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NOÇÕES BÁSICAS DE ECLESIOLOGIA

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INTRODUÇÃO À TEOLOGIA II 
 
2º MÓDULO 
NOÇÕES BÁSICAS DE ECLESIOLOGIA 
Pe. Adenilson S. Ferreira 
Apostila Ad usum scholarum 
1
o
. Semestre/2015 
NOÇÕES BÁSICAS DE ECLESIOLOGIA 
 
 
1 DELINEAMENTO 
 
 
Entende-se por “Eclesiologia” o tratado ou a parte da Teologia que estuda o 
mistério da Igreja: sua origem, sua natureza, sua constituição, sua missão, sua relação com o 
mundo e tantos outros aspectos relacionados com sua vida. 
Como observa Salvador Pié-Ninot, “os estudos atuais sobre a história da 
Eclesiologia estão de acordo em situar o verdadeiro nascimento do tratado ‘De Ecclesia’ na 
obra de Tiago de Viterbo, ‘De Regimine Christiano’, publicada em 1301-1302”1. 
Portanto, o referido tratado não remonta às origens do Cristianismo, mas, surgiu 
na Idade Média. Mesmo no Novo Testamento, ainda que várias passagens façam referência a 
sua existência, não se encontra qualquer sistematização de uma doutrina sobre a Igreja
2
. 
Isso não significa que anteriormente os cristãos não tivessem uma consciência 
viva, clara e precisa do que é a Igreja. De acordo com Pié-Ninot, nos primeiros séculos, a 
Eclesiologia era mais vida e consciência do que teologia sistemática
3
. Como a Igreja estava 
presente em todas as suas reflexões e ainda era uma presença fortemente afirmada na 
sociedade, um tratado particular sobre ela seria desnecessário
4
. 
Porém, parece evidente que seu surgimento se fez inevitável quando ela começou 
a ser questionada (por diversos fatores) na história: “em todas as épocas houve problemas 
com a Igreja. Nem poderia ser diferente quando a ação divina é veiculada pela atuação 
humana, sempre caracterizada por fraqueza, imperfeição, falibilidade e maldade”5. 
 
Somente na Idade Média [...] é que se firmou a necessidade de estudar de 
maneira orgânica, a Igreja, também sob o aspecto estritamente institucional. 
É verdade que o Oriente teve de enfrentar, muito cedo as dificuldades do 
cesaropapismo e combater suas batalhas para afirmar a autonomia 
institucional da Igreja diante do poder imperial. Mas a configuração gradual 
desses problemas, durante a segunda metade do primeiro milênio, não 
 
1
 PIÉ-NINOT, Salvador. Introdução à Eclesiologia. São Paulo: Loyola, 1998, p. 13. 
2
 Cf. LELL, Joachim. Igreja/Eclesiologia. In: EICHER, Peter (dir.). Dicionário de Conceitos Fundamentais de 
Teologia. São Paulo: Paulus, 1993, p. 368. 
3
 Cf. PIÉ-NINOT, S. Introdução à Eclesiologia, op. cit., p. 14. 
4
 Cf. BOUYER, Louis. La Iglesia de Dios: Cuerpo de Cristo y Templo del Espíritu. Madrid: Studium, 1973, p. 
19-20. 
5
 WIEDENHOFER, Siegfried. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, Theodor. Manual de Dogmática. 4. ed. 
Petrópolis, Vozes: 2009, 4. v, p. 50. 
impediu nem perturbou a ampla e rica meditação que os grandes Padres da 
Igreja constantemente fizeram sobre a realidade eclesial, contemplando o 
mistério da graça e da eleição divina que nela assume forma e se manifesta. 
Fizeram-no utilizando principalmente imagens, semelhanças, metáforas, a 
linguagem da contemplação e da oração, e estavam pouco interessados em 
buscar, eventualmente, na filosofia política do mundo antigo, esquemas 
conceituais elaborados, nos quais pudessem enquadrar a Igreja e sua 
presença no mundo. O mistério da graça estava ali, onde não alcançavam os 
problemas institucionais, a presença de Cristo em seu corpo que é a Igreja, a 
ação do Espírito nela, sua correspondência ao desígnio salvífico do Pai, 
despertando a reflexão e ativando um discurso que, a respeito desses temas, 
se valia das linguagens da poesia e da mística, quando não mesmo da 
mitologia, mais do que dos raciocínios conceituais
6
. 
 
De qualquer forma, algumas perguntas parecem inevitáveis: O que é a Igreja? Por 
que tenho que crer nela? Por que aceitar sua mediação e não relacionar-se diretamente com 
Cristo? Que garantias há de que Cristo fundou a Igreja e de que ela não seja simplesmente 
uma iniciativa humana? Qual é sua finalidade? 
Ainda que não se pretenda oferecer um curso completo de Eclesiologia, mas, 
“noções básicas”, o presente estudo deverá se deter apenas a algumas questões: a origem e a 
natureza da Igreja, sua existência como condição para a fé em Cristo Jesus e, por fim, o 
estudo de um texto do então Cardeal Ratzinger sobre sua manifestação no mundo como “uma 
comunidade a caminho”. 
 
 
2 A ORIGEM E A NATUREZA DA IGREJA 
 
 
Para compreender a origem e a natureza da Igreja, a Eclesiologia necessariamente 
deve considerar sua relação com Jesus. Para isso, parte-se do estudo da Igreja, enquanto 
fenômeno histórico originado no movimento de Jesus, para depois, proceder a análise de sua 
natureza a partir de algumas imagens e símbolos provenientes do Novo Testamento e da 
Tradição cristã. 
 
