Buscar

História da Antropologia Unidade II

Prévia do material em texto

84
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
Unidade II
Na primeira parte do curso, analisamos os precursores da Antropologia, o surgimento do ser humano 
e as noções de cultura, etnia e identidade.
Na sequência de nossa discussão, vamos nos ater à formação dessa disciplina a partir do que 
pensaram seus pais fundadores, ao trabalho antropológico e aos elementos centrais do método dessa 
ciência, desde a Etnografia até as técnicas de pesquisa e trabalho de campo. Em seguida, traremos à 
luz alguns dos temas centrais estudados pela Antropologia, como sistemas de parentesco, sistemas 
políticos, religião, mitos e ritos.
Por fim, teremos uma discussão sobre o futuro da Antropologia e como essa ciência pode ser 
importante no nosso dia a dia e também na formação de um professor de ciências sociais.
5 Os pais fundadOres da antrOpOlOgia
5.1 O evolucionismo social: tylor, Morgan e frazer
Vimos até este ponto um pouco da Pré‑História da Antropologia. Terminamos aquele tópico com uma 
abordagem sobre a visão dominante no século XIX. Convém retomar um pouco do espírito daquele período, 
no qual era preponderante a ideia do triunfo da ciência sobre as demais formas de pensamento e não havia 
dúvidas, entre os europeus, da superioridade do “civilizado” em relação às populações selvagens ou primitivas. 
O sistema colonial estava plenamente instalado e exigia, para seu melhor funcionamento, que se entendesse 
melhor quem eram os povos das colônias. Se juntarmos a isso tudo a noção de que as ciências, notadamente 
as ciências humanas, já estavam estabelecidas, com seus métodos específicos, veremos que um curto passo a 
ser dado seria estabelecer uma ciência que se ocupasse da compreensão desses povos primitivos.
É nesse contexto que surge a ciência do antropos. Podemos assim dizer que essa Antropologia é fruto 
do colonialismo, mas é também o cume de uma preocupação ou necessidade de longa data a respeito da 
compreensão do outro, do diferente, daquele que é ao mesmo tempo igual e diferente, conforme comentamos 
anteriormente. Nesse sentido, ela seria um desenvolvimento automático dessa preocupação, tendo, dessa vez, 
como base de reflexão o pensamento científico. Entretanto, não seria possível, devido às características daquele 
momento, que essa Antropologia inicial se abstivesse de um forte componente etnocêntrico, uma vez que se 
tratava da afirmação da superioridade do branco sobre os nativos primitivos.
Um detalhe bastante importante a ser ressaltado e que de alguma maneira demonstra certo avanço 
é que esse nativo não era mais considerado um selvagem, como o fora até o século XVIII. Nesse momento 
histórico, os nativos das colônias eram também considerados seres humanos (com pleno reconhecimento 
de sua humanidade), membros de uma mesma espécie, e o que os diferenciaria dos europeus seria o 
estágio de evolução em que se encontrariam.
85
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
Essa primeira escola antropológica ficou conhecida pelo nome de evolucionismo. Num primeiro 
momento, essas diferenças de estágio evolutivo, tão aparentes para todos aqueles que se detiveram 
na observação desses povos, eram bastante elucidativas e explicavam com certa coerência as gritantes 
diferenças entre os povos. Eram influentes, também, as ideias evolucionistas de Charles Darwin. Para 
esses primeiros pensadores, as diferenças humanas poderiam ser explicadas pelas diferenças de estágio 
de evolução entre os grupos humanos, agora pensando em termos até de uma evolução biológica. O que 
reforçava essa posição era a ideia de raça, supostamente, uma noção biológica.
Em outras palavras, é como se entre os humanos pudéssemos encontrar, num mesmo período 
histórico‑geológico, indivíduos de uma mesma espécie em diferentes graus de evolução. Com o passar 
do tempo, ficará evidente que isso é um grande equívoco. Naturalmente, é um erro pensar assim, pois 
em nenhuma espécie encontramos, numa mesma época, grupos de indivíduos em diferentes estágios 
de evolução biológica. Podemos ter, por exemplo, nos dias atuais, elefantes modernos, mas não temos 
grupos de ancestrais de elefantes. Podemos até encontrar os fósseis desses antepassados dos elefantes 
modernos, mas eles eram de outra espécie, já desaparecida. Assim é com todos os seres vivos. Mas 
naquele momento não se tinha clareza disso e se acreditava que entre os humanos poderíamos ter esses 
diferentes graus de evolução convivendo. As diferentes raças, naquilo que se entendia por raça, seriam 
as provas evidentes dos diferentes graus evolutivos.
Os grupos humanos estariam, assim, distribuídos da seguinte forma:
•	 primitivos	(selvageria);
•	 bárbaros	(barbárie);
•	 civilizados	(civilização).
Vamos lembrar que o progresso tecnológico e científico estava em pleno auge no século XIX. A 
exploração pelo interior do território europeu fez que fossem encontrados fósseis de nossos antepassados 
em regiões até então não exploradas. Chamados de homens das cavernas, esses fósseis não eram vistos, 
num primeiro momento, como exemplares de humanos primitivos. As diferentes feições físicas, por 
exemplo, entre as nossas e as dos fósseis de neandertalenses encontrados eram atribuídas a indivíduos 
com deficiências e portadores de doenças causadoras de má‑formação. A visão religiosa de então não 
permitia compreendê‑los como nossos antepassados. Com o avançar da ciência e o começo da aceitação 
das ideias de Darwin, os homens das cavernas passaram a ser vistos como registros fósseis do passado 
histórico dos europeus.
Junto aos fósseis foram descobertos artefatos de pedra, como os famosos machados. Dessa maneira, 
a comparação com o modo de vida dos povos tribais, que também utilizavam ferramentas líticas, era 
evidente. Para os pensadores daquele período, os índios estariam no mesmo estágio em que os europeus 
haviam estado no passado.
Essa visão incorporava o índio no universo humano, afinal, os europeus também haviam passado por 
aquele estágio, o que explicaria as diferenças gritantes entre eles e o ocidental moderno.
86
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
 lembrete
Voltemos um pouco no tempo para lembrar o que tratamos como a 
Pré‑História antropológica. Uma vertente que tinha em suas origens 
influências de pensadores como Rousseau tinha ganhado corpo e se ocupava 
em perceber as características humanas como fruto da aprendizagem, 
muito mais do que das aptidões inatas. Mesmo antes desse mestre francês, 
Locke (1632‑1714) já havia definido a mente humana como uma caixa 
vazia que seria preenchida ao longo do processo de aprendizagem.
Os primeiros pensadores antropológicos não ficaram exclusivamente presos à visão evolucionista 
com viés biológico. Interessava‑lhes verificar as diferenças culturais. Essa vertente da Antropologia 
começava a se voltar para os aspectos sociais como base para se compreender a espécie humana. No 
entanto, ainda não havia um conceito que definisse plenamente o que entendemos por cultura.
5.1.1 Tylor
Foi somente em 1871 que apareceu, pela primeira vez, o conceito de cultura para dar conta das 
diferenças entre os grupos humanos explicando‑as como não provenientes da herança biológica, mas 
da aprendizagem.
O grande marco dessa nova concepção foi, sem sombra de dúvida, a publicação do livro de Edward 
Tylor, Primitive Culture (Cultura Primitiva). Nessa obra, o antropólogo inglês, um dos pais fundadores da 
Antropologia, definia cultura como um atributo exclusivamente comportamental, compreendido como 
um conjunto de hábitos adquiridos pelo ser humano em sociedade por um processo de aprendizagem.Tylor (1832‑1917), assim como seus contemporâneos evolucionistas, ainda estava fortemente 
influenciado pelas ideias biológicas, mas procurava, na cultura, as raízes da diversidade humana e via 
nela uma invenção humana e o fruto da aprendizagem em um meio social. Apesar disso, nesse período, 
o viés etnocêntrico e racista ainda era bastante presente, uma vez que as diferenças entre os povos 
eram relacionadas a estágios diferenciados da evolução, estando o ranço europeu no topo do processo 
evolucionário.
É isso o que caracteriza a Antropologia Evolucionista. Além do ranço biológico, o evolucionismo 
compartilhava algumas ideias com o Iluminismo, como a noção de que o desenvolvimento social era um 
processo inevitável e determinado. De igual maneira, assumia a ideia de que as sociedades começavam 
num estágio de natureza e progrediam para um estágio civilizado.
É preciso, contudo, reconhecer que a Antropologia não é fruto do trabalho de um único autor. 
Geralmente localizamos em Edward Tylor a fundação da Antropologia. Isso se deve, principalmente, 
ao uso pioneiro da noção de cultura no livro Primitive Culture. Porém, vários outros autores daquela 
época contribuíram para o surgimento da nova ciência. Dentre eles citamos: Henry Maine (inglês, 
1822‑1888), com a publicação, em 1861, de Ancient Law (Lei Antiga ou Primitiva);	Johann Bachofen 
87
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
(suíço, 1815‑1887) com a publicação, também em 1861, de Das Mutterrecht (Matriarcado);	Adolf 
Bastian (alemão,	1826‑1905),	precursor	da	noção	de	unidade	psíquica	da	humanidade;	Lewis Morgan 
(estadunidense, 1818‑1881), com o livro A Sociedade Primitiva,	 de	 1877;	 e	 James Frazer (inglês, 
1854‑1941), com a publicação de O Ramo de Ouro, em 1890.
 saiba mais
Dos livros citados, apenas o de Morgan e o de Frazer estão traduzidos 
para o português. No entanto, há uma boa coletânea de textos de Tylor, 
Morgan e Frazer disponível:
CASTRO, C (Org.). Evolucionismo cultural: textos de Morgan, Tylor e 
Frazer. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.
