órgãos ins- tituídos para consecução dos objeti- vos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessá- rias aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é o desem- penho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços do próprio Esta- do ou por ele assumidos em benefício da coletividade. Numa visão global, a Administração Pública é, pois, todo o aparelhamento do Estado preorde- nado à realização de seus serviços, visando à satisfação das necessida- des coletivas. A distinção que o professor Meirelles (1982), faz entre a administração pública e privada é a seguinte “Na Administração Pública não há liberdade pessoal. Enquan- to na administração particular é lícito fa- zer tudo o que a lei não proíbe, na Admi- nistração Pública só é permitido o que a lei autoriza”. Por isso que é uma organização do tipo burocrata. O conceito de José Afonso da Sil- va(1998) não difere muito de Meirelles: 6 7 Administração Pública é o conjunto de meios institucionais, materiais, fi- nanceiros e humanos preordenados à execução das decisões políticas. Essa é uma noção simples de Admi- nistração Pública que destaca, em primeiro lugar, que é subordinada ao Poder Político; em segundo lugar, que é meio e, portanto, algo que se serve para atingir fins definidos e, em terceiro lugar, denota seus as- pectos: um conjunto de órgãos a ser- viço do Poder Político e as operações, atividades administrativas. Percebemos assim, que a Administra- ção Pública atua por meio de seus órgãos e agentes, os quais são incumbidos do exercício da atividade administrativa, a qual é exercida, como já foi falado, tipica- mente pelo Poder Executivo e a atipica- mente pelos Poderes Legislativo e Judici- ário. No art. 1º da CF – 88 é claramente defi- nida a nossa forma de governo: Repúbli- ca, a qual quer dizer coisa pública, assim, a administração pública no seu sentido operacional, realizada pelo Poder Exe- cutivo nada mais é que administrar algo alheio, de toda a sociedade. No nosso sistema a administração não é feita diretamente pelo povo. Este esco- lhe seus representantes para represen- tá-lo no parlamento e editar as normas que os agentes públicos irão aplicar em interesse da coletividade. Contudo, os administradores podem acometer abu- sos e ilegalidades e por esta razão, tor- na-se necessário fiscalizar e controlar os atos da Administração Pública. Com a implementação do Plano Dire- tor da Reforma do Aparelho do Estado em 1995 passou-se a adotado o seguinte conceito para a administração pública: “é todo o aparelho do Estado pré-orientado à realização de seus serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas” (BRASIL, 2001). Esta definição está em consonância com a nova relação que deve existir entre o Estado e a sociedade, onde se vê o cidadão como contribuinte de im- postos e como cliente dos seus serviços. Os resultados da ação do Estado são con- siderados bons não porque os processos administrativos estão sob controle e são seguros, mas porque as necessidades do cidadão-cliente estão sendo atendidas (BRASIL, 1995). Enfim, a Administração Pública é o conjunto de órgãos instituídos para con- secução dos objetivos do Governo. É o desempenho permanente, sistemático, legal e técnico dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefi- cio da coletividade. é o aparelhamento do Estado preordenado à realização de seus serviços, visando à satisfação das neces- sidades coletivas. 1.6 A Classificação da Admi- nistração Pública Segundo Di Pietro (2001), a Adminis- tração Pública pode classificar-se em: Ad- ministração Pública em sentido objetivo, que “refere-se às atividades exercidas pelas pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos de atender concretamente às necessidades coletivas”, e Administração Pública em sentido subjetivo, que “refe- re-se aos órgãos integrantes das pessoas jurídicas políticas (União, Estados, Muni- cípios e Distrito Federal), aos quais a lei confere o exercício de funções adminis- trativas.” 6 7 Segundo Anastácio (2007), cada um desses entes políticos possui sua orga- nização administrativa. No caso da admi- nistração federal, temos o Decreto-Lei n.º 200, de 25 de fevereiro de 1967, que dis- põe sobre a organização da Administração Federal, e em seu art. 4º estabelece a divi- são entre administração direta e indireta. 1.6.1 Administração pública direta A Administração Pública Direta cons- titui-se dos serviços integrados na es- trutura administrativa da Presidência da República e dos ministérios (Ver art. 4º, I, Decreto Lei nº 200/67). 1.6.2 Administração pública indireta Na Administração Pública Indireta en- contramos: as autarquias, as fundações públicas (têm natureza jurídica de direito público), as empresas públicas, as socie- dades de economia mista (têm natureza de direito privado). Essas entidades vin- culam-se ao ministério em cuja área de competência enquadra-se sua principal atividade e são responsáveis pela execu- ção de atividades de Governo que neces- sitem ser desenvolvidas de forma descen- tralizada (Ver art. 4º, II e art. 5º, Dec. Lei 200/67). Cabe enfatizar que todos os entes da administração indireta citados são pes- soas administrativas, com personalidade jurídica própria, enquanto que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são pessoas políticas. No que se refere à criação desses entes da Administração Indireta, extraímos im- portante lição da Constituição Federal: Art. 37, XIX – somente por lei espe- cífica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação; Quanto às fundações (instituídas pelo Poder Público), é importante saber que há divergência doutrinária quanto a sua na- tureza: se somente de natureza jurídica pública ou se de natureza jurídica pública ou privada. Autarquias Destaca-se o conceito de Autarquia de Maria Sylvia Di Pietro (2001), “a pessoa ju- rídica de direito público, criada por lei, com capacidade de auto-administração, para o desempenho de serviço público descen- tralizado, mediante controle administrati- vo exercido nos limites da lei”. Cabe ainda, destacar neste ponto, a im- portância da exigência de criação das au- tarquias por meio de lei, que está prevista no art. 37, inciso XIX, da Constituição Fe- deral, citado acima. Outro conceito para autarquias seria serviços autônomos criados por lei, com personalidade jurídica, patrimônio (Esta estrutura organizacional também é se- guida pelos Estados, Municípios, e Distrito Federal.) e receita própria, para executar atividades típicas da administração públi- ca que requeiram, para seu melhor funcio- namento, gestão administrativa e finan- ceira descentralizada. Temos como exemplos: Instituto Bra- sileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS e o Instituto Nacional de Metrologia, Norma- lização e Qualidade Industrial – INMETRO. 8 9 Empresas Públicas Segundo Anastácio (2007), Empresa Pública é a entidade dota- da de personalidade jurídica de direi- to privado, com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, criada para exploração de atividade eco- nômica que o Governo seja levado a exercer por força de contingência ou conveniência administrativa, po- dendo assumir qualquer das formas admitidas em direito”(Ver art. 5º, II, Dec. Lei 200/67). Alguns exemplos seriam: Caixa Eco- nômica Federal – CEF, Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EM- BRAPA. Sociedades de Economia Mista Sociedade de Economia Mista é o ente dotado de personalidade jurídica de di- reito privado, instituído por meio de au- torização legislativa para exploração de atividade econômica, sob a forma de so- ciedade anônima, cujas as ações com di- reito a voto na sua maioria pertençam a União (Ver art. 5º, III, Dec. Lei 200/67). Exemplos: Banco do Brasil, Companhia Vale do Rio Doce, Centrais Elétricas Brasilei- ras S.A., Telecomunicações Brasileiras S.A. Fundações Públicas Já, Fundação Pública pode ser conceitu- ada como o ente dotado de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucra- tivos, com patrimônio próprio, criados em virtude de autorização legislativa, para o desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgão ou entidade de direito público. Possuem autonomia administrativa (Ver – art. 5º, IV, Dec. Lei 200/67). O seu patrimônio é gerido pelos órgãos de sua direção e funcionamento, custea- dos por recursos da União e de outras fon- tes, segundo seus objetivos. A Lei nº 7.596, de 10 de abril de 1.987, deu nova redação ao art. 4º do Decreto- -Lei nº 200, para nele incluir as fundações públicas. Como exemplo de fundações públicas, podemos citar as universidades federais e a Fundação Instituto Brasileiro de Geo- grafia e Estatística - FIBGE. A definição de personalidade jurídica de direito privado para as Fundações Pú- blicas foi alterada pela atual Constitui- ção, dando-lhes a personalidade jurídica de direito público e passando a integrar a estrutura das entidades da Administração Indireta. A discussão em tomo deste as- sunto é colocada de forma bem cristalina por Meirelles (2007). O Decreto n.