Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 O Papel do Consultor Interno de Recursos Humanos Autoria: Diego Marocco Alberton, Lidia Tassini Mancia, Paula Martyl de Borba RESUMO O presente estudo se propôs a debater sobre a prática da consultoria interna de Recursos Humanos nas empresas. O objetivo principal foi refletir a respeito do papel do profissional que atua como Consultor Interno, contemplando os diversos aspectos que resultam com a adoção da estrutura de consultoria interna na área de Recursos Humanos. A base para realização desse estudo deu-se em informações coletadas junto a dois grupos de profissionais da área de Recursos Humanos, totalizando 32 pessoas. O referencial utilizado baseia-se, principalmente, nos estudos de Kelley (1979), Kurb (1980), Czarnecki (1981), Hansen (1990) e Block (1991), entre outros. A pesquisa realizada caracterizou-se por ser um estudo de caso de abordagem qualitativa. Os participantes foram investigados por meio de observação, durante dois cursos de Formação para Consultores Internos de Recursos Humanos realizados em 2007 e 2008. Os dados obtidos foram analisados utilizando-se a técnica de análise de conteúdo. Os resultados apontam que existem distorções em relação ao papel do Consultor Interno e dos gestores. Ainda, há necessidade de um maior preparo dos profissionais de RH para atuarem nessa posição, sendo esse um dos fatores que contribui para a ineficácia do modelo. Além desses aspectos, também se identificou a importância do gestor da área de RH no processo de comunicação interna do modelo, em organizar a estrutura da área de RH para a atuação neste e, ainda, legitimar a ação dos Consultores Internos. Além disso, investigaram-se os limites de intervenção que o Consultor Interno se depara. Por fim, acredita-se que o modelo de consultoria interna de pode contribuir para um maior alinhamento entre atuação de RH e estratégia organizacional. 1. INTRODUÇÃO Repensar a prática de gestão organizacional e, por conseqüência, a de gestão de pessoas, foi objeto de preocupação e fruto de mudança em diversas empresas. Com o avanço nos estudos a respeito de gestão e, talvez, por uma maior conscientização de empresários e executivos sobre o tema, descobriu-se que o modo no qual a empresa pratica a sua gestão de pessoas tem influência direta nos seus resultados. Trata-se, portanto, de algo fundamental para sua sobrevivência e manutenção no mercado. Abordar gestão de pessoas no ambiente empresarial implica, necessariamente, em versar sobre a área de Recursos Humanos. Ao longo do século XX, essa área se transformou na tentativa de adequar suas práticas às demandas de gestão das empresas, embora nem sempre com o sucesso desejado. Observou-se, ainda, que essa área, de forma geral, atuou reativamente às necessidades empresariais por modelos de gestão mais eficazes. Em diversas oportunidades, a área foi criticada pela implantação de modismos, que variam desde a alteração de seu nome, até algumas tentativas, nem sempre bem sucedidas, de implantar técnicas momentâneas de gestão, algumas que desconsideravam fatores importantes como a missão, a cultura e os valores organizacionais. Nos últimos 20 anos, no mínimo, a área se mantém com o debate a respeito do seu papel estratégico nas empresas. Nota-se que a voracidade pela expressão ‘RH estratégico’ absorve uma parte da literatura que trata sobre o tema e quase a totalidade dos discursos 2 empresariais. Também parece haver uma necessidade de afirmação de sua importância, por parte dos profissionais de RH, cujos discursos têm incluído a expressão ‘estratégica’. Observa-se, por outro lado, que outras áreas não demonstram essa busca por um ‘Financeiro estratégico’, uma ‘Produção estratégica’ ou uma ‘Vendas estratégica’, ao menos não na proporção dos profissionais que atuam em RH. Esta visão dos profissionais de RH, em nosso olhar, não contempla a demanda por uma visão complexa da empresa. Ainda, desconsidera a empresa como um sistema que funciona na inter-relação entre várias áreas e pessoas, tanto dentro quanto de fora do espaço físico empresarial. Esta busca por uma atuação ‘estratégica’ de Recursos Humanos tem passado por diversos caminhos. São abordados fatores como a descentralização da gestão de pessoas para as lideranças, a implantação de políticas corporativas de Recursos Humanos, os códigos de ética e conduta, uma melhor gestão de recompensas e a tentativa de retenção de profissionais. Ainda, um dos aspectos repensados refere-se ao modelo de atuação da área, o que implica, necessariamente, no debate sobre a estrutura da área de RH. Historicamente, a estrutura do RH foi formatada em um modelo funcional, normalmente dividida em subáreas como as de Treinamento e Desenvolvimento, Recrutamento e Seleção, Administração de Pessoal, Remuneração e Benefícios, entre outras. Porém, a partir dos anos de 1980, observou-se que o modelo de consultoria interna, que propõe uma ruptura na visão funcional, foi gradativamente implantado em algumas empresas nacionais. O modelo de consultoria interna refere-se a uma modalidade de condições que envolvem uma mudança na estrutura, nos processos de RH e em seus profissionais, tornando- se um Modelo de Apoio à Gestão. O Modelo de Consultoria Interna, doravante denominado neste texto de MCI, pressupõe uma lógica de funcionamento integrada por macro processos que interagem em suas informações, por uma estrutura que rompe com o modelo da departamentalização e, por conseqüência, exige uma qualificação diferenciada dos profissionais que atuam na área. Nesta lógica, o profissional deixa de ser um especialista apenas num processo de RH, para ser um expert em todos os processos de gestão de pessoas. Cabe a esses profissionais, definidos como ‘Consultores Internos’, apoiarem a prática de gestão de pessoas na empresa, por meio de diagnósticos, intervenções, aconselhamentos, orientações e suporte às lideranças para tomadas de decisão. No MCI, os profissionais de RH passam a atuarem de forma mais próxima e direta com as lideranças da empresa, denominadas, nesse modelo, de ‘Clientes’. . Uma das contribuições desse modelo foi possibilitar, aos profissionais da área de Recursos Humanos, abordarem gestão de pessoas como um fenômeno complexo e multifacetado, e não mais como um conjunto de processos funcionais que atuam de forma isolada, sem nenhuma relação entre si. Porém, a utilização desse modelo para Recursos Humanos ainda não é uma prática usual nas empresas. O que se observa é que diversos fatores relacionados ao MCI implicam no debate e na incerteza das empresas e dos profissionais da área sobre as vantagens e desvantagens em adotá-lo. Constata-se que ele tem implicações tanto nos profissionais de Recursos Humanos, que passam a ser exigidos por conhecimentos em todos os processos da área, bem como nas lideranças, que agora passam a ter consultores mais próximos e ‘cobrando’ ações efetivas em gestão. Também há dúvidas sobre o real papel do consultor interno