O livro de Frazer, O Ramo de Ouro, tem uma edição resumida, mas 
ricamente ilustrada, que vale a pena conferir:
FRAZER, J. G. O ramo de ouro. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
O livro de Morgan possui uma publicação portuguesa:
MORGAN, L. A sociedade primitiva. Lisboa: Presença, 1980. v. 1 e 2.
5.1.2 Maine
Henri Maine ficou famoso por trabalhar a noção de lei nas sociedades primitivas. De acordo com sua 
tese, entre os indivíduos do mundo antigo, havia um forte vínculo com o status de grupos tradicionais, 
enquanto, no mundo moderno, no qual os indivíduos são vistos como agentes autônomos, eles são 
livres para fazer contratos e formar associações com quem escolherem.
Bachofen foi jurista e também pioneiro na Antropologia. Famoso pelos estudos sobre o matriarcado, 
ele reuniu documentos demonstrando que a maternidade é a fonte de todas as sociedades humanas, 
além de ter lidado com a relação entre o matriarcado e o direito da mãe com a religião. Podemos pensar 
em Bachofen como um dos precursores dos estudos de parentesco, tão importantes na Antropologia, 
como veremos adiante.
Mas são Tylor, Morgan e Frazer justamente os três nomes centrais do pensamento evolucionista na 
Antropologia.
Em todas as obras desse período, nota‑se uma forte intenção de se estabelecer um verdadeiro corpus 
etnográfico da humanidade. Há nelas a perspectiva de perceber a humanidade de um modo geral, de 
se incluir o primitivo, embora não mais aquele selvagem do tempo do Iluminismo, vivente num estado 
88
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
de natureza e distante da humanidade. Dessa maneira, a Antropologia, na busca da compreensão do 
significado de ser humano, volta‑se para as nossas origens, para as formas mais simples de organização 
e de mentalidade. A sociedade moderna ocidental seria, assim, o fruto de uma evolução que teria 
começado nos estágios mais primitivos.
Esse evolucionismo empreendeu um método comparativo, estabelecendo na comparação entre as 
diferentes sociedades a fonte da compreensão dos seres humanos. Porém, buscava‑se a confrontação 
de elementos isolados de seu contexto cultural mais amplo, fato que seria fortemente criticado 
posteriormente.
Para entender melhor, convém apontar alguns exemplos. As vestimentas eram comparadas entre as 
diferentes sociedades. As roupagens extremamente simples que um indígena usava eram vistas, a partir 
da moral cristã europeia, quase como nudez. Comparava‑se o hábito indígena com o de um britânico 
da Era Vitoriana, que trajava vestimentas altamente sofisticadas. O resultado seria colocar o indígena 
num dos extremos do gradiente da evolução, e o ocidental moderno, principalmente se britânico, no 
outro extremo. Esse tipo de comparação era feito também em vários outros aspectos, como é o caso 
da religião. As sociedades tidas como as mais primitivas eram as aborígines da Austrália. Suas crenças 
giravam em torno do totemismo e eram vistas como um pensamento não racional, arcaico e bastante 
inferior ao cristianismo monoteísta do europeu.
 Observação
Totemismo é um conjunto de ideias e práticas baseadas na crença na 
existência de um parentesco entre seres humanos e animais ou plantas. A 
partir dessa noção de parentesco se dá a formulação de toda a organização 
social.
Esse método comparativo empreendido pelos evolucionistas consistia em ordenar os fenômenos 
observados, segundo princípios estabelecidos de antemão. Era, portanto, uma postura etnocêntrica. Os 
elementos eram comparados segundo o que se supunha ser uma ordem lógica evolutiva. O estudo do 
parentesco tinha a noção ocidental de família como parâmetro. Ao verificar formas diferentes de parentesco 
entre muitas organizações indígenas, a conclusão era a não compreensão da complexidade dessas sociedades, 
seguida da sua classificação como promíscuas. Essa promiscuidade era vista como uma ausência de estrutura 
familiar e, portanto, um estágio inicial, primitivo, de todo e qualquer sistema de parentesco.
Uma característica fundamental do método evolucionista era a noção da existência de uma linha 
evolutiva única entre todos os povos humanos, a qual teria uma tendência a ser seguida inevitavelmente 
de maneira ascendente. Nesse princípio se inseria a visão da unidade psíquica da humanidade, ou seja, 
todos os seres humanos teriam o mesmo potencial de desenvolvimento, embora estivessem em graus 
bastante diferenciados na evolução.
O pensamento primitivo era, assim, tido como uma maneira errônea de pensamento, não porque o 
primitivo fosse um selvagem, mas somente porque estaria em um estágio primitivo de um processo que 
89
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
ele ainda teria de percorrer até chegar ao estágio científico. Essa noção de unidade psíquica, desenvolvida 
por Adolf Maine, foi importante, entre outras razões, por influenciar o pensamento de autores como 
Carl Jung. Mais tarde, o francês Lucien Lévy‑Bruhl elaborou a tese da mentalidade primitiva, dizendo 
que o primitivo não pensava de maneira lógica, como os ocidentais, mas de modo pré‑lógico.
Guardadas as evidentes críticas que devem ser feitas ao pensamento evolucionista, principalmente, 
com relação à visão etnocêntrica, essa corrente de pensamento pioneira trouxe consideráveis 
contribuições. Foram os evolucionistas os primeiros a organizar e formalizar um pensamento científico 
sobre as diferenças humanas e a contribuir teoricamente com a análise da realidade social para o 
conhecimento de diferentes sociedades e para o entendimento da humanidadede modo geral.
5.1.3 Frazer
Outra forte característica desses desbravadores da ciência antropológica é a ausência do trabalho de campo, 
ou seja, aquilo que é hoje uma característica elementar da Antropologia era evitado pelos evolucionistas. Eles 
foram, assim, chamados de antropólogos de gabinete, justamente por terem construído suas teorias de dentro 
de seus confortáveis gabinetes e não terem mantido contato com aqueles que denominavam primitivos. Apesar 
disso, esses antropólogos tinham enorme capacidade de juntar os mais diversos dados possíveis, coletados por 
viajantes, missionários e agentes coloniais, e de fazer suas comparações, em busca das unidades evolutivas. Há 
uma famosa piada, não sabemos se verdadeira ou não, contando que, quando indagado se conhecia algum 
primitivo, Frazer teria respondido à pergunta com um sonoro “não, graças a Deus”.
Frazer colecionava uma infinidade de fatos etnográficos de todo o mundo, do tempo presente e 
também de épocas historicamente mais distantes, além de procurar verificar numa ordem lógica a 
verdadeira história da humanidade. Nesse processo, ele separava os fatos de seus contextos originais, 
importando, apenas, o fato em si.
A fenomenal obra de Frazer, O Ramo de Ouro, de 1890, é uma coletânea de inúmeros mitos, rituais 
e crenças de diferentes povos, desde indígenas atuais até textos bíblicos e rituais do Egito e da Roma 
antiga. Uma verdadeira epopeia antropológica.
Figura 18 – Capa do livro O Ramo de Ouro
90
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
Apresentada em sua versão ilustrada em doze volumes, a obra busca compreender um mito do norte 
da Itália: o herói, sacerdote‑rei do bosque sagrado de Diana, e também seu consorte, que passa a vida 
ao pé de uma árvore sagrada, na beira do lago Nemi, sabe que seu sucessor deve assassiná‑lo, depois de 
ter roubado um ramo de visgo ou visco (o ramo dourado) que cresce no alto da árvore. As previsões se 
realizam quando as suas forças declinam, iniciando um novo ciclo da narrativa.
O ramo dourado é citado apenas marginalmente numa nota de rodapé de um verso de Ovídio sobre 
o santuário de Diana. Ele é apenas o artifício utilizado por Frazer para fazer toda a sua narrativa. Frazer 
utiliza esse quadro para apresentar uma vasta documentação colhida na biblioteca de Cambridge.
As perguntas de Frazer são: por que o sacerdote de Diana, o rei do bosque, tinha de matar seu 
predecessor? Por que, antes de matá‑lo, tinha de arrancar um visgo de ouro?
A primeira parte do livro é dedicada à distinção entre magia e religião (esforço do homem para conciliar os 
poderes superiores). Para Frazer, há uma evolução do pensamento que começa na magia e chega à ciência. Uma 
vez que tanto magia quanto ciência lidam com a Lei de Causa e Efeito, Frazer afirma que a magia é a precursora 
do pensamento científico. No entanto, o selvagem primitivo não consegue fazer a distinção entre natural e 
sobrenatural;	seu	mundo	é	regido	por	forças	sobrenaturais.	O	nativo	confunde	as	duas	coisas.	A	sequência	
lógica seria sair do mundo sobrenatural da magia e chegar à ciência, essa sim evoluída e, portanto, correta. 
No entanto, aqueles que não conseguem dar o salto qualitativo caem na submissão a um poder superior. 
Renunciando a uma explicação científica do mundo, aceitam a vontade dos deuses e permanecem nas forças 
do sobrenatural, agora na religião. Assim, a religião seria sinônimo do fracasso de se pensar cientificamente.
O grande valor dessa obra está na sua qualidade artística e na capacidade de recriar o espírito 
humano em algumas de suas expressões mais dramáticas, em diferentes tempos e sociedades. Por meio 
dessa multiplicidade infinita de manifestações, Frazer procura demonstrar a unidade essencial do espírito 
humano, pois percebe uma continuidade dos mesmos jogos de pensamento se repetindo ao longo dos 
tempos. Pretende, portanto, mostrar a progressão constante de formas rudes e perversas de conduta 
para formas cada vez mais purificadas e espiritualizadas – ou seja, a da realeza britânica.