°84.128, de 29.10.79, definiu a figura da empresa estatal ampliando a definição anterior, dada pelo Decreto-lei n.° 200/67, artigo 172, incorporando a figura de órgãos autônomos da Administração Direta cuja definição é: O poder Executivo assegurará auto- nomia administrativa e financeira, no grau conveniente, aos serviços, institutos e estabelecimento de pesquisa e ensino, ou de caráter in- dustrial, comercial ou agrícola que por suas peculiaridades de orga- nização e funcionamento, exijam tratamento diverso do aplicável aos demais órgãos da Administração Di- 8 9 reta, observada sempre a Supervi- são Ministerial. No caso de concessão de autonomia financeira, fica o poder Executivo autori- zado à instituir fundos especiais, de na- tureza contábil, a cujo crédito se levarão todos os recursos vinculados às ativida- des do órgão autônomo, orçamentários e extra-orçamentários, inclusive a receita própria. 1.6.3 Serviços públicos Serviços Públicos são todos aqueles serviços prestados pela Administração ou delegados, sob normas e controle es- tatais, para satisfazer as necessidades da coletividade ou simples conveniência es- tatal. Eles podem ser divididos em: serviço privativo do Estado e serviço de Utilidade Pública. No primeiro caso, os serviços privativos são aqueles que a Administração presta por reconhecer a sua essencialidade e ne- cessidade para a sobrevivência do grupo social e do próprio Estado. Por isso mesmo tais serviços são considerados privativos do Poder Público, no sentido de que só a Administração deve prestá-los. Significa dizer que não se poderá delegar a tercei- ros, porque exigem atos de império e me- didas compulsórias em relação aos admi- nistrados. Como exemplos desses serviços temos a segurança interna, a defesa nacional e a preservação da saúde pública. No segundo caso, dos serviços de utili- dade pública, a Administração reconhece a sua conveniência para os membros da sociedade e presta esses serviços dire- tamente ou descentraliza para terceiros (concessionários ou permissionários), conforme regras, regulamentos e contro- le estatal. Entre eles estão os transportes coletivos, energia elétrica, serviços de te- lefonia, dentre outros. Segundo Meirelles (2007), o serviço privativo visa a satisfazer as necessida- des gerais e essenciais da coletividade, com a finalidade precípua de subsistência e desenvolvimento. Nos serviços de utili- dade pública, o objetivo é facilitar a vida dos cidadãos na coletividade, colocando serviços à sua disposição que lhes propor- cionarão conforto e bem estar. 10 1110 UNIDADE 2 - As escolas e teorias do pensamento administrativo Desde a antiguidade, a sociedade vem se transformando de forma progressiva até chegar ao que chamamos hoje de “Era do Conhecimento”. No primeiro momento dessa nova era, as relações sociais eram quase inexistentes, mas hoje, as pessoas estão organizadas e dependentes da so- ciedade para quase todas as atividades que precisam desenvolver. O pensamento individualista da anti- guidade passou a ser trabalhado com o objetivo de ampliar a satisfação e a ciên- cia individual. A Administração científica começou com Frederick Taylor, em 1911, quando publicou “Princípios da Gestão Científica” e assim surgiram princípios e práticas de gestão independentes de outras áreas do conhecimento como a economia. Em relação às suas idéias, elas partiam da aplicação de um método científico para en- contrar a única e melhor maneira de realizar o trabalho, selecionando de forma científica os trabalhadores que melhor desempenha- riam a tarefa, levando gestor e trabalhador a uma cooperação amigável, mas manten- do clara a separação de deveres entre eles. Seus trabalhos que visavam melhorar a produtividade conseguiram êxito inicial, au- mentando também os salários, mas os sin- dicatos e os próprios trabalhadores fizeram oposição temendo que ao se trabalhar mais intensamente estariam contribuindo para reduzir o trabalho disponível. Apesar das críticas às teorias de Taylor, sua contribuição para a profissionalização da gestão (administração) foram conside- ráveis. Enquanto Taylor se preocupava com as funções organizacionais e a produtividade, surge em 1916, Henry Fayol com sua “Te- oria Geral da Administração”, a qual defi- niu e analisou as funções administrativas (planejar, organizar, comandar, coordenar e controlar) que ainda hoje são presentes nas empresas. Fayol foi considerado o fun- dador da escola clássica da gestão, pois foi o primeiro a sistematizá-la e formulou sua teoria a partir de uma perspectiva global. Abaixo tem-se os 14 princípios gerais de administração propostos por Fayol: 1. Divisão do trabalho quanto mais pessoas se especializa- rem maior será a experiência do seu trabalho; 2. Autoridade autoridade e responsabilidade devem estar intimamente ligadas; 3. Disciplina o sucesso da organização requer o esforço de todos, mas as penalidades são necessárias apesar dos incentivos. 4. Unidade de comando cada trabalhador recebe ordens de apenas uma pessoa; 5. Unidade de direção a empresa precisa de uma direção bem definida, a qual é dada por um objetivo comum; 6. Subordinação do interesse individual ao coletivo prevalece os interesses da organiza- ção como um todo sobre os interesses de uma pessoa. 10 1111 7. Remuneração a compensação pelo trabalho realiza- do deve ser justa para quem recebe e para quem paga, por isso, diversas variáveis como custo de vida, oferta de pessoal qualificado, sucesso da empresa devem ser levados em conta. 8. Centralização o grau de centralização ou descen- tralização da gestão dependerá das condições específicas da organização em causa. 9. Cadeia de Comando Em uma organização, a linha de autori- dade – freqüentemente representadapelas linhas que unem os retângulos de um organograma - vai por ordem de escalões de gestão mais altos até aos níveis mais baixos da hierarquia. 10. Ordem Os materiais, tal como as pessoas, devem estar nos lugares certos, nas horas certas. 11. Equidade Os empregados devem ser tratados numa base de justa igualdade. 12. Estabilidade no emprego Reter os empregados produtivos deve ser uma prioridade da gestão. Uma elevada taxa de rotatividade geral- mente está associada a uma queda da eficiência da empresa 13. Iniciativa Os gestores devem encorajar as inicia- tivas dos trabalhadores principalmen- te através de atividades autodirigidas. 14. Espírito de equipe O espírito de equipe contribui para a unidade da organização. 2.1 Teoria da Burocracia A teoria da Burocracia teve origem na fragilidade e parcialidade das Teorias Clás- sica e das Relações Humanas, que deti- nham uma visão extremista e incompleta sobre as organizações. Assim, a necessida- de de um modelo racional que envolvesse todas as variáveis da organização e o cres- cimento e a complexibilidade das organi- zações, passou a exigir modelos mais bem definidos (CHIAVENATO, 1983). A Teoria da Burocracia foi formulada por Max Weber, em meados do século XX, por volta de 1947. Weber tinha em mente que o traço mais relevante da sociedade ocidental naquela época era o agrupamento social em orga- nizações. Partindo dessa premissa, fez um mapeamento de como se estabelece o po- der nessas entidades e construiu um mo- delo ideal, no qual as organizações são ca- racterizadas por cargos formalmente bem definidos, ordem hierárquica com linhas de autoridade e responsabilidades bem deli- mitadas. Quando deu o nome de burocracia ao seu tipo ideal de organização pensava em uma organização eficiente por excelên- cia, a qual para conseguir essa eficiência, precisava detalhar antecipadamente e nos mínimos detalhes como as coisas deveriam ser feitas (CHIAVENATO, 2003). Segundo Weber, a burocracia tem os seguintes princípios fundamentais: Formalização: existem regras defi- nidas e protegidas da alteração arbitrária ao serem formalizadas por escrito. Divisão do trabalho: cada elemen- to do grupo tem uma função específica, de forma a evitar conflitos na atribuição de competências. 