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OCEANOGRAFIA FÍSICA COM ÊNFASE EM AMBIENTES ESTUARINOS Maria Regina Fonseca Guimarães & Eduardo Marone agosto de 1996 PARTE I: CONTEÚDO GERAL.................................................................................................................................... 0 I.1- PROPRIEDADES FÍSICAS DA ÁGUA DO MAR ..........................................................................................................0 PROPRIEDADES PRINCIPAIS................................................................................................................................ 1 OUTRAS PROPRIEDADES....................................................................................................................................... 9 I.2 - APÊNDICE MATEMÁTICO.....................................................................................................................................15 OPERADORES MATEMÁTICOS ...........................................................................................................................15 I.3 - CONCEITOS PRELIMINARES...................................................................................................................................18 FORÇANTES QUE ATUAM NO OCEANO..........................................................................................................18 TIPOS DE CORRENTES.........................................................................................................................................19 EQUAÇÕES DE CONSERVAÇÃO PARA O OCEANO......................................................................................21 VORTICIDADE .........................................................................................................................................................22 I.4 - CIRCULAÇÃO E MASSAS DE ÁGUA OCEÂNICAS.................................................................................................23 INTRODUÇÃO ..........................................................................................................................................................23 CIRCULAÇÃO SUPERFICIAL...............................................................................................................................25 CIRCULAÇÃO DE FUNDO ....................................................................................................................................31 MASSAS D'ÁGUA.....................................................................................................................................................34 CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................................36 I.5- O BALANÇO DE ÁGUA, SAL E CALOR NOS OCEANOS ........................................................................................37 PRINCÍPIOS DE CONSERVAÇÃO .......................................................................................................................38 I.6- PRINCÍPIOS GERAIS DA GERAÇÃO E PROPAGAÇÃO DE ONDAS .......................................................................45 AS FORÇAS CAUSADORAS DE ONDAS.............................................................................................................47 PRINCIPAIS CLASSES DE ONDAS......................................................................................................................48 I.7- PRINCÍPIOS GERAIS DA TEORIA DAS MARÉS.......................................................................................................50 A FORÇA PRODUTORA DA MARÉ......................................................................................................................51 EFEITOS ROTACIONAIS........................................................................................................................................56 CORRENTES DE MARÉ.........................................................................................................................................57 PREVISÕES DE MARÉ ...........................................................................................................................................57 MARÉS EM REGIÕES OCEÂNICAS TÍPICAS....................................................................................................60 I.8- CAMADAS DE CONTORNO .......................................................................................................................................62 CAMADAS DE EKMAN..........................................................................................................................................63 CAMADAS DE FUNDO...........................................................................................................................................66 CONTORNO COSTEIRO.........................................................................................................................................67 I.9- PROCESSOS DE RESSURGÊNCIA COSTEIRA............................................................................................................67 MODELO PARA RESSURGÊNCIA DE EKMAN-SVERDRUP..........................................................................68 OBSERVAÇÕES .......................................................................................................................................................69 MODELAGEM MATEMÁTICA - MODELOS DE ESTRATIFICAÇÃO CONTÍNUA ......................................69 I.10- INTERAÇÃO MAR-AR............................................................................................................................................70 O BALANÇO RADIATIVO NA ATMOSFERA.......................................................................................................71 O SISTEMA GLOBAL DE VENTOS .......................................................................................................................72 TRANSPORTE DE CALOR EM DIREÇÃO AOS PÓLOS PELA ATMOSFERA ..............................................74 A INTERAÇÃO ATMOSFERA-OCEANO..............................................................................................................79 0 Oceanografia Física com Ênfase em Ambientes Estuarinos Parte I: Conteúdo Geral I.1- Propriedades Físicas da Água do Mar Grande parte das características únicas do oceano são consequência da própria natureza da água. A molécula da água é polar, ou seja, como é formada por dois íons negativos (hidrogênios) e um positivo (oxigênio), possui lados positivo e negativo. Esta polaridade é responsável por sua elevada constante dielétrica (abilidade de suportar um campo elétrico) e também por seu alto poder solvente. A água é capaz de dissolver mais substâncias que qualquer outro fluido. Esta propriedade explica a abundância de íons no oceano, que resulta em seu caráter salino. A natureza polar da molécula da água induz à formação de cadeias tipo polímeros de até oito moléculas. Para manter as moléculas ligadas, é necessária uma certa quantidade de energia. Isto explica a abilidade oceânica de absorver energia térmica, a qual desempenha um papel importante tanto na interação entre oceanos e atmosfera quanto na determinação do clima na Terra. A medida que a água é aquecida, a atividade molecular aumenta e ocorre uma expansão térmica. Ao mesmo tempo, a energia adicionada fica disponível para a formação das cadeias cujo alinhamento faz com que a água "encolha". A combinação desses efeitos opostos faz com que a temperatura associada à máxima densidade da áqua pura seja 4oC em vez do ponto de congelamento. Na água do mar este efeito é mascarado pela presença dos sais dissolvidos. Outra consequência da estrutura em cadeias moleculares é a elevada tensão superficialda água que tem como um dos efeitos a formação de ondas capilares, para as quais a tensão superficial é a força restauradora. Apesar de seu pequeno tamanho, tais ondas desempenham um papel importante na determinação do atrito entre vento e água, que é responsável pela geração de ondas maiores e pelos principais sistemas de circulação superficial dos oceanos. Toda característica da água do mar que pode ser representada por um número ou por um vetor é definida como uma propriedade física da água do mar e a distribuição espacial desta propriedade define o chamado campo da mesma. É possível classificar as propriedades com base em vários critérios: · Com relação ao caráter matemático, podem ser escalares ou vetoriais. · Se as mesmas existirem independentemente do movimento do fluido, como no caso da densidade, por exemplo, são denominadas hidrostáticas. · Se, por outro lado, forem propriedades associadas ao movimento do fluido, como a velocidade das correntes e a amplitude das ondas, são denominadas hidrodinâmicas. 