Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE ECONOMIA DE SÃO PAULO (FGV/EESP) DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: UM ESTUDO SOBRE A EVOLUÇÃO DO PIB PER CAPITA DE BRASIL E COREIA DO SUL GERVÁZIO AZEVEDO NETO São Paulo 2015 CURSO MASTER CEAFE – FGV/EESP TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO - TCC GERVÁZIO ASSIS DE AZEVEDO NETO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: UM ESTUDO SOBRE A EVOLUÇÃO DO PIB PER CAPITA DE BRASIL E COREIA DO SUL ROGÉRIO MORI Coordenador Acadêmico PAULO SÉRGIO TENANI Professor orientador (Projeto de Monografia elaborado para a disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso ao MASTER IN FINANCIAL ECONOMICS - CEAFE de Pós-Graduação lato sensu, Nível de Especialização da Escola de Economia de São Paulo/FGV/EESP) São Paulo 2015 Azevedo Neto, Gervázio. Desenvolvimento Econômico: Um Estudo Sobre A Evolução Do PIB Per Capita De Brasil E Coreia do Sul. 55 ff. Trabalho de Conclusão de Curso (CEAFE) – Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV/EESP). São Paulo, 2015. Resumo: O trabalho apresenta quais foram as medidas e escolhas que explicam a evolução da renda per capita no Brasil e na Coreia do Sul. Palavras-chave: Desenvolvimento Econômico; Crescimento Econômico; Brasil; Coreia do Sul; Renda Per Capita. DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: Um Estudo Sobre A Evolução Do PIB Per Capita De Brasil E Coreia do Sul. Elaborado por: Gervázio Azevedo Neto e aprovado pela Coordenação Acadêmica foi aceito como pré-requisito para a obtenção do Nível de Especialização do Curso de Pós-Graduação, lato-sensu, Nível de Especialização, da Escola de Economia de São Paulo/FGV/EESP. Data da aprovação: 23 de Abril de 2015. _______________________________ Rogério Mori _______________________________ Paulo Sérgio Tenani TERMO DE COMPROMISSO O aluno Gervázio Azevedo Neto, abaixo-assinado, do Curso MASTER CEAFE, da Escola de Economia de São Paulo – FGV/EESP, realizado nas dependências desta instituição, localizada em São Paulo, no período de Julho de 2013 a Abril de 2015, declara que o conteúdo do TCC – TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO intitulado Desenvolvimento Econômico: Um Estudo Sobre A Evolução do PIB Per Capita de Brasil e Coreia do Sul, é autêntico, original, e de sua autoria exclusiva. São Paulo, 23 de Abril de 2015. _____________________ Gervázio Azevedo Neto RESUMO O trabalho consiste em um estudo para identificar quais foram as principais ações adotadas por Brasil e Coreia do Sul para que os dois países apresentassem evolução tão diferente no nível de produto per capita. A estrutura do texto apresenta a evolução do estudo da matéria de desenvolvimento econômico e posteriormente a experiência de cada país. A evolução abrange o início do estudo nos anos 1930 até os dias atuais, utilizando o trabalho dos principais autores do assunto. A experiência de cada país é contada levando em conta as características únicas de cada nação e apresentando os pontos relevantes de cada caso. A narrativa das experiências começa com o caso brasileiro e é finalizada com o caso sul coreano. A conclusão apresenta uma comparação entre os países. Tal estrutura tem como intenção fechar o texto com suporte numérico para os capítulos apresentados incialmente. LISTA DE TABELAS, GRÁFICOS E FIGURAS Quadro 1 – Desempenho Econômico – Brasil e Coreia do Sul – Retrospectiva Histórica Tabela 1 – Decomposição Alternativa do Crescimento do Produto por Trabalhador Tabela 2 – Índice Global de Competitividade - 2011 Gráfico 1 – PIB Per Capita – Brasil x Coreia - 1960-2013 Gráfico 2 – Investimento Público – 1953-2010 Gráfico 3 – Artigos Técnicos e Científicos – 1985-2011 Gráfico 4 – Registro de Patentes por Residentes – 1979-2012 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 9 2. REVISÃO DE LITERATURA ............................................................................ 10 2.1 CRESCIMENTO ECONÔMICO – EVOLUÇÃO DO ESTUDO ........................ 10 2.2 BRASIL ..................................................................................................................... 24 2.3 COREIA DO SUL .................................................................................................... 37 3. CONCLUSÃO ...................................................................................................... 47 4. BIBLIOGRAFIA ................................................................................................... 53 9 1. INTRODUÇÃO Entender quais ações devem ser implantadas por uma nação é algo fundamental na busca de uma agenda de governo focada no desenvolvimento, bem- estar e diminuição da desigualdade social. A história proporciona diversas experiências com resultados diversos. Observar e copiar exemplos que apresentaram resultado positivo pode ser o caminho para se obter condições melhores na vida da população em geral. Desta forma a experiência sul coreana fornece grande inspiração na busca de melhores indicadores de desenvolvimento econômico. Para iniciar o trabalho será apresentada a evolução do estudo do desenvolvimento econômico e posteriormente o histórico de decisões e acontecimentos que guiaram a experiência brasileira e sul coreana. 10 2. REVISÃO DE LITERATURA 2.1 CRESCIMENTO ECONÔMICO – EVOLUÇÃO DO ESTUDO Ao observar o padrão de vida em diferentes pontos do mundo nos deparamos com enorme diferença de riqueza entre as nações. A pergunta que nos vem à cabeça é: Qual o motivo para que alguns países prosperem muito mais que outros? O exemplo dado por Acemoglu e Robinson em Por Que as Nações Fracassam faz esta pergunta ser ainda mais intrigante. Os autores apresentam Nogales, uma cidade que possui território entre dois países e é cortada ao meio por uma cerca. Ao norte a cidade pertence ao estado do Arizona, EUA, enquanto ao sul a cidade faz parte do estado de Sonora, México. Segundo descrição dos autores a parte americana da cidade possui renda familiar de cerca de US$30 mil anuais, a grande maioria dos habitantes concluiu o ensino médio e possui expectativa de vida alta quando se observa os padrões globais. Ao sul, mesmo inexistindo grande diferença geográfica, climática ou de pestes e doenças, a renda familiar média anual é cerca de um terço da renda dos moradores do norte. (ACEMOGLU; ROBINSON, 2013, P. 5). Para completar o raciocínio e exemplificar ainda mais o pensamento de estudiosos do assunto encontra-se na mesma passagem do livro uma pergunta dos autores “Como podem as duas metades do que é essencialmente a mesma cidade serem tão diferentes? ”. A resposta final para estas questões, e outras que deverão surgir ao longo do texto, é que a diferença de riqueza entre estas nações está associada aos níveis de produtividade. Embora não seja o único fator gerador das disparidades a produtividade é o indicador final que reflete uma série de escolhas e acontecimentos que ocorreram ao longo do tempo e permitiram a evolução destas nações até o patamar dos dias atuais. É importante observar que estas escolhas que determinaram os níveis atuais de riqueza (e irão determinar o nível futuro) fogem doalcance de grande parte da 11 população, que mal tem consciência e propriedade para conjuntamente determinar o caminho a ser seguido com o intuito de ser uma sociedade mais rica e próspera. A falta de consciência, por sua vez, está diretamente associada à utilização de formas de comunicação ineficientes e pouco claras por parte do governo, que vislumbram o curto prazo, convergindo com os interesses imediatistas da maior parte da sociedade. Ambos, governantes e habitantes de uma nação se encaixariam em uma definição utilizada por Giannetti em O Valor do Amanhã para descrever as trocas intertemporais. Giannetti, em seu texto, faz analogia à ciência e classifica o fenômeno de agentes econômicos que dão valor exacerbado ao presente e abrem mão do futuro como “miopia temporal”, que segundo sua definição é a “[...] atribuição de um valor demasiado grande ou intenso ao que está mais próximo de nós no tempo, em detrimento daquilo que se encontra mais afastado [...]”