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Art. 180 Receptação

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Direito penal iii: parte especial
Prof. MsC. Eduardo Ferraz
RECEPTAÇÃO
Legislação
Art. 180. Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
Receptação qualificada
§ 1º Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime:
Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa.
§ 2º Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência.
Legislação (cont.)
§ 3º Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.
§ 4º A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa.
§ 5º Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do art. 155.
§ 6º Tratando-se de bens e instalações do patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista, a pena prevista no caput deste artigo aplica-se em dobro.
Bem jurídico
Assim como os demais, tutela-se aqui a inviolabilidade do patrimônio.
A razão de ser do presente tipo reside no fato da receptação atingir novamente o direito de propriedade anteriormente violado (v.g., pelo furto, roubo etc.), permanecendo a situação antijurídica criada, e dificultando, ainda, a recuperação dos produtos obtidos com o crime anterior.
Sujeito ativo
Qualquer pessoa (caput e § 3º). Não se inclui o coautor ou partícipe do crime anterior, por se tratar de pós-fato impunível.
Excepcionalmente, o proprietário do bem pode figurar como sujeito ativo caso objeto esteja na posse legítima de terceiro.
No § 1º, o sujeito ativo deve ser comerciante ou industrial, tratando-se assim de um crime próprio.
Sujeito passivo
Qualquer pessoa que figure como vítima do crime antecedente, do qual teve origem a coisa receptada.
Tipo objetivo
A conduta incriminada no caput é adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que saiba produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.
A expressão coisa que sabe ser produto de crime é elemento normativo do tipo penal, e tem o sentido de ação típica, antijurídica e culpável. Ficam excluídas as contravenções. Pressuposto da receptação é a prova da existência de crime anterior, não necessariamente patrimonial, e independentemente de que tenha sido apurado em processo finalizado, sendo suficiente a prova de sua ocorrência, que poderá ser apurada, inclusive, conjuntamente com o delito posterior.
O tipo traz duas modalidades de receptação:
Tipo objetivo (cont.)
A receptação própria, que consiste em adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar coisa que o agente tem conhecimento ser produto de crime.
Adquirir representa o ato de obter a propriedade da coisa seja de forma onerosa (como na compra), seja gratuita (doação). Inclui-se a aquisição decorrente de sucessão causa mortis, desde que o herdeiro saiba que a coisa foi criminosamente obtida pelo de cujus. Inclui-se, ainda, quando não há qualquer vínculo negocial entre o autor do crime anterior e o agente, como no caso do indivíduo que se apodera da coisa atirada pelo ladrão em processo de fuga, com conhecimento da origem criminosa.
Receber tem o sentido de ter a posse da coisa, sem animus de proprietário (ter a coisa em depósito, guarda etc.).
Transportar é transferir, carregar a coisa de um lugar para o outro.
Conduzir representa o ato de dirigir um veículo qualquer.
Ocultar significa esconder a coisa, dissimulando a posse.
Tipo objetivo (cont.)
A receptação imprópria, que consiste em influir (estimular, induzir) para que terceiro de boa-fé (elemento normativo do tipo: lealdade, boa intenção) adquira, receba ou oculte coisa oriunda da prática de um delito anterior.
Objeto material é a coisa móvel (dinheiro, jóias, mercadorias) obtidas por meio do crime. O imóvel, por não ser passível de deslocamento, não pode ser receptado.
O produto do crime de que fala a norma pode ser direto ou indireto. Assim, não desnatura o crime o fato de o agente adquirir coisas oriundas indiretamente do crime antecedente (v.g.: obras de arte adquiridas através de dinheiro roubado).
Com o produto do crime não se confundem os instrumentos do crime. A aquisição, recebimento ou ocultação destes para favorecer o criminoso a escapar configura o crime de favorecimento pessoal (art. 348, CP).
Tipo objetivo (cont.)
É possível a receptação de receptação. Se, porém, nessa cadeia, um dos sujeitos não conhece nem tem condições de conhecer o caráter de origem ilícita da coisa, cessa o caráter criminoso do bem, ainda que adiante este venda a coisa a terceira pessoa que conhece a origem criminosa da res.
Interessante ponto diz respeito receptação de coisa proveniente de vários crimes, realizada em um único contexto. Sendo a conduta realizada num só ato, não importa se as coisas sejam provenientes de mais de um crime antecedente, há apenas uma receptação. Se, porém, a receptação dessas várias coisas passa a ser feita em momentos distintos, provenientes de um único delito antecedente, haverá receptação continuada.
