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Artigo violencia nas escolas

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>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1844 
 
Violência Escolar No Brasil: Desafios Em Curso Na Educação Do 
Século XXI 
Cleide Ester de Oliveira1, Veralúcia Guiamarães de Souza2, Francisco Carlos de Oliveira3, 
Vanessa Gonçalves da Silva 4 
 
1 Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil, 
cleide.oliveira@blv.ifmt.edu.br; cleidester@hotmail.com 
 2Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil, 
veralucia.souza@blv.ifmt.edu.br 
 3Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil, f.oliveira@hotmail.com 
 4Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso IFMT/Brasil, 
Vanessa.silva@blv.ifmt.edu.br 
 
Resumo. Neste artigo busca-se apresentar o recorte de uma pesquisa que está sendo realizada, no Estado 
de Mato Grosso, em quatro cidades e seis escolas. Tem-se como objetivo geral analisar as ocorrências de 
bullying, no ambiente escolar. Dentre as questões, pontuamos as seguintes: Como se materializam as 
práticas discursivas dos alunos vítimas do bullying? Que efeitos de sentido produzem os discursos que 
humilham o outro por conta das diferenças? Tomamos como embasamento teórico a arqueogenealogia 
formulada por Michel Foucault para compreender as categorias teóricas: discurso, poder/saber/verdade e 
normatização. Adotou-se a abordagem qualitativa tendo como corpus para a análise os textos produzidos 
pelos estudantes do ensino médio no Brasil. Pôde-se perceber que as práticas discursivas dos participantes 
desta pesquisa se materializam em discursos de intolerância em relação aos que não se enquadram em 
padrões estabelecidos pela sociedade produzindo efeitos de sentido de autodesvalorização que afeta a 
autoestima e provoca sofrimento psíquico que pode trazer consequências graves. 
Palavras-chave: violência escolar; bullying; discursos; exclusão; normatização. 
 
 Scholar Violence: Current Challenges In The Education Of The 21st Century In Brazil 
Abstract. In this article, we present a survey that is being carried out in the State of Mato Grosso, in four 
cities and six school. It has as general aim to identify and analyze the occurrences of bullying in a scholar 
context. Among the the research questions, we punctuate: How do the discursive practices of students who 
are victims of bullying materialize? What effects of meaning do the discourses that humiliate the other 
because of differences produce? We take as theoretical basis an archaeogenealogy formulated by Michel 
Foucault to understand the theoretical categories: discourse, power / knowledge / truth and normatization. 
A qualitative approach was adopted for analyzing the corpus, the texts produced by high school students in 
Brazil. It was possible to notice that the discursive practices of the participants of this research materialize in 
discourses of intolerance in relation to those that do not fit in established standards by the society 
producing effects of sense of self-devaluation that affects the self-esteem and causes psychic suffering that 
can bring serious consequences. 
Keywords: scholar violence; bullying; discourses; exclusion; normatization. 
 1 Introdução 
A escola é, depois da família, o mais importante ambiente de socialização, sendo o espaço onde as 
crianças e os jovens passam boa parte do tempo e a sua função é educar, proteger e aprimorar seus 
estudantes no que se refere aos valores, ao respeito e ao exercício da cidadania e do direito de 
todos. No entanto, esse é um desafio que não tem sido fácil de enfrentar, já que os índices de 
violência, de norte a sul do país, são cada vez maiores no contexto da escola brasileira. 
É visível como os casos de violência nas escolas tem sido destaque na imprensa em todo o Brasil. As 
atitudes de violência no ambiente escolar afetam a integridade física e psíquica contribuindo para 
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1845 
 