. (GIANNETTI, 2005, P. 174). Ao induzir tal raciocínio é interessante trazer um exemplo. O exemplo em questão refere-se ao aumento real do salário mínimo no Brasil, concedido todos os anos. Esta prática não apenas repõe as perdas inflacionárias do período como também eleva o custo de tal remuneração, em grande parte para pensionistas do INSS (órgão previdenciário brasileiro). Os sucessivos aumentos deixam cada vez maior a conta para o estado e consequentemente para os outros contribuintes. Ao observar tal situação é fácil perceber que ao longo dos anos esta política se tornará insustentável e será cada vez mais um peso, significativo, para o crescimento brasileiro. O raciocínio se escora na possibilidade de utilizar os recursos em questão para investimentos em educação básica e infraestrutura ao invés de remunerar além da inflação pessoas que não mais contribuem para o crescimento do país. Acontece que dificilmente a população em geral aceitaria que tal regra fosse alterada sem maiores dificuldades. Da mesma forma nenhum político bem-intencionado e com visão de longo prazo, em condições normais, tentaria tal manobra. O risco seria que ele acabasse malvisto por boa parte da população, além do que o impacto positivo de tal escolha provavelmente não ocorreria na sua gestão. Escolhas, como este exemplo brasileiro, são fruto de uma herança institucional proporcionada (em grande parte) por fatos históricos que se perpetuam dentro de uma sociedade na forma de cultura. Cultura esta que pode levar o país ao caminho da prosperidade e inovação ou simplesmente colocá-lo em segundo plano no caminho 12 da mediocridade. Para discorrer sobre os pilares que determinam o desenvolvimento econômico de duas nações (próximos capítulos deste trabalho) é necessário o entendimento dos conceitos e da evolução do estudo do crescimento econômico. Iniciando pelos conceitos, temos a definição de desenvolvimento econômico dada por Bresser-Pereira (2008). Segundo o autor, o desenvolvimento econômico de um país, “[...] é o processo de acumulação de capital e incorporação de progresso técnico ao trabalho e ao capital que leva ao aumento da produtividade, dos salários, e do padrão médio de vida da população”. (BRESSER-PEREIRA, 2008, P. 1). Outro ponto importante além da definição é trazido por Carlos Gonçalves, “[...] vale fazer um breve esclarecimento sobre a dicotomia “crescimento” versus “desenvolvimento” econômico”. Gonçalves explica que a diferença entre as “teorias de crescimento” e “teorias de desenvolvimento” é relacionada ao objeto de estudo em questão. Segundo o autor, a definição mais usual sugere que as “teorias do crescimento” teriam como alvo o entendimento do fenômeno do crescimento econômico de modo geral e as “teorias do desenvolvimento” estariam mais centradas em entender a diferença econômica entre os países ao longo do tempo. (GONÇALVES, 2013, P. 39) Apresentado os conceitos iniciais vamos à construção histórica da matéria. Robert Solow e Frank Ramsey são considerados os pioneiros no estudo do crescimento econômico, apesar da diferença temporal em que os principais artigos dos autores foram escritos. Ramsey em 1928 publicou A Mathematical Theory Of Saving e Solow em 1956 ficou conhecido com A Contribution To The Theory Of Economic Growth. No início de seu artigo, Ramsey tenta responder a pergunta “How much of it is income should a nation save?” Levantando a questão sobre crescimento econômico e poupança. Segundo Ana Sofia Rodrigues o modelo de Ramsey primava pela simplicidade e era demasiadamente sofisticado para a época. “[...] com uma função de utilidade intertemporal, Ramsey, ao tentar responder à questão – qual é a taxa de poupança ótima numa economia? –, mostrou que os agentes econômicos tentam “suavizar” o consumo durante a sua vida. O modelo trata uma economia que pode ser entendida como uma economia do tipo “Robinson Crusoé”, ou como uma economia cuja população é constante e que é totalmente controlada por um único indivíduo que toma todas as decisões respeitantes às variáveis econômicas. Nesta perspectiva, o modelo de Ramsey prima pela simplicidade e, no entanto, explica muitas das variáveis macroeconômicas como as decisões de consumo, poupança e investimento, o progresso tecnológico, o processo de tomada de decisões intertemporais, os ciclos econômicos, a taxa de salário real e a taxa de juro. O modelo de Ramsey era analiticamente sofisticado, talvez demasiado para a época. Permaneceu, por isso, ignorado 13 por muito tempo. A sua função de utilidade viria a ser adoptada por muitos economistas apenas três décadas após Ramsey a ter proposto. ” (RODRIGUES, 2004, P. 201) A explicação para que o modelo de Ramsey ficasse ignorado por muito tempo foi o seu falecimento prematuro ocorrido no auge do seu trabalho, em 1930. A linha de pensamento foi retomada posteriormente por David Cass e Tjalling Koopmans, ficando popularizado pela a versão Cass-Kopmans do Modelo de Ramsey. Segundo Gonçalves a versão Cass-Kopmans do Modelo de Ramsey “[...] nada mais é que um modelo de Solow mais sofisticado no qual a taxa de poupança advém endogenamente de um problema de maximização intertemporal da utilidade de um agente econômico representativo [...]” (GONÇALVES, 2013, P. 42). Ao observar as citações dos autores, podemos entender a cronologia de evolução da matéria e a importância de cada autor para que a evolução caminhasse até os dias de hoje. O ponto a ser levantado é que para explicar a evolução no modelo de Ramsey, Gonçalves utiliza a teoria de Solow. A base para isso será apresentada a seguir. O artigo de Robert Solow já era considerado adequado para a época, o ano era 1956 e os conceitos eram muito próximos aos de Ramsey. Solow combinou uma função de produção onde os insumos (capital e trabalho) teriam ganhos decrescentes de escala com uma equação dinâmica de acumulação de capital ditada por uma taxa de poupança exógena. Outra figura exógena ao modelo é a produtividade total dos fatores (PTF), a variável capta a eficiência de alocação dos insumos na economia. Segundo Gonçalves os resultados mais importantes do modelo de Solow são: “ (i) Taxa de poupança, crescimento populacional e depreciação do estoque de capital afetam o nível de renda, mas possuem impacto transitório sobre o crescimento. (ii) controlando-se para características que afetam o estado estacionário, o modelo prevê convergência condicional entre os países. (iii) no longo prazo, o modelo prevê que o crescimento do PIB por habitante é igual à taxa de progresso tecnológico. ” (GONÇALVES, 2013, P. 41) Ao avaliar o trabalho de Solow, Charles Jones descreve cada um dos resultadoscolocados acima por Gonçalves. “[...] o modelo de Solow recorre às diferenças nas taxas de investimento e nas taxas de crescimento populacional e (talvez) das diferenças exógenas na tecnologia para explicar diferenças nas rendas per capita [...]”. (JONES, 2000, P. 36) Tal argumento demonstra que Solow criou 14 parâmetros para determinar o motivo da renda per capita em um país ser maior que em outro, mas que no longo prazo, quando a economia se aproxima do “steady state” somente a evolução tecnológica garante a perenidade da evolução da renda. O raciocínio demonstra exatamente o que Gonçalves classifica como um dos resultados importantes. A teoria de Solow demonstra que o aumento de poupança afeta o nível de renda e consequentemente gerará crescimento em algum momento, mas de forma temporária e deslocada no tempo. O motivo é que o consumo no futuro se dá à custa de menor consumo hoje. Jones continua com a avaliação e busca a resposta para a pergunta (fazendo alusão a uma comparação entre duas economias): Por que somos tão ricos e eles tão pobres? Segundo Jones a resposta baseada em Solow é: “[...] é porque investimos mais e temos menores taxas de crescimento populacional, o que nos permite acumular mais capital por trabalhador e, assim, aumentar a produtividade da mão-de-obra. ” (JONES, 2000, P. 36). Para concluir, Jones faz a seguinte afirmação acerca do crescimento sustentado. “[...] sem progresso tecnológico o crescimento per capita acabará na medida em que começarem a manifestar-se os retornos decrescentes ao capital. Contudo, o progresso tecnológico pode compensar a tendência declinante do produto marginal do capital e, no longo prazo, os países crescem à taxa do progresso tecnológico. ” (JONES, 2000, P. 36). Desta forma, pelo contexto geral do estudo do crescimento/desenvolvimento econômico podemos observar que tanto Solow quanto Ramsey contribuíram muito para o desenvolvimento da matéria. Ambos chegaram a um ponto até então desconhecido, mas, no entanto, não conseguiram incluir variáveis que explicam o crescimento econômico sustentado. Após algum tempo diversos estudiosos se debruçaram sobre os modelos de Solow e Ramsey para buscar uma resposta satisfatória e criar um modelo que contemplasse a produtividade. Tais estudos começaram a decompor as causas do crescimento chegaram até três parcelas fundamentais: Capital físico, capital humano e PTF. Sendo PTF (produtividade total dos fatores) a variável nova e de grande peso para estes modelos. Iniciava-se então o período dos modelos de crescimento endógeno. A grande diferença apresentada foi em relação ao olhar dos investimentos. Os modelos de crescimento endógeno incorporam dentro de sua lógica que investir em avanço tecnológico é uma escolha ótima, da mesma forma que os investimentos em capital físico eram considerados escolhas ótimas nos modelos exógenos. O raciocínio 15 para chegar a tal ponto (internalização do avanço tecnológico ao modelo) foi sendo construído principalmente a partir do final dos anos 80 e início dos anos 90. Paul Romer em 1986 com o artigo Increasing Returns and Long-Run Growth traz o primeiro modelo AK. Termo que é utilizado para descrever a nova curva de produção que de acordo com o modelo teria um formato linear e não mais côncavo. Traduzindo em termos práticos, Romer conseguiu gerar um modelo onde os ganhos decrescentes de escala da economia desaparecem. Entretanto Romer também não consegue apresentar o progresso tecnológico como uma variável de forma totalmente separada, o progresso tecnológico está dentro do modelo, mas é intrínseco ao capital físico. Gonçalves apresenta as características do modelo da seguinte forma: “[...] o autor postula que os investimentos em capital físico de cada firma individual em dada economia geram externalidades positivas para o conjunto de todas elas. Nessa formulação, o progresso tecnológico vem então acoplado, ou melhor, indistinguível do processo de acumulação de capital. A intuição econômica subjacente é que realizar investimentos em máquinas e equipamentos acaba gerando aprendizado tecnológico que de alguma forma transborda para todos os agentes da economia. Isso faz com que a PTF global, comum a todas as firmas de certa economia possa ser expressa como