1 · Se ainda forem propriedades relacionadas a processos de trocas de calor, como a temperatura e o calor específico, são denominadas hidrotermodinâmicas. As unidades de medida comumente utilizadas na descrição das propriedades físicas da água do mar expressam-se no Sistema Internacional de Unidades (SIU). PROPRIEDADES PRINCIPAIS Temperatura A temperatura (T) mede o grau de agitação das moléculas de um corpo e está relacionada, pelas equações termodinâmicas, à outras propriedades como: pressão, energia interna, capacidade calorífica e etc... Além disso é um parâmetro modificador de propriedades como a densidade, condutividade elétrica e velocidade de propagação do som, por exemplo. Na oceanografia, a temperatura é sempre expressa na escala Celsius (oC), no entanto ao nos referimos à variações de temperatura, podemos expressá-las em Kelvin (K), para evitar confusões com as temperaturas "in situ" (oC). - pag 36 Pickard-descriptive figura I.1 - Temperatura superficial dos oceanos em fevereiro (Pickard & Emery, 1982). A distribuição da temperatura na superfície oceânica é aproximadamente zonal (as isolinhas de temperatura são paralelas ao Equador), como pode ser observado na figura I.1. Entretanto, próximo à costa as isolinhas são desviadas pela ação das correntes e ao longo dos contornos leste dos oceanos frequentemente ocorrem 2 baixas temperaturas devido à ressurgência de águas frias de subsuperfície. As temperaturas superficiais para o oceano aberto variam de cerca de 28oC, ao norte do Equador, a cerca de -2oC, próximo às geleiras das altas latitudes. Abaixo da superfície, a água pode, em geral, ser dividida em três zonas, em termos de sua estrutura de temperatura (figura I.2). Existe uma camada superficial, cuja profundidade varia de 25 a 200m, e que devido à mistura causada pelo vento, possui basicamente a mesma temperatura da água de superfície, sendo denominada camada de mistura; uma segunda camada, de 200 a 1000m de espessura, denominada zona da termoclina principal, na qual se verifica um acentuado decréscimo de temperatura a medida que a profundidade aumenta e uma camada profunda, que se extende da base da zona da termoclina até o fundo oceânico, onde as variações de temperatura ocorrem lentamente. - pag 38 figura I.2 - Perfis médios típicos de temperatura x profundidade para o oceano aberto (Pickard & Emery, 1982). A temperatura da camada superficial apresenta variações sazonais, em particular nas médias latitudes. No inverno, a temperatura da superfície é baixa, as ondas são grandes e a camada de mistura é profunda. No verão, a temperatura da superfície aumenta, a água se torna mais estável e frequentemente se observa a formação de uma termoclina sazonal na camada superficial (figura I.2). A região da termoclina, ou termoclina principal (que existe independentemente de ser verão ou inverno) é altamente estável, pois a forte variação vertical de temperatura (estratificação) torna esta camada uma barreira térmica, tornando difícil a transferência de propriedades ao longo da coluna d'água, e fazendo desta região uma espécie de camada de separação entre águas superficiais e de fundo. Nas altas latitudes, as temperaturas superficiais são bem menores que nas baixas latitudes, enquanto que as temperaturas das águas profundas não apresentam muita variação. Como consequência, pode não existir termoclina principal em regiões de alta latitude, apenas termoclina sazonal. Variações diurnas de temperatura nas águas superficiais são pequenas no oceano aberto (dificilmente maiores que 0,3K), mas podem ser consideráveis em 3 regiões de águas rasas e abrigadas, próximo à costa (de 2 a 3K). A insignificante variação em oceano aberto se dá em parte pelo fato de geralmente haver mistura da água aquecida com a água fria de subsuperfície. Um fator mais importante é que a maior parte do calor recebido diariamente pela radiação solar é utilizado na evaporação da água, deixando apenas uma parte diponível para o aumento da temperatura da mesma. Nas águas profundas, abaixo da região da termoclina, a temperatura em geral decresce a medida que a profundidade aumenta. No entanto, em fossas profundas, de mais de 3000m, com o aumento da pressão, o volume da parcela de água diminui e a temperatura "in situ" aumenta. Assim, ao tratar de fenômenos ocânicos onde ocorrem variações consideráveis na profundidade das massas d'água, é melhor utilizar a chamada temperatura potencial (Q), que é a temperatura que uma parcela de água teria se fosse levada adiabaticamente (sem troca de calor ou mistura durante o processo) até a superfície, ou seja a temperatura que ela teria à pressão atmosférica. A temperatura potencial é um parâmetro que também serve para caracterizar tipos de água (águas de mesma origem possuem mesma Q). Salinidade Idealmente os oceanógrafos gostariam de conhecer a salinidade absoluta, ou seja, a medida da concentração total dos materiais sólidos dissolvidos num determinado volume de água do mar (massa), quantidade que depende de uma análise química detalhada e complexa, o que a torna inconveniente para os propósitos práticos da oceanografia. Em 1889, Knudsen e colaboradores desenvolveram um método de determinação da concentração de sais de uma amostra de água do mar baseado em sua evaporação; com base nesse método, publicaram em 1902 a seguinte definição de salinidade (S): quantidade total dos materiais sólidos, em gramas, contidos em um quilograma de água do mar quando todos os carbonatos são convertidos em óxido, todos os brometos e iodetos substituídos por cloretos, e toda matéria orgânica completamente oxidada . A aplicação desse método, porém, apresenta dificuldades técnicas além de ser difícil de ser realizado a bordo. Entretanto, já em 1884, Dittmar, analisando 77 amostras da expedição pioneira do Challenger, constatou que, embora a concentração de sal varie bastante (no espaço e no tempo), a proporção relativa dos constituintes maiores permanece constante, o que possibilita determinar a salinidade analizando apenas um dos constituintes maiores. O cloro, elemento mais abundante, foi o escolhido, dada a disponibilidade de uma técnica analítica simples: titulação com nitrato de prata, usando o cromato de potássio como indicador. Assim, definiu-se clorinidade como a massa em gramas (medida no vácuo) dos cloretos contidos em um quilograma de água do mar (também medido no vácuo) quando todos os brometos e iodetos são substituidos por cloretos. 4 Uma vez determinada a clorinidade, a salinidade pode ser calculada por meio da expressão:S = 1,80655 Cl, ambas as quantidades dadas em (o/oo). Para a água pura, a salinidade é zero. A padronização do reagente químico se fazia com a água normal de Copenhagem, para a qual o valor de salinidade adotado foi 35o/oo, estabelecendo um segundo ponto para a escala da salinidade. Outro método de se medir salinidade, conhecido como método indutivo, é baseado na condutividade elétrica da amostra de água, ou seja, na capacidade da água de conduzir elétrons, que é uma função direta de sua temperatura e salinidade. Os aparelhos fornecem a temperatura da medição e a chamada razão R15 (razão entre as condutividades de uma amostra de água e a da água normal de Copenhagen, estando ambas as soluções a 15 oC e a pressão atmosférica). Por este método, verificou-se que a densidade pode ser obtida com melhor precisão do que pelo método químico e como a densidade é uma das principais razões para a determinação da salinidade, este método é o mais utilizado atualmente. Em 1966 foi obtida uma equação relacionando a salinidade com a razão R15 . Considerando-se que os salinômetros indutivos devem ser padronizados, seria desejável que isso fosse feito independentemente de qualquer estoque de água normal, o que é possível ao se utilizar uma solução de KCl, denominada água padrão, para a qual a condutividade é a mesma da água normal de Copenhagem, mantendo a continuidade com a escala estabelecida por Knudsen. Assim, em 1978, foi introduzida a Escala Prática de Salinidade, definida em termos da razão K15, razão entre as condutividades de uma amostra de água e a de uma solução de cloreto de potássio (KCl), cuja concentração é igual a 32,4356 g/kg, estando ambas as soluções a 15 oC e a pressão atmosférica. O valor de salinidade 35 foi definido como sendo aquele para o qual a razão K15 é igual a 1. Desde então a Unesco recomenda que, uma vez utilizada esta nova metodologia para medição de salinidade, não há necessidade de se colocar unidades nos valores obtidos; entretanto, como toda grandeza física escalar é composta de um número e sua respectiva unidade, alguns autores tem utilizado o ‘psu’ (unidades práticas de salinidade). Em mar aberto, os valores observados de salinidade variam de 33 psu a 37 psu. Em áreas costeiras pode variar de 15 psu a 28 psu, sendo que o valor médio mundial é de 34,7 psu. O valor máximo ocorre no Mar Vermelho: 40 psu. A distribuição horizontal da salinidade nas águas de superfície é basicamente zonal sendo determinada pelos efeitos opostos de evaporação (aumentando) e precipitação (diminuindo), (figuras I.3 e I.4). O máximo de salinidade ocorre na região dos ventos alísios, onde a evaporação anual excede a precipitação. Já o máximo de temperatura ocorre próximo ao equador, pois nesta região a quantidade de radiação solar entrando no mar é máxima. Da figura I.3 , observa-se que o 5 mínimo de densidade acompanha o máximo de temperatura e a distribuição de salinidade exerce menor influência sobre a densidade. 4.1 pag. 32 figura I.3 - Variação com a latitude da temperatura, salinidade e densidade (st) superficiais - média para todos os oceanos (Pickard & Emery, 1982). fig4.9 p.44 -Pickard Descriptive figura I.4 - Salinidade da superfície oceânica em agosto (Pickard & Emery, 1982). 