2.1 Jesus, o Reino de Deus e a origem da Igreja 
 
A questão da origem da Igreja é um dos temas clássicos da Eclesiologia, porque, 
segundo Rufino Velasco, trata-se de um tema “fontal” e “radical”. 
Fontal (grifo do autor), não somente porque estuda a fonte original da Igreja, 
como algo que nos remete ao passado, mas sobretudo porque desta fonte a 
 
6
 DIANICH, Severino; NOCETI, Serena. Tratado sobre a Igreja. Aparecida: Santuário, 2007, p. 175-176. 
4 
 
Igreja continua nascendo sempre, e é portanto um tema de suma atualidade 
em qualquer momento histórico da Igreja. Radical (grifo do autor), porque se 
refere às raízes e fundações colocadas no princípio, base a partir de onde a 
Igreja deve crescer e para onde deve retornar sempre. Nesta perspectiva, 
nosso tema é de grande interesse em muitos sentidos: antes de tudo, por 
obrigar constantemente a Igreja a uma poda histórica de toda frondescência 
que não se nutra dessas raízes...
7
 
 
O entendimento tradicional sobre a origem da Igreja se fixou basicamente em 
demonstrar sua fundação como obra do próprio Jesus. Para ser mais preciso, os manuais 
clássicos afirmam que o Filho de Deus sabia, desde o início, que tinha de fundar a Igreja. 
Aliás, asseveram que esta é a grande obra para qual foi enviado ao mundo: edificar sua 
Igreja
8
. É claro que esse enfoque levanta muitos problemas na atualidade
9
. Ainda que não haja 
espaço para apresentar todas as críticas feitas a ele ao longo da história, cabe expor, 
sumariamente, uma das questões de maior relevância: 
 
Pergunta-se se é possível falar-se de uma instituição da Igreja por um Jesus 
pré-pascal, ou então se se deve pensar no evento da eclesiogênese como 
posterior à Páscoa. Em outras palavras, se existe um anúncio que dá vida à 
Igreja, é ele o anúncio do Reino que constituiu o coração da pregação de 
Jesus, ou então o anúncio de sua ressurreição, feito pelos discípulos?
10
 
 
Torna-se muito comum na atualidade a oposição entre Jesus Cristo e a Igreja. Por 
exemplo, no início do século XX, o teólogo e filósofo francês Alfred Loisy (1857-1940), 
modernista, afirmara: “Jesus pregou o reino de Deus, e o que veio foi a Igreja”11. Com essa 
frase, quis dar a entender que a Igreja não foi desejada por Deus. 
Segundo o Cardeal Joseph Ratzinger, é possível compreender o pensamento de 
Loisy, quando se observa que Jesus, em sua mensagem, não anunciou imediatamente o 
advento da Igreja, mas do Reino de Deus. Pode-se constatar ainda alguns dados estatísticos: 
existem 122 passagens do Novo Testamento sobre o Reino de Deus (das quais 99 pertencem 
aos Evangelhos Sinóticos e 90 são diretamente palavras de Jesus)
12
. 
Além disso, é curioso “o fato de os evangelhos não falarem de Igreja, a não ser 
por apenas duas vezes (Mt 16,18 e 18,17), e em uma delasa Igreja é anunciada como um 
 
7
 Cf. VELASCO, Rufino. A Igreja de Jesus: Processo histórico de Consciência Eclesial. Petrópolis: Vozes, 
1996, p. 23. 
8
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 17. 
9
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 19-22. 
10
 DIANICH, S.; NOCETI, S. Tratado sobre a Igreja, op. cit., p. 236. 
11
 LOISY, Alfred. L’évangile et l’Église. Paris: Picard, 1902, p. 111. 
12
 Cf. RATZINGER, Joseph. Compreender a Igreja hoje: vocação para a comunhão. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 
2006, p. 13-14. 
acontecimento futuro, não como algo já existente”13. Mas, esse último aspecto não seria um 
problema: “indicar como sua origem o tempo depois da Páscoa, não significa dizer que ela é 
estranha aos projetos de Cristo, mas significa vê-la inteiramente solidificada pela mudança 
decisiva que a obra do Senhor sofre em sua morte e ressurreição”14. Mas, será preciso retomar 
essa questão depois. 
De qualquer forma, 
 
o interesse pela questão foi suscitado pelo fato de se haver suspeitado que a 
pregação de Jesus, na verdade, é incompatível com a existência da Igreja, 
que teria tido sua origem não nele, mas até contra sua vontade, porque o 
objeto único e imediato do anúncio do Reino...
15
 
 
Assim, a questão a ser investigada é se a fundação da Igreja corresponde ou não à 
intenção de Cristo. Para isso, faz-se necessário buscar o testemunho do Novo Testamento, a 
partir da consideração de alguns fatos – ao menos os que parecem mais relevantes. 
De acordo com os Santos Evangelhos, realmente, o Senhor Jesus começou sua 
obra proclamando a iminência do Reino de Deus e convidando o povo à conversão (cf. Mc 
1,14s)
16
. Porém, tal proclamação inaugurou um movimento peculiar: na Palestina, no século 
primeiro da era cristã, no contexto de seu povo judeu, iniciou um grupo de discípulos que 
desencadeou o processo histórico assumido como origem e fundamento da Igreja
17
. 
Portanto, “é inegável que a pregação de Jesus reuniu muitas pessoas, desde a 
multidão dos simpatizantes que se ajuntou ao grupo maior dos discípulos, até o grupo 
escolhido dos Doze”18. Como observa Joseph Ratzinger, 
 
... Jesus, plenamente, nunca se entende como indivíduo isolado. Ele veio, 
com efeito, para congregar os que estavam dispersos (cf. Jo 11,52; Mt 
12,30). Por isto toda a sua obra consiste em reunir o novo povo. Aqui 
aparecem já dois elementos de grande importância para a compreensão 
futura da Igreja: o dinamismo do tornarem-se Um, da mútua aproximação 
através do encontro com Deus, é, para Jesus, específico do novo povo de 
Deus. E mais ainda: o mais íntimo ponto de reunião deste novo povo é 
Cristo: este povo só se tornará verdadeiramente povo enquanto for chamado 
por Cristo e responder à sua chamada, à sua Pessoa
19
. 
 
 
13
 DIANICH, S.; NOCETI, S. Tratado sobre a Igreja, op. cit., p. 236. 
14
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 237. 
15
 IDEM, Ibidem, loc. cit. 
16
 Cf. VELASCO, R. A Igreja de Jesus, op. cit., p. 23. 
17
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 23-24. 
18
 DIANICH, S.; NOCETI, S. Tratado sobre a Igreja, op. cit., p. 236. 
19
 Cf. RATZINGER, J. Compreender a Igreja hoje, op. cit., p. 14. 
6 
 
Como fora afirmado nos estudos de Cristologia, todos os exegetas estão de acordo 
que a pregação de Jesus está centrada no anúncio do Reino de Deus. Porém, não se pode 
negligenciar que Jesus, junto com a pregação do Reino, buscava ao mesmo tempo a formação 
de uma comunidade, pois concebia a realização do Reino de Deus numa comunidade unida à 
sua Pessoa. 
De fato, os Evangelhos falam claramente que Jesus busca formar um grupo de 
discípulos. Para a verificação da causa em epígrafe, esse dado é de suma importância. 
Segundo Velasco, a formação desse grupo encontra-se entre o que se pode chamar 
“experiências fundantes da Igreja”, pois sua constituição pode ser assumida como “ponto de 
partida” de seu movimento (Mt 4,17-22; Mc 1,14-20; Lc 5,1-11). Conforme o referido autor, 
esse grupo é tão importante que, por meio dele, Jesus chega até nós por meio de sua 
mensagem e conteúdo de sua vida histórica. Assim, 
 
É de suma importância guardar isto e compreender seu alcance 
eclesiológico. Graças a este grupo, Jesus chega até nós: sua mensagem e o 
conteúdo de sua histórica. O grupo é parte integrante da proclamação do 
reino em que se concentra toda a atividade de Jesus: “para que sejam seus 
companheiros, e para os enviar a pregar a mensagem do reino de Deus” (Mc 
3,14). É no grupo que se começa a pôr em prática aquilo que significa o 
reino de Deus, suas exigências concretas
20
. 
 