um mau aprendizado e às vezes trauma por toda a vida na pessoa que sofreu ou ainda sofre essas 
agressões. 
Fazendo uma retrospectiva, um estudo realizado pelo MEC em parceria com a UNESCO, no ano de 
2003, mostrou que a violência no ambiente escolar foi crescente até então. Os atos delituosos e as 
pequenas e grandes demonstrações de incivilidades nas escolas chamam a atenção e provocam um 
sentimento de insegurança na comunidade escolar (Abramovay & Castro, 2003). Para esta autora, a 
escola, já naquela época, não representava um espaço seguro de integração social, de socialização, 
pois deixou de ser um espaço resguardado, uma vez que se tornou cenário de ocorrências violentas. 
O estudo intitulado Bullying em escolares brasileiros (Malta et al., 2012) que teve como objetivo 
descrever a vitimização e a prática de bullying em escolas brasileiras, analisou dados da Pesquisa 
Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada pelo IBGE em parceria com o Ministério da Saúde. 
Participaram da PeNSE escolares do 9º ano (8ª série) do ensino fundamental de escolas públicas e 
privadas do Brasil. Os autores do referido estudo enfatizam que: 
O bullying não deve ser considerado como uma característica normal do desenvolvimento das 
crianças e dos adolescentes, mas sim um indicador de risco para a adoção de comportamentos 
violentos mais graves, incluindo o porte de armas, agressões e lesões frequentes. A vivência do 
bullying expõe as crianças e os adolescentes à condição de vulnerabilidade. O bullying entre 
estudantes é, em geral, encontrado na maioria das escolas, independentemente das características 
sociais, culturais e econômicas de seus alunos. Estudos demonstram que se trata de um problema 
mundial, comum a diversos países e escolas. 
Por isso, considera-se de grande relevância estudar sobre o tema e procurar respostas para as 
questões da violência escolar que cotidianamente se vê nos noticiários. Já no início deste século, 
segundo Abramovay & Castro (2003), a violência escolar era um fenômeno preocupante porque 
atinge a todos os envolvidos: agressores, vítimas e os que assistem a essa violência e, sobre tudo, 
retira da escola o seu objetivo principal que é a promoção de conhecimento, de formação do ser, de 
educação, como veículo, por excelência, do exercício e aprendizagem, da ética e da comunicação por 
diálogo e, portanto, antítese da violência. 
Neste artigo busca-se apresentar um recorte de uma pesquisa que está sendo realizada no Estado de 
Mato Grosso, em quatro cidades e seis escolas (uma escola em Sinop, uma escola em Pontes e 
Lacerda, uma escola em Santo Antonio de Leverger e três escolas em Cuiabá). Dessa forma, este 
trabalho apresenta dados de uma escola que se localiza em Cuiabá por serem os primeiros coletados. 
Procura-se analisar um fenômeno que não é novo nas escolas, mas que vem ganhando contornos 
bem expressivos e chama a atenção para as relações humanas e sociais que se desenvolvem entre os 
pares – o bullying. Dentre as questões, pontuamos as seguintes: Como se materializam as práticas 
discursivas dos alunos vítimas do bullying? Que efeitos de sentido produzem os discursos que 
humilham o outro por conta das diferenças? 
 
1.1 O conceito de violência escolar 
Para que possamos aprofundar, primeiro devemos entender o conceito de violência. A violência na 
escola é um tema abrangente, pois sua tipificação e bem variada. Abramovay e Castro (2006) 
definem violências como atos reais que são visíveis, pois sangram, afetam órgãos, ressoam gritos e 
resultam em pessoas desfiguradas, ou seja, provocam dor, porém, de acordo com a autora nem 
todas as dores são físicas e, não necessariamente, todos sentem a dor com amesma intensidade e 
da mesma maneira, pois em cada época e em cada sociedade as representações e os sentimentos 
em relação à violência variam. E o mais complexo, em certos contextos, o que é terrível a um olhar 
estrangeiro, embasado em princípios de ética universal, não são tidos como violências pelos que dela 
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1846 
 
padecem, pois faltariam parâmetros, condições materiais, conhecimentos possíveis sobre outros 
horizontes, como a possibilidade de ser sujeito de direitos (p. 3). 
Por isso, não só no Brasil, mas em diversos países, os pesquisadores buscam conceituar a violência 
levando em conta a população alvo, ou seja, os jovens e o lugar da escola como instituição. Sendo 
assim, resumidamente, pode-se dizer que a violência “é todo ato que implica a ruptura de um nexo 
social pelo uso da força. Nega-se, assim, a possibilidade da relação social que se instala pela 
comunicação, pelo uso da palavra, pelo diálogo e pelo conflito” (Abramovay & Castro, 2006). 
Nessa perspectiva, Williams e Pereira (2010) afirmam que definir violência escolar não é uma tarefa 
fácil, uma vez que o que se caracteriza por violência depende de aspectos culturais, históricos e 
individuais, porém, as autoras apontam que a violência escolar engloba tanto a forma mais visível da 
violência, como agressão entre indivíduos, quanto a violência simbólica que se caracteriza por meio 
das regras, normas e hábitos culturais de uma sociedade desigual. 
 