No pensamento dos evolucionistas, há um enfoque centralizado em alguns temas. Notadamente, 
podemos perceber uma recorrência aos estudos de parentesco e de religião. Essas temáticas 
permaneceram centrais na Antropologia até os dias atuais. Mas por que despertaram a atenção já dos 
primeiros antropólogos?
A perspectiva de compreensão das diferenças humanas passava, inevitavelmente, pela comparação 
entre as sociedades. Talvez dois dos fatores que tenham chamado tanto a atenção dos antropólogos 
tenham sido justamente o parentesco e a religião. Esta última em sua intrínseca relação com a magia. 
Afinal, para esses evolucionistas, o primitivo não tinha religião, apenas magia.
Para alguns pais fundadores dessa ciência, o que mais chamava a atenção na comparação desses 
outros com o europeu branco, cristão e civilizado, era o fato de haver um enorme fosso no universo de 
compreensão e visão do mundo e nos hábitos um tanto exóticos dos nativos. Não se reconhecia nessas 
crenças uma verdadeira religião – que só podia ser monoteísta, revelada e denominada religião do 
91
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
livro. Extraordinariamente a essa ideia, podiam ser classificadas como religiões, no máximo, as grandes 
tradições do Oriente, como as religiões da Índia, da China e do Japão. Os povos tidos como primitivos 
eram detentores, dizia‑se, de uma mentalidade primitiva, que enxergava feitiçarias e animismos em todos 
os cantos. Pensar o diferente englobava pensar as diferentes mentalidades, fossem elas consideradas 
animistas, mágicas, míticas ou até pré‑lógicas.
A preocupação de fundo era, justamente, perceber como os povos primitivos podiam pensar de modo 
tão distante da maneira dos ocidentais. Tratava‑se de perceber a espécie humana por meio de uma unidade 
psíquica que ligaria o primitivo ao civilizado. O que poderia, então, distingui‑los era justamente o estágio 
de desenvolvimento das ideias. Enquanto uns pensavam ainda de maneira animista ou mágica, outros já 
tinham alcançado um estágio superior de desenvolvimento e de compreensão da realidade, sabendo separar 
a ciência, voltada para as coisas materiais, da religião, voltada para a dimensão da relação com o criador e 
para a verdade última.
Para Edward Tylor, o animismo seria universal e o primeiro estágio do processo evolutivo daquilo que 
viria a se tornar a religião. Embora sem a crença em deuses, o primitivo atribuía os fenômenos naturais 
à intervenção de espíritos benevolentes ou malévolos. Para o animismo, o mundo estaria povoado por 
seres que habitariam os objetos, as plantas, os animais e os homens. As experiências da doença, da morte 
e, sobretudo, dos sonhos estariam nas origens da noção de alma. Isso levaria o primitivo a imaginar que 
existiria um ser, dotado de uma substância espiritual, que estaria além do corpo físico.
Com a evolução das culturas, o animismo daria lugar ao politeísmo e depois ao monoteísmo. É 
famosa a definição de religião elaborada por Tylor. A Tese da Unidade Psíquica da Humanidade percebe 
nos mitos concordâncias espantosas, como entre mitos de índios americanos e africanos ou australianos. 
Para ele, é o recurso da Psicologia que poderia explicar essas coincidências, como o medo de pesadelos 
e a crença disseminada na existência de uma alma distinta do corpo. Freud utilizou as interpretações 
de Tylor na Psicanálise, tomando sua ideia de que os místicos, o esquizofrênico e também a criança e o 
primitivo valorizam seus próprios desejos.
Para esse britânico pioneiro, religião era a crença em seres sobrenaturais ou espiritualizados. Desse modo, 
num gradiente evolutivo, haveria desde a crença animistaaté a formulação mais sofisticada do divino.
Tylor, contudo, não se restringiu apenas à definição de cultura nem à questão de animismo. Em seu 
livro Primitive Culture, aparecem também reflexões sobre o tema do parentesco. Ele percebeu que a 
circulação de bens dentro de uma sociedade indígena se dá a partir da classificação entre os diferentes 
clãs. Apesar de verem as formações familiares como aberrações primitivas, os evolucionistas perceberam 
que essas sociedades se organizavam a partir do parentesco. Sendo a noção de família algo básico, 
o que chamou a atenção de alguns deles foi como essas sociedades poderiam continuar existindo, 
apesar de formularem sistemas de parentesco que lhes pareciam tão equivocados. Parentesco e família 
pareciam, também, um belo exemplo de comparação com a sociedade europeia, principalmente, naquilo 
que acarretava termos de comparação moral.
Distante do continente europeu, mas afinado com a mesma formulação teórica, temos o 
norte‑americano Lewis Morgan. Foi ele quem iniciou o estudo comparativo dos sistemas de parentesco. 
92
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
Morgan estudou os índios dos Estados Unidos e ficou bastante impressionado com os iroqueses, que 
ficaram famosos pela utilização de estruturas matrilineares, ou seja, famílias que se classificavam a 
partir de descendência materna. Morgan fez uma análise aprofundada em relação aos costumes e regras 
sociais dos iroqueses, tendo como ponto de partida as relações de parentesco.
Ao analisar os índios iroqueses, o antropólogo percebeu que havia uma lógica que determinava 
as relações familiares. Foi Morgan que estabeleceu as tipologias de formas de parentesco diferentes 
e que até os dias de hoje são bastante utilizadas na Antropologia. Ele utilizou as expressões sistema 
classificatório e sistema descritivo.
Os sistemas classificatórios eram característicos das sociedades primitivas, com classificações de termos 
de parentesco que podiam ir muito além daquelas conhecidas na sociedade ocidental, como pai, mãe, filho, 
primo e avô. Além dos iroqueses, em outras das sociedades estudadas por Morgan, aparecem diferentes 
terminologias para primos, como primo paralelo e primo cruzado, ou tio materno e tio paterno. Se para nós 
essa diferenciação entre primos ou tios não faz nenhuma diferença, para os povos primitivos significava 
situações completamente diferentes, a ponto de um ser parente e outro não, ou um ser preferível para se 
casar e outro considerado parente tão próximo que seria proibido o estabelecimento de laços matrimoniais. 
O sistema descritivo, no entender desse autor evolucionista, seria próprio da sociedade considerada 
civilizada e estabeleceria a classificação de parentesco segundo a ordem biológica, ou seja, a verdadeira.
Sem dúvida, essa visão trouxe uma forte conotação etnocêntrica, própria do pensamento 
evolucionista, mas representou um ganho ao mostrar que os sistemas de parentesco possuíam lógicas 
próprias e que interferiam na vida social.
Em suma, a Antropologia Evolucionista, com todos os problemas de ordem etnocêntrica e 
preconceituosa que podemos localizar, representou a abertura da compreensão da cultura e das 
diferenças entre os agrupamentos humanos, de um ponto de vista científico. Estava, desse modo, criada 
a Antropologia como uma ciência.
5.1.4 O darwinismo social
5.1.4.1 Spencer
De certa maneira, ainda relacionada à visão evolucionista, embora não tenha a ver diretamente com 
a Antropologia, está a ideia do darwinismo social. Essa expressão foi criada a partir das posições de 
um filósofo inglês, Herbert Spencer (1977, p. 147‑9), profundo admirador do pensamento de Charles 
Darwin. Embora Spencer nunca tenha utilizado a expressão darwinismo social, as ideias centrais dessa 
teoria foram por ele propostas. Para esse pensador britânico, as leis da evolução descobertas por Darwin 
poderiam ser aplicadas às sociedades humanas. Quando falamos em sobrevivência do mais forte, logo 
pensamos se tratar de uma ideia de Darwin, mas, na verdade, foi uma criação de Spencer para explicar 
e justificar as divisões sociais existentes na sociedade.
Convém ressaltar que Darwin estava preocupado com a evolução biológica e nunca utilizou sua 
teoria para explicar as diferenças sociais ou as desigualdades entre classes sociais. Foram outros autores, 
93
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
a começar por Spencer, que procuraram justificar a divisão da sociedade em classes, sugerindo que as 
diferenças fossem exemplos de seleção natural por meio do conflito e da competição entre os grupos 
sociais, sobrevivendo, ou tendo mais êxito, aqueles mais fortes ou aptos.
Como consequência desse tipo de pensamento, surgem as explicações de que os mais pobres eram menos 
aptos, enquanto os mais ricos, que haviam prosperado economicamente, eram mais aptos a sobreviver e, 
portanto, mais evoluídos. Essas explicações justificavam desde a dominação imperialista das metrópoles sobre 
as colônias, no processo do sistema colonial descrito anteriormente, até o sucesso de alguns empresários que 
haviam demonstrado sua capacidade de vitória no competitivo mundo dos negócios.
Outras consequências danosas desse pensamento foram o fortalecimento e a justificativa dados ao 
racismo, como se a superioridade de uma raça (ao menos, daquilo que se convencionou chamar de raça) 
sobre outra fosse fruto da luta pela vida e da sobrevivência do mais forte.
Não é preciso ir muito longe para compreender as terríveis consequências dessa visão. Porém, é sempre 
bom lembrar que no senso comum muitas pessoas continuam repetindo esses velhos preconceitos, 
embora em termos científicos nada justifique ou comprove as teses do darwinismo social.