Dessa forma, o Evangelho deixa a entender que há uma “comunidade” que deriva 
de Jesus: o grupo de seus discípulos. Um grupo que não pode ser considerado amorfo, 
destituído de organização. Como observa Ratzinger, “em seu centro se encontra o núcleo 
claramente definido dos Doze, aos quais, segundo S. Lucas (10,1-20), se acrescenta ainda o 
círculo dos setenta ou setenta e dois discípulos”21. 
Para Ratzinger, a instituição dos “Doze” revela de alguma forma a vontade de 
Cristo de reunir ao redor de si um novo povo (cf. Mc 3,13-19; Lc 6, 12-19; Mt 10,1-4; At 
1,13). Seu chamado pode ser entendido como a expressão de seu desejo de fundar o “novo 
Israel”. Não se pode esquecer que o antigo povo era constituído em “Doze tribos”, a partir dos 
“Doze filhos” de Jacó. Logo, Jesus se apresenta como patriarca de um novo Israel. De fato, a 
esse número é dada muita importância na Igreja primitiva
22
, de tal modo que aos apóstolos 
simplesmente são chamados de “os Doze”. Sua primeira missão consiste simplesmente em ser 
 
20
 Cf. VELASCO, R. A Igreja de Jesus, op. cit., p. 29. 
21
 RATZINGER, J. Compreender a Igreja hoje, op. cit., p. 14. 
22
 Esse número que os reúne em uma comunidade claramente delimitada, é de tal importância, que é 
completado outra vez depois da traição de Judas (At 1,15-26). 
Doze, e a ela se acrescentam, logo a seguir mais duas funções: “para estarem com ele e para 
enviá-los” (Mc 3,14)23. 
Os Doze são enviados por Cristo para continuarem sua missão (Jo 17,18; 20,21). 
Desse modo, entende-se que os apóstolos são instituídos para continuarem a mesma missão de 
Cristo e por encargo de Cristo: Jesus dissera que quem o via, via o Pai (Jo 14,9), agora diz que 
quem escuta os apóstolos, a Ele escuta, e quem os despreza, a Ele despreza (Lc 10,16). 
Portanto, esse chamado deve ser entendido como um chamamento para uma nova 
convocação de Israel diante da iminente vinda do Reino de Deus. É claro que não se deve 
resumir tal grupo aos Doze. Mesmo que não seja possível determinar com exatidão o número 
dos discípulos do Senhor, são mais numerosos que os seus seguidores em sentido estrito. 
Além disso, não se pode esquecer que muitos o abandonaram (Jo 6,66)
24
. 
Por sua vez, o grupo dos Setenta ou Setenta e Dois, do qual São Lucas fala, 
completa esse simbolismo: setenta ou setenta e dois era, segundo a tradição judaica (Gn 10; 
Ex 1,5; Dt 32,8), o número das nações do mundo. Os setenta e dois discípulos significam que 
Jesus reivindica para si toda a humanidade, que deve tornar-se sua discípula: são o sinal que o 
novo Israel abrangerá todos os povos da terra
25
. 
Com efeito, Ele veio congregar “os que estavam dispersos” (cf. Jo 11,52 e Mt 
12,30). Toda a sua obra consiste em “reunir” um novo povo. Na sua pregação usou muitas 
imagens para falar da congregação do povo de Deus, como por exemplo, em Mc 14,27 e em 
Lc 12,32, fala de rebanho. 
Deve-se notar ainda que, em primeiro lugar, o Reino chega para o Povo de Deus, 
o “velho Israel” que o rejeita.Diante dessa rejeição, nasce o “novo Israel” que o acolhe na fé. 
Esse dado pode ser comprovado quando se lê nas Sagradas Escrituras que Jesus Cristo quis 
reunir a todo Israel como “a galinha a seus pintainhos” (Lc 13,34), porém não quiseram. 
Ainda na parábola dos vinhateiros homicidas, diz claramente: “tirar-vos-ão o reino de Deus 
para dá-lo a um povo que dê seus frutos” (Mt 21,43). Em outra parábola menciona que os 
primeiros convidados à festa não quiseram entrar, por isso, convoca a todos os que se 
encontram pelos caminhos (cf. Mt 22,1-6). Logo, pode-se entender que um novo povo surge 
pela aceitação do Reino que chega com a sua Pessoa. A Igreja no Novo Testamento é a 
comunidade que o Reino cria diante da rejeição de Israel. 
 
23
 RATZINGER, J. Compreender a Igreja hoje, op. cit., p. 15. 
24
 Cf. VELASCO, R. A Igreja de Jesus, op. cit., p. 30. 
25
 RATZINGER, J. Compreender a Igreja hoje, op. cit., p. 15. 
8 
 
E, por fim, o último dado: a instituição da Eucaristia na Última Ceia, na noite 
anterior à sua Paixão. Trata-se da conclusão de uma aliança e, como aliança, é fundação 
concreta de um novo povo que se torna povo por sua aliança com Deus, através da comunhão 
no corpo e no sangue de Jesus. Ele incorporou em sua pregação a ideia de aliança proveniente 
do Antigo Testamento, mas, com um novo centro: “ser um” no Corpo dele26. 
Assim sendo, ao longo de sua vida, o Senhor Jesus foi colocando as bases de uma 
Igreja que se manifestaria propriamente no dia de Pentecostes (At 2,1-13). Por isso, não existe 
oposição entre o Reino que Cristo buscou e a Igreja que convocou. A Igreja vem a ser, 
sobretudo, o germe e o princípio do Reino. Na verdade, a Igreja pode ser assumida como 
presença e comunidade que o Reino cria. Ela nasce como resultado da proclamação do Reino, 
pois, a partir dela, inicia-se na Palestina o que se pode chamar “movimento de Jesus”. 
 