1.2 O Bullying 
Convém refletir neste estudo, o termo bullying, já que este será o recorte desta pesquisa. Embora 
não seja um fenômeno novo, pois é do conhecimento de todos que sempre existiu dentro da escola, 
o termo pertence à língua inglesa, passou a ser usado no Brasil recentemente e tem sido objeto de 
estudos acadêmicos. O vocábulo só se tornou conhecido no Brasil por conta dos estudos acadêmicos 
iniciados nos Estados Unidos, nos anos 70. O significado da palavra bullying está relacionado com 
situações de abuso e intimidação que ocorre dentro ou fora da escola, ou seja, se refere a todas as 
formas de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e repetitivas com o objetivo de 
intimidar ou agredir outra pessoa sem que este tenha a possibilidade ou capacidade de se defender. 
Ocorre em uma relação desigual de forças ou poder (Eljach, 2011). 
Lemos (2007) explica que dentro da escola essa forma de agressão é dissimulada e tem 
consequências graves, pois os danos na vida dos envolvidos são irrecuperáveis e podem “destruir-
lhes a saúde psicológica e física, além de consequências como rebaixamento da autoestima, 
depressão e marginalização, pode estimular desejos e (atitudes) de suicídio e assassinatos” (p. 68). O 
agressor, segundo a autora, costuma estar em uma relação frente à vítima e dirigindo-lhe “ameaças, 
intimidações, apelidos maldosos, gozações, ofensas, intrigas, xingamentos, agressões físicas, 
discriminação, constrangimentos, perseguições, chantagem, dentre outros” (p. 72). 
Considerando a gravidade do problema, em 2011, a UNICEF publicou um estudo sobre violência 
escolar na América Latina e no Caribe onde mostra que a violência psicológica contra crianças e 
adolescentes e entre pares foi intensificada nos últimos tempos, principalmente as formas de 
violência relacionadas aos usos da tecnologia da comunicação e informação. O referido estudo 
evidencia o Brasil como um país onde o bullying é uma ocorrência comum. 
Uma pesquisa realizada por Ferrari (2010), na cidade de Juiz de Fora, mostrou como a humilhação 
surge nas definições de classe, raça e gênero e como ela serve para construir a noção da diferença e 
do diferente, a noção de pertencimento e de grupo como algo que configura a distinção entre o 
“nós” e “eles”. Para esse autor, as situações que relacionam violência e humilhação ao gênero, raça 
e classe no contexto da escola, nos proporcionam uma boa oportunidade para problematizar a 
formação desses conceitos, a hierarquização instaurada e como isso está na própria constituição 
dessas categorias e sujeitos. 
 
2. Teorização 
 
Discurso 
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1847 
 
No edifício teórico da análise do discurso, é ponto fundamental trazer os conceitos formulados por 
Michel Foucault (2008) no plano discursivo, uma vez que o autor deixa claro que o discurso luta pelo 
poder na sociedade, além de traduzir as lutas ou os sistemas de dominação, e é também a luta pelo 
poder do qual se quer apoderar. 
Nesse sentido, o que está na base desse conceito é a ideia de que em toda sociedade há um certo 
número de procedimentos que controlam, selecionam, organizam e redistribuem simultaneamente a 
produção do discurso (Foucault, 2008). A função desses procedimentos é a de “conjurar seus 
poderes e perigo, dominar seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível 
materialidade” (p. 9). Em nossa sociedade existem procedimentos de exclusão, sendo que a 
interdição é apontada por Foucault (2008) como a mais conhecida. A palavra proibida, a segregação 
da loucura e a vontade de verdade são os três sistemas de exclusão que afetam o discurso. Porém, 
para dar legitimidade a esses sistemas de exclusão, a vontade de verdade foi a mais enfatizada 
(Foucault, 2008) e tanto ela quanto outros sistemas de exclusão têm como apoio as instituições, pois, 
através de um conjunto de práticas, dentre elas a pedagogia, os sistemas de livros, as bibliotecas, as 
sociedades antigas e os laboratórios de hoje os reforçam e os reconduzem simultaneamente. Além 
disso, segundo o autor, esse sistema é reconduzido, também, pela forma como o saber é 
administrado em uma sociedade, como é valorizado, dividido e de certa maneira distribuído. 
O presente estudo tem como pressupostos teóricos e metodológicos a Análise do Discurso (AD). No 
livro Arqueologia do Saber, Michel Foucault (2008) concebe que é preciso acolher o discurso em sua 
dimensão de acontecimento, isto é, cada texto, cada palavra, por mais que se aproximem de outros, 
nunca são idênticos aos que os precedem. 
A análise arqueológica focaliza na dimensão de exterioridade dos discursos e busca suas condições 
de existência nas práticas discursivas, que são também práticas sociais. As práticas discursivas 
produzem saberes de diferentes tipos que as caracterizam e delimitam suas especificidades 
(Foucault, 2008). 
De acordo com esse autor, para compreender por que apareceram em certo tempo e lugar uma 
ciência, uma teoria, um conceito, valores, verdades, etc., é preciso atentar para as relações sociais 
que os tornaram discursos enunciáveis e visíveis, ou seja, situá-los em determinadas relações de 
poder. Nesse sentido, o saber se liga ao poder. Em síntese, analisar discursos significa, de acordo com 
Gregolin (2007), “tentar compreender a maneira como as verdades são produzidas e enunciadas” (p. 
15). 
Nessa perspectiva, a análise enunciativa é uma análise histórica e só pode se referir às coisas ditas, 
ao que foi pronunciado ou escrito, às performances verbais realizadas, pois a análise é feita no nível 
de sua existência e só se pode descrever as coisas ditas porque foram ditas (Foucault 2008). 
O conceito de discurso carrega em seu bojo a ideia de práticas discursivas, pois é nelas que o discurso 
se materializa. Foucault chama de práticas discursivas um conjunto de regras anônimas, históricas e 
determinadas no tempo e no espaço, que definem, em uma época dada, as formas como se devem 
enunciar os discursos. 
 