12 13 Hierarquia: o sistema está organi- zado em pirâmide, sendo as funções su- balternas controladas pelas funções de chefia, de forma a permitir a coesão do funcionamento do sistema. Impessoalidade: as pessoas, en- quanto elementos da organização limi- tam-se a cumprir as suas tarefas, poden- do sempre ser substituídas por outras - o sistema, como está formalizado, funcio- nará tanto com uma pessoa como com outra. Competência técnica e Meritocra- cia: a escolha dos funcionários e cargos depende exclusivamente do seu mérito e capacidades - havendo necessidade da existência de formas de avaliação objetivas. Separação entre propriedade e administração: os burocratas limitam-se a administrar os meios de produção - não os possuem. Profissionalização dos funcionários. Completa previsibilidade do funcio- namento: todos os funcionários deverão comportar-se de acordo com as normas e regulamentos da organização a fim de que esta atinja a máxima eficiência possível. Por outro lado, a burocracia possui muitas disfunções: Internalização das regras: às re- gras são dadas mais importância do que às metas. Excesso de Formalismo e formulá- rios: tornando os processos mais lentos. Resistências às Mudanças. Despersonalização: os funcionários se conhecem pelos cargos que ocupam. Categorização como base no pro- cesso decisorial: O que tem um cargo maior, toma decisões, independentemen- te do que conhece sobre o assunto. Superconformidade com as Roti- nas: Traz muita dificuldade de inovação e crescimento. Exibição de poderes de autoridade e pouca comunicação dentro da em- presa. Dificuldade com os clientes: o fun- cionário está voltado para o interior da or- ganização, tornando difícil realizar as ne- cessidades dos clientes tendo que seguir as normas internas. Por fim, a Burocracia não leva em conta a organização informal e nem a va- riabilidade humana (CHIAVENATO, 2003). Mas é preciso deixar claro que em am- bientes estáveis e com pouquíssimas va- riações, embora a adaptação seja difícil, essas organizações burocráticas conse- guem ser bem sucedidas. 2.2 Teoria da Decisão A teoria da decisão nasceu nas déca- das de 40 e 50, com Herbert Simon, que a utilizou como fundamento para explicar o comportamento humano nas organiza- ções. Segundo Chiavenato (1983) na Teoria Comportamental da Administração a or- ganização é considerada como um sistema de decisões em que cada pessoa participa racional e conscientemente, escolhendo e tomando decisões a respeito de alterna- tivas mais ou menos racionais de compor- tamento. A organização é um complexo sistema de decisões. 12 13 Ainda segundo Chiavenato (1983), os elementos comuns à decisão são: a) Tomador de decisão: é quem faz uma escolha ou opção entre várias alter- nativas de ação; b) Objetivos: são as pretensões que o tomador de decisão pretende alcançar com suas ações; c) Preferências: são os critérios que o to- mador de decisão usa para fazer a escolha; d) Estratégia: é o caminho que o deci- sor escolhe para melhor atingir o objetivo; e) Situação: são os aspectos ambien- tais que envolvem o decisor; f) Resultado: é a conseqüência de uma dada estratégia. Sobre a tomada de decisão pode ser estudada sob a perspectiva do processo (se concentrando nas etapas do proces- so de decisão, sendo genérica e muito criticada porque se relaciona muito com o procedimento e não com o conteúdo da decisão. As emoções e os impulsos de quem decide, influenciam muito). Sob a perspectiva do problema se orienta para a resolução dos mesmos. Na perspecti- va de problemas, o tomador de decisão pode aplicar métodos quantitativos para tornar o processo decisório mais racional possível, concentrando-se principalmen- te na determinação e equacionamento do problema a ser resolvido. A teoria das Decisões vista numa pers- pectiva humana não conseguiu resolver os problemas de insatisfação dos traba- lhadores e a sua resistência às mudan- ças, uma vez que a essência do movimen- to na perspectiva humana se encontra no pressuposto de que a chave para o alcan- ce de elevadas produtividades está no grau de satisfação do empregado no seu trabalho. Há que se lembrar aqui, as experiên- cias de Hawthorne (realizadas pela Aca- demia Nacional das Ciências dos Estados Unidos, numa fábrica da Wester Eletric Company localizada em Chicago, que co- meçaram em 1924 e se prolongaram até 1932, com a finalidade de determinar a relação entre a intensidade da iluminação e a eficiência dos operários, medida atra- vés da produção) as quais demonstraram que a produtividade dos trabalhadores aumentava ou até se mantinha quando a intensidade da luz aumentava ou era reduzida abaixo do razoável. Foi então que Elton Mayo, concluiu que o compor- tamento aparentemente contraditório dos trabalhadores tinha, sobretudo, que ver com a atenção que lhes estava sendo dispensada e os levava a produzir mais, o que ficou conhecido como o “efeito de Hawthorne”. Concluíram que os sentimentos e as atitudes dos trabalhadores podiam in- fluenciar significativamente a produti- vidade e perceberam ainda a tendência dos seus elementos (trabalhadores) para constituírem grupos informais, com as suas normas próprias e o desempenho de papéis próprios (CHIAVENATO, 1983). Essa teoria sofreu duras críticas, sen- do considerada ingênua e romântica em relação ao operário, além de apresentar uma visãoinadequada dos problemas nas relações industriais, limitação no campo experimental e parcialidade nas conclu- sões. Na evolução das teorias da adminis- tração deixamos para o passado, as te- 14 15 orias de Taylor, da organização científica do trabalho, a ciência administrativa de Fayol e as experiências nas relações hu- manas de Elton Mayo. Contemporaneamente temos as abor- dagens: sistêmica e contigencial. 2.3 Teoria dos Sistemas Na abordagem sistêmica temos as or- ganizações vistas como sistemas sociais complexos; uma grande interdependên- cia entre pessoas, tarefas e administra- ção; organizações como se fossem com- postas de partes interdependentes e um sistema aberto, ou seja, sofrendo influ- ências do ambiente. Segundo seus autores, os professores Daniel Katz e Robert Kahn, a abordagem coloca o meio ambiente como centro das discussões, não radicalizando se o pro- blema é de uma prática que busca obter a máxima produtividade através da adap- tação do home à máquina, ou por outro lado, se o problema está na adaptação da máquina ao homem. Dentre as características dos siste- mas abertos, segundo Katz & Kahn, encontramos: Importação de energia: Significa di- zer que todos os sistemas abertos importam e absorvem energia de fontes externas. Transformação: A transformação da energia absorvida propiciará o alimento para que o sistema se revigore, se renove. Saída: Todo sistema aberto exporta resultados para o meio ambiente ou para outros sistemas abertos. Sistemas são entidades cíclicas: Ao repetir as atividades de importar, ab- sorver, reciclar e exportar a energia ne- cessária à sua sobrevivência, o sistema executa um padrão cíclico para essas ati- vidades. Entropia e sintropia: Por natureza, todos os sistemas, mesmo os sistemas abertos, caminham para a desorganiza- ção e conseqüente autodestruição. A saí- da para retardar essa inexorável tendên- cia é o sistema importar mais energia do que ele consome. O oposto de entropia é sintropia, que significa que o sistema tem capacidade para importar e nutrir-se da energia oriunda de fontes externas. Entrada de informação: Os siste- mas abertos importam, além de energia, informação que vai permitir que o proces- so seja corrigido e melhorado. Observamos que a perspectiva sistê- mica mostra que a organização deve ser administrada como um todo complexo, em oposição a focar as partes em separa- do. Ao perceber a organização como um sistema aberto, a Teoria de Sistemas opõe-se às teorias de Taylor e Weber que utilizaram a abordagem racional, porém percebendo os sistemas como fechados (isolados das influências das variáveis ex- ternas) (CHIAVENATO, 2003). 2.4 Teoria da Contingência Na abordagem contingencial, temos necessidade de ponderar cada situação concreta; a percepção de que não há uma forma melhor de administrar; a recusa de princípios universais; o reforço da influ- ência do meio e igualmente o reforço das diferentes variáveis como culturais, so- ciais e tecnológicas. 