2.2 Um fenômeno histórico que remonta a Jesus 
 
Depois das considerações anteriores, resta somente verificar que a Igreja é 
também um fenômeno histórico que remonta a Jesus. 
Segundo Luigi Giussani, “a Igreja é um fenômeno histórico: emergiu, como que 
‘veio à tona’ no fluxo da história em um determinado instante”27. Assim, após a Ressurreição 
do Senhor, num número sempre crescente, homens e mulheres aderiram a Cristo na fé. Por 
isso, historicamente, quem fala da Igreja terá de interpretá-la como o agrupamento religioso 
surgido imediatamente depois do movimento iniciado por Jesus na Palestina
28
. 
 
Nos últimos dois mil anos a vida de milhões de homens e mulheres, o 
desenvolvimento da cultura, a história das ideias e a organização social têm 
sido marcados, particularmente no Ocidente, mas não só, pela presença e 
pela ação de um agrupamento religioso que se auto definiu “Igreja”, nascida 
a partir da pregação de Jesus de Nazaré
29
. 
 
Por um lado, tranquilamente se aceita que a Igreja, desde suas origens, manifesta-
se como uma realidade comunitária sociologicamente identificável. Talvez seja essa a 
primeira evidência para quem se aproxima do Cristianismo
30
. Por outro lado – e, talvez aí 
 
26
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 16-17. 
27
 Cf. GIUSSANI, Luigi. Por que a Igreja?: Terceiro volume do percurso. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova 
Fronteira, 2004, p. 112. 
28
 Cf. LELL, J. Igreja/Eclesiologia. In: EICHER, Peter (dir.). Dicionário de Conceitos, op. cit., p. 375. 
29
 DIANICH, S.; NOCETI, S. Tratado sobre a Igreja, op. cit., p. 13. 
30
 Cf. GIUSSANI, L. Por que a Igreja?, op. cit., p. 124. 
esteja a questão mais delicada, – um dos grandes problemas consiste em aceitar como ela se 
coloca na história, ou seja, aquilo que ela diz de si mesma
31
. 
Nesse horizonte, como observa Salvador Pié-Ninot, “a questão da formação da 
Igreja e de sua relação com Jesus é fundamental para a fé cristã”32. 
 
A Igreja se coloca na história, antes de tudo, como relação com o Cristo 
vivo. Qualquer outra reflexão, qualquer outra consideração vem depois desta 
postura originária. Lucas, nos Atos dos Apóstolos, delineia o quadro de um 
grupo de pessoas que continuou a subsistir como comunidade a partir dos 
dias da vida terrena de Jesus no período pós-pascal. Eles teriam tido, pelo 
contrário, todas as razões para uma dissolução daquela agregação, nascida 
enquanto seguiam um homem excepcional. Com a morte d'Ele, se tivesse 
sido destruída aquela presença ao redor da qual girava o seu estar-junto, teria 
sido compreensível também uma definitiva dispersão do grupo dos 
discípulos
33
. 
 
Dessa forma, da análise do texto supracitado, é possível compreender a Igreja 
como uma realidade pós-pascal
34
. Certamente, os apóstolos, depois do evento pascal, teriam 
suficientes motivos para uma dissolução daquela agregação inicial nascida enquanto seguiam 
um homem excepcional. Em princípio sua morte os deixou desorientados. Porém, além do 
medo, da dor do que lhes havia acontecido, a partir da certeza da ressureição, da convicção de 
sua presença, os apóstolos mostraram-se um grupo que se reforçava cada vez mais e se 
estabelecia
35
. 
Como observa Giussani, o início da Igreja é precisamente esse grupo de 
discípulos, essa “turminha de amigos” que, após a morte de Cristo, permanecem juntos do 
mesmo modo. Isso porque Cristo ressuscitou e se fazia presente no meio deles. Eles puderam 
experimentar que Cristo permanece na história, na vida do homem, de forma pessoal e real, 
com um rosto histórico, vivo, da comunidade cristã, da Igreja. Deus veio ao mundo para 
permanecer no mundo ainda que de maneira invisível. Ele é o “Deus conosco” (cf. Is 7,14; Mt 
1,21-23). As narrações que trazem os evangelhos e Atos Apóstolos testemunham 
simplesmente uma presença familiar que continua e é tradução em fato da expressão “Deus 
conosco”36. 
 
31
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 112. 
32
 PIÉ-NINOT, S. Introdução à Eclesiologia, op. cit., p. 39. 
33
 GIUSSANI, L. Por que a Igreja?, op. cit., p. 113. 
34
 Cf. VELASCO, R. A Igreja de Jesus, op. cit., p. 23. 
35
 Cf. GIUSSANI, L. Por que a Igreja?, op. cit., p. 113-114. 
36
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 115-116. 
10 
 
Além disso, Jesus lhes havia garantido a sua presença: “Eis que estou convosco 
todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28,20). Desde o início, apoiada nessa promessa, a 
Igreja sente a si mesma como a comunidade de Jesus. Destarte, “o conteúdo da 
autoconsciência da Igreja das origens está no fato de que ela é a continuidade de Cristo na 
história”37. 
Dito isso, pode-se concluir tranquilamente com Salvador Pie-Ninot, que “a Igreja 
não se reduz a uma mera realidade histórica e sociológica, nem a uma mera comunidade 
espiritual e invisível”38. Trata-se de uma realidade em que coexistem os aspectos visível e 
invisível. Essa questão poderá ser melhor compreendida a partir do que segue. 
 
2.3 A natureza da Igreja 
 
Em relação à natureza da Igreja, na tentativa de entrever em que consiste o 
fenômeno histórico em estudo, faz-se mister a consideração de alguns conceitos fundamentais 
e imagens provenientes do Novo Testamento e da Tradição cristã. 
Etimologicamente, o termo grego ekklesía (h¨ e)kklhsi¢a), do qual deriva o 
termo latino ecclesia, do qual provém Igreja, na Septuaginta, traduz sempre a expressão 
hebraica qahal, que significa “aviso de convocação” e “assembleia reunida”. No Novo 
Testamento, a frequência do termo se tornará progressiva, pelo uso evangélico exclusivo 
presente em Mt 16,18; 18,17, até às 144 vezes em que é usada no restante do Novo 
Testamento
39
.Convém admitir que não é tão fácil elaborar uma definição sobre a Igreja, porque 
é impossível reunir numa definição toda sua riqueza. Normalmente, para explicar o que é a 
Igreja, costuma-se usar o recurso de algumas imagens e símbolos que ajudam a entender o seu 
mistério. Aqui são apresentadas quatro imagens: (1) Igreja, Povo de Deus; (2) Igreja, Corpo 
de Cristo; (3) Igreja, Templo do Espírito Santo e, por fim, (4) Igreja, Sacramento Universal de 
Salvação. 
 