3. Metodologia 
 
Nesta pesquisa, adotou-se a abordagem qualitativa, uma vez que, segundo Minayo (2010), essa 
abordagem “se aplica ao estudo da história, das relações,das representações, das crenças, das 
percepções e das opiniões, produtos das interpretações que os humanos fazem a respeito de como 
vivem, constroem artefatos e a si mesmos, sentem e pensam” (p. 57). De acordo com essa autora, o 
método qualitativo é o que se adapta às investigações de grupos e segmentos delimitados e 
focalizados, de histórias sociais sob a ótica dos atores, de relações, de discursos e de documentos. 
Assim, este trabalho é recorte de um projeto de pesquisa em andamento no estado de Mato Grosso, 
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1848 
 
( uma escola em Sinop, uma escola em Pontes e Lacerda, uma escola em Santo Antonio de Leveger e 
três escolas em Cuiabá). Dessa forma, o recorte deste trabalho apresenta dados de 480 alunos de 
uma escola pública de ensino médio que se localiza em Cuiabá e se caracterizam como 
descritivos/interpretativos, balizados com instrumentos de geração de dados primários. 
Adotou-se esta metodologia porque ela possibilita o estudo do fenômeno para compreender a 
realidade de forma complexa e contextualizada por meio da subjetividade dos sujeitos-participantes 
da investigação e, pela possibilidade de retorno para os sujeitos participantes, uma vez que, na 
pesquisa qualitativa, é de praxe o retorno para a comunidade que participa do evento da pesquisa. 
Neste caso, para a análise das práticas discursivas dos alunos, foram utilizadas somente as questões 
abertas do questionário aplicado. Ressalta-se que dados primários, segundo Andrade (2003, p. 125), 
são aqueles coletados “diretamente no local de ocorrência dos fenômenos”, ao passo que os dados 
secundários provêm de outras fontes. 
A pesquisa qualitativa, segundo Deslandes (1994, p. 22), “trabalha com o universo de significados, 
motivos, aspirações, representações, valores e atitudes”. Isso implica estudo do mundo dos 
significados das ações e relações humanas, não tão perceptíveis e não tão captáveis com outro 
método de pesquisa. Assim, essa metodologia de pesquisa concebe a linguagem, as práticas e as 
coisas como inseparáveis, pois procura trabalhar com a vivência, com a experiência, com o dia a dia, 
com a compreensão das estruturas e instituições como resultantes da ação humana, tais como, a 
prática de bullying no contexto escolar. 
André (1995, p. 17) define pesquisa qualitativa como “o estudo do fenômeno em seu acontecer 
natural”, levando em consideração todos os componentes de uma situação em suas interações e 
influências recíprocas. Isso endossa a importância da pesquisa qualitativa para o estudo de 
representação discursiva e social de alunos de ensino médio que sofrem ou sofreram bullying. 
Nesse caso, Deslandes (1994), ao professar os pensamentos de Lévi-Strauss, argumenta que “numa 
ciência onde o observador é da mesma natureza que o objeto, o observador, ele mesmo, é uma 
parte de sua observação”. Deslandes deixa clara a existência de uma identidade entre sujeito e 
objeto, pois “a pesquisa nessa área lida com seres humanos que, por razões culturais, de classe, de 
faixa etária, ou por qualquer outro motivo, têm um substrato comum de identidade com o 
investigador, que os torna solidariamente imbricados e comprometidos” (Deslandes, 1994, p. 14). 
Afirmar que o pesquisador é neutro dentro desse contexto de pesquisa é negar a capacidade 
humana que o retrata em seu percurso diário. Sua ideologia está presente em suas ações. Dessa 
forma, o olhar que se dá ao objeto veicula interesse e visões de mundo, historicamente construídos 
pelos atores sociais, participantes e pesquisador, considerados, neste trabalho, como colaboradores. 
O trabalho de investigação pautado na pesquisa qualitativa promove um grande debate na academia 
acerca de validade e de controle de variáveis, pois parece começar, segundo Denzin & Lincoln (2006, 
389), “pelo distanciamento das narrativas e dos paradigmas únicos, de maior abrangência, 
ontológicos, epistemológicos e metodológicos”. Esse distanciamento ocorre porque alguns 
pesquisadores que trabalham com a pesquisa qualitativa acreditam em uma política de libertação. 
Assim, procuram estudar o mundo a partir da perspectiva dos indivíduos ou dos grupos que foram 
marcados pelas forças ideológicas, econômicas e políticas de uma sociedade ou de um momento 
histórico (Denzin & Lincoln, 2006, p. 390). 
Diante desse contexto, Denzin & Lincoln (2006, p. 389) esclarecem que os praticantes da pesquisa 
qualitativa “são suscetíveis ao valor da abordagem de múltiplos métodos, tendo um compromisso 
com a perspectiva naturalista e a compreensão interpretativa da experiência humana”, por isso ela é 
definida por uma série de tensões e contradições. Afirmam os dois autores (p. 391) que, no presente, 
a pesquisa qualitativa continua com quatro pontos principais em discussão: primeiro, “o pesquisador 
qualitativo não é um observador objetivo, oficial, politicamente neutro, que está fora ou acima do 
texto”. Segundo, os estudos de Bruner (1993, p. 1) asseveram que “o pesquisador qualitativo tem 
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1849 
 