14 15 Segundo Chiavenato (2003, p.161): Na teoria da contingência ocorre o deslocamento da visualização de dentro para fora da organização, e a ênfase é colocada no ambiente e nas demandas ambientais sobre a di- nâmica organizacional. [...] salienta que são as características ambien- tais que condicionam as caracterís- ticas organizacionais. É no ambiente que se pode localizar as explicações causais das características das orga- nizações. Na há uma única maneira melhor (the best way) de se organi- zar ou de se administrar uma orga- nização. Tudo depende das caracte- rísticas ambientais relevantes para a organização. Os sistemas culturais, políticos, econômicos, etc., afetam intensa e continuamente as organi- zações, ao mesmo tempo em que se encontram em dinâmica interação, influenciando-se reciprocamente. [...] A teoria contingencial é basica- mente situacional, circunstancial e condicional: nada há de absoluto nas organizações e em sua administra- ção. Tudo é relativo. A maneira de se administrar uma organização difere no tempo e no espaço (ambiente). Como se percebe pela ampla explicação de Chiavenato, não se consegue um alto nível de satisfação organizacional com a aplicação de um só modelo, ou seja, não há uma só forma de tornar uma organização eficaz. Haverá sempre diferentes alterna- tivas para o encaminhamento de estudos, problemas e carências organizacionais. Falando um pouco sobre o surgimento da Teoria da Contingência, esta foi desen- volvida na década de 50, nos Estados Uni- dos a partir de várias pesquisas realizadas nos mais diversos tipos de indústria, que tinham como objetivo analisar as estrutu- ras organizacionais. Quanto maior a diferenciação maior a necessidade de integração para promo- ver um esforço convergente e unificado a fim de atingir os objetivos da organização. Portanto, a integração é o nível de coor- denação atingido entre os diversos com- ponentes internos da organização. No quadro abaixo temos as principais pesquisas, seus autores e resultados. Autor Chandler EUA, 1962 Pesquisa e suas fases Veio a relacionar as mudanças estruturais das or- ganizações à estratégia de negócios utilizada por cada empresa. 1) Acumulação de recursos: ampliação das instala- ções de produção e preocupação com matéria prima; 2) Racionalização do uso dos recursos: contenção dos custos e ênfase no planejamento; 3) Continuação do crescimento: aumento da efi- ciência de vendas, compras, produção e distribui- ção, grande competitividade, diversificação; Resultados Chegou à conclusão de que a estrutura organi- zacional da empresa era determinada por sua es- tratégia mercadológica. 16 1716 Burns e Stalker Inglaterra, 1961 Lawrence e Lorsch EUA, 1967. 4) Racionalização do uso dos recursos de expan- são: ênfase em estratégia mercadológica, início da estrutura multidepartamentalizada, preocupação com o planejamento a longo prazo. Como resultado, se chegou que diferentes am- bientes levam as empresas a adotar novas estra- tégias que, por sua vez exigem diferentes estru- turas organizacionais. Direcionada à relação existente entre as práticas administrativas e o ambiente externo da empre- sas pesquisadas. Encontrou então dois tipos de empresas: 1) As organizações mecanísticas, que apresentava uma estrutura burocrática, especialistas com fun- ções definidas, e hierarquia rígida e sistema sim- ples de controle. Este tipo parecia ser apropriado a empresas que operam em condições ambientais relativamente estáveis. 2) As organizações orgânicas, cujas estruturas eram flexíveis, cargos redefinidos constantemen- te, maior confiança nas comunicações, ênfase nos princípios da Teoria da relações Humanas. Este tipo era exigido pelas empresas cujas condições ambientais estivessem em transformação. Sobre a confrontação: organização x ambiente mostram a preocupação com as características que devem ter as empresas para enfrentar com eficiência as diferentes condições externas e tec- nológicas. Marca o surgimento da Teoria da Contingência O ambiente estava de- terminando a estrutura e o funcionamento das organizações. O resultado final do estudo encaminhou a problemática organiza- cional para dois aspectos básicos: diferenciação e integração. 16 1717 UNIDADE 3 - Os modelos da administração pública no brasil Partindo do conceito de modelo de ges- tão como sendo um conjunto de práticas administrativas postas em execução pela direção de uma organização para atingir seus objetivos, vamos abordar neste ca- pítulo, o desenvolvimento ou a evolução histórica da administração pública no Bra- sil, a qual passou pelos modelos patrimo- nialista, burocrático e, nos dias atuais,o modelo gerencial. No caso brasileiro pode-se dizer que superou o modelo patrimonialista, atra- vessou a burocracia e está ingressando na administração gerencial. 3.1 Modelo Patrimonialista O Patrimonialismo pertence ao Esta- do Absolutista que persistiu até início do século XX. Neste modelo, o aparelho do Estado funciona como uma extensão do poder do soberano, e os seus auxiliares, servidores, possuem status de nobreza real. Não existe diferenciação entre coisa pública e particular. Thomas Hobbes citado por Tapajós (1984), ensinava que no início, ou seja, até o século XVIII quando prevaleceu o Estado Absolutista, os homens viviam em estado natural sem lei que os submetesse. O Es- tado, para ele, nada mais era que o resul- tado de um contrato pelo qual os homens cediam todos os direitos ao rei, que fosse forte o bastante para protegê-los. Segundo Bresser Pereira (1996), essa di- ficuldade em distinguir patrimônio público de privado, permite a proliferação do nepo- tismo e da corrupção, bem como não havia diferenciação entre os princípios de um ser- viço público profissional e um sistema admi- nistrativo impessoal, formal e racional. Enfim, não havia a definição clara das competências ou das funções exclusivas do Estado. Mas, a partir do momento em que o ca- pitalismo e a democracia se tornam do- minantes, o mercado e a sociedade civil passam a se distinguir do Estado e o patri- monialismo perde totalmente seu espaço. Para construirmos a evolução do Patri- monialismo no Brasil é preciso voltar um pouco no tempo e relembrar Portugal, que em sua primeira fase enquanto mo- narquia era agrícola e patriarcal. A partir do desenvolvimento das cidades e conse- qüentemente, do comércio e da economia monetária, seu quadro administrativo se definiu e se tornou elemento de domina- ção da vida pública, ou seja, estava pas- sando para a fase patrimonialista. A estrutura de poder de Portugal era baseada no poder absolutista caracte- rizado pelo sistema político europeu da época, que se mantinha através do mo- nopólio do comércio; e em um enorme aparelho estatal, ocupado por uma classe economicamente improdutiva, formada por uma antiga nobreza proveniente do término das guerras contra os mouros e da Espanha (MARTINS, 1985). Como o Brasil era considerado uma co- lônia de exploração, tendo na cultura de açúcar a principal exportação e causa de ocupação do Brasil, a estrutura de poder de Portugal foi toda transplantada aqui. Podemos constatar essa situação me- 18 19 diante os engenhos de cana e a comercia- lização de açúcar que dependiam de licen- ça do Estado, pois privilegiavam a Corte Portuguesa. Mesmo após a independência, essa herança colonial ficou arraigada no povo brasileiro, passado o período colonial ain- da fez surgir um conglomerado de estru- turas oligárquicas de poder espalhadas pelo país. Algumas delas organizaram-se como sistemas fechados, baseados nos latifúndios improdutivos, na escravidão e na regra senhorial que foi apoiada pela administração política de favores aos clientes locais. Embora sem autonomia, o município representou tanto no Império quanto durante a Primeira República um importante papel político. Assim, os coro- néis (donos dos latifúndios) dominavam os cargos públicos, usavam em proveito de seus “afilhados” e se impunham peran- te às Câmaras. O “coronelismo” caminha- va juntamente com o sistema político, os presidentes das províncias, na defesa dos interesses mútuos (TAPAJÓS, 1984). Para fazer cumprir essas regras, fazia- -se necessário uma grande burocracia e as pessoas empregadas na administração colonial eram conhecidas como “filhos da folha” que significava vivendo às custas da folha de pagamento do Estado (MAR- TINS, 1985). Segundo Vera Stork apud Cadernos MARE (1998, p.7) “a história da adminis- tração pública brasileira é a história do patrimonialismo, do rei senhor das terras, das gentes e dos cargos, dos amigos do rei, os quais modernamente se inserem no tecido da administração pública pela via do contrato sem concurso, sem aferi- ção prévia da capacitação”. Martins (1985) conclui que o patri- monialismo, o clientelismo, a burocracia extensiva e a intervenção do Estado na economia estão inscritas na tradição bra- sileira com características persistentes da herança colonial, o que se deu do período monárquico até a República Velha, favo- recendo a corrupção, o empreguismo e o favoritismo. 