uma função direta do somatório desses investimentos individuais. ” 2013, (GONÇALVES, 2013, P. 45) A lógica de Romer nos induz a conclusão de que o fator que abre a possibilidade de crescimento de longo prazo é, mais uma vez, uma externalidade positiva, mas que agora está no escopo do modelo, como podemos ver em seu trabalho. Segundo Romer “The creation of new knowledge by one firm is assumed to have a positive external effect on the production possibilities of other firms because knowledge cannot be perfectly patented or kept secret.” (ROMER, 1986, P. 1003). Na citação acima Romer começa a dar indícios de como o arcabouço teórico do seu trabalho se fechará mais alguns anos à frente. De acordo com sua afirmação podemos entender que a tal externalidade positiva ocorre pelo investimento de várias empresas na melhora de seus negócios e de fazer produtos ou processos de modo inovador. Vamos então pensar como um executivo, que pelas suas atribuições deve fazer a empresa que comanda ser cada vez mais lucrativa. Ao tomar a iniciativa de desenvolver novos produtos ou melhorar seu processo o agente econômico pode se deparar com a realidade colocada por Romer, já que conhecimento não pode ser mantido em segredo, todas as somas de dinheiro que forem investidas para alguma inovação deverão em algum tempo cair nas mãos da concorrência no formato do 16 próprio conhecimento. Por que então existiria este dispêndio financeiro, que diminuiria a rentabilidade da empresa, se ele não trará nenhum benefício concreto no longo prazo? A pergunta é respondida pelo próprio Romer em 1990 com o artigo Endogenous Technological Change. Gonçalves descreve o trabalho com as seguintes palavras: “Paul Romer é quem lidera a revolução, trazendo a novidade de incorporar em um modelo de escolha intertemporal a lá Ramsey um setor produtor de inovações (sob a forma de insumos intermediários) que escolhe preço e quantidades visando a maximizar o lucro. A inovação finalmente deixa de ser algo que cai do céu e passa a ser explicada dentro do modelo. O “pulo do gato”, em termos de estratégia de modelagem, está no fato de as firmas produtoras de inovação, diferentemente das do setor de bens finais, não estarem inseridas em um ambiente de competição perfeita. É justamente essa característica de monopolista inventor de certa variedade de insumo produtivo que as possibilita colher lucro econômico positivo, o qual por sua vez financia o custo fixo associado à atividade de inovar. ” (GONÇALVES, 2013, P. 46) Desta forma, o trabalho de Romer mostra que inovação é algo decorrente de escolhas deliberadas feitas por agentes racionais com o intuito de maximizar o lucro. Assim coloca-se um ponto final nas teorias que colocavam a produtividade e a inovação como algo sem explicação e que aparecia simplesmente do nada. O crescimento econômico está, segundo o modelo desenvolvido por Romer, fortemente correlacionado com a alocação de esforços no desenvolvimento de novas tecnologias (P&D). Tal afirmação, no entanto não se prova empiricamente, Jones traz um artigo onde sugere inexistir evidências ligando maiores taxas de investimento a maior crescimento econômico. “[...] if the level of resources devoted to R&D – measured, say, by the number of scientists engaged in R&D- is doubled, then the per capita growth rate of output should also double, at least in the steady state.” (JONES,1995, P. 760). Inicialmente o autor induz ao raciocínio, utilizando a lógica dos modelos de crescimento endógeno e faz um exercício utilizando dados reais. “For example, according to the National Science Foundation (1989), the number of scientists and engineers engaged in R&D in the United States has grown from under 200.000 in 1950 to nearly 1 milion by 1987; per capita growth rates in the U.S exhbit nothing remotely similar to this fivefold increase.” (JONES, 1995, P. 760). Utilizando este argumento sobre P&D e alguns outros como políticas governamentais Jones tenta “quebrar” o modelo de Romer. Outra importante contribuição foi de Barro, que em 1997 segue a mesma linha colocada por Jones. 17 Barro acredita que os modelos são importantes para o entendimento do crescimento mundial, ou seja, o mundo somente pode continuar crescendo indefinitivamente porque alguém em algum lugar inventou uma nova tecnologia que aumenta a produtividade de uma atividade específica. Mas, a inovação por si só não explica a diferença de crescimento entre países. “Theories of basic technological change seem most important for understanding why the world as a whole can continue to grow indefinitely in per capita terms. But these theories have less to do with the determination of relative rates of growth across countries [...]” (BARRO, 1997, P. 8). Segundo o autor existiam outros pontos para explicar o motivo de alguns países obterem maior taxa de crescimento que outros. Estes pontos passavam pelas mãos do governo que pode exercer o poder sobre taxações, manutenção da ordem, serviços de infraestrutura e outros aspectos. Observando estes dados na busca pelas causas profundas do crescimento econômico acabamos caindo na economia política. Edward Prescott e Stephen Parente abordam o lado político. A tese dos autores defende que grupos de trabalhadores de certas indústrias, chamados de insiders organizam-se habilmente para barrar a adoção de tecnologias e práticas de produção mais eficientes amplamente disponíveis em escala mundial sem aparente motivo econômico que justifique tal escolha. O comportamento descrito pelos autores por parte dos insiders visa preservar suas funções, mesmo que a um elevado custo à economia. Os autores se perguntam se sua tese possui força suficiente para explicar a diferença de PTF entre nações. A ideia de certos países não terem acesso ao conjunto de tecnologias e melhores práticas é quebrada, utilizando a linha de raciocínio de Gonçalves “Tecnologia ou melhores práticas são, em boa dimensão, um bem público, e a informação no mundo moderno viaja rapidamente e de modo desimpedido, seja direta, seja indiretamente, embutida em bens intermediários e finais transacionados internacionalmente. ” (GONÇALVES, 2013, P. 49). Outra tentativa de quebrar a lógica proposta pelos autores é relacionada ao capital humano. Algumas nações teriam melhor capital humano e, portanto, poderiam e teriam facilidade em adotar práticas mais eficientes. Tal raciocínio induz que ao falar “melhores práticas” está se falando de algo muito sofisticado, o que não é necessariamente verdade. Outro ponto é que mesmo em países ricos podemos observar variabilidade na produção, conforme mostra Gonçalves “O problema com essa linha de raciocínio é 18 que, mesmo em países ricos, com nível de capital humano similar, existe enorme variabilidade de produtividade setorial. ” (GONÇALVES, 2013, P. 49). Observando que é possível adotar novas tecnologias e melhores práticas por parte de qualquer nação e levando em conta que os insiders conseguem agir habilmente para não se tornarem obsoletos. Podemos inferir que os mesmos não serão resistentes apenas em uma situação, quando existir o risco do negócio do qual participam morrer pela não adoção das melhores práticas. Desta forma Gonçalves apresenta dois pontos cruciais para o desenvolvimento econômico que dependem de atitudes governamentais como: “ (i) políticas públicas de incentivo à entrada (competição exante) no mercado de bens; (ii) flexibilização do mercado de trabalho [...]”. (GONÇALVES, 2013, P. 50). Parente e Prescott citam alguns casos para exemplificar sua tese onde a diferença de produtividade parece desempenhar papel relevante no desenvolvimento econômico. Gonçalves em seu trabalho extrai do trabalho dos autores exemplo dos setores têxteis da Inglaterra e da Índia, mostrando que deliberadamente uma escolha governamental impediu o avanço tecnológico para garantir um número maior de empregos “[...] como no exemplo da diferença de produtividade verificada entre os setores têxteis da Inglaterra e da Índia no início do século XX, devido à decisão indiana de subutilizar maquinário já existente nas operações do chão de fábrica para impedir aumento do desemprego setorial.” (GONÇALVES, 2013, P. 50). O trabalho de Prescott e Parente sofreu outra crítica, o ponto levantado é que o ajuste pode ser feito apenas nas horas trabalhadas e não na redução de renda dos insiders. Desta forma não existiria motivo para que as tecnologias fossem “barradas”, já que os insiders trabalhariam menos horas, mas mantendo a renda. A resposta para tal colocação pode ser encontrada no trabalho de Acemoglu e Robinson (2000). Os autores apresentam em seu trabalho Political Losers as a Barrier to Economic Development o termo “political-loser hypothesis”, conceito análogo ao “economic- losers hypothesis”, porém aplicado à política. Logo no início do artigo Acemoglu e Robinson buscam resposta para a pergunta “Why do societies, as in this example, fail to adopt the best available technologies? ” A pergunta é a mesma que motivou o trabalho de Prescott e Parente, no entanto a resposta é um pouco diferente. “One answer is that existing powerful "interest groups" block the introduction of new technologies in order to protect their economic rents, and societies are able to make technological advances only if they can defeat such groups.” (ACEMOGLU; 19 ROBINSON, 2000, P. 1). Os autores também exploram o conceito de insiders, mas de uma forma levemente diferenciada. Acemoglu e Robinson trazem os monopolistas como um exemplo de grupo que pode bloquear