6 A distribuição vertical da salinidade não é tão simples de ser descrita quanto a da temperatura. Na água de superfície, para o oceano aberto (exceto a região polar), a densidade, responsável pela estabilidade de um corpo de água na vertical, é determinada principalmente pela temperatura. Portanto, água de temperatura mais alta (menor densidade) geralmente é encontrada nas camadas superficiais, enquanto que as de temperatura mais baixa (maior densidade), nas camadas profundas. As variações de salinidade que ocorrem no oceano aberto em geral não afetam a densidade a ponto de se sobrepor ao efeito da temperatura. Assim, é possível encontrar tanto salinidade baixa quanto alta nas águas superficiais. A distribuição vertical de salinidade para as regiões equatoriais, tropicais e subtropicais, apresenta um mínimo entre 600 e 1000m, com valores voltando a aumentar a partir de 2000m. No oceano Atlântico, ocorre um suave decréscimo abaixo dessa profundidade. Nos trópicos, frequentemente se observa um forte máximo entre 100 e 200m, próximo ao topo da termoclina (figura I.5), resultante do afundamento da água que flui em direção ao equador em regiões de máxima salinidade tropical. Nas altas latitudes, onde o valor na superfície é baixo, a salinidade geralmente aumenta com a profundidade até cerca de 2000m, sem que haja mínimo de subsuperfície. Em regiões costeiras, onde a descarga de rios é intensa, em geral se observa uma região de acentuado aumento de salinidade, a haloclina, entre as águas superficiais, de baixa salinidade, e as profundas, mais salinas. Nessas regiões, onde as variações de salinidade são muito maiores que as de temperatura, a densidade é determinada principalmente pela distribuição da salinidade. figs. p.46 figura I.5 - Perfis médios típicos de salinidade para o oceano aberto e perfil de temperatura para os trópicos (Pickard & Emery, 1982). Em águas profundas (4000m ou mais), a salinidade é relativamente uniforme, variando de 34,6 psu a 34,9 psu para todo o planeta. As temperaturas das águas 7 profundas também possuem um pequeno intervalo de variação (-0.9 a 2oC), o que significa que o ambiente do oceano profundo é bastante uniforme. Não se tem tantas informações a respeito de variações temporais da salinidade quanto para a temperatura, a qual é mais facilmente medida. Variações anuais de salinidade no oceano aberto são em geral menores que 0,5 psu, a não ser em regiões de acentuada variação anual na precipitação. Estes efeitos se restringem à camada superficial pois em tais regiões o efeito da redução de salinidade pode superar o efeito da temperatura, reduzindo a densidade da água, o que mantém na superfície a água de baixa salinidade. Assim como a temperatura, a salinidade é um fator determinante de outras propriedades da água do mar. · Variam diretamente com a salinidade: densidade, viscosidade molecular, índice de refração, condutividade elétrica, coeficiente de expansão térmica, velocidade do som e pressão osmótica. · Variam inversamente com a salinidade: calor específico, temperatura do ponto de congelamento, temperatura de máxima densidade e condutividade térmica. Pressão Define-se pressão (p) como a grandeza dada pela relação entre a intensidade da força que atua perpendicularmente e a área em que ela se distribui. Assim, uma mesma quantidade de força, aplicada a uma área pequena produzirá uma pressão maior do que se aplicada a uma área grande, como quando se aperta a ponta de um lápis, por exemplo. No cálculo da pressão se considera apenas a componente da força perpendicular à superfície; ao se considerar todas as componentes (tangenciais e perpendiculares), tem-se a grandeza denominada tensor de tensão (t), que contém informações tanto sobre compressão quanto sobre deformação do fluido. A unidade de pressão no SI é o newton por metro quadrado (N/m2), também denominada pascal (Pa). Eventualmente é usado o dina por centímetro quadrado (dyn/cm2) ou bária (b). A relação entre essas unidades é: 1Pa = 10 b Muitas são as forças que atuam sobre uma parcela de água no mar. Existem forças de atrito, forças que surgem pelo fato de a Terra ser um corpo em rotação e forças associadas a movimentos de outras massas d'água, entre outras. Cada uma dessas forças será abordada em detalhe na secção I.3. Os movimentosno oceano podem ser divididos em verticais e horizontais, sendo descritos por uma equação denominada equação do movimento. Muitas vezes a componente vertical da equação do movimento para um ponto em equilíbrio no interior do oceano (que possa ser considerado homogêneo e incompressível) é dada pela expressão: p = pA + r .g.h, 8 ou seja, a pressão p em um ponto situado à profundidade h no interior do oceano é o resultado da pressão atmosférica (pA) somada à pressão exercida pela coluna d'água situada acima do ponto, denominada pressão hidrostática e expressa pelo produto r .g.h . Densidade A densidade da água do mar (r) é definida como a massa de uma parcela de água dividida por seu volume. A distribuição da densidade da água do mar controla os movimentos em grande escala das massas de água, sua circulação tri-dimensional e também desempenha um papel extremamente importante na geração da circulação nos estuários, circulação esta denominada circulação gravitacional. A expressão matemática que relaciona a densidade com a temperatura, salinidade e pressão é denominada de equação de estado da água do mar. Para o caso dos estuários, que em sua maioria são corpos de água de pequena profundidade, pode-se determinar a densidade da água unicamente pela temperatura e salinidade, uma vez que o efeito da pressão pode ser desprezado, nesses casos. A densidade é expressa fisicamente em kilogramas por metro cúbico (kg/m3), sendo que em oceano aberto os valores observados variam de 1021,00 kg/m3 (na superfície) a cerca de 1070,00 kg/m3 (a 10.000m de profundidade). Por conveniência, é comum, em oceanografia, citar somente os últimos quatro dígitos, fazendo uso de uma quantidade denominada ss,t,p, definida como: ss,t,p = densidade - 1000 onde s é a salinidade, t a temperatura e p a pressão. Quando o efeito da pressão pode ser ignorado, faz-se uso da quantidade ss,t,p comumente abreviada de st e quando somente a salinidade é considerada no cálculo da densidade, utiliza-se o s 0. O volume específico (a = 1/r) é o recíproco da densidade, com unidades dadas em m3/kg. Uma de suas aplicações é no cálculo de correntes a partir distribuições de massa, através do método geostrófico , que será descrito na secção I.3. Para os propósitos práticos da oceanografia é conveniente referir a ao chamado oceano padrão, que é um oceano de temperatura e salinidade constantes (T=0oC e S=35). Daí vem as seguintes definições de anomalias em relação ao oceano padrão, cuja aplicação prática será vista adiante: anomalia termostérica: DS,T = a S,T,0 - a35,0,0 e anomalia do volume específico : d = aS,T,p - a 35,0,p . 9 A distribuição da densidade na superfície oceânica pode ser descrita grosseiramente como variando de 22, próximo ao equador, até 26 a 27, nas latitudes 50o a 60o e diminuindo suavemente em direção aos pólos (figura I.3 ). A densidade, em geral, aumenta com a profundidade, mas não uniformemente. Nas regiões equatoriais e tropicais, geralmente existe uma camada superficial rasa, de densidade aproximadamente constante seguida de uma camada denominada picnoclina, onde ocorre um acentuado aumento de densidade e abaixo desta, uma região profunda, onde o aumento com a profundidade se dá mais suavemente. Os valores de st para águas profundas estão em torno de 27,9 e apresentam pouca variação latitudinal. Como consequência, em altas latidudes, onde o st é cerca de 27 ou mais, existe uma variação menor da densidade com a profundidade, e a picnoclina é menos evidente. A taxa de variação da densidade com a profundidade determina a estabilidade estática da água, que seria a resistência da coluna d'água a movimentos verticais. Assim, onde a estabilidade é alta, existe dificuldade de movimento e mistura na vertical. Se a densidade aumenta com a profundidade, a coluna é estável; se diminui, é instável e se é constante, a estabilidade é neutra e a água pode ser misturada verticalmente sem esforço. Na camada superior (50 a 100m) ligeiras instabilidades ocorrem com frequência nas médias latitudes, provavelmente devido ao aumento de salinidade causado pela evaporação. Abaixo da camada superficial não é comum haver condições instáveis, a não ser na interface de corpos de água com diferentes distribuições de densidade, durante o processo de mistura. A água na picnoclina é bastante estável, ou seja é necessária uma grande quantia de energia para deslocar uma parcela de água para cima ou para baixo nesta camada. O resultado é que a turbulência, responsável pela maioria da mistura entre diferentes corpos de água, encontra maior dificuldade de penetrar esta camada, fazendo da picnoclina uma barreira à passagem de água e suas propriedades, tanto para cima como para baixo. OUTRAS PROPRIEDADES Estado de Movimento É possível definir o estado de movimento de uma parcela de água conhecendo sua massa, posição e velocidade. A velocidade r V informa como é seu movimento num dado instante. No SI a velocidade é medida em m/s, apesar de ser comum a utilização, em meteorologia e oceanografia, da unidade milhas/h, conhecida como nós (1 nó é aproximadamente igual a 0,5 m/s). Um fluxo de água é definido como o volume de água que passa através de uma secção transversal por unidade de tempo. Há dois tipos de fluxo num fluido: o laminar, no qual o fluido se move suavemente, em camadas paralelas, havendo somente transferência