3.2 Administração Pública Burocrática Para Chiavenato (2006), a burocracia é uma organização na qual a escolha das pes- soas é baseada no mérito e na competência técnica e não em preferências pessoais. A burocracia surgiu da necessidade de um modelo de administração que conse- guisse distinguir o político e o adminis- trador público, e separar o que é público e privado. Dentre as características da burocracia temos a profissionalização, a idéia de car- reira, a hierarquia funcional, a impessoali- dade, o formalismo, que podemos sinteti- zar em um poder racional legal. A prioridade quando da implantação do sistema burocrático eram os controles ad- ministrativos para combater a corrupção e o nepotismo legados pelo patrimonialismo. Algumas considerações pertinen- tes e importantes ao sistema buro- crático nos são oferecidas por Max Weber que conceitua a burocracia como um modelo extremamente efi- ciente que detalha antecipadamen- te e nos mínimos detalhes como as coisas devem ser realizadas. As ca- racterísticas no entender de Weber são as seguintes: 18 19 1. Hierarquia de autoridade. 2. Divisão do trabalho. 3. Competência técnica. 4. Normas de procedimentos para atua- ção no cargo. 5. Normas que controlam o comporta- mento do empregado. 6. Autoridade limitada do cargo. 7. Gratificação diferencial por cargos. 8. Separação entre propriedade e admi- nistração. 9. Ênfase nas comunicações escritas. 10. Disciplina racional. 11. Especialização da administração que é separada da propriedade. 12. Profissionalização dos participantes. 13. Completa previsibilidade do funcio- nalismo. Já para Chiavenato (1983, p. 617) a abor- dagem de um sistema fechado é a maneira de ver tudo o que acontece dentro de uma organização como se ela existisse num vá- cuo, ou como se fossem entidades autôno- mas, absolutas e hermeticamente fecha- das a qualquer influência vinda do exterior. Na década de 30, surge a administra- ção pública burocrática com o objetivo de combater a corrupção e o nepotismo pa- trimonialista. Ela veio no quadro de ace- leração da industrialização brasileira, em que o Estado passou a assumir um papel decisivo, intervindo no setor produtivo de bens e serviços. Essa reforma foi iniciada no governo Vargas. A administração so- freu um processo de racionalização que acabou por criar as primeiras carreiras pú- blicas, tentando adotar o concurso como forma de acesso ao serviço público. O governo Vargas criou em 1936, o DASP – Departamento Administrativo do Serviço Público, para realizar a moderni- zação administrativa. A implementação da administração pública burocrática foi uma conseqüência clara da emergência do capitalismo moderno no Brasil e no começo sofreu muitas influências da te- oria de Taylor, tendendo à racionalização mediante a simplificação, padronização e aquisição racional de materiais, revisão de estruturas e aplicação de métodos na definição de procedimentos (CADERNOS MARE, 1998). O patrimonialismo (contra o qual a ad- ministração pública burocrática se insta- lara), embora em processo de transforma- ção, mantinha ainda sua própria força no quadro político brasileiro. O coronelismo dava lugar ao clientelismo e ao fisiologis- mo, persistindo no interior do país. Evidentemente que devidoao contro- le excessivo, dentre outras características marcantes da burocracia, com o passar do tempo, surgiram pontos negativos que a tornaram ineficiente. Muitos desses proble- mas foram em decorrência do aumento de serviços do Estado, uma vez que no inicio da implantação esses mesmos serviços eram em número reduzido e o Estado limitava-se a manter a ordem, administrar a justiça, ga- rantir os contratos e as propriedades. Dentre esses pontos podemos citar o grande volume de papéis, a ausência de responsabilidade por parte dos servido- res, uma vez que o modelo burocrático não visava obtenção de resultados somente o cumprimento às rotinas e aos regulamen- 20 21 tos que acabavam por impedir soluções rápidas ou eficientes. Desta época vem o clichê de “burocra- cia”, titulo que a população em geral dá ao serviço público ainda nos dias de hoje e a toda situação em que pese a demora da resolução de um problema. Como conseqüência desse excesso de controle, o Estado acabou por perder de vista os objetivos de servir à sociedade, a sua razão de ser. 3.3 Administração Pública Gerencial Segundo Brasil (1995), devido aos pro- blemas deixados pelo modelo burocrático, surge em meados do século XX, esse novo modelo de administração pública denomi- nado modelo gerencial. Segundo Abrúcio (Cadernos 10, ENAP, 1996), dentre vários, tem-se quatro fatores sócio-econômicos mais importantes que contribuíram para a crise do Estado contemporâ- neo no final dos anos 70: 1. As duas crises do petróleo, em 1973 e 1979, ocasionando uma recessão na economia mundial dos anos oitenta; 2. Problema fiscal dos Estados em fi- nanciar os seus déficits públicos e a re- cusa dos contribuintes em pagar mais im- postos; 3. A crise de governança dos Estados contemporâneo, e por fim; 4. A globalização e todas as transfor- mações tecnológicas que ocorreram no setor produtivo afetaram o Estado. Na retrospectiva feita por Abrúcio (Ca- derno 10, ENAP, 1996), Bresser Pereira (1998) e Paula (2005) a partir dos anos se- tenta surgiram principalmente nos Esta- dos Unidos e na Grã Bretanha programas governamentais voltados para o aumento da eficiência e a melhoraria da qualidade dos serviços prestados ao cidadão, cuja denominação genérica é “gerencialismo” na administração pública ou mais conhe- cido pelo termo ‘managerialism”. A administração pública gerencial evo- lui do “Modelo Gerencial Puro” para o “New Public Management e finalmente para o “Public Service Orientation”. O primeiro movimento iniciou nos anos 70 e foi denominado “gerencialismo puro” e tinha como objetivo básico a preocupa- ção com a eficiência, a economia e produ- tividade, pretendendo sensibilizar, dessa forma, os contribuintes. Em seguida, surge nos anos 80 o movi- mento do “New Public Management”, que incorpora a idéia da efetividade e da bus- ca da melhoria da qualidade dos serviços, na perspectiva dos clientes/usuários des- ses serviços. Desde a metade dos anos 80, o gover- no britânico vem incorporando os princí- pios da qualidade na administração públi- ca visando à obtenção da satisfação dos cidadãos. Assim, a busca da qualidade dos serviços públicos é outro conceito que o modelo ge- rencial vem incorporando, a partir da expe- riência do setor privado com a abordagem da Administração da Qualidade Total (Total Quality Management). A estratégia adota- da pelo governo inglês foi a descentraliza- ção administrativa e o modelo contratual de prestação de serviços públicos. 