nesse modelo, em como administrar a necessidade de se ter uma visão ‘externa e isenta’, mesmo atuando como funcionário, sob um contexto de relação de poder imposta pela formatação ‘cliente-fornecedor’, diante de diversos dilemas éticos próprios da sua atuação. Assim, diante desse contexto, o presente artigo se propõe a debater a respeito da prática da consultoria interna de Recursos Humanos nas empresas. O objetivo principal é refletir a respeito do papel do profissional que atua neste tipo de estrutura, contemplando os 3 diversos aspectos que resultam com a adoção deste modelo. A base para realização do presente estudo deu-se em informações coletadas junto a dois grupos de profissionais da área de Recursos Humanos, que realizaram cursos de Formação para Consultores Internos de RH nos anos de 2007 e 2008, totalizando 32 pessoas. Ossujeitos envolvidos nessa pesquisa ou atuavam como Consultores Internos de RH em suas respectivas empresas ou buscavam qualificação para tal, diante da perspectiva da empresa em implantar o MCI. Assim, espera-se contribuir para o avanço nos estudos a respeito do tema, a partir da visão dos Consultores Internos, como forma de esclarecer e apontar caminhos sobre o seu papel, 2. REVISÃO DA LITERATURA 2.1 Transformações na área de Recursos Humanos no Brasil Pode-se afirmar que o início das atividades de Recursos Humanos, no Brasil, deu-se juntamente com o surgimento das primeiras empresas de maior porte, a partir da década de 1930. De forma geral, o início do processo de industrialização e o investimento do Estado em infra-estrutura e na criação de estatais acarretaram no incremento substancial de empresas no Brasil, e com ela a necessidade de atividades de controle e pagadoria de funcionários. A preocupação da área de Recursos Humanos, nessa época, era a de realizar atividades de Administração de Pessoal – sendo esse, inclusive, o nome dado à área. O enfoque das ações era para o pagamento de salários, controle da jornada de trabalho e fiscalização da aplicação da legislação trabalhista, ainda em fase de implantação e divulgação. Nesse período, além das atividades de rotinas trabalhistas, os processos de recrutamento e seleção eram responsabilidades quase que ‘únicas’ do chefe de pessoal, dada à importância desse processo na época, considerando os aspectos legais envolvidos. A necessidade de controle exigia do profissional da Administração de Pessoal o conhecimento a respeito de temas técnicos e legais. Comumente, os profissionais que atuam na área, na época, eram advogados ou bacharéis em Direito. Pode-se dizer que os Departamentos de Pessoal funcionavam bem em relação ao que se esperava deles, por parte da organização, face aos modelos taylorista-fordista em prática nas organizações nacionais e, durante os 30 anos seguintes, a área de Recursos Humanos manteve esse mesmo modelo de atuação (ARAUJO, 2006). A expansão do Estado e o incremento industrial são características nacionais até meados dos anos de 1960. A partir dessa época, o país experimenta um novo regime político, caracterizado pelo controle militar, que veio acompanhado por um período de grande crescimento, definido à época como ‘milagre econômico’, que duraria até meados da década de 1970, com a crise do petróleo. Esse período é marcado por fortes investimentos em infra- estrutura e pelo desenvolvimento econômico composto por empresas estatais, nacionais e estrangeiras, que já implantavam fábricas no país desde o fim da segunda guerra mundial. Ao mesmo tempo, esse período caracteriza o desenvolvimento incremental de algumas práticas em gestão de pessoas, embora ainda de baixa representatividade, juntamente com uma maior intervenção do Estado na economia e nas relações de trabalho (WOORD JR. e TONELLI, 2005). O período final dos anos da década de 1970 é marcado por movimentos sociais, onde o sindicato assume um papel presente de interlocutor nas relações de trabalho. Nesse período ocorrem fortes mobilizações grevistas – sendo diversas na região do ABC paulista – que forçaram a área de Recursos Humanos a direcionar esforços, também, para os acordos e negociações trabalhistas. As críticas sindicais baseavam-se, fundamentalmente, ao modelo fordista de organização do trabalho, com sua rígida separação entre elaboração e execução do 4 trabalho, severa disciplina e controle, por melhores condições de trabalho e pela elevação dos salários frente a um cenário de recessão, inflação e aumento da dívida externa (LAPIS, 2006). Na época, a área de Recursos Humanos ocupou-se de ações visando administrar esses conflitos, na qual a posição de ‘advogado trabalhista’ era valorizada. Ainda, essa época marca o início das primeiras pesquisas salariais, como forma de organização patronal frente aos pedidos sindicais por melhores salários. É nesse período que, também, cresce o interesse de profissionais em atuar na área de Recursos Humanos, mesmo que a área não apresente maiores transformações em suas práticas de gestão de pessoas. A partir da abertura econômica, no início dos anos da década de 1990, diversos reflexos foram percebidos na economia nacional. Destacaram-se, na época, programas de reestruturações, além de fusões e aquisições de empresas. Ao mesmo tempo, houve o incremento substancial de competição internacional, o que acarretou em fechamento de empresas de capital brasileiro. A ‘reengenharia’ implicou em vastos programas de demissões e ajustes em relação ao quadro de pessoal das empresas, atividade na qual a área de Recursos Humanos se ocupou, principalmente, na primeira metade da década (WOORD JR. e TONELLI, 2005). As mudanças, alicerçadas em um novo modelo de organização do trabalho, definido agora como de ‘acumulação flexível’, impunha uma série de medidas para gestão das empresas, que apesar de demissões, pregava práticas de gestão mais adequadas aos tempos de competição internacional. Desta forma, por uma demanda maior das organizações em relação à gestão de pessoas, a prática de Recursos Humanos precisava se transformar. Passado o período difícil até metade da década de 1990, a área é forçada a apresentar resultados mais consistentes do que vinha até então, embora nem sempre os tenha conseguido. Nesse momento, o processo de gestão de pessoas passa a ser percebido como solução para as demandas de excelência organizacional (ARAUJO, 2006). É neste período em que se observa, então, o incremento de uma série de novas práticas em Recursos Humanos, como Avaliação 360º., Competências, Remuneração Variável, Programas de Trainees, Benefícios Flexíveis, uso do E-learning, etc. Ao mesmo tempo, fortalece o discurso de uma atuação ‘estratégica’ de Recursos Humanos, que agregue valor ao negócio, focado em resultados e envolvido nas decisões importantes da empresa. A pressão interna e externa por uma melhor atuação de Recursos Humanos, a partir dos anos de 1990, acarreta, além da implantação de novas práticas, na reflexão a respeito do modelo de atuação dessa área nas