de quantidade de movimento entre as camadas e o turbulento, caracterizado pela presença de vórtices ou turbilhões, havendo transferência tanto de quantidade de movimento quanto de massa entre as 10 camadas do fluido. O estado hidrodinâmico do mar é fundamentalmente turbulento e é comum se referir ao mesmo como sendo a sobreposição de perturbações (movimentos aleatórios) ao fluxo laminar, ou seja: fluxo turbulento = fluxo laminar + pertubações É nestas pertubações que podem ser reconhecidos comportamentos ‘caóticos’ nos oceanos. Coeficientes de Difusão Difusão é o processo de homogenização de uma propriedade distribuida num fuido através de um fluxo da propriedade das regiões de alta concentração para as de baixa. Este é um processo que ocorre a nível molecular, sem a necessidade da existência de agitação externa. De acordo com a lei de Fick esse fluxo (F ) é dado por: F = - D r Ñ p , onde r Ñp é o gradiente da propriedade, um vetor que representa a variação espacial da propriedade em três dimensões, apontando da região de mínimo para a de máximo e D é o coeficiente de difusão molecular, a constante de proporcionalidade entre o fluxo e o gradiente. O sinal negativo serve para inverter o sentido do vetor gradiente, indicando que o fluxo está orientado das regiões de máximo para as de mínimo. Quando a concentração da propriedade é dada por unidade de volume, e não de massa, é utilizado o coeficiente cinemático de difusão molecular, D', definido por D/r. O fenômeno de difusão molecular gera um processo de mistura, pois a propriedade passa a ser distribuida por todo o volume. Se, por outro lado, houvesse uma agitação, haveria uma distribuição mais rápida da propriedade por todo o volume e, neste caso, estariamos na presença de um processo de difusão turbulenta, o qual gera uma mistura turbulenta. O processo de difusão turbulenta pode ser simulado através de uma lei semelhante à de Fick, substituindo o coeficiente molecular por outro coeficiente, várias ordens de grandeza maior que D, denominado coeficiente de difusão turbulenta. Os coeficientes de difusão de uma propriedade são, em geral, denominados "coeficiente de difusão da propriedade", como o coeficiente de difusão de sal, por exemplo. Quando a propriedade é a quantidade de movimento ouo calor, são denominados de coeficiente de viscosidade turbulenta e condutividade térmica turbulenta, respectivamente. Estes coeficientes são, em geral, funções do espaço e do tempo, também dependendo da escala do fenômeno estudado. Coeficientes de Viscosidade 11 Ao definir viscosidade é útil o seguinte exemplo. Considere duas placas de área S, paralelas, inseridas num fluido e separadas por uma distância H. Uma das placas está fixa, enquanto que a outra é posta em movimento com velocidade constante U. A força necessária para manter a placa se movimentando com velocidade constante será denotada F. Empiricamente sabe-se que esta força é proporcional à área das placas e à velocidade U, mas inversamente proporcional à distância H, ou seja, F a SU H Þ F = m SU H . m é a constante de proporcionalidade denominada coeficiente dinâmico de viscosidade, onde viscosidade quer dizer dissipação de energia por atrito interno ou molecular. Algumas vezes é conveniente considerar estas forças divididas pela densidade do fluido, neste caso, o coeficiente m/r é definido como coeficiente cinemático de viscosidade (n). A velocidade do fluido arrastado entre as duas placas pode variar, sendo maior próxima à placa em movimento e nula próximo à placa fixa. Assim, a força viscosa é melhor descrita ao se considerar a diferença de velocidade du para uma distância infinitesimal dh: F = mS du dh Þ F S = x = m du dh . Quando há viscosidade existe deformação do fluido e surgem os cisalhamentos que são as variações do vetor velocidade do fluido na direção perpendicular ao movimento. A grandeza x é a tensão de cisalhamento , definida como a força viscosa entre as camadas do fluido por unidade de área. Assim m pode ser definido como a constante de proporcionalidade entre a tensão x e o gradiente vertical de velocidade. Quando o fluxo é laminar, a única forma de dissipação da energia é pelo atrito molecular. Já num fluxo tubulento, as flutuações irregulares das velocidades instantâneas permitem a transferência de energia das escalas de movimento maiores para as menores, onde são, então, dissipadas pelo atrito molecular. Pode- se dizer que a turbulência se comporta como uma força viscosa, de modo que pode ser chamada de força pseudo-viscosa. Daí vem o conceito de viscosidade turbulenta, que é a dissipação de energia e momento devido à turbulência, que ocorre de maneira análoga a ação da viscosidade molecular, porém em uma escala muito maior. O coeficiente de viscosidade turbulenta é representado por A. Assim, para fluxo laminar x = m du dh e 12 para fluxo turbulento x = A du dh . O coefiiciente de viscosidade molecular pode variar com a temperatura e pressão, mas em geral é específico para cada fluido, sendo da ordem de 10- 3kg/m.s para a água do mar. O coeficiente de viscosidade turbulenta na direção horizontal (Ah) é bem maior que na vertical (Av): Ah = 3,5x109m e Av = 3,5x105m. Os altos valores de Ah em relação a Av refletem as diferentes extensões nas quais a mistura pode ocorrer na horizontal ou na vertical. A estratificação leva à estabilidade, que age no sentido de suprimir a mistura vertical; além disso, as dimensões oceânicas horizontais são bem maiores que as verticais, o que faz com que os movimentos turbulentos na horizontal sejam bem menos limitados que na vertical. Coeficiente de Difusão de Sal O fluxo de sal (F s) provocado por um gradiente de salinidade ( r ÑS ) no oceano, é representado matematicamente pela expressão: Fs = Ks r ÑS , onde Ks é o coeficiente de difusão molecular de sal. Num fluxo turbulento Ks é substituido pelos coeficientes turbulentos, na horizontal (Kh) e na vertical (Kv): Kh = 107 Ks e Kv = 1012 Ks . Coeficiente de Condutividade Térmica De maneira análoga à difusão de sal, o coeficiente molecular de condutividade térmica (Kt) é a constante de proporcionalidade entre o fluxo de calor (Fc) e o gradiente de temperatura ( r ÑT ) : Fc = Kt r ÑT , sendo as relações de Kt com os coeficientes de condutividade térmica turbulenta horizontal (Kth) e vertical (Ktv) dadas por: Kth = 1010 Kt e Ktv ³105 Kt . 13 Calor Específico O calor específico de uma substância é uma propriedade física intimamente relacionada à capacidade térmica e a entropia do sistema. Esta quantidade somente pode ser definida quando não há mudança de fase do sistema. A capacidade térmica média de uma substância (C), é definida como sendo a razão entre a quantidade de calor (DQ) fornecida ou retirada do sistema e o correspondente valor de variação de temperatura (DT), logo, C = D D Q T No SI, a capacidade térmica é expressa em J/K (Joules por Kelvin) ou J/oC. A capacidade térmica é uma propriedade do sistema. No entanto, é conveniente definir uma propriedade que seja uma característica da substância e independente de sua massa (m). Assim, define-se calor específico (c) como sendo a razão entre a capacidade térmica e a massa da substância, c = C m c Q m T Þ = D D No SI, o calor específico é expresso em J/kg.K ou J/kg.oC. Entretanto, também é comum a unidade Cal/g.oC, sendo que 1Cal/g.oC equivale a 4186,8J/kg.oC. Para os oceanos, os valores típicos de c estão entre 0,95 e 0,97 Cal/g.oC. Velocidade do Som O som é uma forma de energia que resulta do movimento oscilatório de um corpo elástico, e que provoca uma vibração, a qual se transmite ao meio, formando as ondas sonoras. A onda sonora é uma onda longitudinal também chamada de onda de pressão ou compressão, cuja direção de propagação é paralela à direção do avanço da perturbação. Quando essas ondas tem frequência apropriada, e são captadas pelo ouvido e enviadas ao cérebro, percebe-se o som. A velocidade de propagação da onda sonora (velocidade do som) é governada pela natureza do meio, dependendo, nos oceanos, da temperatura, salinidade e pressão em que se encontra. Para salinidade igual a 35psu, pressão atmosférica e temperatura 0oC, a velocidade do som no mar é de 1446m/s (cerca de quatro vezes e meia a velocidade do som no ar) e aumenta 2,5 m/s por cada oC aumentado; 1,4m/s para cada 1 de salinidade acrescentada e 1,8m/s para cada 100m a mais em profundidade. Cor 14 A cor aparente das camadas superficiais dos oceanos é causada pela reflexão de certos componentes da luz visível somada aos efeitos de matéria dissolvida, concentração de plancton, detritos e etc... Não existe uma grande quantidade de registros da cor do mar, entretanto, pode-se dizer que, em geral, o azul escuro é característico dos mares tropicais e equatoriais, particularmente onde a produção biológica é pequena. Águas costeiras são esverdeadas e nas altas latitudes a cor varia do azul esverdeado ao verde, nas regiões polares. Temporariamente, concentrações de plâncton podem causar a aparência de vermelho, branco, pardo ou outras. Transparência É a propriedade que tem a água do mar de transmitir luz de diferentes comprimentos de onda. A transparência pode ser medida em porcentagem de radiação que penetra em 1 metro de água ou em profundidade média na qual o disco de Secchi* desaparece e reaparece. As moléculas da água espalham mais luz de comprimento de onda curto (azul) que de comprimento de onda longo (vermelho), assim, quanto