2.3.1 Igreja como Povo de Deus 
 
A partir de 1930, alguns estudos exegéticos sistemáticos deram início à 
recuperação, ao menos na Teologia católica, de uma categoria interpretativa para a 
 
37
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 120. 
38
 PIÉ-NINOT, S. Introdução à Eclesiologia, op. cit., p. 11. 
39
 Cf. IDEM. Ibidem, p. 27. 
compreensão do mistério da Igreja: “povo de Deus”. Desde o século V, a expressão 
continuava presente nos textos litúrgicos, mas, desapareceu dos tratados teológicos.
40
 Depois, 
somente no século XX, essa imagem seria recuperada em grande apreço pelo Concílio 
Vaticano II (1963-1965). 
Trata-se de uma compreensão originada nas fontes mesmas da revelação cristã, 
pois, enquanto povo de Deus, a Igreja recebe seu conceito fundamental do autoconceito que 
se desenvolveu, no Antigo Testamento, em Israel, o antigo povo da Aliança. Tal entendimento 
parte da consideração “pessoal e histórica” da Igreja e, ao mesmo tempo, é consequência do 
fato de que ela se reconhece constituída como “comunidade” pelo próprio Deus. Logo, esse 
conceito permite, em primeiro lugar, a percepção da natureza comunitária e histórica da 
Igreja, porque, historicamente, a Igreja se originou do povo de Israel. 
 
Com este autoconceito da Igreja, retomado conscientemente e lançado para o 
primeiro plano pelo Concílio Vaticano II (“Povo de Deus”: LG capítulo II 
“De populo Dei”) é trazido à lembrança, em primeiro lugar (grifo do autor), 
a natureza pessoal e histórica da Igreja: essa comunidade de crentes não se 
entende como resultado de processos naturais necessários, não como auto 
explicação da vida na natureza, no consciente, na sociedade ou na história, 
mas como consequência de um ato de dedicação divino na história, que 
acontece a partir da liberdade indisponível do amor e a qual apela para a 
liberdade do ser humano. A forma de socialidade dessa fé, portanto, é 
pessoal-libertária e apresenta estrutura histórica. Enquanto povo de Deus, a 
Igreja recebe seu conceito fundamental concretamente do autoconceito que 
se desenvolveu ao longo de séculos no povo da aliança Israel: esse povo se 
sabe constituído como comunidade pelo próprio Deus
 
41
.
 
 
Desse modo, a Igreja mostra-se um povo que, como Israel, tem sua origem não na 
decisão de seus membros, mas, na vocação de Deus. Quando se analisa a “História da 
Salvação” narrada na Bíblia, percebe-se claramente que Deus não quis salvar os homens 
individualmente, mas como um “povo que ele conquistou” (1Pd 2,9). 
 
Aprouve, no entanto, a Deus santificar e salvar os homens, não 
individualmente, excluindo toda a relação entre os mesmos, mas formando 
com eles um povo, que o conhecesse na verdade e o servisse em santidade. E 
assim escolheu Israel para seu povo, estabeleceu com ele uma aliança, e o foi 
instruindo gradualmente, manifestando, na própria história do povo, a si 
mesmo e os desígnios da sua vontade e santificando-o para si. Tudo isto 
aconteceu como preparação e figura daquela aliança nova e perfeita, que 
haveria de ser selada em Cristo, e da revelação mais plena que havia de ser 
comunicada pelo próprio Verbo de Deus, feito carne. “Eis que dias virão, 
 
40
 Cf. DIANICH, S.; NOCETI, S. Tratado sobre a Igreja, op. cit., p. 78-79. 
41
 Cf. WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 89. 
12 
 
oráculo de Javé, em que selarei com a casa de Israel (e com a casa de Judá) 
uma aliança nova... Eu porei minha lei no seu seio e a escreverei no seu 
coração. Então eu serei o seu Deus e eles serão meu povo. Todos me 
conhecerão dos menores aos maiores, oráculo de Javé” (Jr 31,31-34). Cristo 
estabeleceu este novo pacto, isto é, a nova aliança do seu sangue (cf. 1Cor 
11,25), formando, dos judeus e dos gentios, um povo que realizasse a sua 
própria unidade, não segundo a carne mas no Espírito, e constituísse o novo 
povo de Deus
42
. 
 
Dessa feita, como Israel, a Igreja sabe-se propriedade de um Deus que a chama a 
servi-lo em santidade, com a incumbência de levar a própria experiência de Deus e do seu 
poder aos outros deste mundo. 
 
Assim o povo messiânico, ainda que não abranja de fato todos os homens e 
repetidas vezes se pareça com um pequeno rebanho, é para toda a 
humanidade um germe validíssimo de unidade, de esperança e de salvação. 
Constituído por Cristo numa comunhão de vida, de caridade e de verdade, é 
assumido por ele para ser instrumento da redenção universal, e como luz do 
mundo e sal da terra (cf. Mt 5,13-16), é enviado ao mundo inteiro
43
. 
 
Além disso, a noção de “povo de Deus” tem a vantagem de apresentar a igual 
dignidade de todos os membros batizados. 
 
Cristo Senhor, Pontífice tomado de entre os homens (cf. Hb 5,1-5), fez do 
novo povo “um reino de sacerdotes para Deus, seu Pai” (cf. Ap 1,6; cf. 5,9-
10). Com efeito, pela regeneração e unção do Espírito Santo, os batizados 
são consagrados para serem edifício espiritual e sacerdócio santo, a fim de, 
por todas as obras do cristão, oferecerem sacrifícios espirituais e 
proclamarem as grandezas daquele que das trevas os chamou para a sua luz 
maravilhosa (cf. 1Pd 2,4-10). Assim, todos os discípulos de Cristo, 
perseverando juntos na oração e no louvor de Deus (cf. At 2,42-47), 
ofereçam-se a si mesmos como hóstia viva, santa, agradável a Deus (cf. Rm 
12,1); dêem testemunho de Cristo em toda a parte; e, àqueles que por isso se 
interessarem, falem da esperança, que está neles, da vida eterna (cf. 1Pd 
3,15)
44
. 
 