empresas. Pode-se afirmar, de forma geral, que, até meados dessa década, boa parte das empresas nacionais mantinha suas estruturas da área de Recursos Humanos semelhantes às utilizadas no início do século XX. Basicamente, a organização da área se dava em um formato funcional, com subdivisões departamentais dentro da própria área. Comumente, observávamos seções como o Recrutamento e Seleção, Treinamento e Desenvolvimento, Administração de Pessoal, Remuneração e Benefícios, entre outros. Geralmente, essas seções atuavam de forma isolada e não consideravam uma perspectiva integrada de gestão de pessoas. Com a necessidade de eficácia em Recursos Humanos, face aos novos desafios, algumas empresas começaram a discutir se o formato atual da área conseguiria atender as demandas organizacionais. É neste contexto que o modelo funcional passa a ser revisto e, utilizando-se de exemplos já introduzidos em empresas americanas desde a década anterior, algumas empresas nacionais de grande porte, gradativamente, alteram o seu modelo de atuação para o de consultoria interna de recursos humanos. De forma geral, esse modelo deu- se como uma resposta da área de Recursos Humanos ao novo modelo de organização do trabalho, que exigia gestores mais preparados e apoiados para realizarem seu trabalho como líderes, demandando uma atuação mais efetiva de Recursos Humanos. Atualmente, esse 5 modelo de atuação de RH não se trata de algo consolidado no cenário organizacional. Ainda há dúvidas e dilemas impostos por esse modelo, que carecem de maior reflexão e discussão, tanto no meio acadêmico, como empresarial. 2.2 Consultoria Interna de Recursos Humanos 2.2.1 Conceitose História Com o intuito de contribuir para a sistematização de conceitos e integrar um corpo de conhecimento fundamentado na literatura, aborda-se considerações sobre o conceito, os objetivos, a função, a posição e o papel que envolve a atividade de consultoria interna. Observa-se que a atividade de consultoria é cada vez mais utilizada no mundo do trabalho. No entanto, é preciso clarear alguns aspectos da profissão de Consultor e de seu diferente papel enquanto Consultor Externo ou Interno. Neste artigo, estaremos abordando, principalmente, o modelo de Consultoria Interna e o papel Consultor Interno em RH. As referências no campo da consultoria surgiram em meados dos anos 50, concentradas na área médica e da saúde mental. Sua transformação e evolução se deram dos consultórios e hospitais para as atividades de consultoria em saúde mental coletiva, até migrar para a área organizacional (KURPIUS e ROBINSON, 1978). Na área organizacional, a atividade de consultoria teve seu início nos países com economias de livre comércio, mais especificamente em empresas privadas de países industrializados. Já nos países em desenvolvimento, a atividade de consultoria é mais recente, havendo uma tendência a incrementar cada vez mais a utilização de consultores. A utilização da atividade de consultoria em empresas privadas foi, posteriormente, ampliada às empresas públicas e também aos países que eram geridos por economias socialistas com planejamento central. Especificamente nos Estados Unidos, durante a década de 1980, um grande número de profissionais ligados à saúde mental foi atraído para o trabalho de consultoria organizacional em função da demanda e especificidade de problemas, geralmente ligados à área comportamental; e ainda pela oportunidade de utilização de suas áreas de conhecimento e experiência, além do melhor retorno financeiro decorrente da valorização desse profissional. (HANSEN, 1990). Na definição de Block (1991, p.2), “o Consultor é uma pessoa que por sua habilidade, postura e posição, têm poder de influência sobre pessoas, grupos e organizações, mas não tem poder direto para produzir mudanças ou programas de implementação”. Assim, o Consultor tem uma posição de influência, mas não pode assumir o controle das mudanças. O Consultor deve prestar consultoria e não assumir uma posição de gerência. Esta posição está baseada numa abordagem educacional, onde o papel do Consultor é o de oferecer caminhos, mas é o cliente que deve tomar a decisão final. A atividade de consultoria, além de ser uma relação de ajuda envolvendo pessoas especializadas na resolução de problemas, pressupõe que haja uma relação de parceria entre consultor e cliente, cujo resultado está diretamente relacionado ao nível de comprometimento de ambas as partes. Este comprometimento deve ocorrer tanto para com a relação em si, com o problema focado e com o resultado esperado. Em relação à Consultoria Interna de Recursos Humanos, iniciou-se o movimento de utilização desse modelo em empresas americanas, que buscavam um profissional habilitado para trabalhar com aspectos mais amplos. O foco era auxiliar o cliente interno, no caso, as lideranças, para resolver problemas de diversas naturezas, como a diferenciação de salários, estratégias para desenvolvimento de pessoas, problemas éticos envolvendo a equipe e/ou a empresa, dificuldades com a equipe de trabalho e condução de processos de mudança, entre outros. Define-se consultoria interna como uma atividade meio, orientada para dar suporte às 6 atividades fins nos diferentes campos que envolvem mudança, conhecimento técnico, pesquisa e desenvolvimento; e o Consultor Interno, caracteriza-se por ser um profissional vinculado à empresa, devidamente capacitado para atuar em processos de mudança, sejam eles num sentido estratégico ou em atividades táticas da Organização (HANSEN, 1990). Esta atividade vem caracterizando-se como uma nova função que se configura com o objetivo de responder de maneira ágil e inteligente, às necessidades organizacionais. Um dos principais argumentos em favor desse modelo refere-se a respostas que o mesmo trouxe às organizações, tais como: redução de custos em projetos realizados internamente pelos Consultores Internos, soluções de problemas mais adequados à realidade vivida, respostas rápidas em problemas emergenciais, possibilidades de monitorar a implementação de um projeto e o conhecimento e familiaridade com as estruturas e funcionamento da empresa, tanto no aspecto formal quanto informal (KELLEY, 1979; HANSEN, 1990). Hoje, pode-se compreender que esse modelo ainda contribui para uma atuação mais estratégica da área de Recursos Humanos, pois permite ao profissional dessa área atuar mais próximo das lideranças e de realizar intervenções que visem a eficiência organizacional. De qualquer forma, o modelo ainda carece de maiores estudos e, por conseqüência, de maior clareza em relação ao papel do consultor nesse modelo. 