menor o comprimento de onda, maior a transparência. água costeira água oceânica 1m 60% 75% 10m 15% 45% 50m 0,01% 5% 100m 0% 0,5% * Disco de metal, pintado de branco, de 30cm de diâmetro, usado para se estimar a transparência da água do mar. Índicede Refração Refração é o processo pelo qual a energia radiante, ao passar do meio em que se propaga para um outro meio, sofre, na superfície de separação dos dois meios, um desvio em sua direção de propagação. O índice de refração é definido como o quociente entre a velocidade da luz no vácuo e na substância em questão. No oceano, o valor do índice varia com os valores de temperatura e salinidade, oscilando entre 1,334 e 1,341. Radiatividade Durante muitos séculos, os oceanos tem sido utilizados para o despejo de detritos. Historicamente este despejo não criou muitos problemas, mas resíduos radiativos de alta dosagem são bilogicamente perigosos e a gravidade disto se 15 deve em parte à incapacidade dos sentidos humanos de detectá-los durante a exposição. Assim, tem-se pesquisado e discutido intensamente a utilização do mar como depósito de resíduos radiativos. I.2 - Apêndice Matemático OPERADORES MATEMÁTICOS Por simplicidade as definições a seguir serão dadas em coordenadas cartesianas. O sistema de coordenadas cartesianas está ilustrado na figura I.6. figura I.6 - eixos cartesianos x, y, z e os vetores unitários v r r i j k, , . · O Gradiente de um campo escalar ( r Ñf ) Þ O gradiente de uma função escalar da posição f(x,y,z) é expresso por grad f º r r r r Ñ º + +f f x i f y j f z k ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ , onde o operador del (ou nabla) é definido por v v r r Ñ º + +i x j y k z ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ . O gradiente é a aplicação do operador nabla a um campo escalar. Este operador é um vetor. No entanto ele não pode existir sozinho; ele só possui significado quando atuando sobre uma função escalar, vetorial ou um tensor. Cada uma de suas parcelas expressa uma variação em relação a uma direção diferente. 16 Exemplo: Um exemplo de função escalar da posição é a pressão, assim r r r r Ñ º + +P P x i P y j P z k ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ , que é um vetor cuja direção é normal às superfícies de mesmo valor de pressão, apontando da superfície de menor para a de maior pressão. A magnitude deste vetor representa o quanto variou espacialmente a pressão. No caso de um tanque preenchido por um fluido homogêneo, onde a pressão só varia verticalmente, o gradiente de pressão se reduz a: r r Ñ ºP P z k ¶ ¶ . A figura I.7 é uma representação das superfícies isobáricas no tanque e do vetor gradiente de pressão resultante. figura I.7 - Vetor gradiente de pressão num tanque contendo um fluido homogêneo. · O Divergente de um campo vetorial ( r r Ñ. f ) Þ O divergente de uma função vetorial da posição é definido como o produto escalar entre o operador nabla, v Ñ, e a função r r r r f f i f j f kx y z= + + , div r r r f f f x f y f z x y zº Ñ º + +. ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ , 17 que é um escalar. Cada parcela expressa a variação de uma componente da função, segundo uma direção em relação a essa mesma direção. Exemplo: Um exemplo de função vetorial da posição é a velocidade, assim, r v Ñ º + +.V u x v y w z ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ , onde r r r r V ui vj wk= + + . O Ñ. r V pode ser maior, menor ou igual a zero. Quando é positivo é denominado de divergência da velocidade; quando é negativo, de convergência. Enquanto as divergências estão associadas a um aumento de volume do elemento de fluido, as convergências estão associadas a uma diminuição do volume do mesmo. O divergente de velocidade nulo representa que não houve alteração no volume, o que não quer dizer que a forma do elemento não varie. A figura I.8 ilustra algumas possíveis situações para um fluido movendo-se horizontalmente ( r r r V ui vj= + ) e só apresentando variações de velocidade na direção x. figura I.8 - Exemplos de divergência e convergência num elemento de volume. O primeiro caso é um exemplo de divergência: r r Ñ ×V = ¶ ¶ u x u u xi = -2 1 D > 0, e o segundo, de convergência: r r Ñ ×V = ¶ ¶ u x u u xi = -2 1 D < 0 18 · O Rotacional de uma função vetorial da posição ( r r Ñ´ f ) Þ é definido como o produto vetorial entre o operador nabla, v Ñ, e a função r r r r f f i f j f kx y z= + + , rot r r r r r r f f i j k x y z f f fx y z º Ñ ´ º ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ = ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ f y f z i f z fz x j f x f y kz y x y x- æ è ç ö ø ÷ + - æ è ç ö ø ÷ + - æ è ç ö ø ÷ r r r . Cada uma das derivadas que formam o vetor representam medidas da variação de uma componete da função segundo uma direção, em relação a uma direção perpendicular à mesma. O vetor resultante possui direção normal ao plano em que se encontram a função r f e v Ñ. Exemplo: Utilizando mais uma vez a velocidade, temos, v v r r r Ñ´ ºV i j k x y z u v w ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ = ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ w y v z i u z w x j v x u y k- æ è ç ö ø ÷ + - æ èç ö ø÷ + - æ è ç ö ø ÷ r r r . O rotacional da velocidade, também denominado de vorticidade, expressa a tendência de giro da parcela de fluido considerada e será descrito em maior detalhe adiante. · O Laplaciano de um campo escalar (Ñ2 f ) Þ É definido como o divergente do gradiente de uma função escalar f, Ñ2 f = r r Ñ Ñ. f = v r r i x j y k z ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ + + æ è ç ö ø ÷ . ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ f x i f y j f z k r r r + + æ è ç ö ø ÷ = ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ 2 2 2 2 2 2 f x f y f z + + , e é um escalar. Exemplo: tomando como a função escalar a temperatura, temos Ñ2T = r r Ñ Ñ. T = ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ 2 2 2 2 2 2 T x T y T z + + I.3 - Conceitos Preliminares FORÇANTES QUE ATUAM NO OCEANO 19 Nas seguintes definições se considera as forçantes atuando sobre um elemento de volume unitário de água do mar. · Força gravitacional Þ esta Forçante que atua sobre um elemento de volume é devida à atração gravitacional exercida por todos os corpos em especial a Terra, Lua e Sol. As forças exercidas pela Lua e pelo Sol são responsáveis pelo fenômeno das marés. A força gravitacional por unidade de massa, exercida pela Terra sobre um elemento de volume de água do mar é representada por r g . A direção é a do raio da Terra e o sentido aponta para o centro do planeta. · Efeito Centrífugo Þ esta Forçante existe quando é adotado como referencial um ponto fixo na Terra, ou seja, um referencial não inercial. A forçante centrífuga por unidade de massa é igual e oposta à aceleração centrípeta, defletindo as massas na direção perpendicular ao eixo de rotação, no sentido do eixo para a superfície do planeta. É comum somar a força gravitacional por unidade de massa à forçante centrífuga por unidade de massa, resultando na Força de gravidade por unidade de massa, representada por r g *. · Efeito de Coriolis Þ esta Forçante também ocorre pelo fato de se adotar um referencial não inercial e é expressa, por unidade de massa, como o seguinte produto vetorial: 2 r W x r V , onde r W é a velocidade de rotação da Terra e r V a velocidade da parcela de água em relação à Terra. A forçante de Coriolis só existe quando há movimento em relação à Terra, ou seja, quando r V ¹ 0 e atua nosentido de modificar os movimentos, defletindo-os para a direita no hemisfério Norte e para a esquerda no hemisfério Sul. · Força de gradiente de pressão Þ é provocada por uma variação espacial de pressão, sendo dirigida do local de maior para o de menor pressão. A Força de gradiente de pressão, por unidade de massa num volume unitário, é expressa matematicamente por: - r ÑP r , onde P é a pressão e r a densidade da água. · Força de atrito molecular Þ o atrito entre camadas do fluido depende linearmente do cisalhamento da velocidade, sendo expressa, por unidade de massa num volume unitário, como: m r Ñ2 v V , onde m é coeficiente de viscosidade molecular. TIPOS DE CORRENTES As correntes podem ser classificadas segundo diversos critérios. A seguir será apresentada uma classificação conforme os mecanismos geradores. 