20 21 Por último, aparece nos anos 90 o “Public Service Oriented” resgatando os conceitos: transparência, dever social de prestação de contas, participação polí- tica, eqüidade e justiça. Essa nova visão introduz novas idéias ao modelo gerencial puro, que são: valorização da descentra- lização como meio de implementação de políticas públicas; mudança do conceito de cidadão passando de mero consumidor para uma conotação mais coletiva de ci- dadania que incluem direitos e deveres; e competição entre agências públicas como princípio de cooperação para obter um melhor resultado global. Este aperfeiçoa as discussões sobre: eficiência, qualidade, avaliação de desempenho, flexibilidade e planejamento estratégico (ABRÚCIO, CA- DERNO 10, ENAP, 1996). De acordo com os estudos de Bresser Pereira (1996) a proposta da administra- ção pública gerencial no Brasil foi confun- dida com as idéias NeoIiberais de reduzir o gasto público e o número de funcionários como resposta às limitações orçamentá- rias, em virtude da crise do Estado que co- meçou a se apresentar desde os anos 80, assunto que será aprofundado no último capítulo desta apostila. Tanto o modelo de administração públi- ca burocrática quanto o modelo gerencial assumem que é preciso combater o ne- potismo e a corrupção, porém esta última argumenta que não são necessários pro- cedimentos rígidos para isto, uma vez que existe uma nítida rejeição da sociedade em relação às pessoas que confundem os patrimônios públicos e privados. A admi- nistração gerencial está orientada para o cidadão e é baseada na descentralização e no rígido controle sobre o desempenho organizacional aferido por indicadores e definidos por contratos de gestão (BRES- SER PEREIRA, 1996). Podemos defini-lo, então, como uma resposta à duas necessidades básicas: 1. A expansão das funções econômicas e sociais do Estado; 2. Ao desenvolvimento tecnológico e à globalização da economia mundial. Neste novo modelo, torna-se essencial para a administração pública: ser eficien- te, reduzir custos e aumentar a qualidade dos serviços, tendo sempre em vista, be- neficiar o cidadão. Embora tenha havido um avanço sig- nificativo e uma certa ruptura com o mo- delo burocrático, devido a flexibilização do novo sistema, este manteve vários princípios como a admissão de servido- res segundo rígidos critérios de mérito, a existência de um sistema estruturado e universal de remuneração, as carreiras, a avaliação constante de desempenho, o treinamento sistemático. Uma das grandes diferenças se encon- tra na forma do controle, que deixa de ba- sear-se nos processos para concentrar-se nos resultados, e não na rigorosa profis- sionalização da administração pública. Na administração pública geren- cial a estratégia volta-se para: 1. A definição precisa dos objetivos que o administrador público deverá atingir em sua unidade; 2. A garantia de autonomia do adminis- trador na gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros que lhe forem co- 22 23 locados à disposição para que possa atin- gir os objetivos contratados; 3. O controle ou cobrança a posteriori dos resultados. Adicionalmente, pratica- -se a competição administrada no interior do próprio Estado, quando há a possibili- dade de estabelecer concorrência entre unidades internas. No plano da estrutura organizacional, a descentralização e a re- dução dos níveis hierárquicos tornam-se essenciais (BRASIL, 1995). Em suma, afirma-se que a administra- ção pública deve ser permeável à maior participação dos agentes privados e/ou das organizações da sociedade civil e des- locar a ênfase dos procedimentos (meios) para os resultados (fins) (BRASIL, 1995). Embora a administração pública geren- cial inspira-se na administração de em- presas, não pode ser confundida com esta última. Enquanto a receita das empresas depende dos pagamentos que os clientes fazem livremente na compra de seus pro- dutos e serviços, a receita do Estado deri- va de impostos, ou seja, de contribuições obrigatórias, sem contrapartida direta. Enquanto o mercado controla a adminis- tração das empresas, a sociedade - por intermédio de políticos eleitos - controla a administração pública. Enquanto a administraçãode empresas está voltada para o lucro privado, para a maximização dos interesses dos acionis- tas, esperando-se que, através do mer- cado, o interesse coletivo seja atendido, a administração pública gerencial está ex- plícita e diretamente voltada para o inte- resse público (FALLER, 2004, p.52). Neste último ponto, como em muitos outros (profissionalismo, impessoalida- de), a administração pública gerencial não se diferencia da administração pública bu- rocrática. Na burocracia pública clássica existe uma noção muito clara e forte do interes- se público. A diferença, porém, está no entendimento do significado do interes- se público, que não pode ser confundido com o interesse do próprio Estado. Para a administração pública burocrática, o in- teresse público é freqüentemente iden- tificado com a afirmação do poder do Es- tado. Ao atuarem sob esse princípio, os administradores públicos terminam por direcionar uma parte substancial das ati- vidades e dos recursos do Estado para o atendimento das necessidades da própria burocracia, identificada com o poder do Estado. O conteúdo das políticas públicas é relegado a um segundo plano. A admi- nistração pública gerencial nega essa vi- são do interesse público, relacionando-o com o interesse da coletividade e não com o do aparato do Estado (BRASIL, 1995). A administração pública gerencial vê o cidadão como contribuinte de impostos e como cliente dos seus serviços. Os resul- tados da ação do Estado são considerados bons não porque os processos adminis- trativos estão sob controle e são seguros, como quer a administração pública buro- crática, mas porque as necessidades do cidadão-cliente estão sendo atendidas (BRASIL, 1995). O modelo gerencial tornou-se realida- de no mundo desenvolvido quando, atra- vés da definição clara de objetivos para cada unidade da administração, da des- centralização, da mudança de estruturas organizacionais e da adoção de valores e de comportamentos modernos no interior 22 23 do Estado, se revelou mais capaz de pro- mover o aumento da qualidade e da efici- ência dos serviços sociais oferecidos pelo setor público. Para finalizar este capítulo, apresentamos no quadro abaixo, uma visão comparativa dos modelos de administração pública burocrática e gerencial. Paradigma Burocrático Baseia-se na noção geral do interesse público Eficiência Administração Controle Especificar funções, autoridade e estrutura Justificar custos Garantir cumprimento de responsabilidade Seguir regras e procedimentos Operar sistemas administrativos Estrutura hierárquica Definição rígida e fragmentada de cargos Alta especialização Chefias zelam pelos cumprimentos de normas e procedimentos Paradigma Gerencial ou pós-burocrático Busca obter resultados valorizados pelos cidadãos Qualidade e valor Produção Ganhar adesão a normas Identificar missão, serviços, usuários e resultados Transferir valores Criar accountability e fortalecer as relações de trabalho Compreender e aplicar normas, Identificar e resolver problemas, Melhorar continuamente os processos. Separar serviços e controles, Criar apoio para normas, Ampliar a escolha do usuário, Encorajar ação coletiva, Criar incentivos, Definir, medir e analisar resultados. Redução dos níveis hierárquicos e gestão participativa. Multifuncionalidade, Flexibilidade nas relações de trabalho. Gerentes incentivam a obtenção de resulta- dos e animam equipes. Quadro Comparativo dos modelos burocrático e gerencial. Fonte: PACHECO (2007, p.44). 24 2524 UNIDADE 4 - Os princípios constitucionais da administração pública Sabemos que determinadas áreas como a administrativa e a contabilidade são regidas por princípios, mas o que são eles? Para que servem? Antes de apresentar os princípios cons- titucionais da Administração Pública va- mos entender a que eles vieram. Os princípios exercem múltiplas funções e dentre elas temos: ser fundamentadora, interpretativa, supletiva, integrativa, dire- tiva e limitativa. Ou seja, são fonte de legi- timação de uma situação fundamentando e orientando sua interpretação. Além do exposto acima, nesse mundo globalizado, com novas tecnologias surgin- do a cada momento, a aplicação dos princí- pios é imprescindível tendo a função de dar um norte, de direcionar as novas situações que vão surgindo. Ao contrário das regras, eles são abertos, captam as mudanças da realidade e estão em sintonia com as con- cepções de verdade e justiça. De acordo com a legislação vigente, encontramos no art. 37 da Constituição Federal de 1988 que “A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Dis- trito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoali- dade, moralidade, publicidade e eficiên- cia”. Já o art. 2º da Lei 9784/99, vai além e fala de outros princípios aos quais a ad- ministração pública deverá obedecer. “A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, fina- lidade, motivação, razoabilidade, propor- cionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interes- se público e eficiência.” Existem ainda os princípios implícitos. Todos estão elenca- dos e discutidos abaixo. 