Essa concepção ajudou sobretudo a superar a visão de uma Igreja eivada no 
hierarquismo
45, pois ressaltou que “qualquer que seja a sua condição ou estado, são chamados 
pelo Senhor a procurarem, cada um por seu caminho, a perfeição daquela santidade pela qual 
 
42
 CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Apostólica Lumen Gentium, n. 9. In: Documentos do Concílio 
Vaticano II, op. cit., p. 112-113. 
43
 IDEM. Ibidem, n. 9, p. 114. 
44
 IDEM. Ibidem, n. 10, p. 115. 
45
 Cf. PIÉ-NINOT, S. Introdução à Eclesiologia, op. cit., p. 30. 
é perfeito o próprio Pai celeste”46. Consequentemente, o conceito de “povo de Deus” coloca 
em evidência que todos os membros formam uma comunhão igualitária, pois, “salvação” 
significa também unidade, comunhão, conciliação e unificação
47
. 
À guisa de conclusão, pode-se dizer que, ainda que a expressão “povo de Deus” 
não seja tão frequente no Novo Testamento a respeito da Igreja, mesmo assim possui um 
caráter essencial
48: “a Igreja é povo de Deus, porque realiza a vocação universal a que era 
chamado Israel pelo seu Deus, o qual, sendo único, queria ser também o Deus de todos os 
homens”49. 
 
2.3.2 A Igreja como Corpo de Cristo 
 
Em sua Primeira Carta aos Coríntios (12,12), São Paulo faz a seguinte afirmação: 
“como o corpo é um, embora tenha muitos membros, e como todos os membros do corpo, 
embora sejam muitos, formam um só corpo, assim também acontece com Cristo”. Como se 
pode notar, no versículo citado, São Paulo oferece as bases para a consideração da Igreja 
como Corpo de Cristo. 
Comumente,o referido versículo tem sido interpretado como afirmação de que na 
Igreja de Cristo existe a questão pluralidade a serviço da unidade. É verdade. Porém, não é 
essa a questão fundamental. A comparação da Igreja com um corpo lança, sobretudo, uma luz 
particular sobre sua íntima ligação com Cristo. Portanto, não se trata somente de uma 
diversidade funcional, mas, antes de tudo, de uma compreensão que manifesta correlação e 
interdependência
50
. Dessa forma, a Igreja não está somente reunida à volta de Jesus: está 
unificada nele, no seu Corpo. 
Por isso, segundo Joseph Ratzinger, no Novo Testamento, a ideia de povo de 
Deus não pode ser concebida de forma isolada da Cristologia
51
. No Novo Testamento, como 
observa Wiedenhofer, o novo Templo é o Corpo do Senhor: 
 
Assim como Israel era uno por meio do templo e de suas reuniões de culto 
divino, as comunidades de cristãos geograficamente dispersas se tornam 
unas a partir do novo templo, do corpo do Senhor (Mc 14,58 par.; 15,29s 
 
46
 CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Apostólica Lumen Gentium, op. cit., n. 11, p. 117. 
47
 Cf. WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 90. 
48
 Cf. DIANICH, S.; NOCETI, S. Tratado sobre a Igreja, op. cit., p. 269. 
49
 PIÉ-NINOT, S. Introdução à Eclesiologia, op. cit., p. 32. 
50
 Cf. Bíblia do Peregrino: Edição de estudo. São Paulo: Paulus, 2002, nota referente a 1Cor 12,12-30. 
51
 RATZINGER, J. Compreender a Igreja hoje, op. cit., p. 19. 
14 
 
par.; Jo 2,19). Eles são unos na reunião de culto divino na qual comem o pão 
uno que os transforma em um só corpo (1Cor 10,17)
52
. 
 
Como se pode notar, essa ideia expressa não só o sentido de diversidade de 
funções e de encargos que se dão na Igreja com o fim de salvação. Em primeiro lugar, coloca-
se em relevo o mistério da união dos batizados em Cristo. A Igreja é apresentada como íntima 
comunhão com Cristo. É um povo que crê em Cristo, que está batizado no seu nome e vive de 
seu Corpo Eucarístico
53
. 
 
Desde o início, Jesus associou seus discípulos à sua vida, revelou-lhes o 
Mistério do Reino, deu-lhes participar de sua missão, de sua alegria e de seus 
sofrimentos. Jesus fala de uma comunhão ainda mais íntima entre Ele e os 
que o seguiriam: “Permanecei em mim, como eu em vós.... Eu sou a videira, 
vós os ramos” (Jo 15, 4-5). E anuncia uma comunhão misteriosa e real entre 
o seu próprio Corpo e o nosso: “Quem come a minha carne e bebe o meu 
sangue permanece em mim e eu nele” (Jo 6, 56)54. 
 
Portanto, a Igreja é Corpo de Cristo, porque torna os seus membros participantes 
da mesma vida e do mesmo Espírito de Cristo. O cristão participa da vida de Cristo, porque a 
ele é incorporado por meio do batismo. 
O segundo aspecto a ser salientado está no reconhecimento de que a Igreja 
somente é Corpo de Cristo porque tem a Cristo como cabeça. Assim, de Cristo procede todo o 
“fluxo vital” de seus membros. 
 
Cristo “é a Cabeça do Corpo que é a Igreja” (Cl 1,18). Ele é o Princípio da 
criação e da redenção. Elevado na glória do Pai, “Ele tem em tudo a 
primazia” (Cl 1,18), principalmente sobre a Igreja, por meio da qual estende 
seu reino sobre todas as coisas
55
. 
 
Contudo, a unidade de Cristo e da Igreja, Cabeça e membros do Corpo, implica 
também a distinção entre ambos, numa relação pessoal. Esse é o terceiro aspecto, muitas 
vezes, expresso pela imagem do esposo e da esposa. 
 
O tema de Cristo Esposo da Igreja foi preparado pelos profetas e anunciado 
por João Batista. O próprio Senhor se designou como “o Esposo” (Mc 2, 19). 
O Apóstolo apresenta a Igreja e cada fiel, membro do seu Corpo, como uma 
esposa “desposada” com Cristo Senhor, para formar com Ele um só Espírito 
(1Cor 6,15-16). Ela é a Esposa imaculada do Cordeiro imaculado (Ap 22,17) 
a qual “Cristo amou, pela qual se entregou a fim de santificá-la” (Ef 5, 26), 
 
52
 WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 90. 
53
 Cf. IDEM. Ibidem, loc. cit. 
54
 Catecismo da Igreja Católica, op. cit., p. 226-227, n. 787. 
55
 Ibidem, p. 228, n. 792. 
que associou a si por uma Aliança eterna, e da qual não cessa de cuidar 
como de seu próprio Corpo (Ef 5,29)
56
. 
 