o avanço tecnológico para preservar sua posição no mercado “A monopolist might wish to block the introduction of a new technology by a rival that will capture the Market”. (ACEMOGLU; ROBINSON, 2000, P. 1). Note que aparentemente o conceito proposto no trabalho de Prescott e Parente mostrava um grupo de pessoas que resistia à inovação para preservar seus postos de trabalho, enquanto Acemoglu e Robinson fala de setores na figura de uma forte empresa monopolista. Tal conceito, é o que foi chamado de “economic-losers hypothesis” algumas sentenças atrás. Os autores continuam com o raciocínio e evoluem para a força política dos agentes econômicos “[...] the economic losers hypothesis relies on the presumption that certain groups have the political power to block innovation.” (ACEMOGLU; ROBINSON, 2000, P. 1). A observação feita mostra que os grupos que desejam bloquear o avanço tecnológico precisam de poder político para atingir seu objetivo. Ou seja, temos um grupo político agindo ao seu próprio favor e contra o interesse da população. Mas qual é a motivação para isso? Por que agentes políticos aceitariam tal restrição e não simplesmente podem deixar o avanço tecnológico ocorrer e ter a sua retribuição na forma de maior arrecadação de impostos? O ponto que os autores mostram, é que tal grupo político pode não ter forças para enfrentar o grupo econômico que tenta barrar a tecnologia. Isso poderia aumentar o lobby para a redistribuição de poder, o grupo que detêm opoder econômico forçaria a troca do grupo político por outro que defendesse seus interesses. Desta forma, quem possui o poder político e quer mantê-lo tem uma escolha totalmente assimétrica à sua frente. Desagradar os agentes que possuem o poder econômico parece não ser interessante e seguir com o incentivo à inovação permite o surgimento de entrantes (novos agentes) na economia, os quais não têm compromisso com quem possui o poder político. O caos provocado por uma combinação de inovação tecnológica e mudança econômica ocorrendo simultaneamente, aumenta de forma substancial a chance de redistribuição do poder político. Este comportamento é o que Acemoglu e Robinson chamam de “political loser hypothesis”. Os autores ainda traçam o caminho e a relação entre os grupos que possuem o poder político e o poder econômico. 20 “[...]If agents are economic losers, but have no political power, they cannot impede technological progress. If they have and maintain political power - i.e., are not political losers - then they have no incentive to block progress. It is therefore agents who have political power and fear losing it that will have incentives to block. ” (ACEMOGLU; ROBINSON, 2000, P. 2). Ao observar o argumento e os pontos levantados pelos autores podemos observar que o desenvolvimento econômico está claramente relacionado com a qualidade dos políticos, empresários e da população que compõe a economia em questão. As travas que amarram o crescimento passam diretamente pela qualidade institucional do país. Em Why do some countries produce so much more output per worker tha others? Hall e Jones abordam a qualidade institucional para explicar a diferença de crescimento entre países. Os autores utilizam a expressão “infraestrutura social”, que segundo os mesmos pode ser definida da seguinte forma: “By social infrastructure, we mean the institutions and government policies that provide the incentives for individuals and firms in an economy. Those incentives can encourage productive activities such as the accumulation of skills or the development of new goods and production techniques, or those incentives can encourage predatory behavior such as rent-seeking, corruption, and theft. ” (HALL; JONES, 1998, P. 14). Com a definição descrita os autores buscam identificar desvios teóricos entre a taxa de retorno privada dos investimentos em capital físico e humano e a taxa de retorno social. Tal desvio pode ser classificado como um índice que procura medir a probabilidade de expropriação do investimento privado, o desvio pode ocorrer por intervenção governamental (taxas, contribuições e impostos) ou por meio de indivíduos (roubo e corrupção). Os resultados explicam de forma robusta a diferença de PTFs entre as nações estudadas e mostram relação de causalidade quando controladas pelas variáveis geográficas e linguísticas. Três anos após o trabalho de Hall e Jones, Acemoglu e outros autores abordaram novamente a qualidade institucional das nações para explicar o desenvolvimento econômico. Em The Colonial Origins of Comparative Development: An Empirical Investigation os autores buscaram as origens das colônias europeias no século XVII. Segundo os autores, devido às condições geográficas e populacionais os europeus cunharam dois tipos de colônias. As colônias de povoamento, com qualidade institucional fértil e a colônia de exploração, com qualidade institucional 21 predatória. Segundo Gonçalves (2013) os autores traçaram algumas características para que a colônia fosse denominada de exploração: “A ideia subjacente é que, nas regiões menos propensas a uma verdadeira “colonização de povoamento”, devido (i) às vicissitudes do ambiente natural; (ii) à presença de recursos facilmente capturáveis e populações nativas bem organizadas que poderiam servir de mão de obra escrava; ou ainda (iii) a um tipo de solo propenso a culturas em que grande escala das propriedades/escravidão era a escolha tecnologicamente eficiente, os europeus optaram por implantar “instituições de exploração”, predatórias, com pouco zelo pelos direitos de propriedade.” (GONÇALVES, 2013, P. 53). Pensando sob o ponto de vista econômico fazia todo o sentido utilizar mão de obra escrava disponível para explorar recursos naturais disponíveis em abundância. Desta forma nestes locais nasceram instituições com dificuldades de crescimento de longo prazo devido à qualidade institucional fraca e exploratória. Já, do outro lado da moeda existia um ambiente que proporcionava a instalação de uma colônia de povoamento, onde nasciam instituições com qualidade institucional fértil e viés positivo para o desenvolvimento econômico. Tal ambiente foi descrito pelos autores e interpretado por Gonçalves (2013) como: “Já em lugares climática e ambientalmente mais similares aos seus de origem, onde predar recursos e populações nativas não fazia sentido econômico e nos quais o solo não favorecia o plantio em larga escala (e, por conseguinte, instituições escravocratas), os mesmos europeus fincaram pé em “colônias de povoamento”, com divisão igualitária da terra, e implantaram instituições socioeconômicas iniciais garantidoras de direitos de propriedade para uma ampla parcela da população (que eram eles mesmos!).” (GONÇALVES, 2013, P. 53). A pergunta que deve ocorrer agora é: A diferença de colonização é realmente tão importante para explicar a diferença de desenvolvimento econômico verificado nos dados pelos autores após tantos anos? A resposta segundo Gonçalves é não. O autor recorre à inercia do arcabouço institucional dos países para dar tal resposta. “A história ligando o ambiente natural de outras épocas à qualidade institucional atual só fecha com a hipótese adicional – fortemente defendida pelos economistas da vertente institucional, como North – de que instituições, boas ou ruins, tendem a se perpetuar no tempo. ” (GONÇALVES, 2013, P. 54). Gonçalves continua sua linha de raciocínio e argumenta que qualidade institucional não é algo imutável, mas mudanças nesta alavanca são suaves e lentas. O principal argumento, como já abordado anteriormente, é que os ganhadores de um 22 arranjo institucional (empresários, governantes ou trabalhadores) investem pesadamente na manutenção da estrutura que os beneficia, independente do resultado desta para a economia como um todo. Desta forma, caso ocorra de as instituições nascerem com uma estrutura benéfica ao crescimento é uma vantagem enorme, mas caso contrário à mudança é extremamente difícil e lenta. É importante entender que as nações que nasceram com qualidade institucional prejudicada têm um longo caminho a percorrer até evoluir a um ponto que permita maior crescimento. Mas, nada garante que nações com qualidade institucional pró-crescimento tenham sucesso no seu desenvolvimento. O potencial, mais pronto, destas instituições deve ser aproveitado utilizando conhecimento e bom senso econômico. Logo, a condução da política econômica exerce papel decisivo no desenvolvimento de uma nação. O trabalho de Henry e Miller (2008) intitulado Institutions vs. Policies: a tale of two islands procura mostrar duas nações com padrões parecidos, exceto a condução da política econômica. Os autores comparam os resultados obtidos em Barbados e Jamaica para provar sua tese. O argumento para realizar a comparação é que ambos os países foram colonizados por ingleses e, portanto, teriam identidade política, econômica e institucional de mesma origem. Além de contar com geografia e garantias de direitos de propriedade no pós-independência similares. “Specifically, Barbados and Jamaica are both former British colonies, small island economies,predominantly inhabited by the descendants of Africans who were brought to the Caribbean to cultivate sugar. As former British colonies, Barbados and Jamaica inherited almost identical political, economic, and legal institutions: Westminster Parliamentary democracy, constitutional protection of property rights, and legal systems rooted in English Common Law.” (HENRY E MILLER, 2008 – P. 2) A