5.2 a crítica ao evolucionismo: Boas e Malinowski
Na virada do século XIX para o XX, a Antropologia empreendeu uma forte crítica à visão evolucionista 
e a seu viés etnocêntrico. Podemos afirmar que, a partir de então, o reconhecimento de que as diferenças 
entre as culturas humanas não podem ser compreendidas por serem mais ou menos primitivas ou 
civilizadas tornou‑se um postulado para a Antropologia.
 lembrete
Chama‑se relativização ou relativismo cultural o processo de não 
valorização de uma cultura em detrimento de outra, tomada, num olhar 
etnocêntrico, a partir dos valores da primeira.
Essa crítica surgiu em dois contextos diferentes e, consequentemente, acarretou posições teóricas 
também distintas. Nos Estados Unidos, surge com Franz Boas o culturalismo ou Antropologia Cultural. 
Na Europa, desenvolve‑se outra corrente teórica, denominada funcionalismo, principalmente, com 
Bronislaw Malinowski. Ambas criticam a visão evolucionista, mas são bastante diferentes entre si.
 lembrete
Embora o pensamento evolucionista tenha sido fortemente criticado 
e não seja mais aceito atualmente na Antropologia, muitas pessoas 
continuam acreditando que existem povos mais primitivos e outros mais 
evoluídos.
94
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
Um ponto fundamental de distinção dessa crítica empreendida por Malinowski e por Boas com 
relação ao pensamento evolucionista diz respeito ao contato direto com os povos nativos. Surge, então, 
a Etnografia, a qual pressupõe que o próprio antropólogo colha seus dados por meio de um trabalho 
de campo de observação direta. Esse procedimento elimina a divisão anterior, na qual o observador era 
um viajante ou missionário, e o antropólogo permanecia distante, dentro de sua biblioteca ou de seu 
gabinete. Esse trabalho de campo, portanto, deve ser a própria fonte de pesquisa do antropólogo.Por trás dessa postura está a concepção de que não se está falando de fósseis do passado quando 
se trata de sociedades primitivas ainda existentes ou das fontes históricas de povos antigos, mas sim de 
culturas vivas, atuais, tanto quanto a moderna sociedade ocidental. Há diferenças entre ambas, claro, 
mas essas não podem ser imputadas a estágios evolutivos diferenciados. Todas as culturas, assim, seriam 
historicamente	evoluídas;	a	questão	seria	entender	em	que	medida	se	daria	a	diferença	entre	elas.
Da mesma maneira que nos referimos à escola teórica evolucionista, não podemos dizer que essa 
crítica seja feita apenas com base na obra de um ou dois pensadores. Vários antropólogos do período de 
virada de século promoveram trabalhos de campo e contato direto com os nativos. Radcliffe‑Brown 
(inglês, 1881‑1955) desenvolveu um estudo com os habitantes das ilhas Andamã, no Oceano Índico, 
entre os anos de 1906 e 1908. Charles Seligman (inglês, 1873‑1940) esteve entre os melanésios da Nova 
Guiné, em 1904. Em 1907, esteve no Ceilão e, posteriormente, entre 1909 e 1910, no Sudão. William 
Rivers (inglês, 1864‑1922) estudou os toda na Índia. Porém, são Boas e Malinowski os pensadores mais 
influentes desse período.
As duas correntes relativizadoras tomam a história única dos evolucionistas como parâmetro de suas 
críticas, mas em situações opostas. Para a corrente culturalista (Boas), não existe uma história única, 
mas inúmeras histórias particulares, tantas quantas são as culturas diferentes. Cada qual teria traçado 
sua própria história particular. Essa corrente também é reconhecida como particularismo histórico. 
Para o funcionalismo (Malinowski), a história não tem a importância dada pelas demais correntes, o que 
importa é a compreensão de uma determinada cultura num dado momento específico. Veremos essas 
duas correntes teóricas de maneira mais aprofundada a seguir.
5.2.1 O culturalismo de Franz Boas (1858‑1942)
Boas nasceu na Alemanha, em 1858. Antes da Antropologia, Boas interessou‑se por física, formando‑se 
doutor nessa área em 1881. Ao desenvolver pesquisas sobre Psicofísica entre os inuítes (esquimós), no 
norte do Canadá, teve seu primeiro trabalho de campo e contato com um povo nativo. Esse contato foi 
decisivo para a mudança de suas preocupações e para o seu encaminhamento à Antropologia. Depois 
dessa experiência, estabeleceu‑se nos EUA. Em 1896, passou a ser curador de Etnologia do Museu 
Americano de História Natural. Logo depois, tornou‑se professor da Universidade Columbia, em Nova 
Iorque. Seu trabalho na universidade foi de fundamental importância para o estabelecimento acadêmico 
da disciplina nos EUA. Em torno de Boas formaram‑se grandes nomes da Antropologia norte‑americana, 
como Margaret Mead, Melville Herskovits, Ruth Benedict e Alfred Kroeber. Para a Antropologia brasileira, 
Boas teve grande influência na formação de Gilberto Freyre.
95
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
Figura 19 – Franz Boas
Boas foi o responsável pela formulação do conceito de etnocentrismo, em sua crítica à postura 
evolucionista e em sua defesa da ideia da necessidade de se estudar cada cultura em seus próprios 
termos e processo histórico particular. O antropólogo criticou de maneira veemente a noção de evolução 
única para toda a humanidade e defendeu a visão de que os povos são diferentes devido às trajetórias 
históricas desiguais que trilharam. Vem de Boas a crítica aos conceitos de determinismos biológico e 
geográfico. Ou seja, a cultura não é fruto dos determinantes biológicos e da raça, nem das condições 
geográficas em que se acha inserida. Para ele, a dinâmica da cultura está na interação dos indivíduos 
com a sociedade.
Para Boas, as situações assemelhadas em duas diferentes culturas não podem ser atribuídas a uma 
linha evolutiva comum. Esses eventos poderiam ter se originado de diferentes caminhos, tendo em cada 
cultura um significado próprio e diferente. Para compreender o sentido próprio de cada cultura, seria 
fundamental a compreensão da história de cada grupo estudado.
Para Boas, não há, portanto, uma cultura única, mas culturas particulares, sempre no plural. As 
culturas são, assim, todas elas, independentemente da sua situação, dinâmicas e, justamente por isso, 
sofrem mudanças ao longo do tempo. É preciso perceber qual o sentido dado pelos membros de uma 
cultura às suas práticas cotidianas.
Figura 20 – Um inuíte, da capa do livro A Formação da Antropologia Americana, de Franz Boas
96
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
As principais obras de Franz Boas foram: The Mind of Primitive Man (A Mente do Ser Humano 
Primitivo), de 1911, Primitive Art (Arte Primitiva), de 1927, e Race, Language and Culture (Raça, Língua e 
Cultura), de 1940. Há, ainda, uma coletânea de textos e discursos proferidos pelo mestre teuto‑americano.
 saiba mais
Os textos de Boas publicados no Brasil são:
BOAS, F. Arte primitiva. São Paulo: Fenda, 1996.
___. A mente do ser humano primitivo. Petrópolis: Vozes, 2011.
___. A formação da Antropologia americana: 1883‑1911. Organização e 
introdução	de	George	Stocking	Jr.	Rio	de	Janeiro:	Contraponto;	UFRJ,	2004.
Boas e seus discípulos desenvolveram um longo trabalho de mapeamento das populações nativas 
norte‑americanas. Foi ele o responsável pela notável pesquisa entre os kwakiutl e os chinook, da 
Colúmbia Britânica, no oeste do Canadá. Suas pesquisas ficaram notabilizadas pela precisão minuciosa. 
Para ele, tudo deveria ser anotado, desde a construção das casas até as melodias cantadas pelos nativos. 
Diferentemente dos evolucionistas, que se preocupavam com a comparação de alguns elementos entre 
diferentes culturas, o culturalismo atentava à cultura estudada em si, como uma totalidade autônoma. 
Boas deu muita importância ao estudo da língua por parte do pesquisador, pois só assim este poderia 
ter acesso às particularidades da cultura estudada.
Embora não tenha deixado escrito nenhum tratado teórico de peso, sua influência na Antropologia 
foi significativa. Uma importante geração de antropólogos que constituiriam a Antropologia nos Estados 
Unidos teve sua formação a partir de Boas e de seu culturalismo.
5.2.2 O Funcionalismo de Bronislaw Malinowski (1884–1942)
Bronislaw Malinowski nasceu na Polônia e se formou, inicialmente, em Ciências Exatas. Após a leitura 
de O Ramo de Ouro, de James Frazer, resolveu abandonar a carreira de Física e Matemática e dedicar‑se 
à Antropologia. Após breve passagem pela Alemanha, foi estudar na Inglaterra, com o próprio Frazer. 
Em menos de três anos, já era tido como antropólogo promissor. O início de sua carreira acadêmica 
coincidiu com um período de grande crescimento da Antropologia, caracterizado pela busca de novas 
técnicas de pesquisa e pela crítica aos métodos interpretativos existentes.
Malinowski ficou notabilizado pela introdução do trabalho de campo na Antropologia. Embora 
saibamos que ele não foi o pioneiro, vieram dele as maiores contribuições para a sistematização desse 
tipo de levantamento de dados.
97
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
Esse antropólogo polonês ficou por vários anos em ilhas do arquipélago Trobriand, na Nova Guiné. 
Ninguém antes dele havia se esforçado tanto para penetrar na vida dos nativos e procurar levar uma 
vida tal qual a do povo estudado. Sua monografia, publicada em 1922, sobre os trobriandeses é um 
primor não apenas no relato cativante e envolvente, mas na descrição do método empregado.