2.2.2 Papel do Consultor Interno Em relação ao Consultor Interno, é comum encontrarmos definições caracterizando-o como um generalista ou Consultor Interno de pessoas. Em nosso entender, o Consultor Interno de Recursos Humanos não é um ‘simples’ generalista, com conhecimentos gerais sobre sua área de atuação, mas sim um especialista em todos os processos de Recursos Humanos. Trata-se de um profissional que faz parte do quadro da organização e possui um vínculo de trabalho com base nas leis contratuais, ou seja: é um funcionário da organização. É também um especialista numa área de conhecimento, pois caso contrário não seria considerado um Consultor, além de não ter poder decisório para implantar ações, mas sim para recomendar (KELLEY, 1979; CZARNECKI, 1981; HANSEN, 1990). A figura do profissional especialista tem dado lugar a um profissional com qualificações múltiplas, que possam dar suporte aos processos de mudança nas organizações. Esses processos têm sido cada vez mais intensos e têm se manifestado através de diferentes práticas e abordagens de intervenções que incluem, entre outras formas, mudanças que envolvem produto, qualidade, produtividade, estrutura, cultura, tecnologia, etc. Neste sentido, entende-se o Consultor Interno como um especialista e não como um generalista. Acredita-se que a expressão ‘generalista’ possa transmitir a mensagem de alguém que conheça e domine superficialmente alguma área de atuação. Porém, ao observar o papel e responsabilidades de um Consultor Interno, entende-se que o mesmo deve dotar de profundos conhecimentos a respeito de sua área. Assim, pode-se definir que o Consultor Interno, por ser especialista num campo de conhecimento, e por sua habilidade, experiência, postura e posição, pode influenciar diferentes segmentos da organização (pessoas e grupos), mas não possui poder decisório sobre seus clientes para a implementação de mudanças. O Consultor Interno parece estar, para os processos de aperfeiçoamento e mudanças organizacionais, assim como o operário multifuncional está para as células de manufatura nas atividades de produção. Passa a ter um papel fundamental nas diferentes atividades de uma empresa, uma vez que ele terá como função básica a responsabilidade de ajudar os clientes internos a resolverem problemas, sejam eles de ordem tecnológica, mercadológica, estrutural, cultural, operacional, comportamental etc. 7 A atividade de consultoria interna abrange um escopo amplo, tendo vários objetivos. Para Kurb (1980), esses objetivos são: 1) promover a integração a um cliente; 2) resolver problemas de um cliente; 3) realizar diagnóstico que pode gerar a redefinição do problema; 4) fazer recomendações baseadas no diagnóstico; 5) prover assistência na implementação das recomendações; 6) conseguir consenso e comprometimento em torno da ação corretiva; 7) facilitar aprendizagemdo cliente, isto é, ensinar ao cliente como resolver problemas semelhantes no futuro; e 8) promover de forma permanente a efetividade organizacional. O Consultor Interno, portanto, transita por estas diferentes modalidades de objetivos em função de duas variáveis: uma refere-se à demanda apresentada pela organização em termos de metas organizacionais e que funcionarão como pano de fundo da atividade de consultoria e a outra, refere-se à demanda apresentada pelo cliente, cuja natureza do problema trazido reforçará a atuação em um ou mais objetivos. Mesmo apresentando um alto grau de importância, sabe-se que o papel do Consultor Interno sofre limitações. A principal delas refere-se à efetividade de suas ações de intervenção em função de sua posição e de seu papel na organização. O Consultor não possui carreira gerencial, mas sim técnica. Para muitas organizações, o viés técnico no desenvolvimento de carreira não é visto como estratégico, dando ao Consultor Interno um pouco espaço para circular dentro da estrutura hierárquica da organização. Outra limitação se refere à qualidade de sua objetividade em trabalhar com os problemas organizacionais, em função de ser um membro da organização, logo, sujeito aos vícios e contaminações culturais. É importante que o Consultor Interno tenha clareza dessa situação, pois assim fica mais fácil de ele perceber quando seu envolvimento com a organização, em determinada situação, torna-se dificultador para sua ação. Nessas situações o consultor interno pode ter auxílio de uma consultoria externa ou ainda de um colega – Consultor Interno – de outra área (HANSEN, 1990; MOSCOVICI, 1994). Diversos autores trouxeram conceitos e teorias sobre os papéis desempenhados pelos Consultores Internos nas organizações. Champion, Kiel e Melendon apud Néri (1985) propõem nove papéis básicos para o Consultor Interno, sendo eles: observador reflexivo, facilitador, conselheiro, coach, professor, assessor técnico, especialista, modelador de comportamento e parceiro do cliente. Já Uhlfelder (1993) propõe sete papéis ao Consultor Interno: professor/treinador, facilitador de grupos, líder, conselheiro, expert, preparador e facilitador. Este autor reforça que a postura do Consultor Interno deve se concentrar em papéis mais diretivos no início de um projeto, devendo migrar para papéis de facilitação na medida em que os projetos vão avançando. Ainda em relação aos papéis, Gebelein (1989) apresenta uma posição bastante similar à dos autores citados anteriormente, ao afirmar que os Consultores Internos podem assumir diferentes papéis, mas freqüentemente desempenham três: de iniciador, de especialista (expert) e de facilitador. Como iniciador, é incumbido das responsabilidades básicas sobre o trabalho. Muitas vezes este papel pode ser confundido com o que Block (1991) denomina criticamente de “mão-de-obra”, ou seja: o Consultor faz um papel operacional de executor de uma tarefa do cliente. Como expert, ele oferece seu conhecimento especializado. Por fim, como facilitador, contribui para que o cliente resolva seus próprios problemas, ajudando-o a diagnosticá-los e solucioná-los. É fundamental que, neste papel, o Consultor tenha domínio de teorias e técnicas educacionais. Muitas vezes, pela falta de conhecimento, incorre no erro de pensar que ‘facilitar’ não exige métodos específicos. Alguns clientes não conseguem resolver seus problemas, simplesmente, porque nunca aprenderam. Aprender com um Consultor Interno pode ser o ponto de partida, desde que ele se proponha e saiba ensinar. O envolvimento do Consultor Interno no processo de intervenção de consultoria é, também, um fator que está intimamente relacionado com o seu papel. Hansen (1990) 8 relaciona esta questão com a participação ativa versus a participação passiva do Consultor. Na participação ativa, o Consultor assume o papel de especialista que deve buscar soluções e fazer recomendações, baseado em sua condição de especialista, ficando o cliente com a responsabilidade de implementar as recomendações propostas por ele. Essa posição de ‘notório saber’ embute a crença de que o Consultor Interno é aquele que resolve os problemas e, de certa forma, coloca o cliente numa posição secundária. Já na participação passiva, o Consultor atua no papel de formador, que deve educar o cliente para que ele possa conduzir o processo ou resolver problemas sempre que surgirem, em vez de centrar as soluções na figura do consultor. Assim, pôde-se identificar que existem diversos aspectos que circundam a atividade de consultoria interna. Nas organizações, nota-se que o debate a respeito desses papéis, e muitas vezes, os dilemas enfrentados pelos Consultores Internos, provocam receios e dúvidas da eficácia desse modelo. 