uma posição histórica e situa-se localmente [como] um [observador] extremamente humano”. 
Terceiro, ainda, a partir das discussões de Bruner, veem que o “significado é plural, aberto e a 
política perpassa todo relato”. Quarto, “uma maneira correta de conceituar a investigação qualitativa 
é como um projeto cívico, participativo, colaborativo, que faz com que o pesquisador e os 
pesquisados envolvam-se em um diálogo moral contínuo”. 
Nessa perspectiva, Bauer & Allum (2003, p. 19) defendem a necessidade de o pesquisador distinguir 
quatro dimensões que descrevem o processo de pesquisa. 
Primeiro, é necessário o delineamento da pesquisa de acordo com seus princípios estratégicos. 
Segundo, há os métodos de coleta de dados, tais como, a observação, a entrevista e a busca por 
documentos. Terceiro, há os tratamentos analíticos dos dados, tais como, a análise de conteúdo, 
a análise retórica, a análise de discurso e a análise estatística. Finalmente, os interesses do 
conhecimento referem-se à classificação de Habermas sobre o controle, a construção de 
consenso e a emancipação e “empoderamento”. 
Primeiro, o delineamento da pesquisa perpassa a descritivo/interpretativa. Segundo, o método de 
coleta é questionário com questões fechadas e abertas, por ora usadas apenas as questões abertas. 
Terceiro, os dados são tratados sob o olhar da Análise de Discurso. Quarto, os interesses em todo 
esse conhecimento referem-se às categorias teóricas: discurso, poder/saber/verdade e 
normatização. Após a conclusão da pesquisa, há o retorno para a comunidade que participou da 
pesquisa. Neste trabalho, especificamente, a comunidade será contemplada com palestras de 
psicólogos e com ações diretas com os alunos para mitigar a presença de bullying no contexto 
escolar. 
 
3.1 O corpus 
Este trabalho apresenta o recorte de uma pesquisa que está sendo realizada em cinco escolas de 
ensino médio no estado de Mato Grosso ( uma escola em Sinop, uma escola em Pontes e Lacerda, 
uma escola em Santo Antonio de Leveger e três escolas em Cuiabá). Foram selecionados os textos 
produzidos pelos alunos do questionário aberto apenas de uma das escolas que se localiza em 
Cuiabá. Assim, pôde-se observar os discursos que emergem das práticas discursivas dos estudantes 
que sofreram ou sofrem bullying no contexto desta escola. 
O projeto de pesquisa está registrado no Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE: 60165016. 
0.0000.5165|) com o termo de autorização e de consentimento aprovado, encontra-se em 
andamento desde agosto de 2016 e encerrará em agosto de 2018. Antes de aplicar o questionário,foram lidos os termos com o respectivo objetivo da pesquisa, bem como a explicação quanto à 
utilização dos dados gerados. 
 
3.2 Procedimentos 
Após a aplicação de um questionário com perguntas fechadas e duas abertas, apresentadas a seguir 
somente as perguntas abertas porque são as de interesse neste trabalho. 
1.Você já sofreu ou viu alguém sofrer Bullying na escola? Relate o ocorrido. 
2.Você tem alguma sugestão para acabar com Bullying? 
Escolheram-se os textos que mais representavam o universo do contexto por ora estudado, 
separando-os pelas categorias mais recorrentes nas vozes dos alunos. 
Em seguida, os textos foram transcritos sem identificação e em sua originalidade, sem efetivar 
quaisquer alterações, sejam de norma, sejam de conteúdo. 
 
3.3 Participantes 
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1850 
 
Os participantes são 480 alunos de Ensino Médio do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de 
Mato Grosso – Campus Cuiabá Bela Vista (IFMT), na faixa etária entre 16 e 18 anos, em sua maioria, 
pertencentes à classe média. 
 
3.4 Análise de dados 
Para analisar as práticas discursivas de ocorrência de bullying em contexto escolar, utilizou-se a AD 
proposta por Foucault (2008), a partir das categorias teóricas: discurso, poder/saber/verdade e 
normatização. O presente estudo tem a finalidade de analisar as práticas discursivas dos estudantes 
que sofreram ou sofrem o bullying na escola e os efeitos de sentido produzidos pelos discursos que 
humilham o outro por conta das diferenças. São essas as questões que norteiam a identificação dos 
sentimentos de aversão, rejeição e exclusão. 
 