20 · Correntes de gravidade Þ ocorrem devido à inclinação da superfície livre da água, que gera gradiente horizontal de pressão, provocando movimento de água da região de alta para a de baixa pressão. · Correntes termohalinas Þ geradas pela alteração da densidade (por variações de temperatura ou salinidade) em alguma região do oceano. O aumento da densidade na superfície faz com que a água mergulhe (buscando uma região de mesma densidade) deslocando as águas profundas; assim, a gênesis da circulação termohalina é um fluxo vertical mergulhando a uma profundidade intermediária ou mesmo ao fundo, prosseguindo como um fluxo horizontal, com as águas recém afundadas deslocando as antigas residentes no local. · Correntes de maré Þ movimentos horizontais de água associados à propagação da onda de maré, uma onda longa cujas correntes associadas não variam ao longo da coluna d'água, exceto próximo aos contornos. Em oceano aberto, a direção da corrente gira de 360o, continuamente, diurna ou semidiurnamente. Em regiões costeiras podem atingir até 3m/s, sendo a direção determinada pela topografia local. Como invertem o sentido periodicamente, não são responsáveis por transporte de massa. · Correntes geradas pelo vento Þ ocorrem principalmente na primeira centena de metros de profundidade e é basicamente uma circulação horizontal. A força geradora é o atrito do vento, transferindo energia cinética para a superfície. A direção da corrente, entretanto, não é a do vento, mas 43o a esquerda, no hemisfério sul (devido à deflexão pelo efeito de Coriolis). · Correntes geostróficas Þ havendo um gradiente horizontal de pressão, existe movimento de água da região de pressão maior para a de menor; existindo movimento, passa a atuar a força de Coriolis. Em movimentos de grande escala a aceleração de Coriolis torna-se dominante, uma vez que as acelerações relativas passam a ser desprezíveis, podendo ocorrer, então, um balanço entre a Forçante de gradiente de pressão e a força de Coriolis. Surge, assim, a corrente geostrófica, não mais na direção do gradiente, mas perpendicular ao mesmo (ao longo das linhas de pressão constante), a direita da força de Coriolis no hemisfério Sul e a esquerda, no hemisfério Norte. · Correntes geradas por ondas de gravidade superficial Þ o movimento orbital das partículas individuais de água numa onda de gravidade superficial é aproximadamente circular, havendo, entretanto, um pequeno movimento na direção de propagação, da ordem de 20 cm/s. Além disso, o efeito da arrebentação das ondas na praia provoca o aparecimento de duas correntes: uma paralela à costa, com valores de até 50 cm/s (corrente litorânea) e outra dirigida para alto mar, com valores de até 100 cm/s (corrente de retorno). 21 · Correntes geradas por ondas de gravidade internas Þ A marcante descontinuidade na distribuição vertical da densidade origina, nas interfaces, as ondas de gravidade internas, que podem gerar correntes de até 150 cm/s. EQUAÇÕES DE CONSERVAÇÃO PARA O OCEANO Quando uma propriedade física pode ser expressa em função da posição e do tempo, sua distribuição espaço-temporal define o chamado "campo" dessa propriedade. Desta forma, temos os campos de temperatura e salinidade, que definem o campo de massa, os campos de velocidade, de calor, e assim por diante. O fluxo dessas propriedades pode, então, ser estudado através das leis de conservação das mesmas. · Equação da conservação de quantidade de movimento Esta equação é a aplicação da 2a lei de Newton ( r r F ma= ) para a Oceanografia. Esta relação nos diz que se uma força resultante r F age sobre um corpo de massa m, o corpo irá adquirir uma aceleração ou taxa de variação da velocidade, va , na direção da resultante das forças aplicadas sobre ele. É conveniente escrever v r a F m= , de forma que podemos dizer que a aceleração observada é decorrente da força resultante por unidade de massa. Assim, para um elemento do fluido de volume unitário (m=r), temos: ¶ ¶ r m r r r r r r v r rV t V V V P g V+ Ñ = - ´ - Ñ + + Ñ*( . ) 2 1 2W . Do lado esquerdo estão a aceleração num ponto fixo do espaço, também chamada de termo inercial ou variação local do vetor velocidade e um termo não linear representando a advecção de velocidade (transporte das propriedades de um fluido em razão do movimento da própria massa desse fluido). Do lado direito estão as forças de Coriolis, de gradiente de pressão, gravitacional combinada à centrífuga e Forçante de atrito molecular, por unidade de massa. · Equação da conservação de massa ou da continuidade A medida que um elemento material se move, sua massa permanece constante (não considerando os casos de velocidades próximas à da luz); entretanto, seu volume pode mudar, mas de uma maneira que seja dependente do campo de movimento. A equação que relaciona a taxa de variação da densidade ao campo de movimento é a equação de conservação de massa ou da continuidade. Esta expressão estabelece a conservação de massa num volume unitário de um fluido em movimento. Ela nos diz que, na ausência de fontes ou sorvedouros de matéria, a variação local da densidade do fluido no interior da parcela, ¶r ¶t , deve resultar de 22 variações no fluxo de massa, r rv , devendo existir, portanto, uma divergência de r rv através dos contornos do volume de fluido, ou seja, ¶r ¶ r t V= -Ñ. r Esta expressão ainda pode ser escrita de outra maneira, ¶r ¶ r r ¶r ¶ r r t V V t V V= - Ñ + Ñ Û + Ñ = - Ñ( . . ) ( . ) . v v r r , segundo a qual a taxa de variação total da densidade (¶r ¶t V+ Ñ( . ) r r) é atribuida ao divergente de velocidade. Num fluido incompressível, entretanto, não existem alterações de volume, de forma que o divergente de velocidade é nulo. Neste caso, a equação da continuidade se reduz a: Ñ = Û + + =. r V u x v y w z 0 0 ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ ¶ , a qual é uma boa aproximação para a água do mar. · Equação da conservação de sal Esta expressão estabelece que na ausência de fontes e/ou sorvedouros de sal, a variação total da salinidade no elemento de fluido considerado é devida à variações (divergência) no fluxo difusivo de sal, K SS r Ñ (proporcional ao gradiente de salinidade), ¶ ¶ r r S t V S K S K SS S+ Ñ = Ñ Ñ = Ñ( . ) .( ) r r1 2 · Equação da conservação de calor A interpretação física desta expressão é análoga à anterior, ¶ ¶ r T t V T K c TT p + Ñ = Ñ( . ) r 2 . VORTICIDADE O vetor vorticidade, como descrito na secção de operadores matemáticos, é definido como o rotacional da velocidade e expressa a tendência de giro da parcela de fluido considerada. A direção do vetor resultante, normal ao plano do23 movimento, é a direção do eixo de rotação da parcela e o sentido do vetor expressa o sentido da rotação (se positivo, anti-horária e se negativo, horária). Cada derivada de que é composto o vetor representa o cizalhamento de uma componente da velocidade. Basta haver cizalhamento em uma componente para que a parcela gire; havendo, entretanto, mais termos de cisalhamento, existe a possibilidade de haver uma composição entre eles, causando a neutralização da tendência de giro. Mesmo fluidos em repouso com relação à Terra possuem vorticidade em relação ao sistema inercial das estrelas fixas pois a Terra está em rotação em relação a este sistema. A esta vorticidade damos o nome de vorticidade planetária, que é descrita matematicamente como o rotacional da velocidade tangencial de rotação da Terra, sendo igual ao dobro de sua velocidade angular (2 r W ). Se o fluido tem uma tendência de girar além da rotação da Terra (se apresentar cizalhamento de alguma componente de seu campo de velocidade), diz-se que o fluido possui uma vorticidade relativa ( r w ). Por fim, definimos vorticidade absoluta como a soma dessas duas tendências de giro ( r r r w wa = +2W ). Vorticidade Potencial - Sendo l uma propriedade escalar e conservativa de um fluido barotrópico (para o qual as isolinhas de salinidade são paralelas às de pressão) e invíscido (no qual as forças de atrito envolvidas são desprezíveis), pode ser demonstrado que a quantidade dada pelo gradiente de l multiplicado pela vorticidade absoluta e dividido por sua densidade, não varia no decorrer do tempo, ou seja, essa quantidade é conservativa e a ela damos o nome de vorticidade potencial (P ). Assim, P= × Ñr r w l ra . Este teorema foi deduzido por Ertel em 1942. O nome vorticidade potencial advém do fato que existe um reservatório de vorticidade entre duas iso- superfícies de l . Se, por exemplo, uma parcela de fluido, entre essas superfícies, move-se para um local onde a distância entre as mesmas é maior, haverá uma diminuição do r Ñ l . Como P é constante, é necessário que haja um aumento proporcional de r w r a ; se a variação de r é pequena, rw a aumenta; ou seja, a coluna d’água passa a girar. A conservação de vorticidade potencial explica o comportamento das ondas de Rossby, que serão discutidas adiante, no capítulo de ondas. I.4 - Circulação e Massas de Água Oceânicas INTRODUÇÃO 24 Apesar de flutuações mais ou menos periódicas, as águas oceânicas encontram-se em movimento seguindo padrões consistentes que prevalecem ao longo do tempo. Estas são as chamadas correntes oceânicas. A circulação de superfície dos oceanos é relativamente simétrica, sendo a presença de grandes giros, o padrão predominante. Nas regiões tropicais e subtropicais do hemisfério Norte, os giros possuem sentido horário, enquanto que no hemisfério Sul, anti-horário. Próximo aos contornos Oeste as correntes são menos espalhadas e bem mais intensas que ao Leste, especialmente no hemisfério Norte, com as Correntes do Golfo e Kuroshio, atingindo velocidades de aproximadamente 250 cm/s. Na região equatorial, um pouco ao Norte e um pouco ao Sul, ocorrem as correntes Norte e Sul Equatorial, ambas para Oeste; estas duas correntes são separadas por uma Corrente Contra Equatorial, fluindo para Leste, bastante marcada no Pacífico (50 cm/s), já nem tanto no Atlântico (mais restrita à costa da Africa) e nem sempre presente no Índico (devido aos ventos Monsões). Nas altas latitudes os padrões de circulação são mais complexos. No hemisfério Norte a circulação é limitada principalmente pelos continentes; o oceano Ártico possui um padrão próprio de circulação, interagindo pouco com o Pacífico Norte e bastante com o Atlântico Norte. No continente antártico, as limitações impostas pelos outros continentes não existem, havendo interação com todos os oceanos; lá ocorre a corrente oceânica de maior volume de transporte (cerca de 