Malinowski inicia seu relato com a descrição de uma cena que poderia ser desalentadora para amaioria de nós. Diz ele:
[...] imagine‑se o leitor sozinho, rodeado apenas de seu equipamento, numa 
praia tropical próxima a uma aldeia nativa, vendo a lancha ou o barco que 
o trouxe afastar‑se no mar até desaparecer de vista. Tendo encontrado um 
lugar para morar no alojamento de algum homem branco – negociante ou 
missionário – você nada tem a fazer a não ser iniciar imediatamente seu 
trabalho etnográfico. [...] Lembro‑me bem das longas visitas que fiz às aldeias 
durante	as	primeiras	semanas;	do	sentimento	de	desespero	e	desalento	após	
inúmeras tentativas obstinadas, mas inúteis para tentar estabelecer contato 
real com os nativos e deles conseguir material para minha pesquisa. Passei 
por fases de grande desânimo, quando então me entregava à leitura de 
um romance qualquer, exatamente como um homem que, numa crise de 
depressão e tédio tropical, se entrega à bebida (MALINOWSKI, 1976, p. 19).
Após um período de adaptação, o antropólogo deveria ficar atento a tudo o que ocorresse ao seu 
redor. Essa busca incorria num verdadeiro processo de alteridade, de relação com o outro. A meta era 
viver tal qual um nativo, ou, como diz o próprio Malinowski, ver o mundo a partir do ponto de vista 
daquele a quem se está estudando. Ele continua:
[...] tive de aprender a comportar‑me como eles e desenvolvi uma certa 
percepção para aquilo que eles consideravam como “boas” ou “más” 
maneiras. Dessa forma, com a capacidade de aproveitar sua companhia e 
participar de alguns de seus jogos e divertimentos, fui começando a sentir 
que entrara realmente em contato com os nativos. Isso constitui, sem dúvida 
alguma, um dos requisitos preliminares essenciais à realização e ao bom 
êxito da pesquisa de campo (MALINOWSKI, 1976, p. 22).
Esse livro marcou profundamente a história da Antropologia. o autor radicalizou a necessidade de 
compreensão da cultura em estudo “por dentro”. Para isso, procurou romper os contatos com o mundo 
europeu e estabelecer a permanência do antropólogo no meio da aldeia a ser estudada.
Quanto à postura teórica, o pensamento de Malinowski trouxe a ruptura com a visão de 
história única dos evolucionistas por meio do estudo de uma sociedade enquanto uma totalidade. 
Desaparece, então, a necessidade de se estabelecer comparações entre duas ou mais culturas e 
inseri‑las numa linha evolutiva única, a que estabelecia aquela mais primitiva e a mais evoluída. 
Para o funcionalismo de Malinowski, todas as culturas são consideradas válidas e corretas, mas 
devem ser analisadas cada qual em si. É preciso verificar como funciona uma dada sociedade no 
98
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
momento em que a observamos. É nesse sentido que o funcionalismo não considera a história 
como elemento‑chave de seu recorte analítico.
Não devemos pensar que essa corrente de pensamento tenha obliterado o desencadeamento 
histórico. É evidente que ele reconhece que as sociedades são históricas, mas, para sua análise, 
importa apenas a situação num dado momento. Como numa fotografia de um momento, a análise 
funcionalista procura os elementos da cultura estudada que contribuem para o funcionamento da 
sociedade em si. Há uma busca intensiva e contínua por analisar uma microssociedade sem se referir 
à sua história.
Para Laplantine, é com Malinowski que a Antropologia se torna uma ciência da alteridade, que se 
“dedica ao estudo das lógicas particulares características de cada cultura” (LAPLANTINE, 1988, p. 81). Os 
povos estudados pelos antropólogos, por mais exóticos que possam parecer à primeira vista, não são 
resquícios de um passado primitivo, uma infantilidade da humanidade.
Hoje, todos os etnólogos estão convencidos de que as sociedades diferentes 
da nossa são sociedades humanas tanto quanto a nossa, que os homens e 
as mulheres que nelas vivem são adultos que se comportam diferentemente 
de nós, e não ”primitivos”, autômatos atrasados (em todos os sentidos do 
termo) que pararam em uma época distante e vivem presos a tradições 
estúpidas (MALINOWSKI, 1976, p. 81).
A coerência interna de uma sociedade a ser estudada é a meta a ser atingida por essa ciência 
desenvolvida por Malinowski. Nisso consiste a herança que vem do sociólogo Émile Durkheim. Para 
esse mestre francês, a sociedade é formada por várias instituições, que, como num organismo ou 
corpo, possuem cada qual a sua função. O bom funcionamento de todas elas garante a saúde da 
sociedade inteira.
Durkheim partia de uma perspectiva das ciências naturais para estudar a sociedade, principalmente, 
da Medicina. Malinowski segue na mesma direção, e é com este último que o termo funcionalismo 
ganha o uso corrente que encontramos nos dias de hoje. O termo vem das funções que cada instituição 
(econômica, política, familiar, etária, educativa etc.) tem para atender às necessidades da sociedade e 
da cultura em geral. A partir disso, o mais importante é verificar, a cada momento, como uma dada 
sociedade está organizada e como funciona. O retrato estático, sincrônico é mais importante que o filme 
dinâmico, diacrônico.
Convém, neste ponto, retomar alguns tópicos da obra máxima de Malinowski, tida com um dos 
grandes clássicos da Antropologia até os dias atuais.
Os Argonautas do Pacífico Ocidental, livro publicado em 1922, representou uma verdadeira revolução 
na Antropologia. A obra teve enorme repercussão, inclusive, entre o público leigo, pois apresentou uma 
nova visão de ser humano e indicou uma nova maneira de compreender o nosso comportamento. 
Desfez, assim, a visão anterior das sociedades tribais como fósseis vivos do passado, como aglomerados 
de crenças e costumes irracionais e desconexos. Os costumes e as crenças de qualquer povo, por mais 
99
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
exóticos que possam parecer à primeira vista, adquirem plenitude de significado, e o comportamento 
nativo, dessa forma, aparece como ação coerente e integrada.
Nesse livro, Malinowski trabalha a ideia de que todos os aspectos sociais, como religião, mito, 
parentesco, economia, organização social etc. devem ser vistos a partir da perspectiva do kula, um 
sistema de trocas. Essa perspectiva permitiu perceber a totalidade integrada da vida social.
O kula foi algo que logo chamou a atenção de Malinowski, e foi com essa instituição que o autor 
pôde compreender a cultura trobriandesa em sua totalidade. kula é a troca de colares e braceletes entre 
os habitantes das ilhas circunvizinhas. A troca não tem o caráter meramente econômico que podemos 
pensar em nossa sociedade, muito menos uma visão utilitarista. É comum serem trocados braceletes e 
colares tão pequenos ou tão grandes que seu uso seria impraticável. Mas por que esses nativos fazem 
essas trocas?
Os habitantes das ilhas fabricam canoas, praticam rituais e promovem viagens de vários quilômetros 
pelo mar bravio com a finalidade de realizar as trocas. O arquipélago tem as ilhas dispostas numa forma 
circular. Os colares, feitos de coral avermelhado, são trocados sempre no sentido horário, entre uma ilha e 
outra, enquanto os braceletes, de conchas brancas, caminham na direção oposta. Mas não é qualquer pessoa 
que pode simplesmente dar um bracelete ou um colar a qualquer outra. Aparece, então, uma série de regras 
de hierarquias e posições sociais. Esses habitantes das ilhas Trobriand estabelecem relações entre si a partir 
da instituição kula. Além disso, uma vez recebido um colar, estabelece‑se a necessidade da reciprocidade por 
meio de um bracelete. Essa troca não ocorria necessariamente no mesmo momento, mas estava estabelecida 
a obrigatoriedade da retribuição. Algo parecido acontece quando recebemos um presente de algum conhecido 
e sentimos odever de retribuir‑lhe posteriormente. Ao estabelecer essas trocas dos braceletes e colares, esses 
indivíduos compactuam com outros elementos da vida social, como mercadorias e parentesco. Esse último 
deve ser pensado no sentido de que, se um ilhota está impedido de casar com alguém de sua tribo, devido a 
laços de parentesco, estabelece, por meio do kula, uma relação com um habitante de uma ilha vizinha e poderá 
casar‑se com a irmã de seu parceiro, e vice‑versa.
Malinowski percebeu que toda a vida dos trobriandeses girava em torno do kula. Posições políticas, 
hierarquias, economia, rituais mágicos, quem pode ou não praticar os rituais, construção das canoas, 
casamentos e inúmeros outros aspectos se relacionavam com esse aparentemente estranho processo 
de troca.
Somente uma perspectiva que procurasse entender a sociedade de um modo geral (base do 
pensamento funcionalista) daria conta desse tipo de compreensão.
Malinowski publicou outros livros a partir de seus trabalhos de campo na Melanésia. Além de 
monografias sobre os hábitos dos moradores daquelas ilhas distantes, elaborou trabalhos teóricos, como 
o livro Magia, Ciência e Religião, publicado em 1925.
Essa obra, também um contraponto à visão evolucionista, estabelece os campos entre os saberes e 
busca compreender a realidade quente da vida humana com as abstrações frias da ciência. Nela, não 
há preocupação em saber o que aparece primeiro, magia, religião ou ciência, mas com o fato de essas 
100
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
dimensões da vida social aparecerem ligando todos os aspectos. Não há separação entre magia, religião 
e vida social do grupo. A vida social é permeada pela magia e pela religião.
Magia encarna a esperança do ser humano em superar a própria natureza quando não há outros 
recursos da ciência. É aquilo que alimenta os primitivos, fazendo‑os crer que existam possibilidades. 
Ciência e magia diferem de maneira radical. A ciência nasce da experiência, a magia é feita pela tradição. 