De acordo com Ratzinger, a Igreja é Corpo de Cristo da mesma maneira em que a 
mulher e o marido são um só corpo ou uma só carne. Esse fator fica mais claro quando o 
referido autor explica que, mesmo em sua união espiritual e corporal indissolúvel, não se 
misturam nem se confundem
57
. 
Em suma, com a imagem do Corpo de Cristo, deseja-se colocar em relevo mais 
especificamente três aspectos eclesiológicos, a saber: (1) a unidade de todos os membros entre 
si, pela união a Cristo; (2) o fato de que Cristo é Cabeça da Igreja e, ainda, (3) a partir da 
imagem da Igreja como Esposa de Cristo, a distinção entre ambos, numa relação pessoal e 
amorosa. 
 
2.3.3 Igreja, Templo do Espírito Santo 
 
A terceira imagem oferecida para a compreensão do mistério da Igreja também é 
oriunda dos escritos paulinos: a Igreja como “Templo do Espírito Santo”. 
Em sua Segunda Carta aos Coríntios (6,16), São Paulo diz claramente: “nós 
somos templos o Templo do Deus vivo”. Mas, o ensinamento de que os cristãos são “Templo 
de Deus” aparece também em outras passagens do corpo paulino. 
Na Primeira Carta aos Corintos (3,16s), São Paulo questiona os cristãos: “Acaso 
não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós?”. Na mesma 
carta pergunta ainda: “Acaso ignorais que vosso corpo é templo do Espírito Santo que mora 
em vós e que recebestes de Deus? Ignorais que não pertenceis a vós mesmos?” (6,19s). 
Desse modo, desde o início, a Igreja se entende numa explícita relação com o 
Espírito do Senhor. Como observa Wiedenhofer, a nova comunidade religiosa, 
necessariamente teve de se entender a partir da atuação do Espírito de Deus: 
 
No encontro com o Ressurreto os discípulos também passaram por nova 
experiência consigo mesmos: a pessoa que entra no espaço de vida do 
Ressurreto passa por uma transformação interior: libertada do pecado, da lei 
e da morte, torna-se nova criatura. Diante do pano de fundo das promessas 
de Israel os discípulos tiveram que entender essa nova experiência da 
recriadora força de vida e poder de vida de Deus corno expressão do 
derramamento escatológico do Espírito de Deus. Uma vez que a experiência 
da nova comunhão estava muitíssimo ligada justamente com essa nova 
experiência conjunta do Espírito, a nova comunidade religiosa 
 
56
 Ibidem, p. 229, n. 796. 
57
 RATZINGER, J. Compreender a Igreja hoje, op. cit., p. 22. 
16 
 
necessariamente teve que se entender a partir da atuação do Espírito de 
Deus, corno criatura do Espírito
58
. 
 
Se a Igreja é experimentada e entendida como obra do Espírito criador de Deus, 
toda a estrutura institucional só tem sentido em dependência e em função da atuação do 
Espírito
59
. Perceba-se que o Catecismo da Igreja Católica trata da dimensão carismática da 
Igreja, apresentado o Espírito do Senhor como o princípio vital de todo o edifício espiritual 
que é Igreja: 
 
O Espírito Santo é o “Princípio de toda ação vital e verdadeiramente salutar 
em cada uma das diversas partes do Corpo”. Ele opera de múltiplas maneiras 
a edificação do Corpo inteiro na caridade: pela Palavra de Deus, “que tem o 
poder de edificar” (At 20, 32); pelo Batismo, por meio do qual forma o 
Corpo de Cristo (1Cor 12,13); pelos sacramentos, que proporcionam 
crescimento e cura aos membrosde Cristo; pela “graça concedida aos 
Apóstolos que ocupa o primeiro lugar entre seus dons”; pelas virtudes que 
fazem agir segundo o bem; e, enfim, pelas múltiplas graças especiais 
(chamadas “carismas”), por meio das quais “torna os fiéis aptos e prontos a 
tomarem sobre si os vários trabalhos e ofícios que contribuem para a 
renovação e maior implemento da Igreja”60. 
 
Porque o Espírito Santo é o princípio vital da Igreja, há diversos carismas. Tais 
carismas, quer extraordinários ou mesmo os mais simples e humildes, estão ordenados à 
edificação da comunidade eclesial, ao bem dos homens e às necessidades do mundo. Assim, 
entende-se que os carismas cooperam para o “bem comum” (1Cor 12,7)61. 
Em síntese, pode-se dizer que a Igreja é Templo do Espírito Santo, porque está 
ligada a uma realidade interior, dinâmica e profunda. E, sobretudo, porque a apresenta como 
uma comunidade de salvação marcada por uma estrutura carismática
62
. 
 
2.3.4 Igreja, Sacramento Universal de Salvação 
 
Entre as solenes declarações do Concílio Vaticano II a respeito da natureza da 
Igreja, encontra-se aquela em que se afirma que, em Cristo, a Igreja é “como um sacramento 
ou sinal ou instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano”63. 
Segundo Pié-Ninot, 
 
 
58
 WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 91. 
59
 Cf. CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Apostólica Lumen Gentium, op. cit., n. 8, p. 110. 
60
 Catecismo da Igreja Católica, op. cit., p. 230-231, n. 798. 
61
 Cf. Catecismo da Igreja Católica, op. cit., p. 231, n. 799-801. 
62
 Cf. WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 92. 
63
 CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Apostólica Lumen Gentium, op. cit., n. 1, p. 102. 
a fonte desse conceito, utilizado aqui analogicamente, deve ser buscada na 
teologia patrística para a qual o termo latino sacramentam traduzia o 
conceito bíblico de mysterium que, de acordo com o que vem explicado no 
próprio Vaticano II, não é algo incognoscível e obscuro, mas na Bíblia é 
equivalente a uma realidade divina portadora de salvação, que se revela de 
modo visível. O concílio, empregando esse conceito de sacramento, quer 
exprimir a dupla dimensão da Igreja, humana e divina, visível e invisível, 
que faz com que ela seja, já em si mesma, e em virtude da lei da encarnação 
pela qual o visível é mediação do invisível, “uma realidade complexa”64. 
 