independência de ambos os países ocorreu nos anos sessenta e o crescimento da renda per capita nos anos posteriores tomou rumos diferentes entre os países. Quarenta anos após a independência a renda por habitante na Jamaica cresceu em média 0,8% ao ano, enquanto em Barbados o crescimento médio foi de 2,2% ao ano. A diferença do nível de renda nos dias atuais, segundo Gonçalves (2013), chega a ser 75% maior em Barbados do que na Jamaica. O argumento para esta diferença aparece no conjunto de políticas macroeconômicas adotadas no período. Acertadas em um país e equivocadas no outro. Os autores discorrem sobre as principais medidas adotadas por cada nação e mostram ênfase no período pós-choque do petróleo. Barbados optou por prudência 23 fiscal, combate à inflação e de ajuste de gastos. Do outro lado, a Jamaica optou por protecionismo crescente, expansão do déficit público, intervenção estatal na economia e momentos de depreciação cambial/inflação. Segundo os autores o contraste de decisões elencadas acima foi responsável pela enorme disparidade na evolução da renda per capita dos dois países. Com estes argumentos e baseados em fatos a tese é fechada mostrando que qualidade institucional é realmente importante, mas que nações constituídas sob o mesmo arranjo institucional também podem apresentar diferença em seu desenvolvimento. A condução, de forma desastrosa, da política macroeconômica (cambial, fiscal e monetária) pode trazer anos de atraso, mesmo dentro de um arcabouço teórico institucional favorável. Gonçalves (2013) argumenta que a qualidade institucional possui horizonte de influência de séculos enquanto a deterioração dos pilares macroeconômicos apresenta influência de décadas no crescimento de um país. (GONÇALVES, 2013, P. 56). Ao fechar o tópico de políticas econômicas, Gonçalves (2013) traz alguns pontos aprendidos que se provam empiricamente ao longo dos anos. São eles: - Maior abertura comercial gera maiores níveis de desenvolvimento econômico, via ganhos de escala, importação de insumos intermediários de melhor qualidade, aprendizado tecnológico etc. - Inflação muito alta é prejudicial ao crescimento da economia, possivelmente por gerar migração de recursos escassos para atividades defensivas destinadas à proteção contra a perda inflacionária e também por nublar os sinais emitidos dos preços relativos da economia. - Déficits públicos elevados por muito tempo estão negativamente associados ao crescimento do PIB, possivelmente pela instabilidade econômica associada (mudanças de taxação inesperadas, inflação alta e volátil) etc. - Desigualdade elevada está associada a um crescimento subsequente mais baixo, embora o canal ligando as duas variáveis ainda não esteja bem estabelecido na pesquisa empírica. - Maior desenvolvimento dos mercados de crédito causa crescimento econômico mais acelerado, possivelmente por permitir melhor diversificação e, assim, assunção maior de riscos associados à atividade de inovar; alocar eficientemente a 24 poupança da economia e, finalmente, atenuar os impedimentos à acumulação de capital humano e físico associado à desigualdade de renda. Colocado todo o desenvolvimento teórico da matéria, partiremos para uma análise comparativa entre Brasil e Coreia do Sul. Nos próximos capítulos será apresentado uma contextualização de ambas economias e posteriormente uma análise dos dados disponíveis para entender como cada economia se comportou e quais foram os motivos para a diferença da renda per capita apresentada. 2.2 BRASIL Para começar a breve descrição da história econômica brasileira nada mais oportuno do que trazer a ideia central que a maioria dos economistas e estudiosos do assunto têm ao falar de Brasil. A frase, que faz parte do título de Giambiagi (2007, P. 55) Brasil Raízes do Atraso, é creditada à Georges Clemenceau, um estadista francês que em 1964 proferiu: “O Brasil tem um grande futuro. O Brasil teve um grande futuro. O Brasil terá sempre um grande futuro? ”. Infelizmente, após cinquenta anos as palavras ainda são atuais. O Brasil ainda caminha de forma muito lenta rumo a ser um país mais rico e próspero. Os fatos para a lenta evolução é uma conjuntura de fatores muito desfavorável quando ligadas às teses apresentadas no capítulo anterior. Observando os fatos, percebemos que a colonização não nos deixou uma instituição pró crescimento, sofremos com a burocracia e as barreiras ao aumento de produtividade e esbarramos, por muitas vezes, na condução equivocada da política macroeconômica proposta por nossos governantes. Vamos então iniciar pelos fatores da colonização do país. O Brasil foi descoberto em 22 de abril de 1500 por uma frota de navios portugueses. A população local era composta por índios, o território possuía terras férteis e com grande disponibilidade de recursos naturais. Recursos naturais que foram alvo de trocas imensamente vantajosas para a corte portuguesa. O primeiro material a ser extraído em grande quantidade foi o pau-brasil, que era comercializado por alto valor na Europa. Nas trocas, os portugueses utilizavam produtos 25 manufaturados de baixo valor em seu continente e que por sua vez eram desconhecidos pela população indígena. Este tipo, extrativista, de atividade começou a dar os moldes de qual seria a forma que os portugueses tratariam o território descoberto. Caio Prado em 1942 no clássico Formação do Brasil Contemporâneo – colônia coloca três características que ajudam a e entender a formação da economia brasileira, tais característica são aplicadas as colônias de exploração. Segundo o autor, o trabalho escravo (organização de trabalho), o envio de recursos para o exterior e a grande propriedade disponível (organização de produção) explicam muito de nossa formação econômica. “São estes, em suma, os característicos fundamentais da economia colonial brasileira: de um lado, esta organização da produção e do trabalho, e a concentração da riqueza que dela resulta; do outro, a sua orientação, voltada para o exterior e simples fornecedora do comércio internacional. ” (PRADO,1963, P. 125) O autor continua sua linha de raciocínio que mais tarde seria utilizada e renovada por autores como Acemoglu (2001). Prado descreve como se constituiu a exploração do território brasileiro e consequentemente qual foi a base que a instituição teve para nascer, apresentando baixa qualidade institucional. “O que o autor em suma procura expor e demonstrar, é que as colônias existem e são estabelecidas em benefício exclusivo da metrópole; este benefício se realiza pela produção e exportação, para ela, de gêneros de que necessita, não só para si própria, mas para comerciar com o supérfluo no estrangeiro; que, finalmente, o povoamento e organização das colônias deve subordinar-se a tais objetivos, e não lhes compete se ocuparem em atividades que não interessem o comércio metropolitano. Admite no máximo, mas como exceção apenas, a produção de certos gêneros estritamente necessários à subsistência da população e que seria impraticável trazer de fora. ” (PRADO,1963, P. 126) Os pontos levantados por Prado mostram como era a relação entre colônia e colonizadores. Em um trecho mais à frente em sua publicação o autor consegue de forma objetivadescrever o panorama da sociedade brasileira durante sua colonização. “Numa palavra, e para sintetizar o panorama da sociedade colonial: incoerência e instabilidade no povoamento; pobreza e miséria na economia; dissolução nos costumes; inércia e corrupção nos dirigentes leigos e eclesiásticos. ” (PRADO,1963, P. 356) Desta forma, todo o arcabouço montado por Prado e depois aperfeiçoado nos anos 2000 por Acemoglu e coautores, apresenta coerência com o caso brasileiro. O território rico em recursos naturais e com população local para ser utilizada como mão de obra escrava foram importantes para a implantação de uma cultura que não beneficia o crescimento econômico. 26 Angus Maddison, economista britânico que ficou conhecido por gerar estimativas de desempenho econômico de vários países em longos períodos da história estimou o crescimento médio do PIB per capita brasileiro em 0,28% ao ano entre 1500 e 1945. Villela (2013) cita a estimativa do autor em seu trabalho e completa “[...] isto é, grosso modo equivalente ao crescimento médio do PIB per capita mundial em igual período, estimado por ele (Maddison) em 0,29% ao ano. ” (VILLELA, 2013, P.92). O autor continua com sua análise sobre o caso brasileiro e monta a linha de raciocínio utilizando o trabalho de Maddison (2010). Villela divide o crescimento brasileiro em subperíodos de aproximadamente cem anos, onde em alguns intervalos a média de crescimento do PIB per capita brasileiro é maior que a média do PIB per capita mundial. O resultado começa a mudar, com o Brasil apresentando crescimento abaixo da média mundial em meados do século XIX. Segundo o autor os números indicam que a Revolução Industrial foi o evento divisor de águas no comportamento do crescimento brasileiro em relação ao mundo. “[...] até o início do século XIX, a economia brasileira cresceu a taxas médias acima das do conjunto da economia mundial, mas que tal fato deixou de ocorrer a partir do momento em que a Revolução Industrial abriu caminho para o crescimento econômico sustentado em algumas partes do mundo. ” (VILLELA,2013, P. 93) Villela (2013) utiliza como referência os Estados Unidos e traça um paralelo comparando os crescimentos. “De fato, se até 1700 o PIB per capita das duas economias do novo mundo (as Américas portuguesa e