260 x 106 m3/s ou 260 Sverdrups) e maior velocidade, a Corrente Circumpolar Antártica, formada pelos fortes ventos de oeste e pela diferença de densidade, fluindo de oeste para leste através de todos os oceanos em torno do continente. A circulação em águas profundas é fortemente influenciada pela topografia de fundo, o que implica na não existência de características globais. Para essas águas se considera, normalmente, cada região em particular, sendo necessária, as vezes, a divisão dessas águas em camadas. Como visto, as águas dos oceanos estão continuamente se movendo, seja na forma de correntes intensas, como a Corrente do Golfo seja na forma de pequenos vórtices. Pode-se perguntar: o que guia todo este movimento? a resposta é: a energia do sol e a rotação da Terra. A maneira mais óbvia pela qual o sol guia a circulação oceânica é através da circulação da atmosfera, ou seja, pelos ventos. É transferida energia dos ventos para as camadas superficiais do oceano através do acoplamento friccional entre oceano, atmosfera e superfície oceânica. O sol também guia a circulação oceânica, causando variações na temperatura e salinidade da água do mar, que controlam sua densidade. Variações na temperatura são causadas por fluxos de calor através da interface ar-mar; variações na salinidade ocorrem pela adição ou remossão de água doce, principalmente por evaporação e precipitação, mas também, em regiões polares, pelo congelamento e degelo das águas. Todos estes processos estão associados direta ou indiretamente ao efeito da radiação solar. Quando a água de superfície torna-se mais densa que a água ao redor, ocorre uma instabilidade, fazendo com que a água superficial afunde. A circulação vertical (governada pela densidade) que resulta do resfriamento e/ou aumento de salinidade é conhecida como circulação termohalina. 25 A contribuição da rotação da Terra nos padrões da circulação oceânica pode ser ilustrada com o seguinte exemplo: considere um míssil lançado para o norte de um "rocket launcher" posicionado no equador. Quando deixa o lançador, o míssil está se movendo tanto para leste, com a mesma velocidade da superfície da Terra, assim como para norte, com sua velocidade de lançamento. A medida que o míssil se move para norte, a Terra está girando para leste, abaixo dele. No princípio, por possuir componente de velocidade para leste de mesmo módulo que a da superfície da Terra, o míssil parece seguir em linha reta. Por outro lado, a velocidade tangencial na superfície de um corpo que gira é função da distância da superfície ao eixo de rotação. Como a Terra é uma esfera, a distância ao eixo de rotação varia, fazendo com que sua velocidade tangencial na superfície se altere com a latitude. Assim, a velocidade da Terra para leste na superfície é maior no equador, diminuindo em direção aos pólos, de forma que a medida que o míssil se move para norte, a Terra move-se para leste mais lentamente abaixo dele. Como resultado, em relação à Terra, o míssil está se movendo não só para norte como também para leste, numa taxa progressivamente maior. Esta aparente deflexão de objetos que estão se movendo sobre a superfície da Terra, não sujeitos ao atrito, sejam eles mísseis, parcelas de água ou de ar, é levada em conta através do efeito de Coriolis. CIRCULAÇÃO SUPERFICIAL Correntes induzidas pelo vento, a espiral de Ekman e as ondas de tempestade O vento soprando sobre a superfície da água exerce uma tensão friccional na direção em que o mesmo está soprando e gerando ondas. Existe algum movimento de partículas de água para a frente no movimento das ondas e a magnitude da tensão que o vento exerce depende da rugosidade da superfície da água, de forma que os dois processos estão intimamente correlacionados. fig.14.1 do livro citado acima 26 figura I.9 - O balanço de forças na camada de Ekman conduz a uma corrente média 90o à direita da direção da tensão do vento, no H.N. (Harvey, 1975). A situação mais simples para se considerar a natureza das correntes geradas pela tensão do vento é aquela na qual se tem um vento soprando com velocidade constante sobre um oceano homogêneo, infinito e profundo. Neste caso o movimento das águas não é impedido por nenhuma barreira continental e o coeficiente de viscosidade (turbulenta) permanece constante com a profundidade. É razoável assumir que em tal situação a velocidade da corrente resultante é máxima na superfície e decresce a medida que a profundidade aumenta, sendo que abaixo de certa profundidade, na qual a corrente seja desprezivelmente pequena, podemos ignorar o atrito. Considerando a camada acima desta profundidade como uma coisa só, e assumindo que o vento permanece estacionário por um período longo o suficiente para permitir que se estabeleça uma corrente estacionária com aceleração nula, temos que a magnitude da tensão do vento (t ) se iguala ao efeito de Coriolis, de forma que a velocidade média da corrente (u ), e o consequente transporte de água nesta camada, é a 90o da direção do vento anticiclonicamente (sentido horário para o Hemisfério Norte e anti-horário para o Hemisfério Sul) (figura I.9). fig. 14.2 figura I.10 - Espiral de Ekman, mostrando a variação da velocidade da corrente com a profundidade na camada de Ekman (Harvey, 1975). Em qualquer profundidade, portanto, a água está sujeita a 3 forçantes - a tensão da camada superior (no caso de ser a superfície, o vento), a tensão na camada inferior e ao efeito de Coriolis. A consequência disto é a corrente se desviar cada vez mais anticiclonicamente a medida que a profundiadde aumenta. Ekman, que explicou este ponto teoricamente, mostrou que a corrente superficial se desvia 45o 27 da direção do vento em sentido anticiclônico e que a velocidade da corrente decresce exponencialmente com a profundidade, a medida que gira mais anticiclonicamente até que, numa profundidade D, possui cerca de 4% da intensidade superficial com direção exatamente oposta à corrente superficial. Esta estrutura de correntes é conhecida como Espiral de Ekman (figura I.10), e a profundidade D, que varia com a viscosidade turbulenta e com a latitude, é chamada de profundidade de influência friccional, estando tipicamante entre 100 e 200m. A velocidade da corrente superficial depende dos mesmos fatores que D, e da tensão do vento, sendo geralmente de 1% a 3% da velocidade do vento. A estrutura completa da espiral de Ekman nunca foi observada nos oceanos, em parte devido às suposições em que se baseia (vento estacionário, oceano infinito e homogêneo e mais nenhuma força agindo) serem um tanto irreais. Observações da corrente superficial bem distante da costa, entretanto, tem mostrado velocidades semelhantes àquelas previstas por Ekman e desvios anticiclônicos em relação a direção do vento, apesar de serem menores que 45o. Um exemplo clássico é a deriva do navio Fram no Ártico, o qual foi 20 o a 40 o à direita do vento; esta informação foi dada a Ekman quando ele estudava este problema, de forma que sua teoria foi desenvolvida na tentativa de fornecer uma explicação para o mesmo. Outros parâmetros atmosféricos podem afetar os movimentos da água assim como o vento. A superfície do mar reage como um barômetro invertido às variações de pressão atmosférica. Uma baixa atmosférica, é então acompanhada de nível do mar alto, e se os ventos associados a essa baixa fazem com que a água se mova em direção a costa contra a qual ela se empilha, níveis de água particularmente altos podem ser experimentados. Tanto depressões de média latitude quanto ciclones são sistemas em movimento; se a velocidade deles é apropriada, tais altos níveis de água, denominados ondas de tempestade ou ressacas podem viajar com estes sistemas na forma de ondas longas. Desta forma, fenômenos meteorológicos podem ser responsáveis pelo aumento ou diminuição do nível do mar em um dado local. Este fenômeno é particularmente importante quando os registros são maiores do que aqueles previstos astronomicamente, o que implica em intrusão de água do mar em locais onde isso normalmente não acontece, podendo causar grandes inundações. Matinhos, no Estado do Paraná, é um exemplo de local que frequentemente é vítima de ressacas. Marone & Camargo (1995) analisaram um evento de alteração do nível do mar devido a fatores meteorológicos, ocorrido em agosto de 1993, que causou muitos estragos em Matinhos. A principal causa deste evento foi o vento associado à combinação da passagem de uma frente fria pelo oceano e de um centro de alta pressão pelo continente, aumentando a área oceânica sob a ação de ventos do quadrante sul. No sudeste do Brasil estes ventos acumulam água na costa devido ao transporte de Ekman. Além disso, a transferência de momento da atmosfera para o oceano em locais de grande profundidade gerou grandes ondas que tiveram fortes efeitos destrutivos na zona costeira. Apesar do número de frentes frias ser maior durante o inverno, não se pode afirmar que ressacas não ocorram em outras épocas do ano. Os fatores que propiciam este fenômeno não estão diretamente relacionados com as estações do ano. 28 Isto ocorre frequentemente no Mar do Norte, onde uma onda de tempestade, acompanhando uma depressão movendo-se rapidamente para leste, com seu centro passando bem ao norte da Inglaterra, viaja em torno da costa da Escócia e segue, num caminho anti-horário em torno da margem do mar do Norte. Descrição Os oceanos Atlântico e Pacífico, representados esquematicamente na figura I.11, são essencialmente similares na forma, extendendo-se para o norte, e estreitando-se em suas extremidades. Os ventos entre as latitudes 10o e 50 o são essencialmente anticiclônicos em torno das altas subtropicais. Isso faz com que as águas na camada de Ekman, acima da profundidade de influência friccional sejam transportadas para o centro do oceano. Esta convergência causa uma deformação na termoclina, alem de fazer com que o nível do mar se incline para baixo a partir do centro para as extremidades, causando uma corrente de gradiente anticiclônica, ou seja, no mesmo sentido do vento (figura I.12). Este giro subtropical é bastante assimétrico, em particular nos oceanos do norte, com seu centro deslocado para oeste, de forma que a Corrente do Golfo no Oceano Atlântico Norte e a de Kuroshio no Pacífico Norte, são bem mais intensas que quaisquer outras da porção leste desses oceanos. figura 14.3 figura I.11 - Representação esquemática das distribuições de pressão e vento num oceano idealizado (Harvey, 1975). 