A	ciência	se	guia	pela	 razão	e	se	corrige	pela	observação;	a	magia	é	 impermeável	a	ambas	 (razão	e	
observação)	e	vive	em	uma	atmosfera	de	misticismo.	A	ciência	é	aberta	a	toda	a	sociedade;	a	magia	é	
oculta, se ensina a partir de misteriosas iniciações.
A religião, assim como a magia, deriva de momentos de caráter emotivo. Tanto uma quanto a 
outra estão rodeadas por tabus e cerimônias que diferenciam seus atos daqueles do mundo profano. 
Mas o que distinguiria magia de religião? Na magia há sempre a afirmação de um poder de controle 
sobre	a	natureza	por	meio	de	ritos;	na	religião	aparece	todo	o	mundo	sobrenatural	da	fé,	com	espíritos,	
demônios	etc.	A	mitologia	religiosa	é	mais	complexa.	A	magia	busca	um	fim	prático;	a	religião	já	é	a	
finalidade em si.
Esse livro sobre magia, religião e ciência marcou uma posição do autor e de toda uma corrente 
antropológica posterior de que não se deve pensar os nativos que agem magicamente como movidos 
por um pensamento infantil, pré‑lógico. Ao contrário, deve‑se ter em mente a compreensão de que 
qualquer instituição de conhecimento deve ser buscada no todo social.
Equipamento material, organização social e simbolismo são três dimensões intimamente vinculadas, 
e a realidade jamais poderá ser compreendida integralmente se não se apreender a simultaneidade de 
todas as suas dimensões. As instituições são os núcleos de ordenação da sociedade que formam o todo 
integrado. Qualquer elemento cultural aparece como uma projeção parcial da totalidade, mas não como 
uma parte apenas. A instituição permeia toda a cultura, e a cultura está presente na instituição.
Essa foi a grande contribuição de Malinowski à Antropologia, marcando definitivamente essa 
disciplina a partir de então.
5.2.3 Radcliffe‑Brown
Outro grande nome desse período foi Alfred Radcliffe‑Brown (1881‑1955). Também influenciado 
pelo pensamento de Durkheim, esse antropólogo britânico praticamente inaugurou um ramo teórico 
denominado estrutural‑funcionalismo. Radcliffe‑Brown reconhecia nas instituições a chave para 
a manutenção da ordem social de modo similar aos órgãos de um corpo para o funcionamento do 
organismo em sua totalidade. O estudioso buscou, assim, compreender as funções sociais dos costumes 
culturais para a manutenção da estabilidade global de uma sociedade. No entanto, colocava‑se numa 
posição teórica bastante distante do funcionalismo de Malinowski, pois não admitia que as práticas 
sociais pudessem ser explicadas pela sua capacidade de satisfazer necessidades biológicas básicas.
Para Radcliffe‑Brown, as relações sociais são reais e diretamente observáveis, mas a estrutura social 
é uma construção teórica postulada pelo cientista, com base em sua observação das relações sociais. 
101
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
Ele defendeu a importância da noção de uma estrutura social total, que é a soma total das relações 
sociais de uma determinada unidade social de análise durante um determinado período. Segundo ele, 
as funções das práticas sociais deveriam ser relativas a essa estrutura social total.
Tanto Malinowski quanto Radcliffe‑Brown têm papel capital no desenvolvimento da Antropologia 
na Europa, notadamente, na Inglaterra. Este último ficou notabilizado, também, pelos estudos dos 
sistemas de parentesco, que terão bastante influência no pensamento estruturalista do francês Claude 
Lévi‑Strauss.
 saiba mais
O livro de Malinowski sobre os argonautas do Pacífico ocidental é uma 
obra‑prima que merece ser lida:
MALINOWSKI, B. Argonautas do Pacífico ocidental: um relato do 
empreendimento e da aventura dos nativos nos arquipélagos da Nova 
Guiné – Melanésia. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
O livro básico da teoria de Radcliffe‑Brown está traduzido para o 
português e também se constitui como leitura interessantíssima:
RADCLIFFE‑BROWN, A. R. Estrutura e função na sociedade primitiva. 
Petrópolis: Vozes, 2013.
6 O MétOdO antrOpOlógicO
Passaremos, a partir de agora, a tratar um pouco do trabalho do antropólogo.
De que maneira esse cientista colhe os dados necessários para suas pesquisas sobre a cultura e 
a diversidade humana? Além disso, depois de colhidos os dados, quais são os tratamentos analíticos 
necessários para extrair deles as respostas para as perguntas feitas inicialmente?
Lembremos que a Antropologia pode ter vários campos, entre eles a arqueologia e a Antropologia 
Biológica. Estas últimas trabalham com escavações do solo, restos de antigas sociedades, fósseis e outros 
elementos que devem ser colhidos, necessariamente, num sítio arqueológico. Não é dessa Antropologia 
que estamos falando nesta disciplina, mas da Antropologia Cultural. Esta também deve colher seus 
dados, fazer “escavações” de outra ordem, ou seja, procura colher, entre os indivíduos de um determinado 
grupo, as lógicas simbólicas da cultura estudada.
Vimos, no tópico anterior, que no início da Antropologia os dados não eram colhidos pelos 
antropólogos, mas por terceiros, viajantes ou missionários, principalmente, dos povos distantes e 
exóticos. Também aprendemos que a virada da Antropologia no começo do século XX representou uma 
102
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
profunda modificação na coleta de dados, acarretando uma ampla alteração no olhar sobre o “outro”. 
Tratamos, ainda, do trabalho de campo feito pelo próprio antropólogo. Vamos, agora, nos deter um 
pouco mais sobre o nosso trabalho de pesquisa.
Diferentemente da Sociologia, que desde o seu início trabalhou com as grandes sociedades ocidentais, 
a Antropologia teve início no estudodos povos indígenas, distantes e de dimensões bastante reduzidas 
em relação à nossa sociedade.
Aos poucos, a Antropologia foi percebendo que seu olhar característico, o olhar antropológico, poderia ser 
aplicado a sociedades maiores. Tratava‑se de compreender as lógicas simbólicas dessas sociedades. Em meados 
do século XX, começam os chamados estudos de comunidade, principalmente, os de aldeias camponesas. Não 
era ainda o estudo da moderna sociedade ocidental, mas já era algo mais próximo dela. Dos anos 1960 em diante, 
a Antropologia se abriu cada vez mais para os estudos sobre a nossa própria sociedade moderna ocidental.
Atualmente, um antropólogo pode tanto estudar os hábitos de consumo de uma elite econômica 
em Nova Iorque quanto os costumes de um grupo de funk na periferia carioca, ou, ainda, a questão 
da multiculturalidade que caracteriza a vida de qualquer citadino metropolitano neste início de século 
XXI, tudo isso sem deixar de lado a velha Etnologia indígena em seus estudos sobre os povos distantes 
pouco	contatados	pela	nossa	sociedade;	ou,	ainda,	as	transformações	que	uma	etnia	indígena	sofre	ao	
estabelecer relações com a sociedade ocidental.
O desenvolvimento da coleta de dados, a Etnografia, deu‑se com o estudo das pequenas sociedades. 
Essa tradição permanece até mesmo quando estudamos uma grande sociedade. Ao antropólogo interessa 
o detalhe, os particulares de uma cultura. Para tanto, é preciso o contato direto com o povo estudado, 
para levantar as maneiras pelas quais as pessoas vivem e constroem suas visões de mundo.
Figura 21 – Trabalho de campo
6.1 O estudo da totalidade
Os sociólogos, para estudar as grandes sociedades industriais, desenvolveram métodos a partir 
de questionários e de outros levantamentos de dados quantificáveis. Para esses cientistas sociais, era 
103
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
importante trabalhar com dados estatísticos, pois eles permitiriam perceber as grandes tendências 
e características de uma sociedade. Para a Antropologia, no entanto, esses dados estatísticos nunca 
foram muito importantes. Para estudar as pequenas sociedades tradicionais, geralmente ágrafas, os 
antropólogos depararam com a necessidade de utilizar outras técnicas.
 lembrete
Como visto, a Etnografia é a técnica própria de pesquisa em que o 
antropólogo busca vivenciar, junto com um determinado povo, tudo aquilo 
que faz parte de sua cultura e a constitui.
Após esse momento de trabalho de campo, chamado de observação participante, o antropólogo 
deve refletir sobre o que viu, ouviu e presenciou. É o momento da reflexão teórica. Sem esta última, não 
teríamos a Antropologia.
No levantamento de dados, o antropólogo procura todo e qualquer detalhe do grupo pesquisado, 
mesmo que aparentemente não seja relevante numa primeira instância. Chamamos isso de observação 
em totalidade ou estudo de totalidade. Em geral, os antropólogos praticam uma observação mais livre, 
mas nem por isso menos sistemática, em que possam entrar em contato com determinadas dimensões 
da vida cultural que, de outra forma, seria impossível.
É importante, portanto, que o antropólogo desenvolva empatia com o grupo, de forma que este 
possa agir como se o pesquisador não estivesse presente. Claro que isso é bastante difícil, mas é uma 
meta a ser sempre buscada. Um breve paralelo serve aqui como ilustração dessa dificuldade. Imagine 
uma situação em que um fotógrafo vá fazer um retrato de um grupo de amigos ou de uma família 
qualquer. Todos querem “sair bem na foto”. Isso significa que as pessoas buscam fazer poses ou se 
mostrar de um jeito “oficial”, um jeito como gostariam de ser vistas. Não há escapatória, o fotógrafo 
dificilmente conseguirá uma foto mais correspondente ao modo de vida próprio daquele grupo. A 
presença do antropólogo em campo acaba tendo um peso semelhante ao da máquina fotográfica. Além 
disso, é preciso salientar que vários antropólogos utilizam instrumentos como gravadores, máquinas 
fotográficas ou filmadoras em seus levantamentos etnográficos. A questão é como o pesquisador deve 
estar presente nos acontecimentos cotidianos do grupo e, ao mesmo tempo, interferir minimamente 
nesses mesmos acontecimentos.
