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1 ESTRATIGRAFIA AULA Nº 03-DISCORDÂNCIAS I-INTRODUÇÃO É possível reconhecer fases positivas e negativas na sedimentação. A fase positiva representa o intervalo de tempo de deposição contínua, enquanto que a fase negativa corresponde a intervalo de sedimentação interrompida, acompanhada ou não de erosão. As discordâncias propriamente ditas expressam sedimentação interrompida ou períodos não-deposicionais maiores que os relacionados à origem da estratificação, separando duas sequências distintas de camadas sedimentares. Qualquer pausa mais duradoura na sedimentação causa uma interrupção no registro geológico que, comumente, é conhecida como hiato. Outro conceito que é frequentemente considerado sinônimo de hiato é lacuna. Entretanto, vários autores consideram lacuna mais abrangente, representando o somatório de não-deposição ou hiato e erosão (ou vacuidade de erosão). Quando não ocorre erosão durante o interva lo de tempo de não-deposição, o hiato e a lacuna seriam coincidentes (Figura 1). Figura 1. Diferenças entre os casos de sedimentação contínua, descontínua sem erosão (hiato) e descontínua com erosão (lacuna). Fonte: modificado de Suguio (2003, p. 295). O reconhecimento no campo de superfícies erosivas e de não deposição é possível através de feições particulares. Superfícies erosivas são caracterizadas por estruturas de corte e preenchimento (Figura 2), com geometria côncava para o topo que recorta as estruturas da camada abaixo (sotoposta), geralmente com contraste granulométrico (grãos maiores preenchendo a concavidade). As superfícies de não-deposição podem ser caracterizadas em ambiente subaéreo por feições pedogenéticas (paleossolos) e em ambiente subaquoso marinho pela interação sedimentos superficiais-massa d’água e formação, por exemplo, de 2 glauconita (filossilicato hidratado de potássio e ferro) ou nódulos polimetálicos (Fe, Mn, Cu, Ni, Co). Em ambos os casos, a bioturbação pode ser intensa, gerando fósseis traços ou icnofósseis marcando as superfícies. Figura 2. Superfície erosiva marcada por estruturas de corte e preenchimento (setas vermelhas) e contraste litológico entre arenitos médios (abaixo) e arenitos conglomeráticos/conglomerados (acima). Formação Ipu, Parque Nacional da Serra da Capivara-PI. Fonte: W.F. da Silva Filho (2015). No decorrer do tempo, podem ocorrer breves oscilações ou flutuações passageiras nas condições deposicionais, produzindo discordâncias erosivas com extensão espacial limitada que comumente separam camadas litologicamente semelhantes, significando mudanças paleoambientais pouco importantes. Essas feições são denominadas discordâncias locais ou diastemas. Entretanto, os diastemas podem ser confundidos com discordâncias erosivas de maior porte (desconformidades - ver item III), diferenciando-se porque as últimas apresentam maior continuidade lateral, comumente com extensões de caráter regional a inter-regional e podendo representar lacunas de vários milhões de anos. II-ASPECTOS DAS DISCORDÂNCIAS As discordâncias não possuem somente expressão geométrica (ou espacial), mas também envolvem importantes conotações que podem ser apreciadas, no mínimo, sob três aspectos. Estrutural: A discordância sempre envolve um plano (regular ou irregular) que separa dois conjuntos de rochas, as mais antigas abaixo (sotopostas) e as mais recentes acima (superpostas). Este plano pode ser representado por superfícies de denudação (intemperismo e erosão) ou de não-deposição. Cronológico: O plano de discordância é uma superfície inumada (soterrada) que sempre compreende um lapso de tempo variável de interrupção no registro estratigráfico, ocasionada por erosão ou não-deposição. Geológico: A discordância comumente é utilizada na delimitação de unidades em classificações estratigráficas, como na Estratigrafia de Sequências e 3 Aloestratigrafia. Podem corresponder ao registro geológico de importantes eventos, tais como transgressões (avanço da linha de costa em direção ao continente) e regressões (recuo da linha de costa em direção ao mar) marinhas, fases de orogênese, mudanças climáticas que se materializam através de acentuadas mudanças faciológicas (características objetivas dos estratos, como composição, granulometria etc.). III-TIPOS DE DISCORDÂNCIAS Segundo o clássico livro de Dunbar e Rodgers (1957, apud Suguio, 2003), as discordâncias mais importantes para a Estratigrafia (discordâncias regionais) são de quatro tipos (Figura 3), descritos abaixo. Figura 3. Tipos de discordâncias. Fonte: modificado de Suguio (2003, p. 295). Desconformidade (disconformity) ou discordância erosiva (erosional unconformity) (Figura 3A): discordância entre camadas paralelas, com superfície mais ou menos regular, representando uma fase erosiva ou não deposicional de grande significado geológico. Paraconformidade (paraconformity) (Figura 3B): discordância em que as camadas sotopostas e sobrepostas , bem como o plano de descontinuidade, são paralelizadas, embora representem considerável hiato ocultado por falta de contraste litológico, mas revelado pela bioestratigrafia, por exemplo. Discordância angular (angular unconformity) (Figura 3C): camadas mais antigas apresentam intensidades de mergulho maiores que camadas mais recentes, com uma superfície erosiva separando-as, situação explicada pelo basculamento tectônico das camadas mais antigas antes da erosão e deposição das camadas mais recentes. Inconformidade (non conformity) ou discordância heterolítica (heterolithic unconformity) (Figura 3D): rochas estratificadas jazem mais ou menos 4 horizontalmente sobre rochas maciças não-estratificadas, em geral ígneas ou metamórficas. Cabe salientar que a mesma superfície de discordância pode variar lateralmente suas características ao longo de uma bacia, dependendo do contexto geológico (Figura 4). Figura 4. Tipos de discordâncias e sua possível variação lateral. O conjunto das descontinuidades separa duas sequências deposicionais. Fonte: modificado de Holz (2012, p. 63). Por fim, um pouco sobre o geossítio (sítio geológico de relevância científica) considerado o mais importante do mundo, Siccar Point, no sudeste da Escócia. Ali, James Hutton (1726-1797), pai da moderna estratigrafia, tomou consciência em 1788 dos enormes intervalos de tempo que envolvem os processos geológicos através de uma discordância angular e erosiva (Figura 5). Figura 5. Discordância angular e erosiva de Siccar Point, sudeste da Escócia, onde James Hutton lançou as bases da Geologia moderna. Fonte: modificado de http://edinburghgeolsoc.org/downloads/lbgcleaflet_siccarpoint.pdf. 5 Bibliografia HOLZ, Michael. Estratigrafia de Sequências. Histórico, princícpios e aplicações. Rio de Janeiro: Interciência. 2012. 272 p. POMEROL, Charles et al. Princípios de Geologia. Técnicas, modelos e teorias. 14ª ed. Porto Aleggre: Bookman. 2013. 1017 p. SUGUIO, Kenitiro. Geologia Sedimentar. São Paulo: Edgard Blucher. 2003. 400 p.
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