29 fig. 14.4 figura I.12 - Movimentos de água associados a ventos anticiclônicos no H.N. (a) pressão atmosférica, ventos e os correspondentes transportes de Ekman para a direita. (b) topografia resultante da superfície do mar e as correspondentes correntes de gradiente, abaixo da profundidade de influência friccional. (Harvey, 1975). De acordo com a equação de conservação da vorticidade, a quantidade de gradiente de vorticidade planetária advectada pelo campo de massa é igual à vorticidade transmitida à água pela rotação da tensão do vento (circulação das massas de ar), adicionada à vorticidade perdida pelo atrito com o fundo, adicionada à vorticidade retirada (ou adicionada) à coluna d’água quando o gradiente de velocidade é grande (próximo a contornos). A intensificação das correntes no contorno oestedos oceanos é causada pelo fato de o 1parâmetro de Coriolis, f, variar com a latitude. Se simplificarmos bastante a situação, ignorando movimentos verticais, podemos considerar os fatores que causam variações na vorticidade, a medida que a água se move em torno do giro subtropical. No hemisfério Norte, por todo o giro, a água vai adquirindo vorticidade relativa negativa devido à tensão anticiclônica que o vento imprime à superfície. A água da porção leste do oceano se move em direção ao equador e sua vorticidade negativa induzida pelo vento pode ser apenas suficiente para se ajustar à componente vertical da vorticidade planetária positiva reduzida das latitudes mais baixas, de forma que sua vorticidade absoluta é conservada. No lado Oeste, a água se move em direção ao pólo, ganhando vorticidade planetária negativa de forma a sua vorticidade absoluta tornar-se cada vez mais negativa. Assim, existe uma ação reguladora, para impedir que a vorticidade aumente indefinidamente, realizada pelo atrito, tanto nos contornos laterais quanto no fundo do mar, ou ainda, por viscosidade dentro da água. Isto requer velocidades bem maiores do lado oeste, uma vez que o atrito é algo como proporcional ao quadrado da velocidade da água. O resultado é que as velocidades são tipicamente da ordem de dez vezes maiores 1Componente vertical da vorticidade planetária, num dado ponto sobre a superfície terrestre, ou seja, a vorticidade planetária multiplicada pelo seno da latitude local. 30 nas correntes quentes dos contornos oeste, que nas correntes frias do lado leste, além das correntes nos contornos oeste se extenderem a profundidades maiores. A assimetria dos giros subtropicais ao sul do equador não é tão marcante, e no Pacífico Sul a fria corrente do Peru no lado leste é talvez a característica dominante. O diferente padrão de distribuição de terra e mar no hemisfério Sul parece ser o responsável por este contraste. A figura I.13 mostra as correntes de superfície dos oceanos, características para o inverno do hemisfério Norte. Na região dos ventos Alíseos, a água é transportada através dos oceanos para o lado oeste, de forma que existe uma inclinação da superfície do mar de oeste para leste. Ao longo da zona de convergência inter- tropical, onde os ventos são leves, a água é capaz de fluir de volta para leste e próximo ao Equador a força de Coriolis tem pouco efeito sobre a mesma; assim, tem-se a Contra Corrente Equatorial . Exatamente sobre o Equador, onde a força de Coriolis muda de direção, existe divergência de água superficial. Este fenômeno 'puxa' a termoclina para mais próximo da superfície, também promovendo mistura vertical na mesma, o que faz com que a água acima da termoclina no equador seja mais densa que em qualquer outro lado, e abaixo dela menos densa que em qualquer outro lado. Como consequência, os gradientes de pressão na profundidade da termoclina (cerca de 100m) se inclinam do Equador para os outros lados, dando origem a correntes geostróficas para leste, tanto imediatamente ao norte quanto ao sul do Equador. Alem disso, do outro lado do Equador, a direção das correntes induzidas pelo vento a 100 m de profundidade é aproximadamente oposta àquela das correntes superficiais (efeito da espiral de Ekman); estas correntes, apesar de muito fracas causam convergência no Equador, contribuindo ao fluxo ali com uma componente para leste. Há também o gradiente de pressão direcionado para leste, resultante da inclinação da superfície da água, e todos esses fatores, juntamente com a ausência da força de Coriolis no Equador, parecem ser os responsáveis pela existência da Contra-corrente Equatorial que tem sido observada em cada um dos oceanos. Estas correntes são comparáveis à Corrente do Golfo em termos de velocidades e volume de água que as mesmas transportam. figura 14.5 31 figura I.13 - Correntes de superfície globais durante o inverno do H.N. (Harvey, 1975). Em latitudes maiores que 50 o existe um marcante contraste entre os hemisférios Norte e Sul. No Atlântico e Pacífico Norte, o movimento da água é obstruido pelas barreiras continentais, já no hemisfério Sul é possível viajar ao redor do globo com a Corrente Circumpolar Antártica. Acima dos oceanos do Sul, os ventos são essencialmente de Oeste, causando um um transporte líquido de água para fora do continente Antártico. Isso faz com que a superfície do mar se incline para cima na direção do Equador e as correntes de gradiente associadas vão para leste, mais uma vez, na mesma direção em que o vento está soprando. Existe, entretanto, uma zona de convergência muito importante em torno da Antártica, entre cerca de 50 o e 60o , conhecida como Convergência Antártica. Existe um marcado aumento de temperatura no mar, a medida que prosseguimos para Norte através desta Convergência, e é aí que a água submerge para formar a Água Intermediária Antártica. Sua localização tem sido relacionada à zona dos ventos mais fortes do Oceano Sul, mas a sua posição é constante demais para que ela seja atribuida inteiramente ao campo de ventos, e existem várias teorias relacionando a mesma à circulação da água de sub-superfície. CIRCULAÇÃO DE FUNDO São conhecidas algumas zonas de convergência e divergência no fluxo das camadas superiores do oceano. A divergência ocorre particularmente onde o transporte induzido pelo vento é para fora da costa, requerendo ressurgência. Essa ressurgência traz água rica em nutrientes para a zona eufótica, e assim estas áreas são caracterizadas por uma produtividade biológica considerável. As principais regiões onde isso ocorre são as correntes de contorno leste frias dos giros subtropicais (figura I.14). As baixas temperaturas dessas correntes são ainda diminuidas pela ressurgência de água fria, de forma que nevoeiros de advecção ('advection fogs') são frequentemente observados nessas regiões. Os movimentos verticais de água associados a essas convergências e divergências são limitados principalmente pela água acima e no interior da termoclina principal. 32 fig. 14.6 figura I.14 - Ressurgência nas correntes de contorno leste, no H.N. (a) Plano horizontal, mostrando os transportes de Ekman resultantes da tensão do vento. (b) Perfil mostrando os movimentos verticais associados e a inclinação da superfície do mar. (c) Possível balanço de forças e corrente resultante. (Harvey, 1975). Considerações teóricas mostram que em toda a parte dos oceanos deve haver uma lenta ressurgência de água através da termoclina principal (esta conclusão é obtida tanto ao se considerar a divergência no fluxo acima da termoclina principal, quanto ao se considerar os processos necessários à manutenção da termoclina, apesar da ocorrência de transporte de calor para baixo por difusão). Para compensar esta ressurgência, a água afunda, mas apenas em alguns poucos locais dos oceanos, determinados por fatores climatológicos. Estas áreas podem ser localizadas através de análise de massas d'água, em particular pelo estudo da concentração de oxigênio dissolvido nas massas de água profundas. 33 figura 14.7 figura I.15 - Representação esquemática tri-dimensional das correntes de superfície e subsuperfície no Oceano Atlântico (Harvey, 1975). Massas d'água intermediárias que nunca afundam para profundidades maiores que 2000m no oceano, se originam, por exemplo, na Zona de Convergência Antártica, e nos mares Mediterrâneo e Vermelho. As únicas regiões de origem de massas de água de fundo são: em torno do continente Antártico
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