Uma passagem da descrição de trabalho de campo entre os balineses, na Indonésia, de um famoso 
antropólogo estadunidense, Clifford Geertz (1926‑2006), ilustra bem essa questão. Geertz estava na ilha 
de Bali já há um tempo, e todos os nativos o ignoravam, fazendo que ele não conseguisse os dados para 
sua pesquisa. Ninguém conversava com ele. Seu tempo de estadia estava se esgotando, e ele deveria 
retornar aos EUA, mas um acontecimento inesperado alterou tudo. Ele estava assistindo a uma briga 
de galos. As brigas de galo são muito importantes na cultura balinesa, mas são proibidas pelo governo 
da Indonésia, que controla politicamente a ilha de Bali. Num determinado momento, a polícia apareceu 
na rinha, e todos correram, inclusive Geertz e sua esposa, que o acompanhava. Eles se esconderam na 
casa de um nativo. Quando os policiais chegaram até eles e perguntaram o que aqueles dois “brancos” 
104
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
estavam fazendo por lá, o dono da casa, até então um completo e distante estranho, começou a relatar 
tudo o que Geertz fazia na ilha, os pormenores de sua vida como professor norte‑americano e que 
estavam há horas tomando chá e que nada sabiam das brigas de galo. Geertz ficou espantado que 
aquele nativo, que jamais havia conversado com ele, soubesse em detalhes o que ele fazia na ilha. Isso 
mudou sua pesquisa.
Na manhã seguinte, a aldeia era um mundo completamente diferente para 
nós. Não só deixáramos de ser invisíveis, mas éramos agora o centro de todas 
as atenções, o objeto de um grande extravasamento de calor, interesse e, 
principalmente, de diversão. Na aldeia todos sabiam que havíamos fugido 
como todo mundo. [...] Em Bali, ser caçoado é ser aceito. Foi justamente o 
ponto da reviravolta no que concerne ao nosso relacionamento com a 
comunidade, e havíamos sido literalmente “aceitos”. Toda a aldeia se abriu 
para nós, provavelmente mais do que o faria em qualquer outra ocasião. [...] 
Ser apanhado, ou quase apanhado, numa incursão policial ao vício talvez não 
seja uma receita muito generalizada para alcançar aquela necessidade do 
trabalho de campo antropológico – o acordo, a harmonia –, mas para mim 
ela funcionou admiravelmente. Levou‑me a uma aceitação súbita e total, não 
habitual, numa sociedade extremamente avessa à penetração de estrangeiros. 
Deu‑me a oportunidade de aprender, de imediato, um aspecto introspectivo 
da “mentalidade camponesa” que os antropólogos que não tiveram a sorte de 
fugir como eu, juntamente com o objeto de suas pesquisas, das autoridades 
armadas, normalmente não conseguem (GEERTZ, 1978, p. 282‑3).
Essa passagem não apenas abriu as portas para seu trabalho de campo, mas também foi fundamental 
para recolher um dado de campo básico para a compreensão da cultura balinesa. Geertz relata que essa 
oportunidade o fez colocar‑se em contato com os nativos e permitiu que passasse um tempo maior 
colhendo dados, além de o colocar diretamente em contato com a dimensão emocional da vida dos 
balineses. A partir de então, ele pôde perceber como a briga de galos, aparentemente, um elemento 
pequeno na vida dos balineses, é um ritual em que os balineses expressam a totalidade de sua cultura 
afetiva, emocional e intelectiva. Isso é um estudo de totalidade, ou seja, de um pequeno elemento 
colhido em campo, e esse pequeno elemento pode ser até mesmo uma anedota, mas podemos tirar dele 
elementos fundamentais da vida cultural de um povo.
Essa noção de totalidade,tão cara à Antropologia, deve ser entendida como uma técnica que não 
estava presente nos primórdios da disciplina.
 lembrete
No evolucionismo, um elemento da cultura era tomado e retirado de 
seu contexto sociocultural. Com a crítica realizada no início do século XX, 
tanto no culturalismo quanto no funcionalismo, um elemento cultural só 
podia ser compreendido na totalidade da cultura estudada.
105
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
Todos os elementos de uma dada cultura guardam uma intrínseca relação com o contexto mais 
amplo. Isso não significa dizer que as culturas sejam fechadas, pois elas estão constantemente trocando 
informações com outras sociedades, mas sim que só poderemos compreender um elemento, por menor 
que seja, se levarmos em consideração a totalidade da cultura.
Por isso a tradição dos estudos de grupos pequenos das primeiras Etnografias permaneceu mesmo 
quando a Antropologia se voltou para o estudo das grandes sociedades: preocupamo‑nos com os detalhes 
porque eles nos ajudam a compreender o todo de uma cultura. Ainda hoje, quando um antropólogo 
estuda um estilo de vida de um grupo de adolescentes que frequenta uma dada praça ou galeria no 
centro de uma cidade como São Paulo, não apenas procura compreender esse pequeno grupo levando 
em consideração a cultura envolvente, mas também entender a cultura dessa grande cidade a partir do 
que fazem os inúmeros e diferentes grupos que ali habitam.
6.2 etnografia e o método etnográfico – a observação participante
É costume entre os antropólogos registrar tudo o que observam em campo num caderno ou diário 
pessoal. Essa técnica vem desde Malinowski, em seu famoso estudo entre os trobriandeses. Nesse diário 
de campo, o antropólogo deve registrar os detalhes que presencia, os contos, os mitos, as práticas 
cotidianas, mesmo que num primeiro momento não façam sentido para ele. Todo esse material será 
analisado posteriormente, quando estiver numa situação de distanciamento físico do grupo. Em geral, 
esse diário é separado do caderno de anotações mais formais, mas compõe com ele um conjunto 
importante de registro de dados.
Há uma máxima, na Antropologia, expressada por Roberto da Matta, que diz o seguinte: “vestir 
a capa de etnólogo é aprender a realizar uma dupla tarefa que pode ser grosseiramente contida nas 
seguintes fórmulas: (a) transformar o exótico em familiar e/ou (b) transformar o familiar em exótico” 
(DA MATTA, 1983, p. 157). Esse duplo movimento é complementar, e não excludente. Num primeiro 
momento da Antropologia, aquele do estudo exclusivo das sociedades indígenas, era fundamental 
compreender uma prática absolutamente exótica como aquela da troca de braceletes e colares dos 
trobriandeses e estar familiarizado com ela. Contudo, isso não esgota o movimento da Antropologia. 
É preciso também transformar aquilo que é bastante familiar num elemento exótico, distanciado e 
passível de ser analisado.
Em outras palavras, algo a que estamos habituados é sentido e compreendido como natural. Se for 
vista assim, como natural, deixará de ser visto como cultural, construído pelo próprio grupo e pleno 
de significações. É necessário um estranhamento diante desse aspecto, que pode ser um hábito, uma 
prática ou uma crença, para que possamos compreendê‑lo como uma construção humana carregada de 
sentido. Esse fato tão habitual deve passar a ser visto como exótico, distante, para que o antropólogo 
possa estudá‑lo como um dos elementos daquela cultura. Esse mecanismo deve ocorrer nas sociedades 
mais distantes, não nos deixando cair em explicações simplistas que reduzam aquilo que assistimos a 
uma lógica da nossa sociedade, como se fossem sinônimos, mas, principalmente, deve ocorrer no estudo 
da nossa própria sociedade. Neste último ponto o erro é mais comum porque estamos habituados às 
nossas práticas. Como fazer para percebê‑las como elementos de uma cultura mais ampla? Esse é o 
processo de estranhamento, tão fundamental ao método antropológico.
106
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
 lembrete
Tenha em mente que estranhamento não é a atitude de ver uma 
coisa diferente e achá‑la estranha, mas, principalmente, a de transformar 
aquilo que é habitual em algo estranho, de tal maneira que possamos 
compreendê‑lo como um elemento cultural.
Outro fator de extrema importância no método antropológico é o distanciamento. Em sua dimensão 
mais imediata, invoca o próprio distanciamento físico. Malinowski levou das ilhas Trobriand todos os 
registros que lá colhera e, na distante Inglaterra, empreendeu o trabalho de reflexão, análise e construção 
da teoria antropológica. Sem esse movimento, não haveria a obra deixada pelo mestre polonês. O 
trabalho reflexivo é feito a distância, isolado do grupo em que os dados foram colhidos.
Além disso, o distanciamento tem outro significado também importante, sem o qual não haveria 
Antropologia: trata‑se do distanciamento emocional. Como visto no caso de Geertz, o antropólogo 
precisa de empatia com o grupo estudado, mas essa relação não pode ser nem de antipatia, nem de 
simpatia. Explicamos melhor: numa situação de antipatia, o antropólogo já inicia sua pesquisa com uma 
concepção discriminatória diante do grupo. Pode ser que ele inicie seu trabalho com um preconceito, uma 
verdade preestabelecida e fechada, em razão, por exemplo, de o grupo ter uma posição política diferente 
da sua ou compartilhar hábitos que não lhe agradem. Um bom exemplo seria o de um antropólogo da 
religião, convicto de suas verdades religiosas, estudando um outro grupo religioso, bastante diferente 
do seu. Pode ser que ele chegue ao grupo e tudo o que ele presencie ou ouça seja apenas usado para 
comprovar aquilo que ele “já sabia”, isto é, que a sua religião é superior àquela estudada. De certa 
forma, foi isso o que fizeram os antropólogos evolucionistas. Eles estudaram os indígenas com muita 
antipatia, considerando de antemão que fossem primitivos e inferiores aos brancos europeus cristãos. 