3. MÉTODO Para realização desse estudo, fez-se um estudo de caso de abordagem qualitativa (YIN, 2005). O total de participantes foi de 32 sujeitos, sendo que a unidade de análise definida foi os profissionais que atuam como Consultores Internos de Recursos Humanos ou que trabalham na área de RH em empresas interessadas em implantar tal modelo. Os participantes foram investigados por meio de observação durante dois cursos de Formação para Consultores Internos de Recursos Humanos, realizados na cidade de Porto Alegre, respectivamente, durante os anos de 2007 e 2008. Cada curso teve uma duração de 56 horas cada, organizados em 7 encontros com duração de 8 horas, durante um intervalo de 15 dias. As informações levantadas durante as observações foram analisadas com a técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 1979). Os dois cursos de Formação para Consultores Internos de Recursos Humanos tinham o mesmo planejamento e estrutura de conteúdo programático, abordando temas como: conceito de consultoria, papel do consultor, modelos de intervenção e diagnóstico organizacional. Ainda, utilizou-se, como método de ensino, uma abordagem Andragógica visando um aprendizado coletivo. Os estudos eram focalizados em abordagens teóricas e simulações de estudo de caso, propiciando debate entre os participantes. Os pesquisadores do presente artigo alternaram-se como facilitadores do referido treinamento, estando presentes em tempo integral. Dessa forma, foi possível realizar observações a respeito do temas propostos para esse estudo, onde expectativas, anseios, dúvidas, frustrações e dilemas dos participantes em sua função, ao longo do treinamento, foram registradas e sintetizadas pelos pesquisadores, servindo de base para realização desse artigo. O grupo participante da pesquisa caracterizou-se por ser de 84% de mulheres e 16% de homens. Todos tinham formação superior completa, na qual predominavam as de Psicologia, Administração e Ciências Contábeis. Em menor proporção, formações em Assistência Social, Pedagogia e Relações Públicas complementavam o perfil dos sujeitos participantes. A idade dos mesmos era entre 25 e 45 anos. De forma geral, as funções exercidas pelos sujeitos, nas empresas em que atuavam, eram de Consultor Interno ou Analista de Recursos Humanos. A maior parte dos sujeitos atuava em indústrias do ramo de Fertilizantes, Papel e Celulose, Alimentos, Petrolífero e Aço. Em menor proporção, também participaram sujeitos atuantes em empresas de Comunicação, Bancos e Entidades de Classe Patronal. 9 4. RESULTADOS DA PESQUISA Para realizar a análise dos resultados observados nos dois grupos de pesquisa, organizam-se as informações coletadas e identificadas em categorias, conforme a técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 1979). Inicialmente, trata-se a respeito do papel do Consultor Interno nas empresas, na busca de reflexões quanto à atuação do mesmo perante o seu cliente. Em seguida, abordam-se aspectos sobre a relação entre o Consultor Interno e o cliente (gestor). Posteriormente, refere-se ao papel do gestorda área de Recursos Humanos, como aspecto fundamental para a concretização do modelo de consultoria interna na empresa. Por fim, discutem-se tópicos sobre os limites da intervenção do Consultor Interno nas empresas que atuam com esse modelo. 4.1 Papel do Consultor Interno Durante a realização da pesquisa, pôde-se observar que uma das discussões iniciais nos grupos de trabalho ocorreu sobre a existência ou não de diferenças entre o papel de Analista e o de Consultor Interno de Recursos Humanos. De forma geral, não havia clareza, mesmo por parte dos sujeitos que já atuavam como Consultor Interno, do seu real papel dentro das empresas, e ainda das diferenças que existem para quem atuava como Analista de RH. Em nosso ver, esse cenário ocorre tanto pelo fato das empresas não terem conhecimento a respeito do modelo de Consultoria Interna, quanto pelas dificuldades que o Consultor Interno tem para assumir as suas responsabilidades nesse processo. Este cenário, por conseqüência, contribui para que o próprio cliente sinta-se confuso em relação ao papel de cada uma das partes, prejudicando o funcionamento estratégico, tático e operacional do modelo. Em nosso entender, o Consultor Interno de RH tem uma atuação técnica, exercendo um papel de influência, em virtude do conhecimento técnico que deve ter sobre Recursos Humanos. Porém, ele não tem uma posição hierárquica de liderança. A diferença fundamental em relação à posição de Analista é que o Consultor Interno não é mais responsável por uma atuação funcional, sob uma lógica processual de Recursos Humanos, mas sim de atuar como um representante do RH junto aos gestores da empresa. Não é responsabilidade do Consultor Interno tomar decisões a respeito de situações de seu cliente, mas sim apoiá-lo, prestando conhecimento técnico e utilizando sua experiência. Isso implica, necessariamente, que o Consultor Interno tenha capacidade de argumentação perante seu cliente (o gestor). Nesse sentido, o debate entre os sujeitos pesquisados, a respeito do papel do Consultor Interno, remeteu ao perfil de quem ocupa essa posição. Em diversos momentos, o entendimento dos dois grupos era que se tratava de um profissional ‘generalista’ em Recursos Humanos, com conhecimentos gerais a respeito da área. Porém, com a intervenção dos facilitadores, ao trazer o conceito de Consultor Interno como um ‘especialista em Recursos Humanos’, que tenha profundos conhecimentos de todos os processos da área, além de uma visão sistêmica organizacional, o grupo deparou-se com um conflito. Isso decorreu, em nosso olhar, em virtude do distanciamento entre o perfil desses profissionais e o perfil necessário para atuação de um Consultor Interno. Este distanciamento percebido pelo grupo favoreceu o debate e o entendimento sobre a importância do desenvolvimento do Consultor Interno, como um requisito fundamental para o mesmo ocupar essa posição. É necessário que o Consultor tenha uma forte base conceitual para conseguir exercer a sua capacidade de influência aos clientes. Em nosso entender, essa base conceitual refere-se, além de conhecimentos em Recursos Humanos, ao negócio da empresa, de elementos objetivos e subjetivos do ambiente organizacional (cultura, clima, 10 estrutura organizacional, relações de poder, comunicação, processos grupais, etc.), da área(s) do(s) cliente(s), de diagnóstico organizacional e de processos de mudança. Ainda, os grupos debateram a respeito da postura e atitudes exigidas a esse profissional. Nos grupos, abordaram-se aspectos sobre a necessidade de empatia por parte do Consultor Interno para com o cliente; do mesmo ter habilidade de uma escuta