4. Analisando os dados 
 
A referida análise partiu do objetivo da pesquisa, identificar e analisar as ocorrências de bullying, a 
partir das práticas discursivas dos estudantes que o sofreram ou o sofrem no contexto da escola. 
Procurou-se confrontar os diálogos entre teóricos e o que a literatura trata a respeito do tema, em 
busca das suas correlações. Assim, pôde-se constatar que a prática de bullying relacionada à 
aparência física, classe social e sexualidade são as mais recorrentes entre os adolescentes. 
As práticas discursivas desses alunos nos apontam a existência de uma vontade de verdade que tem 
como suporte as instituições que fomentam e disseminam tais conceitos para alimentar um sistema 
que tem por finalidade a exclusão. Essa constatação vem ao encontro do que aponta Foucault (2011), 
pois a vontade de verdade foi um dos sistemas de exclusão mais enfatizado por esse autor, uma vez 
que tem como apoio as instituições e, através de um conjunto de práticas, dentre elas a pedagogia, 
os sistemas de livros, as bibliotecas, as sociedades antigas e os laboratórios de hoje reforçam e 
reconduzem esses sistemas simultaneamente. 
Vê-se, a partir dos enunciados, um ritual que determina propriedades singulares e papéis 
preestabelecidos para os sujeitos que falam, seja no discurso racista, no discurso elitista, no discurso 
de padrão de beleza ou no discurso homofóbico, eles possuem a função de produzir, conservar e 
distribuir esses discursos (Foucault, 2008). Assim, apresentamos a seguir o quadro 1 que resume as 
categorias discursivas presentes nos discursos dos alunos: 
 
Quadro 1 – Resultado parcial dos questionários aplicados com questões fechadas e abertas 
 
Tipos de discursos Ocorrências 
Discurso de 
padrão de beleza 
145 
Discurso 
homofóbico 
115 
Discurso racista 103 
Discurso elitista 64 
Outros 53 
 
A partir dos dados acima, colocou-se como foco para análise das práticas discursivas a questão: Você 
já sofreu ou viu alguém sofrer Bullying na escola? Relate o ocorrido. Foram escolhidos os textos que 
mais representavam o universo do contexto por ora estudado, separando-os pelas categorias mais 
recorrentes nas vozes dos alunos. Vejamos os excertos abaixo: 
>>Atas CIAIQ2017 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 
 
 
 
1851 
 
 
Excerto 1 
Eu já sofri bullying. Sempre fui um pouco acima do peso e isso fez com que alguns alunos da escola 
começaram a inventar apelidos de mal gosto e isso acabou me deixando um pouco mal. Tenho às 
vezes alguns distúrbios alimentares e nunca confio em mim mesmo. 
 
Excerto 2 
Já vi minha irmã sofrer bullying. Por ser gordinha e porque usava tampão, e com isso as crianças 
chamavam ela de pirata, de bujão, de tantas coisas que ela chegava chorando em casa falando que 
não iria mais, nisso ela ficou 2 meses sem ir pra aula. 
 
Chama-nos a atenção nas falas acima, a questão relacionada ao padrão de beleza imposto, 
atualmente, por diversos meios de comunicação: revistas, jornais, programas de televisão, rádio, 
cinema, Internet e também nas relações cotidianas. Percebe-se em nossa sociedade, um interesse 
exacerbado de homens e mulheres em busca do “corpo ideal”. O que marca a diferença, neste caso, 
é o fato das vítimas estarem acima do peso. Os agressores assimilam o discurso, cujo sentido que se 
constrói sobre determinado padrão de beleza, é o de que ser belo significa ser magro e que o 
indivíduo que foge a esse padrão merece ser humilhado. Esses discursos passam ter um valor de 
verdade sobre o que é ser belo. 
Por outro lado, observa-se no excerto abaixo, que há um limite também para a magreza. A vítima, 
nesse caso, era humilhada por ser muito magra e alta, ou seja, o padrão ideal estabelece também 
um limite para a magreza. Vejamos: 
 
Excerto 3 
Fazem bullying comigo quando eu era mais nova, porque eu era muito magra e alta daí me 
chamavam de vários apelidos, perna longa, e sempre faziam mesmo quando eu pedia para parar. 
Diziam que era brincadeira, mas eu não achava isso nem um pouco legal. 
 
Pode-se constatar que estar fora do padrão normativo em relação ao peso, muito gordo ou muito 
magro, estabelece uma forma de desigualdade que coloca o outro em uma posição inferior. A 
afirmação por parte dos agressores que era uma ”brincadeira” é uma forma de legitimar ou 
naturalizar a violência corroborando com a definição de Bordieu e Passeron (1975) sobre o conceito 
de violência simbólica como uma forma de violência que se expressa de forma dissimulada. 
São construídos discursos normativos sobre o corpo. Foucault (2008) explica que há uma ordem no 
discurso e para entrar nela há certas exigências, dentre as quais quatro regras são destacadas pelo 
autor: os rituais da palavra, as sociedades do discurso, os grupos doutrinários e as apropriações 
sociais, pois existe um ritual que determina propriedades singulares e papéis preestabelecidos para 
os sujeitos que falam. Assim, para que o controle funcione, é preciso uma “Sociedade do Discurso” 
que carregue a função de produzir, conservar e distribuir os discursos de acordo com as regras 
estritas. Nos excertos abaixo temos o bullying de cunho racial: 
 