britânica) era, grosso modo, equivalente, à época da independência do Brasil a renda per capita americana já correspondia a quase o dobro da brasileira. Tal proporção dobraria até o final do império e, novamente, até o término da Segunda Guerra Mundial, quando a renda per capita americana era mais de oito vezes superior à do Brasil” (VILLELA,2013, P. 93). A explicação para tal fato passa pelos conceitos de crescimento “extensivo” e “intensivo” que segundo a definição de Villela apresenta a seguinte diferença: “O primeiro tipo decorre de um aumento no uso de insumos de produção (capital, terra, capital humano), ao passo que o segundo diz respeito ao aumento da produção por unidade de insumo, isto é, a eficiência. ” (VILLELA,2013, P. 93). O fato do crescimento médio per capita ser tão baixo quando se considera um longo período, como no exemplo acima (1500 – 1945), é explicado pela falta do aumento de produtividade ou crescimento “intensivo” da economia. Grande parte do crescimento do produto durante o período se deu por conta do crescimento populacional, que proporcionou crescimento “extensivo” com a utilização da oferta em 27 larga escala das terras e recursos naturais disponíveis. Esta análise feita pelo autor nos remete à teoria de Solow (1956), onde pela primeira vez pôde-se concluir que no longo prazo o crescimento da renda per capita é indistinguível do progresso tecnológico. Desta forma fica claro que a Revolução Industrial (Séc. XVIII e XIX) possuiu papel fundamental para o crescimento intensivo da economia. Segundo Villela (2013, P. 94) “Somente a partir da Revolução Industrial abriu-se a possibilidade de as economias romperem em definitivo as barreiras que limitavam historicamente a expansão de renda per capita. ” No entanto o autor se atenta para alguns casos onde a economia já apresentava ganhos de produtividade e crescimento intensivo antes mesmo da revolução industrial. Como é o caso norte-americano. “Na América do Norte britânica observou-se crescimento sobretudo extensivo, por sua vez assegurado por uma oferta infinitamente elástica de terras de alta qualidade e recursos naturais, permitindo o constante alargamento da fronteira produtiva. A tal crescimento extensivo é provável que tenham se somado, nas 13 colônias, ganhos de eficiência (crescimento do tipo intensivo) associados à especialização (por exemplo, nos casos da produção de tabaco – o principal item de exportação colonial – e nas atividades portuárias e comerciais). ” (VILLELA,2013, P. 94). E o autor continua, a afirmação é que o crescimento extensivo combinado com algum crescimento intensivo em variados setores propiciou aos Estados Unidos um aumento do padrão de vida de sua população. “Na prática, o crescimento extensivo (alargamento de fronteira) norte-americano, somado a algum crescimento intensivo em setores da agricultura de exportação e serviços comerciais e marítimos, permitiu um aumento muito mais rápido da população com padrão de vida médio seguramente melhor que no caso da América portuguesa na época colonial. ” (VILLELA,2013, P. 95). Com as considerações sobre as bases da formação institucional brasileira feitas e com o crescimento até 1945 abordado, será discutido um dos pontos apresentados no capítulo anterior. Como se forma a instituição de uma nação. A formação institucional dita muito do ritmo da formação econômica de uma nação. Esta formação não é imutável, mas deixa uma herança secular que demanda muito esforço para ser alterada. Andando de forma acelerada no tempo, serão abordados os outros fatores de crescimento no período subsequente, de 1945 até os anos 2000. Para começar a análise deste novo período da história é importante obter um panorama de como o Brasil estava em no início dos anos 50. Ferreira e Veloso (2013) na introdução de seu trabalho fazem a síntese do momento do país até então “Em 1950, o Brasil era um país pobre e agrícola. Embora já estivesse experimentando crescimento mais acelerado desde o início do século, sua renda per capita ainda era 28 muito baixa e seus indicadores sociais muito precários. ” (FERREIRA; VELOSO, 2013, P.129). O estudo dos autores divide os ciclos pelos quais passaram a economia brasileira. Os mesmos apontam para crescimento acelerado entre os anos de 1950 e 1980, no entanto sem grande proveito deste momento para melhora dos indicadores sociais. Posteriormente a 1980 o Brasil teve forte desaceleração do crescimento econômico e da PTF. A redução da renda per capita ocorreu até 1992. Nos anos 1990 a situação começa a mudar novamente e começa-se a obter indicadores sociais melhores, principalmente relativos à educação. No período pós-guerra a economia brasileira apresentou crescimento significativo da renda per capita. Durante o período de 1950 até 1980 o crescimento foi da renda per capita foi de 4,4% ao ano, segundo dados dos autores. Para se ter ideia do quão significativo era o crescimento da época, Ferreira e Veloso fazem um breve exercício. “Isso implica que, se o país tivesse mantido essa taxa de crescimento nos 31 anos que se seguiram, nossa renda per capita atualmente seria cerca de 14 vezes a de 1950, em vez de cinco. ” (FERREIRA; VELOSO, 2013, P.131). Segundo os autores, mantida a taxa de crescimento de 4,4% ao ano o país dobraria a sua taxa de renda per capita a cada 16 anos. As perguntas que aparecem ao observar estesdados são: Qual o motivo do crescimento acelerado? Ele era sustentável? Os autores recorrem a literatura acadêmica (descrita no primeiro capítulo) e a evidências empíricas para traçar uma resposta. Ferreira e Veloso recorrem ao modelo de Solow para buscar a resposta. “Segundo o modelo de Solow, quando a economia encontra-se em crescimento balanceado, o estoque de capital e o produto crescem à mesma taxa, o que implica que a relação capital- produto permanece constante. Por outro lado, em períodos de transição para uma nova trajetória de crescimento balanceado, o capital cresce mais rapidamente que o produto, o que resulta em elevação da relação capital-produto.“ (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 140). Desta forma, a relação capital-produto fornece informações importantes sobre a trajetória de uma economia. Os autores buscam outro ponto do modelo de Solow que explica o crescimento econômico, a tecnologia. Ferreira e Veloso trazem dois canais ligados à tecnologia que causam impacto no crescimento. O primeiro é o aumento da tecnologia propriamente dita, que aumenta a produtividade. O segundo diz respeito ao aumento da produtividade marginal do capital, induzindo maior 29 acumulação de capital. Para finalizar a ideia, os mesmos fecham o raciocínio “Quando a economia se encontra em crescimento balanceado, o capital por trabalhador e a produtividade do trabalho crescem à taxa de progresso tecnológico. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 140). Os autores apresentam uma análise da evolução da relação capital-produto de 1950 até 2009. Pelos dados podemos observar que a relação capital-produto ficou relativamente estável entre 1950 e 1980, mostrando que a economia apresentou crescimento balanceado durante este período. A conclusão apresentada pelos autores é “O crescimento do produto por trabalhador entre 1950 e 1980 ocorreu principalmente devido à rápida expansão da PTF e ao aumento de capital humano. ” y k/y h A 1950 - 1968 4 0,1 1,3 2,6 (2) (33) (64) 1968 - 1973 7,1 -1,4 0,1 8,3 (-19) (2) (117) 1973 - 1980 3,4 2,0 0,3 1,1 (60) (8) (32) 1980 - 1992 -2,6 1,9 2,5 -7,0 (-74) (-99) (273) 1992 - 2003 0,2 0 2,2 -2 (25) (1273) (-1198) 2003 - 2009 2,1 -1,5 1 2,6 (-70) (49) (121) 1950 - 1980 4,4 0,3 0,9 3,2 (7) (20) (73) 1980 - 2009 -0,6 0,5 2,1 -3,1 (-89) (-372) (561) 1950 - 2009 1,9 0,4 1,5 0,1 (20) (76) (4) Fonte: Ferreira e Veloso, 2013, P. 143 CONTRIBUIÇÃO PARA O CRESCIMENTO Obs: A tabela apresenta a taxa de crescimento anual média do produto por trabalhador (y) e as contribuições anuais médias das fontes de crescimento: relação capital-produto (k/y), capital humano por trabalhador (h) e PTF (A). Valores entre parênteses indicam as contribuições relativas de cada fonte de crescimento. Para metodologia de cálculo ver Ferreira e Veloso, 2013, P. 141 Tabela 1: Decomposição alternativa do crescimento do produto por trabalhador (Brasil, em %) 30 (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 141). Observando os dados da tabela 1 vemos que a maior contribuição, no período, realmente foi da PTF com 73% do crescimento do produto por trabalhador. A resposta para tal aumento na PTF passa pela chamada transformação estrutural, “[...]definida como o deslocamento da atividade econômica entre diferentes setores ao longo do processo de desenvolvimento. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 143). A transformação nada mais é que o movimento de aumento de importância da indústria e do setor de serviços em detrimento do setor agrícola. A explicação é simples e lógica. O setor industrial ou de serviços, em geral, apresenta maior produtividade que o setor agrícola, logo com a migração da população observa-se aumento de produtividade. Segundo os autores em 1950, cerca de 63% dos trabalhadores brasileiros estavam na agricultura, 17% na indústria e 20% em serviços. Em 1980 os números haviam se modificado para 39% em serviços e 23% na indústria, restando 38% para o setor agrícola. Ferreira e Veloso continuam com os argumentos para justificar a PTF, utilizando uma relação de produtividade entre o setor agrícola e os demais setores. Segundo os autores em 1950 a produtividade agrícola correspondia a apenas 15% da produtividade da indústria e 12% da do setor de serviços. Nada mais natural do que observar ganhos de produtividade por uma nova alocação dos recursos. Desta forma fica claro que a resposta para a pergunta lançada alguns parágrafos atrás é não. O crescimento brasileiro não era sustentável e o motivo começou ainda dentro do mesmo ciclo de crescimento. Os autores chamam a atenção, mostrando que o processo de transformação estrutural apresentou distorções microeconômicas e de estabilidade macroeconômica. Isso em grande parte pelo II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), ocorrido na década de 70. O plano implementou várias barreiras à importação de bens intermediários e de capital. Diversos produtos tendo suas tarifas elevadas entre 30% e 100%. O II PND também proporcionou aumento significativo da participação do governo por meio de empresas estatais na produção de bens. Desta forma, segundo os autores houve declínio acentuado na quantidade de bens de capital importados no Brasil após 1974. Para mostrar numericamente Ferreira e Veloso colocam “Em 1985, as importações desses bens de capital corresponderam a apenas 19% da sua quantidade em 1974. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 147) 31 Adicionalmente, durante os anos 80 foi proibida a importação de computadores e tornou-se obrigatório a utilização de componentes produzidos internamente para a fabricação dos aparelhos. Segundo Ferreira e Veloso (2013, P. 148) tal regra atrasou a introdução de tecnologia de ponta em vários setores da economia. Os autores ainda concluem: “Como a importação de máquinas e equipamentos de países desenvolvidos é um canal importante de inovação tecnológica, a política de substituição de importações de bens de capital adotada no Brasil pode ter contribuído para a queda da taxa de crescimento da PTF. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 148). Desta forma existem evidências e arcabouço teórico para deduzir-se que o aumento da intervenção governamental e o fechamento da economia brasileira contribuiu para queda da PTF observada nos anos 80. Outro ponto citado pelos autores e que possui forte correlação com o colapso da PTF no Brasil nos anos 80 é a infraestrutura. Segundo os autores “[...] a infraestrutura tem um papel importante para a transformação estrutural, na medida em que facilita o deslocamento da atividade econômica para setores mais produtivos através de uma redução dos custos de transporte. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 149). A observação aqui é que a PTF e a produtividade do trabalho coincidem com os investimentos feitos no setor. “Os investimentos em infraestrutura no Brasil aumentaram vigorosamente até o final dos anos 1970 e depois caíram de forma acelerada, sem jamais recuperar os valores mais altos. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 149). Os autores citam como exemplo a capacidade de geração de energia, que aumentou 10,6% entre 1960 e 1980, mas apenas 3,5% entre 1980 e 2000. Durante todo este período o Brasil também passou por choques macroeconômicos que prejudicaram seu desempenho. O início destes desarranjos aconteceu com os choques do petróleo na década de 1970. Adicionalmente, no final da referida década Paul Volcker, chairman do Federal Reserve à época elevou os juros nos Estados Unidos com o intuito de combater a inflação naquele país. O movimento dos títulos americanos provocou a crise da dívida externa e a aceleração da inflação no Brasil nos anos 1980. Para Ferreira e Veloso (2013, P.149) “Isso gerou uma desorganizaçãoda economia que contribuiu para o colapso da PTF e do investimento. ” 32 A experiência brasileira também apresenta dois episódios onde medidas de política econômica causaram aumento de produtividade na economia. Foram eles o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) e as reformas dos anos 1990, sendo a principal delas a implantação do Plano Real em 1994. Segundo os autores a reforma do PAEG, realizada entre 1964 e 1967 buscou incentivar maior grau de abertura da economia brasileira. “[...] envolveram forte ajuste fiscal com redução dos gastos; ampla reforma tributária; criação do Banco Central e reforma do sistema financeiro; e, finalmente a implementação de diversas medidas para incentivar maior grau de abertura da economia brasileira ao comércio e ao movimento de capitais com o exterior. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 149) Os autores continuam o raciocínio argumentando que todas as medidas mencionadas anteriormente estão potencialmente associadas a um aumento da eficiência da economia. Segundo Ferreira e Veloso (2013, P.149) “Existem evidências de que a aceleração do crescimento do produto por trabalhador e da PTF entre 1968 e 1973 – o chamado “milagre econômico” – decorreu em boa medida das reformas institucionais do PAEG. ”. Na década de 1990 foram feitas outras reformas além da estabilização dos preços com o Plano Real. Houve também aumento do grau de abertura da economia, privatizações em serviços públicos como energia e telefonia, além da privatização de bancos estaduais. Para consolidar a estabilidade dos preços estabeleceu-se regimes de metas de inflação e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Estas reformas lançaram a base para o crescimento mais acelerado experimentado nos anos 2000. Até o momento podemos observar que os ganhos de produtividade se deram por uma melhor alocação de recursos (mudança estrutural econômica) e que o crescimento brasileiro não era sustentável nesta época (1950-1980). Desta forma o que explica a produtividade baixa do Brasil no período posterior? O que poderia ser feito para que o Brasil experimentasse uma PTF maior? O movimento de deslocamento da atividade econômica de setores menos produtivos para setores mais produtivos deve ser constante. Do ponto de vista de uma economia mais eficiente, empresas e agentes econômicos menos produtivos devem perder participação e até mesmo sair do mercado. Este processo deve ser natural e é importante para a melhora contínua da eficiência agregada. A medida que as firmas saem de cena seus recursos (físico e humano) devem ser alocados em empresas mais eficientes, o que melhora a eficiência agregada da economia. Quando este ciclo não funciona de forma correta, 33 empresas ineficientes continuam no mercado e absorvem recursos, comprometendo o crescimento potencial como um todo. Ferreira e Veloso (2013, P.153) utilizam estudo de Ferraz e Monteiro (2009) para mensurar o quanto a eliminação da ineficiência na alocação de fatores de produção entre as firmas elevaria a PTF brasileira. “[...] a eliminação da ineficiência na alocação de fatores de produção entre as firmas elevaria a PTF da indústria manufatureira em até 49%. Os ganhos potenciais de produtividade provavelmente são ainda maiores, já que os dados disponíveis no Brasil só permitem que seja feita uma estimativa para firmas com pelo menos 30 trabalhadores. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 153) Os autores citam que os dados relacionados a outras economias abrangem firmas com 10 ou mais funcionários, o que permite incluir na estimativa empresas com nível de produtividade mais baixo, fazendo o potencial de melhora na PTF ser ainda maior. De Vries fez um estudo para medir a ineficiência do setor varejista brasileiro. O autor chega a uma estimativa ainda maior neste setor do que no setor manufatureiro. “The gains in the retail sector appear much larger than in the manufacturing sector: allocating resources efficiently may boost total fator productivity (TFP) by more than 200 percent” (DE VRIES, 2009, P.4). Com estes dados podemos observar que o potencial para se elevar a PTF no Brasil era e é enorme. O motivo elencado pelos autores para explicar a razão da ineficiência na alocação de fatores entre as firmas no Brasil baseia-se nos trabalhos de Loayza e Servén (2010) e Restuccia (2009). Começando pela regulação excessiva do ambiente de negócios. “Por exemplo, uma estrutura tributária mal desenhada, que imponha altos custos de operação e de entrada em mercados, pode gerar elevada informalidade e excesso de firmas pequenas. Firmas pequenas e informais, via de regra, são menos produtivas, dado que têm pouco ou nenhum acesso ao crédito e oportunidades limitadas para inovar, treinar trabalhadores e crescer. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 153) O argumento dos autores é que estas empresas geralmente sobrevivem pela informalidade “Como não pagam impostos, possuem uma vantagem competitiva em relação às firmas formais, o que permite que sobrevivam mesmo sendo ineficientes. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 153). Desta forma podemos concluir que com o governo proporcionando um entrave burocrático empresas menos eficientes utilizam recursos que poderiam ser alocados de forma mais eficiente. 34 Outro argumento utilizado é que a regulação excessiva ajuda a tornar as recessões mais longas e eleva o impacto de choques adversos no produto. Segundo os autores isso ocorre porque a regulação dificulta a criação de empresas mais eficientes e torna mais difícil a saída de empresas menos produtivas. “Barreiras regulatórias à alocação eficiente de recursos entre as firmas, e à entrada e saída de firmas do mercado, podem explicar grande parte da diferença de PTF entre a América Latina e os Estados Unidos. Portanto, políticas que reduzam a regulação excessiva do ambiente de negócios podem contribuir para elevar a PTF na América Latina e, em particular, no Brasil. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 154) Para exemplificar a situação da qualidade institucional e das políticas no Brasil é interessante olhar comparativamente qual é a posição do país em rankings que medem estes pontos. Borges Ferreira (2012) utilizou em seu trabalho o Global Competitiveness Index (GCI) 2010 – 2011 elaborado pelo World Economic Forum. Segundo Borges Ferreira “O GCI é um índice composto, resultante da agregação de 111 indicadores, agrupados em 12 subíndices (os “pilares da competitividade”) ”. (2012. P. 9). O autor criou uma tabela que relaciona os 22 indicadores que o Brasil ficou posicionado no quintil inferior do ranking. A intenção é mostrar quais são as maiores deficiências do país quando medidos estes aspectos, a métrica do quintil inferior mostra apenas indicadores para os quais o Brasil apresentou desempenho inferior que pelo menos 80% dos países analisados. Na posição global o Brasil ficou com posição 53 em uma análise que possui 142 países. Borges Ferreira utiliza a tabela 2 para cruzar pontos que são considerados como favoráveis ao crescimento e dizem respeito às instituições e políticas adotadas. Considerando estes pontos, observa-se que as principais deficiências brasileiras que causam entrave ao crescimento segundo o autor são: (BORGES FERREIRA,2012. P. 10). “ (i) Tributação excessiva, (ii) Desperdício no gasto governamental, (iii) Deficiências da infraestrutura de transportes, (iv) Deficiências do sistema educacional, (v) Entraves burocráticos e regulatórios, (vi) Estrições ao comércio exterior, (vii) Rigidez do mercado de trabalho e (viii) Criminalidade elevada. ” 35 Segundo Acemoglu e Robinson “A solução para o fracasso econômico e político das nações, hoje, é transformar suas instituições extrativistasem inclusivas” (ACEMOGLU; ROBINSON,2012. P. 312). Ferreira e Veloso (2013. P155) interpretam que desta forma, a inclusão econômico-social permite a utilização da forma plena do talento das pessoas, ou seja, ao ser inclusivo termos mais agentes econômicos explorando o que realmente fazem bem ao invés de serem subutilizados em outras atividades. A inclusão possui duas formas de ocorrer, ou, dois canais como denominam os autores. A primeira, já discutida trata do ambiente de negócios e Tabela 2: Brasil - Índice global de Competitividade - 2011 Indicadores Posição do Brasil no Ranking Instituições Desperdicio no gasto governamental 136 Peso da regulação governamental 142 Custos para os negócios devidos ao crime e à violência 126 Crime organizado 120 Infraestrutura Qualidade das estradas 118 Qualidade da infraestrutura portuária 130 Qualidade da infraestutura de transporte aéreo 122 Ambiente Macroeconômico Spread da taxa de juros 137 Dívida pública 114 Educação Qualidade da educação primária 124 Qualidade do sistema educacional 115 Qualidade da educação em matemática e ciência 127 Eficiência do mercado de bens Extensão e efeito da tributação 142 Tarifa de impostos total, % lucros 133 Número de procedimentos para abrir um negócio 134 Número de dias para iniciar um negócio 138 Tarifas de importação 120 Entraves nos procedimentos aduaneiros 124 Importações como % do PIB 142 Efiência do mercado de trabalho Flexibilidade na determinação de salários 115 Índice de rigidez do emprego 118 Práticas de contratação e dispensa 128 Fonte: Extraído de Borges Ferreira, 2012, P. 19 - Dados World Economic Forum (2011) 36 facilitação do surgimento de novos empreendedores para o processo continuo de inovação e seleção natural dos agentes econômicos. A segunda passa pelo capital humano. O ponto a ser levantado é como fazer com que os agentes possam adquirir conhecimento que se encaixem com as suas habilidades? Isso envolve a qualidade da instituição com políticas de combate à pobreza, e condições de acesso à saúde e educação. A educação é ponto central quando se fala de capital humano. Além de ter contribuído para a queda da produtividade observada dos anos 1980 em diante, a falta de investimento em educação provoca outros problemas estruturais. Problemas, os quais podemos verificar no Brasil de hoje. Ferreira e Veloso (2013, P. 157) argumentam que pobreza e distribuição de renda estão diretamente ligados à educação. Os autores, utilizam o trabalho de Langoni (2005) para explicar como a falta de investimento em educação básica causou desigualdade social no período do “milagre econômico” (1968-1973). “Pobreza e distribuição de renda, por exemplo, estão ligadas diretamente à educação. A acirrada competição pela limitada força de trabalho com maior escolaridade provocou forte elevação de seus salários em relação aos dos demais trabalhadores. De fato, a pesquisa pioneira de Langoni mostrou que o aumento de desigualdade de renda na década de 1960 resultou de uma forte elevação da demanda por trabalho qualificado durante o “milagre econômico”. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 157) Os autores trazem dados para mostrar que a desigualdade social é conduzida pela desigualdade educacional. Segundo Ferreira e Veloso (2013, P. 157) “Outro fator que influenciou a piora da distribuição de renda foi o aumento da desigualdade educacional, parcialmente explicado pela assimetria de gastos entre níveis de ensino”. Os dados apresentados mostram que em 1950 o gasto por aluno do ensino fundamental era somente de 10% da renda per capita. Já em relação ao ensino superior o gasto era mais de sete vezes e meia o valor da renda per capita. Os autores ainda mostram a evolução até 1980. No referido ano, segundo Ferreira e Veloso “[...] ainda se gastava 15 vezes mais por aluno do ensino superior que do ensino fundamental. ” (2013, P. 156). O trabalho de Barros e Mendonça (1995) encerra a questão ao mostrar que tal desigualdade educacional pode explicar até 50% da desigualdade de renda no país. “Estima-se que, se os diferenciais de salário por nível educacional fossem eliminados, tudo o mais permanecendo constante, a desigualdade salarial no Brasil declinaria de 35 a 50%. Uma rápida revisão da magnitude da contribuição dos diversos componentes da desigualdade salarial investigados acima mostra, claramente, que a contribuição da educação é consideravelmente 37 maior do que a contribuição de qualquer forma de segmentação e discriminação ou demais características individuais investigadas (experiência no mercado de trabalho e na empresa). (BARROS; MENDONÇA. 1995. P.48) Na década de 1990 houve melhora na educação brasileira. Segundo Ferreira e Veloso (2013. P. 160) a escolaridade média da população com mais de 15 anos elevou-se para 7,5 anos em 2010 e em meados da década de 1990 o acesso ao ensino fundamental foi universalizado. A conclusão que a história recente do Brasil nos dá é que o crescimento econômico não está necessariamente ligado a melhora social. Observamos crescimento econômico rápido no período pós-guerra, que se exauriu em 1980. Este crescimento ocorreu, como já vimos, pela mudança estrutural da economia brasileira. Tal mudança por si só não garante crescimento por longo prazo, desta forma a justificativa para a queda da produtividade e consequentemente do crescimento da renda per capita no Brasil passa pelo não lançamento de bases para um crescimento sustentável ao longo dos anos. No período pós-guerra pouco se olhou para a educação e para a inclusão social. Adicionalmente optou-se por fechamento da economia e por intervenções governamentais no setor produtivo. O resultado colhido após 1980 foi desastroso. Com o início dos anos 1990 o Brasil começou a experimentar melhora em seus indicadores sociais, colhendo frutos de políticas e reformas implantadas anos antes. “Enquanto as melhorias ocorridas a partir de 1995 podem ser atribuídas à política de estabilização do Plano Real, aquelas observadas após 2003 estão relacionadas ao aumento da educação desde o início dos anos 1980. ” (FERREIA; VELOSO, 2013, P. 160). Desta forma podemos observar que para o crescimento ocorrer de forma sustentável e obter-se melhora nos indicadores é necessário lançar bases para o desenvolvimento futuro olhando com muito cuidado o capital humano e a produtividade. 2.3 COREIA DO SUL A Coreia é uma das nações independentes mais antigas do mundo. Para se ter uma ideia o T’aehak, primeira instituição educacional do país foi criada no ano de 372. A influência da cultura chinesa, tanto nas instituições governamentais quando nas 38 educacionais estimulou o crescimento dos estudos confucionistas entre a elite da população. A doutrina de Confúcio é guiada por princípios que segundo Masiero (2000. P. 4) influenciam a sociedade coreana. Segundo o mesmo autor é senso comum entre estudiosos que o Confucionismo também desempenhou papel importante para o desenvolvimento econômico na Ásia. Os princípios do Confúcio são: Fidelidade e respeito paternal, submissão da esposa ao marido, ordenamento social baseado na senioridade, confiança mútua nas relações humanas e lealdade absoluta aos governantes. A coreia desenvolveu-se basicamente sob influência chinesa, mas foi invadida pelo Japão em 1910. O relato de Kim (2005. P. 21) dá um panorama do desenvolvimento coreano até a invasão. “Ao contrário da maioria dos países em desenvolvimento criados sob a influência de potências coloniais do Ocidente, a Coreia manteve-se como Estado independente e unificado por mais de 1200 anos desde a dinastia Silla, que deixou um legado cultural admirável.
Compartilhar