especializada, tanto de aspectos objetivos quanto de subjetivos que possam estar implicados no cenário em pauta; de manter um comportamento ético, pois irá se deparar com diversas situações de problemas e conflitos ao redor de sua atuação; e, ainda, de ter uma capacidade de questionar o cliente, de saber fazer perguntas pertinentes ao contexto no qual está atuando, visando ampliar o olhar de determinada situação. Baseado em nossa experiência, acredita-se que quanto melhor for a referência conceitual e expertise do Consultor Interno, aliado às atitudes descritas no parágrafo anterior, mais seguro ele se demonstrará perante o cliente. Isso, certamente, irá facilitar a relação entre ambos e na capacidade de influência do Consultor para com o seu cliente. Em nosso entender, embora os dois grupos pesquisados tenham discutido e concluído a respeito dessas definições, percebe-se dificuldades dos profissionais de Recursos Humanos em assumir e atuar nesse papel. Ainda, observa-se que faltam, nas empresas, ações para consolidação deste modelo e espaço para o desenvolvimento conceitual e atitudinal dos Consultores. 4.2 Relação com Cliente Puderam-se perceber, nos sujeitos dos grupos pesquisados, divergências em relação a quem é o ‘cliente’ do Consultor Interno. A maior parte dos grupos compreendia que o cliente era representado por todos os funcionários da empresa, independente da posição hierárquica. A menor parte, que concordava com a posição teórica apresentada pelos facilitadores, entendia que o cliente do Consultor Interno era os ocupantes de posições de liderança. Em nosso olhar, essa interpretação inicial, de que o cliente do RH são todos os funcionários, pode ser compreendida pela característica histórica da área em atuar como um ‘representante dos funcionários’ e que deve prestar auxílio a todos. Porém, essa visão não contempla a perspectiva de geração de valor por parte da área por meio de compartilhamento de conhecimento especializado e expertise em gestão. Esse compartilhamento, em nosso ver, ocorre por meio da relação entre cliente e Consultor Interno. Nesse contexto, um dos aspectos abordados pelos grupos tratou-se da construção dessa relação que, apesar de ser imposta pelo modelo a partir da sua adoção, requer um tempo e um processo para sua consolidação. Para essa consolidação, discutiu-se que se torna importante considerar dois aspectos principais. Inicialmente, debateu-se a respeito da importância de se estabelecer uma relação de confiança mútua entre Consultor e cliente. Isso ocorrerá, especialmente, pelas atitudes que ambos terão no início e ao longo dessa relação. O outro aspecto refere-se à compreensão e clareza dos estilos pessoais do cliente e do Consultor Interno, que podem facilitar ou dificultar a relação e, por conseqüência, o andamento do trabalho. As dificuldades na relação entre cliente e Consultor Interno podem decorrer, entre outros motivos, pela falta de cuidado, principalmente por parte do Consultor, desses aspectos. Em nosso olhar, uma das conseqüências negativas pode ser a solicitação de troca de Consultores por parte dos clientes, e vice-versa. De qualquer forma, a troca, nesse sentido, consolida o modelo de consultoria interna na empresa, pois caracteriza um amadurecimento da área de RH em conseguir compreender que a relação não se estabeleceu e, com isso, os resultados esperados não serão atingidos. Porém, torna-se importante ter clareza de que a troca constante de Consultores e clientes dificulta a construção de uma relação duradoura de 11 confiança mútua e não permite ao Consultor tempo hábil para aproximação com o cliente e sua área. Em nosso entender, a troca de Consultor e cliente deve ser acompanhada de uma reflexão sobre os pontos de dificuldades de cada um dos envolvidos. Outro aspecto debatido pelos grupos foi sobre a relação entre o Consultor Interno e a equipe de trabalho do cliente. As dúvidas recaiam, basicamente, em até que ponto é responsabilidade do Consultor atuar como interlocutor dos funcionários e o cliente. Constatou-se que existe uma linha tênue entre a escuta e o retorno que o Consultor precisa fazer para a equipe e o gestor da área(seu cliente), pois o mesmo não deve assumir um papel de ‘intermediário’ na relação. É importante que o Consultor compreenda que o seu cliente é o gestor. Qualquer atuação sobre a equipe é de responsabilidade do gestor, sendo que interferências do Consultor na equipe de seu cliente poderão acarretar em conflito na relação entre ambos. Ainda, os sujeitos pesquisados trouxeram um conflito recorrente nas empresas em que atuam: a relação de poder imposta pelos seus clientes em virtude da posição hierárquica que ocupam, por terem cargos diretivos e os consultores não. Viu-se que existe uma dificuldade, por parte dos Consultores, em lidar com o fato de se reportar estruturalmente a um gestor de Recursos Humanos e terem como cerne de sua atividade a relação com outros gestores. Observou-se, conforme o debate dos grupos em estudo, que é comum os clientes (gestores), talvez por não compreenderem o modelo de consultoria interna, utilizarem seus Consultores para atividades que não são responsabilidades do mesmo, tanto para trabalhos administrativos da área, quanto para assumir papel gerencial perante a equipe do seu cliente. Em alguns momentos, visualizou-se que o próprio Consultor aceita esse funcionamento. Isso decorre, principalmente, por ele não ter conhecimento técnico e expertise para atuar como Consultor, não se sentindo seguro para exercer seu papel. Nesse contexto, o Consultor depara-se com uma angústia e um incômodo, pois se sente desnorteado em relação a sua atividade, tanto por não conseguir influenciar tecnicamente o seu cliente, quanto por não ter uma relação de poder hierárquico que lhe permita contestar a posição do cliente. Perante o grupo, viu-se que esse cenário de dificuldades corroborou a importância da necessidade de desenvolvimento por parte do Consultor Interno, pois os sujeitos compreenderam que sua principal ferramenta de trabalho é a base conceitual que irá lhe permitir agir com influência para com o cliente. 