Desse modo, quando se fala do “mistério” da Igreja, quer se afirmar que a mesma 
consiste numa “realidade complexa”, na qual há a fusão de um elemento humano e outro 
divino, onde o visível comunica o invisível. Trata-se de duas dimensões inseparáveis
65
. 
Pode-se dizer que, dentre os textos do Concílio Vaticano II, essa é a descrição 
mais significativa da Igreja. Tal afirmação aparece num contexto claramente cristológico, ou 
seja, mostra que a Igreja existe numa total relação a Cristo
66
. Dessa forma, essa compreensão 
permite dizer que a Igreja é sacramento, ou seja, sinal visível e eficaz da salvação que vem 
por meio de Jesus Cristo. 
 
Deus convocou a assembléia dos que em Jesus vêem, com fé, o autor da 
salvação e o princípio da unidade e da paz, e com eles constituiu a Igreja, a 
fim de que ela seja, para todos e cada um, o sacramento visível desta unidade 
salvadora
67
. 
 
Como se pode notar, essa imagem não nega que Cristo é a única fonte de 
salvação, mas, afirma que a Igreja é também necessária para a mesma: 
 
Em primeiro lugar, é aos fiéis católicos que o santo Concílio dirige o 
pensamento. Apoiado na Sagrada Escritura e na Tradição, ensina que esta 
Igreja, peregrina na terra, é necessária para a salvação. Só Cristo é mediador 
e caminho de salvação: ora, ele torna-se-nos presente no seu corpo que é a 
Igreja; e, ao inculcar expressamente a necessidade da fé e do batismo (cf. Mc 
16,16; Jo 3,5), ao mesmo tempo corroborou a necessidade da Igreja, na qual 
os homens entram pela porta do batismo
68
. 
 
Note-se que Karl Rahner considera a Igreja muito mais do que organização social 
para colimar fins religiosos. Isso porque a considera como algo que tem a ver com a essência 
do Cristianismo. Para o autor mencionado, a Igreja é também uma questão de fé e uma parte 
do Cristianismo enquanto evento salvífico, pois, não se pode excluir a comunitariedade, a 
 
64
 PIÉ-NINOT, S. Introdução à Eclesiologia, op. cit., p. 30. 
65
 Cf. Cf. VELASCO, R. A Igreja de Jesus, op. cit., p. 245. 
66
 PIÉ-NINOT, S. Introdução à Eclesiologia, op. cit., p. 29. 
67
 CONCÍLIO VATICANO II. Constituição Apostólica Lumen Gentium, op. cit., n. 9, p. 114. 
68
 IDEM, Ibidem, n. 14, p. 121. 
18 
 
sociabilidade e a intercomunicação da natureza do homem, nem sequer enquanto sujeito 
religioso da relação para com Deus
69
. Segundo Rahner, 
 
Com base na natureza do homem, na natureza de Deus e na natureza da 
relação do homem para com corretamente entendido, não é possível excluir a 
sociabilidade da natureza da religião. Essa lhe pertence porque o homem se 
acha em relação, em todas as suas dimensões, com este Deus único da 
salvação de todo homem. De outra forma a religião tornar-se-ia negócio 
meramente privado e deixaria de ser religião
70
. 
 
Em síntese, a Igreja é sacramento ou sinal da salvação somente em Cristo. Isso 
quer dizer que sempre aponta para além de si, ou seja, para Jesus Cristo
71
. 
 
3 A IGREJA: CONDIÇÃO DA FÉ CRISTÃ 
 
Após sua ressurreição, o Senhor Jesus confiou a seus discípulos, como missão, o 
anúncio e o testemunho do Evangelho: “Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações e 
batizai-os em nome do Pai, do filho e do Espírito Santo” (Mt 28,19). 
No contexto desse versículo anteriormente citado, a expressão “fazer discípulos” 
tem o sentido de “ensinar”72. Como observa Siegfried Wiedenhofer, “sem pregação e sem 
incumbência de pregação não há fé salvadora”73. Na verdade, parece que o mencionado autor 
faz referência ao texto da Carta aos Romanos (10, 14-18): 
 
Ora, como invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele 
que não ouviram? E como o ouvirão, se ninguém o proclamar? E como o 
proclamarão, se não houver enviados? Assim é que está escrito: “Quão 
benvindos os pés dos que anunciam boas novas!”. Mas nem todos 
obedeceram à Boa Nova, pois Isaías diz: “Senhor, quem acreditou em nossa 
pregação?” Logo, a fé vem pela pregação e a pregação, pela palavra de 
Cristo. Então, eu pergunto: Será que eles não ouviram? Certo que ouviram, 
pois a voz deles se espalhou por toda a terra e as suas palavras chegaram 
aos confins do mundo. 
 
Como se pode notar, o autor da Carta aos Romanos trata da dinâmica da 
transmissão da fé. Siegfried Wiedenhofer, de uma forma muito simples, explica em que essa 
 
69
 RAHNER, Karl. Curso fundamental da fé: Introdução ao conceito de Cristianismo. São Paulo: Paulus, 1989, 
p. 400-401. 
70
 IDEM. Ibidem, p. 401. 
71
 Cf. WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 96-97. 
72
 Cf. Bíblia Sagrada: Tradução da CNBB. 6. ed. Brasília: Edições CNBB, 2007, nota referente a Mt 24,19. 
73
 WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 50. 
dinâmica consiste: “a pessoa só passa a ter fé pelo fato de outros a terem vivido, narrado, 
proclamado e ensinado essa fé”74 . 
Dessa forma, no Novo Testamento, o Evangelho é anunciado, veiculado e fixado 
pela fé das testemunhas apostólicas e comunidades. Assim, convém admitirque o anúncio da 
palavra de Deus acontece em responsabilidade e fé da comunidade eclesial. Essa é sua 
primeira missão, sua primeira incumbência. 
Além disso, Wiedenhofer afirma ainda que “somente se aprende a fé [...] sob a 
condição prévia de que já existe uma comunhão dos crentes e de a própria pessoa tornar-se 
parte dessa comunhão”75. Certamente, em todas as religiões, a fé só é possível como uma fé 
conjunta. Isso quer dizer que, geralmente, ninguém inventa sua própria fé. 
Assim, pode-se afirmar, com certeza, que a fé cristã só é possível como 
participação na fé da Igreja, dentro da Igreja. Nessa perspectiva, a Igreja aparece com uma 
determinada tarefa e, como consequência dessa, constituída a partir de certa estrutura e forma 
de organização, com o objetivo de garantir a experiência cristã de Deus, vivida ao longo dos 
dois milênios de sua história
76
. 
 
74
 IDEM. Ibidem, p. 54. 
75
 IDEM. Ibidem, loc. cit. 
76
 WIEDENHOFER, S. Eclesiologia. In: SCHNEIDER, T. Manual de Dogmática, op. cit., p. 54-55.

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