Excerto 4 
Nunca sofri, não que eu me lembre, mas várias vezes vi pessoas olhando feio para pessoas com pele 
escura e até mesmo negros. 
Excerto 5 
Maltrataram um colega por conta da sua raça/cor. 
Excerto 6 
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Sim. Devido a minha característica física, principalmente, no que diz respeito ao meu cabelo e nariz, 
muitos “colegas de classe” não me deixavam concentrar na sala de aulaao som de apelidos 
acompanhados de objetos atirado na minha pessoa pelos mesmos. 
Pode-se perceber que, embora haja uma luta contínua para eliminar ou pelo menos mitigar os 
conflitos raciais na nossa sociedade, os reflexos dessa desigualdade refletem na escola. A cor da pele, 
o tipode cabelo, o formato do nariz que caracterizam a raça negra, serve de pano de fundo para 
marcar a desigualdade. Os agressores se colocam na condição de superioridade por conta da cor da 
pele mais clara em relação aos outros de pele escura. Esses discursos de inferioridade das pessoas de 
pele escura foram historicamente construídos. As condições históricas de construção dos discursos 
sobre os negros como raça inferior tem sua origem no sistema escravocrata que fez parte da nossa 
história, de forma que esse grupo, de maneira geral, foi rebaixado à categoria de “mercadoria” e 
mesmo de “coisa”, num processo de “coisificação” que atingiu profundamente os negros e, mesmo 
com o passar dos anos, essa visão não foi abolida da realidade social na contemporaneidade. 
O excerto abaixo marca a presença do bullying homofóbico: 
 
Excerto 7 
Já vi alguém sofrer bullying na escola por conta da sua opção sexual. 
 
O bullying homofóbico caracteriza-se como um dos problemas mais complexos na sociedade atual. 
Conforme Borillo (2010), a homofobia é uma prática que está arraigada na nossa sociedade e 
configura-se como uma forma de exclusão legitimada por instituições no campo religioso, 
educacional, jurídico e social, constituída dentro de uma lógica perversa sustentada por discursos 
historicamente construídos. Uma pesquisa realizada em 2009 pela Faculdade de Economia, 
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) apontou que, no Brasil, 87% 
da comunidade escolar – sejam alunos, pais, professores ou servidores – têm algum grau de 
preconceito contra homossexuais (UNESCO, 2011). Ainda hoje, vivenciamos casais de gays sofrerem 
violência física, e muitas vezes, essa violência parte de próprios familiares. 
Nos excertos abaixo, percebe-se também o bullying por problemas físicos, poder aquisitivo e por 
vestimenta que caracteriza o caipira, como se a pessoa pudesse escolher somente qualidades e fosse 
proibida de usar a vestimenta que se sente bem, conforme segue: 
 
Excerto 8 
Quando mais nova, eu tinha um problema na formação nas pernas, assim não me permitiam fazer 
nenhum exercício físico, assim meus colegas riam de mim, e colocavam apelidos maldozos. 
 
Excerto 9 
Sim, nesse ano vi alguns meninos da sala querendo crescer emcima de outros só porque veio do 
interior e vestia bota e fivela... 
Outra situação são zoeiras nas redes sociais que houve ano passado onde falaram dos dentes de uma 
caloura e mentiram sobre um professor. 
 
Excerto 10 
Sim com uma amiga estavam agredindo-a verbalmente apenas porque não tinha um celular com 
redes sociais, achei muito besta o que estavam fazendo e acabei entrando na conversa e defendendo 
minha amiga aí elas pararam. 
 
Essas falas relacionam agressão, discriminação por fatores diversos e que marcam as diferenças por 
questões relacionadas problemas físicos, diferenças geográficas, classe social e poder aquisitivo que 
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estão permeando o cotidiano escolar. Nesses momentos, vêm à tona aspectos da pessoa como, por 
exemplo, a situação financeira das famílias, sendo utilizada em alguns momentos como motivos para 
agressão e mesmo para diferenciar uns dos outros. 
A relação da posição do sujeito com os lugares institucionais, conforme explica Foucault (2008), é 
que define o sujeito, ou seja, o lugar de onde fala, entendendo lugar não no sentido geográfico, mas 
como um espaço em que se implicam mutuamente as relações de saber/poder/verdade (Foucault, 
2008). 
O lugar discursivo de onde os sujeitos falam remete a duas situações, ou seja, temos o sujeito que 
pratica o bullying na escola e o sujeito que o sofre. O lugar social de onde os estudantes que sofrem 
o bullying falam não é um lugar de empoderamento, mas de fragilidades, já que como adolescentes 
estão em um momento de formação da personalidade e, por isso, internalizam facilmente os 
discursos sobre padrões estabelecidos pela mídia e pela sociedade em geral como o ideal, o que faz 
eles se sentirem à margem de outros grupos. Isso se constata nos excertos abaixo: 
 
Excerto 12 
Eu já sofri bullying durante o ensino médio. Eu era excluído e as pessoas não gostavam de ficar perto 
de mim e quando eu chegava perto delas, elas se retiravam ou fazião que eu saísse. Isso começou 
porque um dia de educação física, eu avia esquecido de passar desodorante e devido a isso fiquei com 
um odor um pouco forte. Por causa disso eu sofri bullying por quase um ano. 
Depois disso não conseguir fazer amigos com facilidade. Atualmente não sofro mais bullying , sofro 
apenas as conseqüências. 
 