Haverá concurso material entre a receptação e o crime de associação criminosa quando se estabelecer uma associação estável com o propósito de adquirir e vender coisas furtadas.
Tipo subjetivo
O dolo, que no caput só pode ser direto (coisa que sabe ser produto de crime).
O dolo deve ser antecedente ou concomitante. Teremos dolo subseqüente no caso do terceiro que adquire coisa de boa-fé e, tomar conhecimento da origem criminosa da coisa, praticar nova conduta, v.g., ocultando-a.
Exige o tipo ainda o elemento subjetivo especial do tipo consubstanciado no especial fim de obter proveito ilícito para o próprio agente ou para outrem. É este animus lucrandi que diferencia a receptação do favorecimento real (art. 349, CP).
Consumação
Na receptação própria, com a prática de qualquer uma das condutas descritas na norma incriminadora que implique a obtenção da res pelo agente. É um crime de resultado.
Na receptação imprópria, suficiente a prática de qualquer ato capaz de influir terceira pessoa a realizar a conduta objetivada para que se consume. É um delito de mera conduta.
Na conduta de transportar, conduzir e ocultar, há crime permanente, protraindo-se a consumação no tempo, possibilitando a prisão em flagrante enquanto não cessar o ato.
Tentativa
Admite-se na receptação própria; não na imprópria.
Receptação “qualificada” (§ 1º)
Pune-se a conduta daquele que, no exercício de atividade comercial ou industrial, pratique as condutas de adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio.
Em verdade, é tipo penal independente, autônomo, sem qualquer vinculação ao caput.
Atividade comercial ou industrial é elemento normativo do tipo, sendo conceituado pelo Direito Comercial. No § 2º, o legislador equiparou qualquer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive obtido ilicitamente. Referida atividade deve ser continuada, habitual.
Vejamos as demais condutas incriminadas:
Ter em depósito significa o ato de receber, onerosa ou gratuitamente, a coisa oriunda do crime, para que a retenha e a conserve, para si ou para terceiro.
Receptação “qualificada” (§ 1º) (cont.)
Desmontar é separar as peças do bem que é produto do crime.
Montar é preparar, aprontar para funcionamento.
Remontar é montar o que foi desmontado, bem como consertar, reparar, acrescentar ou substituir peças.
Vender é transferir a posse a outrem mediante paga.
Expor à venda é exibir a coisa para fins de transferência a outrem mediante oferta de preço.
Ou de qualquer modo utilizar significa usar, empregar, qualquer modo, independentemente de condições.
É um tipo misto alternativo. A prática de mais de um conduta caracteriza crime único.
Receptação “qualificada” (§ 1º) (cont.)
Tipo subjetivo é o dolo eventual, indicado pela expressão deve saber, que expressa um juízo de dúvida sobre a origem criminosa da coisa. E se o agente age com dolo direto? Deve-se aplicar a interpretação extensiva para admitir-se a receptação qualificada. Há ainda o elemento subjetivo especial do tipo consistente em obter proveito ilícito para si ou para outrem.
Confronto: O agente que, no exercício de atividade industrial ou comercial, vende, expõe a venda ou mantém em depósito mercadoria estrangeira clandestinamente introduzida no país, que importou ou recebeu de outrem, sabendo de tais circunstâncias, responde pelo delito de contrabando ou descaminho (art. 334, § 1º, c, CP), e não pela qualificadora ora em exame.
Receptação culposa (§ 3º)
Consiste em adquirir ou receber coisa que, por sua natureza (essência), ou pela desproporção entre o valor e o preço (devendo ser manifesta), ou pela condição de quem a oferece (idade, aparência, profissão etc.), deve presumir-se obtida por meio criminoso.
Os três elementos devem ser levados em consideração, conjuntamente.
Perdão judicial e privilégio (§ 5º)
Possibilita o § 5º, em sua primeira parte, o perdão judicial da receptação culposa caso seja o autor primário e desde que atue com culpa levíssima.
Em sua segunda parte, tratando-se de receptação dolosa, remete o aplicador ao disposto no art. 155, § 2º, privilegiando as consequências do delito.
Causas de aumento de pena (§ 6º)
Tratando-se de bens e instalações do patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista, a pena prevista no caput é aplicada em dobro.
Aplica-se apenas ao preceituado no caput, ficando de fora a receptação qualificada e a receptação culposa.
Ação penal
Com as ressalvas do art. 182, CP, a ação penal é pública incondicionada.

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