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DEMONSTRAÇÃO X ARGUMENTAÇÃO

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DEMONSTRAÇÃO X ARGUMENTAÇÃO
	Para que se possa compreender melhor a Teoria da Argumentação de Chaϊm Perelman é fundamental que se conheça bem a distinção entre argumentação e demonstração, que representa um de seus pilares. 
	A demonstração é típica de uma lógica formal, que adquiriu grande projeção no século XIX, com a ascensão do paradigma positivista, que defendia a adoção, no estudo das ciências sociais e humanas, do mesmo método utilizado nas ciências naturais e exatas. Segundo essa visão, os fenômenos sociais poderiam ser analisados sob os mesmos parâmetros metodológicos da física ou da química, por exemplo. 
	Quando se trata de demonstração, as conclusões resultam de um cruzamento de juízos hipotéticos e mecanismos de comprovação prática. Tais mecanismos seguem uma receita predeterminada de operações lógicas, que independem do campo de estudo (matemática, física, antropologia, direito ou biologia, por exemplo). O importante é exatamente a comprovação de que, com a repetição de certos procedimentos, previamente determinados, serão observadas certas consequências necessárias, a partir das quais se formarão regras. Segundo Perelman, demonstração é "um cálculo feito de acordo com normas previamente estabelecidas". 
	A chamada prova demonstrativa normalmente é imutável, desde que mantidas as mesmas condições ambientais e adotados os procedimentos previamente estabelecidos. Em função disso, essa prova independe de qualquer tipo de adesão daqueles perante os quais ela se realiza, sendo válida por si só. Em um processo de demonstração, basta indicar os pressupostos metodológicos que levaram a uma determinada conclusão, sem uma preocupação maior com os conteúdos axiológicos e de experiência que possam porventura tê-la influenciado. 
	Este é um princípio perfeitamente aplicável às ciências naturais e exatas, pois tanto a demonstração de uma fórmula matemática, quanto a realização de uma reação química independem dos conteúdos valorativos ou padrões culturais daqueles que as observam. O sistema resultante de tais processos apresenta uma absoluta coerência entre suas premissas e conclusões, sendo, portanto, concebido como um sistema formal. 
	Todavia, quando se trata das chamadas ciências humanas e sociais, os resultados obtidos são profundamente influenciados pelo meio em que a pesquisa é realizada. Justamente neste ponto, se observa a grande limitação do uso da demonstração, como método de abordagem das ciências sociais. 
	O processo argumentativo apresenta natureza bastante diversa do processo demonstrativo, a começar pelo fato de que a demonstração prescinde de um interlocutor para que suas premissas sejam tidas como válidas. Seguidas as regras fixadas, a demonstração é tida como eficaz, desde que os resultados atendam à hipótese previamente estabelecida. Daí dizer-se que o processo pertinente à demonstração pode ser realizado até por uma máquina. 
	Por outro lado, a argumentação pressupõe um "encontro de mentes", no dizer de Perelman, isto é, uma relação entre atores diferentes, para que se torne efetiva. Daí surgem as figuras do orador e do auditório. O orador é aquele que se dirige, oralmente ou mesmo por escrito, a um interlocutor determinado, o chamado auditório ou audiência, que pode ser formado por uma ou mais pessoas, das quais se busca a adesão a uma ideia proposta. Essa adesão é a finalidade maior do processo argumentativo, estando a eficácia do mesmo ligada diretamente a ela. Só há que se falar em argumentação quando há uma inequívoca identidade entre a tese proposta e o auditório, de modo a criar um vínculo entre o orador e seus interlocutores. 
	A argumentação se mostra bem mais adequada ao estudo das ciências humanas e sociais, por não trabalhar com uma lógica puramente formal, adotando procedimentos flexíveis, fundados em uma necessária interação entre o orador e o auditório. Diferentemente da demonstração, o discurso argumentativo destina-se a um auditório específico, cuja adesão é de vital importância. Em consequência disso, a argumentação tende a variar, conforme a composição do auditório e a natureza dos valores nele dominantes. 
MENDONÇA. Paulo Roberto Soares. A Argumentação nas decisões judiciais. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, pp 58-61.

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