Excerto 13 
Já sofri durante todo meu ensino fundamental. Tive que fazer acompanhammento com psicólogo. O 
tratamento com o psicologo juntamente com apoio de calmante. 
Sento-me rejeitado dentro da sala de aula, queria até sair da escola, algumas pessoas fazem com que 
outras se afastem de mim, o motivo não sei. 
Recebo agressões verbais, e as pessoas (alguns colegas de sala) só ficam comigo, quando precisam de 
algo. 
Pode-se perceber que as práticas discursivas dos participantes desta pesquisa se materializam em 
situações humilhantes que se traduzem em angústia e produzem um efeito de sentido de 
autodesvalorização que afeta a autoestima e provoca sofrimento psíquico que pode trazer 
consequências graves. 
Conclusões 
Com este estudo, pôde-se comprovar que vivemos em uma sociedade normalizadora. As vítimas do 
bullying são geralmente descritas como pessoas que apresentam alguma diferença em relação ao 
grupo, como uma característica física, ou portadora de alguma limitação física ou mental, não possuir 
objetos de consumo que indicam status socioeconômico superior e estar fora do padrão 
heteronormativo. 
Nesses relatos, percebe-se que essas formas de violência trazem um prejuízo emocional e psicológico 
tão ou mais grave quanto à violência física e devem ser combatidas na escola com a mesma força 
que qualquer outro tipo de violência. 
Percebe-se uma relação de poder/saber que se materializa nas práticas discursivas dos estudantes 
que praticam o bullying como discursos de verdade sobre padrões pré-estabelecidos. Os que 
humilham os seus pares assumem a posição de sujeitos “normais” enquanto as vítimas, que estão no 
lugar do humilhado, são os “anormais”, ou seja, muito magros, muitos gordos, pele escura, defeitos 
físicos, sexualidade, odores, baixo poder aquisitivo. Sendo assim, pode-se dizer que os discursos que 
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resultam na prática do bullying se inscrevem em uma formação discursiva que produz um efeito de 
sentido em que se reconhecem as diferenças e promovem a exclusão de indivíduos e/ou grupos e, de 
certa forma, naturalizam os atos de humilhação. Conforme explica Foucault (2011), os discursos que 
sustentam essa ideia operam de uma forma estratégica com mecanismos de controle e de 
normatização. 
A constatação desse estudo é a de que a discriminação é o pano de fundo do bullying entre pares. 
Esse é um dos maiores desafios na luta pelos direitos humanos e um problema que acreditamos ser 
de todos. É possível que as atitudes discriminatórias das crianças e jovens sejam imitadas e 
aprendidas no mundo adulto, no ambiente em que eles se desenvolvem onde vivenciam situações de 
abuso de poder e de desigualdades. 
Nesse sentido, acreditamos que é preciso pensar em um modelo educacional que deixe de 
reproduzir a lógica de exclusão, pois o bullying no contexto da escola compromete a inclusão 
educacional e a qualidade de ensino, já que os conflitos referentes às diferenças ganham contornos 
mais expressivos no espaço da escola.É no ambiente escolar, depois do ambiente familiar, que 
ocorre o processo mais importante de socialização, sendo também um lugar de embates e 
enfrentamentos em relação à aceitação das diferenças. O ambiente escolar deve buscar alternativas 
para que deixe de ser reprodutor de injustiças para ser um espaço de transformação. 
As sugestões dos alunos pesquisados para acabar com o bullying na escola são as mais variadas. Vão 
desde punições mais severas para os que o praticam até a promoção de debates, rodas de conversas, 
reuniões com os pais, palestras e jogos interativos. 
Enfatizamos que o papel da escola na luta contra a intolerância é fundamental e diz respeito a todos 
os cidadãos. 
Várias podem ser as limitações deste estudo: poderia ter se expandido mais com a identificação dos 
alunos que sofreram o bullying em contexto escolar para, em seguida, solicitar uma narrativa de vida 
deles para compreender melhor o fenômeno. Com as questões abertas, foi possível identificar as 
ocorrências de bullying, mas não a compreensão mais verticalizada da ocorrência do fenômeno. Ao 
aplicar o questionário, os alunos não foram avisados, assim teve-se que voltar várias vezes na sala de 
aula para obter o questionário do aluno que não estava presente. Pode ser que ao dar o retorno para 
a comunidade escolar, não haja espaço físico suficiente para as palavras com a psicóloga, uma vez 
que as escolas públicas de Mato grosso, em sua maioria, não possuem auditório. 
 
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