Não é possível fazer Antropologia caso vejamos o grupo com uma atitude de antipatia, pois toda a 
análise será deturpada.
O contrário também é verdadeiro. É cada vez mais comum, nos dias atuais, que um antropólogo 
estude seu próprio grupo. Isso se dá com um envolvimento bastante grande, e há muita simpatia na 
relação. Essa proximidade pode atrapalhar. É evidente que o conhecimento “de dentro” desse grupo é 
algo positivo. Afinal, essa é a busca que o antropólogo faz ao tentar “ver o mundo a partir dos olhos 
do nativo”. Nesse caso, ele mesmo é um nativo, um “de dentro”. Digamos que um religioso vá pesquisar 
sua própria religião ou que uma feminista faça um estudo antropológico sobre a questão de gênero em 
seu próprio meio. Nada impede que eles façam uma excelente Antropologia, mas a possibilidade de cair 
num recorte também enviesado, que no fundo procure defender as posições ou crenças deles mesmos, 
é muito grande.
Em ambos os casos é necessário um distanciamento emocional.
O	distanciamento	não	diz	respeito	a	uma	distância	física,	mas	sim	subjetiva;	
é necessário que o observador não se envolva com o observado, ou que esse 
107
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
envolvimento – de fato inevitável – se dê dentro dos limites da empatia, 
que é a capacidade de se colocar no lugar do outro sem, no entanto, tomar 
partido em relação a ele. A empatia permite olhar o mundo através dos 
olhos do outro e, assim, possibilita a compreensão de seu ponto de vista 
em relação à realidade. A título de ilustração, a simpatia e a antipatia, por 
exemplo,seriam formas de envolvimento subjetivo que levam o observador 
a uma tomada de posição valorativa em relação ao observado, resultando 
numa compreensão tendenciosa e parcial. O que se busca na observação 
participante é a compreensão mais complexa e totalizante sobre o outro 
(PASSADOR, 2001, p. 45).
 lembrete
Distanciamento é um afastamento emocional, quando o antropólogo 
procura não se envolver, positiva ou negativamente, com o grupo estudado.
Devemos ter sempre em mente que, quando tratamos de Antropologia, estamos lidando com a 
diversidade cultural humana. Pode parecer óbvio, mas nem sempre estamos atentos a isso. O antropólogo 
é também um ser humano, ou seja, é ele também fruto de uma socialização em um determinado meio 
sociocultural. Se ele não se desprender ou se distanciar minimamente de seus valores, não conseguirá 
captar a realidade que está à sua volta. Por isso, é preciso abertura para o mundo.
[...] o registro das primeiras impressões ajudará a destacar alguns dos 
aspectos mais básicos da diversidade cultural, como odores específicos, 
ruídos que as pessoas fazem, como elas cobrem a boca ao comer e 
como olham para as outras. Esses padrões, que são tão básicos a ponto 
de parecer quase triviais, fazem parte do que Bronislaw Malinowski 
chamou de ”os imponderáveis da vida nativa e do comportamento típico”. 
Essas características da cultura são tão fundamentais que os nativos as 
consideram naturais. São básicas demais, até mesmo para ser comentadas, 
mas o olho desacostumado do etnógrafo, que busca estranhamento, 
as capta. A partir de sua familiarização, ficam borradas nos limites da 
consciência. As primeiras impressões são valiosas e devem ser registradas. 
É muito importante que os etnógrafos façam observações, registros e 
relatos precisos do que veem em campo (KOTTAK, 2013, p. 72).
Estar atento a esses imponderáveis ao mesmo tempo que busca esse distanciamento é uma tarefa 
difícil, mas necessária. Um antropólogo jamais deve ser um observador totalmente imparcial ou distante, 
mas não deve, tampouco, fazer dessa proximidade algo que atrapalhe seu próprio labor. A observação 
participante exige que o antropólogo tome parte da vida da comunidade ao estudá‑la. É somente essa 
proximidade que permite perceber por que as pessoas consideram os eventos significativos. Só assim o 
pesquisador vai poder compreender os significados e a lógica das organizações sociais.
108
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
Próximo e distante ao mesmo tempo, exótico e familiar também simultaneamente. Essas lições 
são básicas para o fazer antropológico. Distante de uma ciência exata e por vezes distante também 
da objetividade esperada de uma ciência social, a Antropologia lida, na maior parte das vezes, com 
a subjetividade tanto do pesquisador quanto dos pesquisados. Nesse sentido, “procura penetrar e 
compreender a subjetividade presente nas manifestações humanas, e o faz procurando traduzir os 
significados particulares de uma cultura para outra” (PASSADOR, 2011, p. 48).
O método da relativização, de que já falamos, não pode jamais ser esquecido ou deixado de lado. 
Nenhum valor é absoluto. É preciso ver valores ou qualquer outra prática ou crença como elementos 
relativos do grupo cultural que está sendo estudado. É preciso perceber que existem tantas formas 
de ser humano quantas são as culturas diferentes. É necessário sair dos nossos próprios valores, ter 
distanciamento e percebê‑los não como únicos e verdadeiros, mas apenas como uma das inúmeras 
maneiras de viver.
 lembrete
Não há culturas superiores nem inferiores. Há culturas diferentes.
 Observação
A relativização procura perceber que nenhum valor ou prática cultural 
é absoluto. Todos devem ser compreendidos como relativos à cultura do 
grupo social original.
6.3 técnicas de pesquisa e trabalho de campo
A partir dos pressupostos básicos da metodologia da observação participante e da visão de 
totalidade, a Antropologia desenvolveu uma série de técnicas capazes de realizar o levantamento dos 
dados necessários.
Algumas dessas técnicas requerem uma atenção redobrada.
Talvez a técnica mais usual do trabalho antropológico seja a conversa. Faz parte da observação 
participante não ser mero espectador, mas procurar dialogar com seus sujeitos. Nas monografias dos 
grandes clássicos da pesquisa etnográfica, a começar pelo próprio Malinowski, não faltaram descrições 
dos informantes‑chaves. O informante é aquele nativo com quem o pesquisador estabelece um vínculo 
mais próximo e que passa a ser uma espécie de companheiro. Em muitas situações, quando o antropólogo 
ainda não domina a língua nativa, esse informante pode ser uma espécie de tradutor, alguém que tenha 
a capacidade de dar ao pesquisador as informações de que ele precisa, traduzindo aquilo que acontece 
no grupo.
109
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
História da antropologia
Figura 22 – Projeto Rondon, Operação Velho Monge, Piracuruca/PI
O conhecimento da língua nativa é fundamental porque, a partir de um dado momento, o 
antropólogo não pode mais depender exclusivamente de seu fiel informante. Uma conversa entre dois 
ou mais nativos pode ser uma rica fonte de informações para o pesquisador.
Além das conversas mais informais, faz parte das técnicas usuais a realização de entrevistas. Em 
geral, um antropólogo não utiliza as mesmas técnicas de um sociólogo, pois este último está mais 
preocupado em atingir uma amostragem estatisticamente significativa e aplicar um questionário 
controlado, geralmente fechado. Na Antropologia, utilizam‑se mais entrevistas abertas, nas quais o 
entrevistador é o próprio antropólogo. Para não se perder na divagação da conversa, é aconselhável 
que o antropólogo siga um roteiro de entrevista previamente estabelecido. Cabe a ele ter sensibilidade 
para, no meio da entrevista‑conversa, fazer as correções necessárias, voltando aos pontos definidos ou, 
se a conversa evoluir para outros caminhos igualmente profícuos, saber aprofundar uma temática que o 
entrevistado demonstre ter vontade de explorar. É comum procurar algumas pessoas com mais idade e 
com muitas histórias do grupo para contar e fazer com elas o que chamamos de entrevistas de história 
de vida. Nessas conversas, procuramos perceber, na trajetória percorrida pelo entrevistado, aspectos 
marcantes da vida cultural do grupo.
Conversas, entrevistas e histórias de vida podem contar com o auxílio de instrumentos de gravação, 
como gravadores de voz ou filmadoras. Essa medida permite que o pesquisador fique despreocupado 
com as anotações e se volte de corpo e alma para a temática em discussão.
A partir dos dados coletados, é importante saber distinguir os saberes aí presentes. Costumamos 
dizer que o antropólogo deve sair do discurso do nativo. A fala e as explicações dadas pelos povos 
estudados podem ser essenciais, mas são apenas o ponto de partida do trabalho, que não pode se limitar 
a reproduzir somente o que dizem os informantes e entrevistados. Costumamos dizer que há uma 
abordagem êmica e uma abordagem ética no trabalho antropológico.
110
Re
vi
sã
o:
 G
io
va
nn
a 
- 
Di
ag
ra
m
aç
ão
: M
ár
ci
o-
 2
3/
05
/2
01
4
Unidade II
 Observação
A abordagem êmica reproduz o que pensam as pessoas locais. Trata‑se 
da visão de mundo do nativo, como ele compreende a realidade, define os 
termos de parentesco, classifica os objetos e os animais etc.
Esse levantamento é condição inicial e necessária para se fazer Antropologia, que se dá por meio da 
abordagem ética.
 Observação
A abordagem ética está no campo dos saberes científicos. Deve 
reorientar aquilo que foi levantado em campo,

Outros materiais