4.3 O papel do Gestor de RH no modelo de Consultoria Interna Em diversos momentos, observou-se que os dois grupos de sujeitos pesquisados remeteram à importância de se consolidar o modelo de consultoria interna para toda a organização. Em nosso entender, a clareza e a divulgação desse modelo é responsabilidade do gestor da área de Recursos Humanos. Ainda, antes de qualquer implantação e execução do modelo, torna-se necessária a sua validação perante todo o grupo diretivo, devendo ser interpretado como um modelo de apoio à gestão. Alguns relatos dos sujeitos pesquisados demonstraram as dificuldades de concretização da atuação dos Consultores em ambientes nos quais não houve um processo adequado de comunicação e clareza nos papéis dos gestores e do Consultor, onde o gestor da área de Recursos Humanos atua como legitimador dessas ações. Em nosso ver, erros no processo de implantação são uma das principais causas de desistências por parte das organizações do uso do modelo de consultoria interna. Em relação à estrutura da área de RH, torna-se importante que o gestor de Recursos Humanos ofereça condições para o funcionamento do modelo. O Consultor, diante de suas responsabilidades técnicas, não deve dar conta de trabalhos e rotinas operacionais. Assim, é necessário que a área tenha uma estrutura de profissionais que realize os serviços burocráticos 12 e operacionais inerentes aos processos de Recursos Humanos. Nos grupos investigados, diversos sujeitos relataram ter que realizar atividades operacionais, como apoio logístico para treinamentos, lançamentos em sistema informatizado, preparação de slides, entre outros, que poderiam ser realizados por outros profissionais da área. Ao realizar essas atividades, os mesmos se deparavam com a falta de tempo para realizar sua função principal: apoiar o cliente na gestão de suas equipes. Ainda, comentaram que se sentiam subvalorizados em relação ao potencial e preparo que julgavam ter. O gestor de Recursos Humanos é fundamental no desenvolvimento da equipe de Consultores Internos. É de sua responsabilidade manter o alinhamento do trabalho dos Consultores, na qual as políticas de gestão de pessoas são ferramentas norteadoras para atuação dos mesmos. Ainda, o gestor de Recursos Humanos deve atuar como forma de minimizar ou eliminar eventuais conflitos entre os próprios Consultores. Na pesquisa realizada, pôde-se perceber que, quando a estrutura do modelo de Consultoria não é clara e as políticas não são definidas e/ou conhecidas, há maior risco de conflitos e competição entre os Consultores Internos, o que expõe a área perante os clientes. Ainda, no grupo investigado, identificaram-se alguns exemplos de conflitos entre Consultores Internos, como a preferência por atender determinado cliente, a ‘eleição’ de um processo como o mais importante, em detrimento de outro, e a falta de comunicação entre projetos, entre outros. No grupo pesquisado, também se observou que algumas empresas, ao definirem a implantação do modelo de consultoria interna, se deparam com a dificuldade de encontrar profissionais especialistas em Recursos Humanos, com sólidos conhecimentos em todos os processos. Assim, elas optam por implantar a estrutura de consultoria de forma híbrida, tendo profissionais atuando como Consultores de RH e, ainda, sendo responsáveis pelo subsistema no qual possui mais experiência. Em nosso entender, a implantação do modelo de consultoria interna, de forma híbrida, pode ser uma alternativa em função da escassa oferta de profissionais especialistas em Recursos Humanos. Porém, acredita-se que a mesma deve ser temporária, como uma fase entre a ruptura do modelo funcional e o de consultoria interna. Nesse contexto, é necessário que o gestor de RH tenha consciência desse gap e promova o desenvolvimento do grupo de Consultores, o que pode ser feito, a nosso ver, por meio da aplicação de job rotation entre os mesmos. Outro aspecto que se identificou ao longo das discussões dos grupos pesquisados refere-se à importância da atuação do gestor de RH como legitimador das ações dos Consultores Internos. Ao mesmo tempo, é importante que o gestor de RH exerça seu papel como responsável da área e atue hierarquicamente sobre os seus Consultores. Nos grupos investigados, viu-se que pode ocorrer uma sobreposição de papéis entre o gestor da área de Recursos Humanos e o cliente (gestor de outra área) sobre o Consultor. Porém, é importante comentar que o reporte funcional do Consultor é ao gestor da área de Recursos Humanos. Os pesquisados, em relação a esse cenário, comentaram a sensação de ‘pressão’ na qual se deparavam em função dessa dupla gestão. De qualquer forma, apesar do reporte do Consultor ser ao gestor de RH, sua atuação também contempla em administrar os anseios e as expectativas do seu cliente. Este, pela posição hierárquica de liderança que tem, pode intervir na atuação do Consultor, o que não é correto no modelo de consultoria interna e deve ser prevenido, em nosso ver, pelo gestor de Recursos Humanos. 4.4 Limites da Intervenção do Consultor Interno Um dos aspectos tratados pelo grupo de pesquisa referiu-se aos limites da intervenção do Consultor Interno. Uma das dificuldades debatidas nos grupos deu-se sobre a necessidade do mesmo ter um olhar diferenciado sobre as situações nas quais é demandado. Entre as 13 dificuldades de intervenção, os sujeitos pesquisados trouxeram a obrigação imposta pelos seus clientes para que tenham uma ‘visão externa e isenta’, mesmo fazendo parte da organização. Ainda, ao longo de nossa pesquisa, foi comum observar comentários dos sujeitos de que os seus clientes esperam uma ‘solução mágica e imediata’ para os problemas da área. Notou-se que, nas empresas que atuam no modelo de consultoria interna, pode existir uma expectativa por parte dos clientes de que o Consultor Interno resolvaboa parte dos problemas da empresa. Porém, em nosso ver, o modelo de consultoria interna não pode ser interpretado dessa forma, visto que o Consultor Interno tem papel de influência e não de tomada de decisão. O fato do Consultor Interno não ser um tomador de decisões também é uma limitação da intervenção. Nos grupos pesquisados, esse aspecto foi comentado, principalmente, em situações onde o Consultor Interno tem clareza do que deveria ser feito, mas não consegue influenciar o cliente para a tomada de decisão. Esse cenário foi descrito, na visão dos sujeitos, como um dos aspectos mais frustrantes da sua atividade, lhes causando ansiedade e um sentimento de que os projetos não se concretizam e/ou que situações erradas não se modificam. Porém, o modelo de consultoria interna de Recursos Humanos prevê que a tomada de decisão é responsabilidade do cliente (gestor), cabendo ao Consultor Interno apoiá- lo. Saber lidar com essa condição e contexto é fundamental para atuar como Consultor Interno nas empresas. Nos sujeitos pesquisados, percebeu-se que um cenário de dificuldades para atuação – como a falta de clareza do modelo, os conflitos com o cliente, a baixa legitimação do seu papel e o poder de influência, entre outros – pode provocar uma reflexão a respeito da carreira dos mesmos onde atuam. Durante a realização da pesquisa, alguns sujeitos comentaram o desejo em trocar de empresa, tendo em vista as dificuldades que observavam na empresa atual, principalmente, em relação aos clientes. Ainda, outros sujeitos, ao compreender o real papel do Consultor Interno, mencionaram que não se identificaram com as atividades deste e optaram por não atuar mais nessa posição, decidindo exercer outras funções dentro da área de Recursos Humanos, provavelmente em um modelo funcional. Outro limite de intervenção, debatido nos grupos de nossa pesquisa, referiu-se que, em alguns momentos, a contratação de um Consultor Externo tenha mais representação e possibilidade de influência, em relação ao Consultor Interno. Com base nos relatos dos participantes, percebeu-se que algumas organizações, em determinadas situações, tendem a valorizar mais as ações de gestão quando essa é realizada por um agente externo, mesmo que esse careça de um domínio do ambiente no qual realiza a intervenção. Ao Consultor Interno de Recursos Humanos, cabe considerar e avaliar as situações e contextos que poderão atingir melhores resultados com a contratação de um Consultor Externo. Além disso, precisa atuar como um elo entre empresa e Consultor Externo, prestando informações e trazendo a sua visão a respeito da situação. Em diversas vezes, a contratação de um agente externo, além do mesmo contribuir com sua experiência, poderá garantir mais legitimidade para diagnósticos, influências e processos de intervenções organizacionais. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo se propôs a debater sobre a prática da consultoria interna nas áreas de Recursos Humanos, com base em dois grupos de sujeitos que realizaram cursos de Formação em Consultoria Interna de Recursos Humanos. O principal objetivo desse estudo foi refletir a respeito do papel do profissional que atua nesse modelo, contemplando os diversos aspectos que resultam com a adoção dessa estrutura. Procurou-se apresentar, ainda, aspectos como a relação do Consultor Interno e o cliente, o papel do gestor da área de Recursos Humanos 14 nesse modelo e os limites de intervenção no qual se depara o Consultor Interno em sua atuação. Historicamente, a área de Recursos Humanos preocupou-se mais com pessoas e menos com o negócio da empresa (estratégia), o que certamente dificultou o seu avanço em relação a outras áreas organizacionais. Porém, entende-se que esses dois aspectos (pessoas e negócios) não são dissociados, devendo ser contemplados sistemicamente. Nesse contexto, acredita-se que o Modelo de Consultoria Interna de Recursos Humanos possa permitir que a área atinja um patamar mais estratégico, em relação ao modelo funcional, por contemplar tanto as pessoas quanto o negócio empresarial. Em virtude de uma maior proximidade da área de RH com os tomadores de decisão (gestores), a mesma tem a oportunidade de direcionar suas ações conforme o alinhamento estratégico da empresa, contemplando os profissionais que atuam nela. Porém, não é somente o modelo de consultoria interna que vai garantir uma atuação estratégica de RH, mas sim o posicionamento dos seus profissionais diante desse modelo. Em nosso entender, o profissional de Recursos Humanos deve ter um comportamento pró-ativo e questionador, com capacidade de perceber a organização como um sistema complexo, repleto de inter-relações. Deve entender que seu papel, atuando como Consultor Interno, é de exercer influência aos gestores da empresa, apoiando-os na execução de sua gestão. Não é seu papel tomar decisões frente a situações de gestão, o que é responsabilidade de cada liderança. Porém, com base em seu conhecimento técnico e experiência em Recursos Humanos, deve orientar o cliente para uma gestão mais adequada a realidade dos negócios e que contemple, tanto o negócio empresarial, quanto os profissionais que atuam na organização. A capacidade de influência do Consultor Interno decorre de sua capacidade em realizar diagnósticos, baseados em referencial teórico e na sua vivência, no qual o seu desenvolvimento constante é processo fundamental para o sucesso do modelo. Em relação ao Modelo de Consultoria Interna, acredita-se que não existe um modelo único, que seja adequado a todas as realidades organizacionais. Cada empresa precisa, antes de qualquer implantação, observar aspectos como: a capacitação dos seus profissionais de Recursos Humanos para atuarem como Consultores Internos, que poderá implicar numa implantação mais lenta ou ainda em formato híbrido; o nível de maturidade dos gestores para atuarem neste modelo, já que poderão ser mais exigidos em gestão de equipes; a estrutura da área de Recursos Humanos, que precisará prestar o suporte operacional necessário para que, efetivamente, os Consultores Internos consigam desempenhar o seu papel; o processo de comunicação interna do modelo, para que todos saibam seus papéis e responsabilidades dentro deste; e, por fim, ter consciência de que os resultados são lentos, pois o modelo requer um período de amadurecimento, tanto dos Consultores, quanto dos gestores, para atuarem nesse novo formato. Assim, com base em nossa pesquisa realizada, acredita-se que o modelo de consultoria interna de RH ainda tem espaço para avançar, tanto nos estudos acadêmicos, quanto nos ambientes organizacionais. Trata-se de um campo de conhecimento propício para debates em Recursos Humanos e gestão organizacional, talvez ainda pouco explorado. Em tempos constantes de repensar a atuação da área de Recursos Humanos, entende-se que o modelo pode contribuir para um maior alinhamento entre atuação tática de RH e estratégia organizacional. De forma geral, observou-se nos dois grupos pesquisados que há uma aceitação dos profissionais de RH em relação ao modelo, como uma forma de atender as demandas de gestão de pessoas, de alinhar as ações de Recursos Humanos com as decisões da empresa e, ainda, por permitir que a área assuma um papel mais presente na estratégia organizacional. 15 REFERÊNCIAS ARAUJO, Luis C. Gestão de pessoas: estratégias e integração organizacional. São Paulo: Atlas, 2006. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Ed. 70, 1979. BLOCK, P. Consultoria: o desafio da liberdade. São Paulo: McGraw-Hill, 1991. CZARNECKI, G. W. The Case of Internal Consulting. Journal of Systems Managment, v. 2, n. 11, p. 6-13, Nov. 1981. GEBELEIN, Susan H. Profile of an internal consultant: roles and skills for building. Training & Development Journal. v. 43, p.52-58, Mar.1989. HANSEN, J et al. Consultoration: concepts and practices. New Jersey: Prencice-Hall, 1990. KELLEY, E. Should you have an internal consultant? Harvard Business Review. v. 57, p. 110-120, Nov./Dec. 1979. KURB, Milan. Consultoria, um Guia para Profissão. Rio de Janeiro: Interamericana, 1980. KURPIUS, D., ROBINSON, S. An overview of consultation. Personal and Guidance Journal. p. 321-323, Feb. 1978. LAPIS, Naira L. Acumulação flexível. In: CATTANI, Antônio D. HOLZMANN, Lorena. Dicionário de trabalho e tecnologia. Porto Alegre: UFRGS, 2006. MOSCOVICI, Fela. Equipes dão certo. Rio de Janeiro: José Olimpio, 1994. NERI, A. Os vários chapéus de um consultor. Revista Treinamento e Desenvolvimento. São Paulo, ago. 1995. SCHEIN, E.H. Consultoria de procedimentos. São Paulo: Edgard Blucher, 1972. UHLFELDER, Helene F. So, you want to be an internal consultant. Journal for Quality & Participation. v. 6, p. 44-46, out./nov. 1993. WOOD JR, Thomaz. TONELLI, Maria José. Organizações e Recursos Humanos no Brasil: tensões e hibridismos. In: CRYTEOS 2005, Porto Alegre. Anais do CRYTEOS, 2005. YIN, Robert. Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2005.
Compartilhar