4.1 Princípio da Legalidade Encontramos no Art. 5º da CF/88 que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Sendo assim, o princípio da Legalidade é um dos sustentáculos da concepção do Estado de Direito e do próprio regime jurí- dico-administrativo. No mundo privado, a máxima regente é: “o que não é proibido é permitido”. No mundo público, o administrador, em cum- primento ao princípio da legalidade, “só pode atuar nos termos estabelecidos pela lei”. Não pode este por atos administra- tivos de qualquer espécie (decreto, por- taria, resolução, instrução, circular etc.) proibir ou impor comportamento a tercei- ro, sendo a lei seu único parâmetro. Enfim, a Administração só pode fazer o que a lei autorizar antecipadamente. No entendimento de MELLO (2006): Para avaliar corretamente o prin- cípio da legalidade e captar-lhe o sentido profundo cumpre atentar para o fato de que ele é a tradução jurídica de um propósito político: o de submeter aqueles que exercem o poder em concreto – administrativo – a um quadro normativo que embar- gue favoritismos, perseguições ou desmandos. Pretende-se através da norma geral, abstrata e impessoal, a lei, editada pelo Poder Legislativo 24 2525 – que é o colégio representativo de todas as tendências (inclusive mi- noritárias) do corpo social – garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização da vontade geral.. 4.2 Princípio da Impessoalidade Disposto no art. 5º onde consta que to- dos são iguais perante a lei, sem qualquer distinção de qualquer natureza e no art. 37 da CF/88, valendo para a administração pública, o princípio da impessoalidade da Administração Pública pode ser definido como aquele que determina que os atos re- alizados pela Administração Pública, ou por ela delegados, devam ser sempre imputa- dos ao ente ou órgão em nome do qual se realiza, e ainda destinados genericamente à coletividade, sem consideração, para fins de privilegiamento ou da imposição de situ- ações restritivas, das características pesso- ais daqueles a quem porventura se dirija. Segundo Silva (1998) tal princípio asse- gura que as realizações administrativo-go- vernamentais não sejam propriamente do funcionário ou da autoridade, mas exclusi- vamente da entidade pública que a efetiva. Uma vez que a atividade da Administra- ção Pública é custeada com dinheiro públi- co, jamais poderá ser apropriada por quem a executa. Um bom exemplo da violação ao princí- pio da impessoalidadeé a publicidade ou propaganda realizada por um administra- dor com verbas públicas. O favorecimento de parentes e amigos, o chamado nepotis- mo, a tomada de decisões administrativas voltadas à satisfação de partidos políticos ou em benefício pessoal são outros exem- plos de violações desse princípio. Mello (2006) sustenta o seguinte en- tendimento em relação ao princípio da im- pessoalidade: No princípio da impessoalidade se tra- duz a idéia de que a Administração tem que tratar a todos os administra- dos sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis. Simpa- tias ou animosidades pessoais, políti- cas ou ideológicas não podem interfe- rir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários, de fac- ções ou grupos de qualquer espécie. O princípio em causa é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia. 4.3 Princípio da Moralidade A moralidade faz parte dos nossos es- tudos desde a Antiguidade, quando os filósofos de então diziam que a moral era uma condição essencial para o exercício de atividades públicas. Meirelles (2007) se manifesta dizen- do que: O agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve, necessariamente, dis- tinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que deci- dir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o in- conveniente, o oportuno e o inopor- tuno, mas também entre o honesto e o desonesto. Por considerações de direito e de moral, o ato administrati- vo não terá que obedecer somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo 26 27 que é legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos – non omne quod licet honestum est. A moral co- mum arremata Hauriou, é imposta ao homem para sua conduta externa; a moral administrativa é imposta ao agente público para a sua conduta in- terna, segundo as exigências da ins- tituição a que serve, e a finalidade de sua ação: o bem comum. A inclusão desse princípio no caput do art. 37 da CF/88, nos leva a perceber que ao administrador público brasileiro, por conseguinte, não bastará cumprir os es- tritos termos da lei, tendo seus atos que serem adequados à moralidade adminis- trativa, a padrões éticos de conduta que orientem e balizem sua realização. Outra maneira de fazer respeitar esse princípio é através do tratamento dado à probidade administrativa (art. 37, § 4º) que pune aquele que não serve com ho- nestidade, aproveitando-se dos poderes a ele outorgados ou das facilidades de- correntes em proveito pessoal ou de ou- trem. As sanções para a improbidade admi- nistrativa são: suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indis- ponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, configurando prática de crime de responsabilidade (art. 85, V). 4.4 Princípio da Publicidade O poder público deve agir com a maior transparência possível, então, para que os administrados ou a população tenham conhecimento, a todo momento, das ati- vidades realizadas pelos administradores, o princípio da publicidade é visto como um princípio administrativo. Encontramos no Art. 1º da CF/88 que “todo poder emana do povo”, então, seria incoerente que os interessados, o próprio povo, não soubesse o que acontece no governo emanado por ele, contudo, ele não é um elemento formativo do ato ad- ministrativo, é requisito da eficácia e mo- ralidade. Sobre a forma de atuação da publicida- de, ela poderá ser realizada através de pu- blicação ou simples comunicação do ato, mas não quer dizer que o interessado leia, por exemplo, uma publicação feita no Di- ário Oficial, havendo, no entanto, presun- ção de ciência do destinatário, ou seja, a obrigação de tornar o ato público foi cum- prida. E é isso que basta à consecução do princípio da publicidade. Outro ponto importante diz respeito à forma adequada de se dar publicidade aos atos da Administração Pública. Nor- malmente, esse dever é satisfeito por meio da publicação em órgão de impren- sa oficial da Administração, seja federal, estadual, municipal e quando não houver, jornais particulares contratados para de- sempenhar esta função. Existem, porém, limites constitucionais ao princípio da publicidade. Ele não pode violar a intimidade da vida pública, da hon- ra e da imagem das pessoas (art. 5.º, X, c/c. art. 37, § 3.º, II (32), da CF), do sigilo da fon- te quando necessário ao exercício profis- sional (art. 5.º, XIV, da CF), ou com violação de sigilo tido como imprescindível à segu- rança da sociedade e do Estado (art. 5.º, XXXIII, c/c. art. 37, § 3.º, II, da CF). Não se pode esquecer que uma coisa é a publicidade necessária para o conhe- cimento do público (dever constitucional) e outra é a publicidade como propaganda 26 27 dos atos de determinada gestão (leva ao estado de improbidade administrativa). 4.5 Princípio da Eficiência Em virtude de alteração introduzida pela emenda Constitucional n.19, o princípio da eficiência, que era implícito, tornou-se ex- presso no caput do art. 37 da CF/88. A eficiência é um conceito econômico e qualifica atividades. Significa fazer alguma coisa com racionalidade. Ele orienta a ati- vidade administrativa no sentido de con- seguir os melhores resultados ou o maior benefício com o menor custo possível. Fica claro que um sistema que tem os princípios da moralidade e da finalidade não poderia admitir a ineficiência adminis- trativa, daí a importância desse princípio. Para Meirelles (2007), Dever de eficiência é o que se im- põe a todo agente público de reali- zar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se con- tenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e sa- tisfatório atendimento das neces- sidades da comunidade e de seus membros. Para Cardozo (1999), Ser eficiente, portanto, exige primei- ro da Administração Pública o apro- veitamento máximo de tudo aquilo que a coletividade possui, em todos os níveis, ao longo da realização de suas atividades. Significa racionali- dade e aproveitamento máximo das potencialidades existentes. Mas não só. Em seu sentido jurídico, a expres- são, que consideramos correta, tam- bém deve abarcar a idéia de eficácia da prestação, ou de resultados da atividade realizada. Uma atuação es- tatal só será juridicamente eficiente quando seu resultado quantitativo e qualitativo for satisfatório, levando- -se em conta o universo possível de atendimento das necessidades exis- tentes e os meios disponíveis. Percebemos que a idéia de eficiên- cia não deve se limitar ao razoável, deve aproveitar da forma mais adequada o que se encontra disponível visando alcançar o melhor resultado possível em relação aos fins desejáveis. 4.6 Outros Princípios Cons- titucionais Explícitos Os princípios explícitos como visto aci- ma, são aqueles mencionados de modo formal e categórico, com clareza e deter- minação. Já os implícitos, são subentendi- dos, estão contidos numa proposição, mas sem uma hierarquia prévia. Os demais prin- cípios explícitos são: da Licitação, da Pres- critibilidade dos ilícitos administrativos, da Responsabilidade da administração, da participação e da Autonomia gerencial. Sendo a Licitação um procedimento ad- ministrativo destinado a provocar propos- tas, escolher proponentes de contratos de execução de obras, compras, serviços ou alienações do Poder Público, a administra- ção pública tem o dever de sempre buscar entre os interessados em com ela contratar, a melhor alternativa disponível no mercado parasatisfazer aos interesses públicos. Assim, agindo de forma honesta e ade- quada e com o dever de assegurar igual- 28 29 dade de oportunidades, sem privilegiar ou desfavorecer alguém, surgiu o Princípio da licitação. No art. 37, XXI, esta é sua redação: “Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegu- re igualdade de condições a todos os con- correntes, com cláusulas que estabele- çam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual permitirá as exigên- cias de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimen- to das obrigações”. Segundo Cardozo (1999), pode ser de- finido como aquele que determina como regra o dever jurídico da Administração de celebrar ajustes negociais ou certos atos unilaterais mediante prévio procedimento administrativo que, por meios de critérios preestabelecidos, públicos e isonômicos, possibilite a escolha objetiva da melhor alternativa existente entre as propostas ofertadas pelos interessados. Ressalte-se que, sendo um procedi- mento regulado em lei, cabendo à União legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para a Administração Pública, direta e in- direta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, nas diver- sas esferas de governo, e empresas sob seu controle (art. 22, XXVII). Aos Estados, Distrito Federal e Municípios, cabe legis- lar adicionalmente sobre no que tange ao seu interesse. Quanto ao Princípio da prescritibili- dade, o art. 37 § 5.º dispõe que “a lei es- tabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”. É uma forma de perda da exigibilidade de direito dado pela inércia de seu titular. No art. 37, § 6.º, temos a redação do Princípio da responsabilidade da ad- ministração: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadores de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa quali- dade, causarem a terceiros, assegura- do o direito de regresso contra o res- ponsável nos casos de dolo ou culpa. Quer dizer que a responsabilidade por qualquer dano causado por um agente pú- blico, no exercício da função pública, é do Estado, enquanto pessoa jurídica, mesmo se o agente tenha agido com culpa ou dolo. O princípio da Participação do usuário na Administração Pública foi introduzi- do pela Emenda Constitucional 19/98. O § 3.º do art. 37 disciplina as formas de partici- pação do usuário na administração pública direta e indireta, especialmente as recla- mações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, o acesso dos usuários a registro administrativos e informações sobre atos do governo, observando o res- peito à privacidade e o direito de receber dos órgãos públicos informações de seu interesse ou de coletivo em geral e a dis- ciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na administração pública. O Princípio da autonomia gerencial, também introduzido pela Emenda Consti- tucional 19/98 é regido pelo Art. 37, § 8.º. 28 29 A Autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da ad- ministração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato, a ser firma- do entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de desempenho para o órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre: I – o prazo de duração do contrato; II – os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidade dos dirigentes; III – a remuneração do pessoal. Este princípio permite algo inusitado segundo alguns juristas, entre eles, Sil- va (1998), que constata a criação de uma forma de contrato administrativo entre administradores de órgãos do poder pú- blico com o próprio poder público e infere que serão precisas definições mais claras no texto da lei. 4.7 Princípios Constitucionais Implícitos Para finalizar, temo abaixo a explana- ção dos princípios implícitos, agregados ao regramento constitucional da Adminis- tração Pública. Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado e Princípio da au- totutela, ou seja, a administração pública tem o dever de respeitar e zelar para que o interesse público seja alcançado, sendo este sobreposto aos interesses particula- res quando vierem a se chocar. Vimos no princípio da legalidade que a Administração Pública só pode agir de acordo com o que expressa a lei, então, o Princípio da finalidade imprime à autori- dade administrativa o dever de praticar o ato administrativo com vistas à realização da finalidade perseguida pela lei. Para Mello (2006): Esse princípio impõe que o administra- dor, ao manejar as competências pos- tas a seu encargo, atue com rigorosa obediência à finalidade de cada qual. Isto é, cumpre-lhe cingir-se não apenas à finalidade própria de todas as leis, que é o interesse público, mas também à finalidade específica obrigada na lei a que esteja dando execução. Por fim, temos os princípios da razoabi- lidade e da proporcionalidade que inferem o seguinte: Uma vez que o administrador público deva obediência à lei (princípio da legali- dade) e o dever de satisfazer aos interes- ses públicos (princípio da finalidade), é muito pertinente o Princípio da razoabi- lidade, vindo supor que o administrador pautará por satisfazer ao público o que for legal, mas razoável às suas necessidades e às suas competências. Igualmente, o Princípio da proporcio- nalidade vem com o objetivo de evitar que o agente público assuma uma conduta desproporcional ao que lhe é devido para o exercício regular de sua competência. Pode-se constatar que os princípios es- senciais e relevantes à administração pú- blica, ou estão explícitos ou implícitos na Constituição Federal, mas lá estão de fato e são as diretrizes norteadoras da condu- ta da administração pública. Concluímos também que para o pleno e excelente funcionamento da máquina pública, os agentes além de conhecer e saber interpretar tais princípios, devem pautar pela sua integridade e concretude. 30 3130 UNIDADE 5 - o estado de bem-estar, a nova administração, sua crise e as reformas da administração do estado brasileiro Chegamos ao século XXI com as mes- mas preocupações e desafios impostos pela crise do capitalismo, uma crise não só da economia ou das finanças, mas do Es- tado capitalista como um todo. Fazendo uma retrospectiva pela ótica de Paula (2005), temos que no período 1889- 1929 (República Velha) e (1930-45) na era Vargas, a centralização do poder na cúpula e o autoritarismo do poder público foram traços distintivos da administração públi- ca brasileira, embora com uma tentativa de profissionalizar o serviço público. Em 1936, com a criação do Departamento de Administração do Serviço Público – DASP, o Estado conseguiu se organizar quanto ao planejamento, orçamento e administra- ção de pessoal. Já entre 1945 e o golpe de 1964, com o governo populista, a reforma do Estado foi limitada pelas forças políticas que sustentavam o governo e o impeliam a acomodar o sistema de mérito e o emprego público como favor político. Contudo, durante o regime militar (1964-1985) a reforma foi mais efetiva, pois sua coligação de forças não teve que levar em conta as mesmas exigências de conciliação do período anterior. A máqui- na administrativa foi melhorada através de técnicas de racionalização do Estado e de métodos de profissionalização dos ad- ministradores. Chegamos
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