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Recreação e jogos SUMÁRIO Quadro-síntese do conteúdo programático ................................................................................................. 11 Contextualização da disciplina ................................................................................................................... 13 UNIDADE I A RECREAÇÃO E O JOGO 1.1 - Concepções de recreação .................................................................................................................... 15 1.2 - Educação lúdica .................................................................................................................................. 16 1.3 - A ludicidade e o processo ensino-aprendizagem ................................................................................ 18 1.4 - A brincadeira, o brinquedo e o jogo na construção do conhecimento ................................................ 20 1.5 - O jogo e as teorias .............................................................................................................................. 22 1.6 - O jogo e a educação ............................................................................................................................ 25 1.7 - O jogo e seus valores interdisciplinares ............................................................................................. 27 UNIDADE II A RECREAÇÃO NO CONTEXTO EDUCACIONAL 2.1 - O papel do brincar no desenvolvimento infantil: como a escola percebe tal relação? ....................... 29 UNIDADE III LÚDICO: ISTO É SÉRIO? 3.1 - A infl uência do jogo no desenvolvimento de aspectos cognitivos, afetivos e sociais ........................ 33 3.2 - Ofi cina de jogos, brinquedos e brincadeiras ....................................................................................... 34 Glossário ..................................................................................................................................................... 40 Gabarito ....................................................................................................................................................... 41 Referências bibliográfi cas ........................................................................................................................... 42 11Quadro-síntese do conteúdo programático UNIDADES DO PROGRAMA OBJETIVOS I - A RECREAÇÃO E O JOGO 1.1 - Concepções de recreação 1.2 - Educação lúdica 1.3 - A ludicidade e o processo ensino-aprendizagem 1.4 - A brincadeira, o brinquedo e o jogo na construção do conhecimento 1.5 - O jogo e as teorias 1.6 - O jogo e a educação 1.7 - O jogo e seus valores interdisciplinares II - A RECREAÇÃO NO CONTEXTO EDUCA- CIONAL 2.1 - O papel do brincar no desenvolvimento infantil: como a escola percebe tal relação? III - LÚDICO: ISTO É SÉRIO? 3.1 - A infl uência do jogo no desenvolvimento de aspectos cognitivos, afetivos e sociais 3.2 - Ofi cina de jogos, brinquedos e brincadeiras • Refl etir sobre as concepções de recreação e a importância deste tema na prática pedagógica com crianças pequenas; • Discutir a relação entre a ludicidade e a apren- dizagem; • Identifi car a importância da brincadeira na cons- trução de novos conhecimentos; • Diferenciar brincadeira, brinquedo e jogo; • Conhecer e analisar semelhanças e diferenças no pen- samento de alguns teóricos em relação à brincadeira. • Refl etir acerca do papel da brincadeira no am- biente educacional; • Discutir sobre a atividade do brincar no contexto da escola infantil; • Refl etir sobre o papel do adulto/educador na construção de um trabalho que favoreça a atividade lúdica da criança. • Discutir a infl uência do jogo no processo de de- senvolvimento infantil; • Reconhecer os jogos, brinquedos e brincadeiras populares como possibilidades para o enriqueci- mento no trabalho com a educação escolar lúdica. 13Contextualização da Disciplina Esta disciplina vem propor uma discussão sobre o brincar enquanto atividade signifi cativa e fundamental no desenvolvimento da criança, visando à refl exão do leitor/educador, com relação ao papel do brincar no contex- to da escola infantil. Concebendo a criança enquanto sujeito de cultura, a idéia de pensar uma disciplina especifi camente sobre jogos, brinquedos e brincadeiras parte da premissa de que essas atividades humanas são o princípio para que as crianças se apropriem, de forma plena e prazerosa, do universo social no qual estão inseridas. O trabalho com a educação infantil pressupõe uma infi nidade de questões que implicam o mergulho nos aspectos inerentes ao desenvolvimento humano. Cabe ressaltar que este material foi elaborado fundamentado nas atuais teorias que buscam explicar de que forma as crianças se apropriam do conhecimento e como os educadores podem atuar, de modo a possibilitar ambientes favoráveis às aprendizagens infantis, em especial aquelas que acontecem no interior da instituição, seja na creche ou na pré-escola. Nesse sentido, buscamos a abordagem interacionista do processo de desenvolvimento humano, através de diversos teóricos e pesquisado- res, trazendo a questão do jogo, da brincadeira e do brinquedo para uma refl exão contextualizada, inclusive, na sua dimensão histórica. No Brasil, o brincar está legalmente assegurado enquanto um direito a todas as crianças. Podemos constatar que a legislação entende o brincar como atividade essencial na formação saudável das crianças e orienta as diversas instâncias responsáveis pelo cuidar e o educar na infância, que toda a ação adulta precisa ser perme- ada pela ludicidade. Confere também ao poder público a responsabilidade em oferecer espaços e atividades para o lazer e o acesso à cultura às crianças desde a Educação Infantil. Portanto, não se trata, somente, de uma opção metodológica, mas acima de tudo o brincar confi gura-se na possibilidade concreta para que a relação entre adultos e crianças, no contexto educacional, aconteça como direito de cidadania e desenvolvimento pleno da criança. 15UNIDADE I A RECREAÇÃO E O JOGOA RECREAÇÃO E O JOGO 1.11.1 - Concepções de Recreação Nas últimas décadas, temos verifi cado um crescimento no interesse pelo tema recreação, que usualmente fazia parte de um repertório específi co da Educação Física, mas que vem ganhando importância cada vez maior em toda a área educacional, especialmente na Educação Infantil. Diversas concepções sobre este assunto já foram es- tabelecidas e percebemos em algumas delas uma ten- dência em associar recreação a uma atividade física. No passado, recreação foi um termo empregado po- pularmente ao pretender se falar sobre atividades físi- cas. Ainda hoje podemos perceber esta utilização, que pode ser facilmente questionada, uma vez que poderia ser considerada como recreação situações que não en- volvem especifi camente um esforço físico, tais como ouvir música, ler um livro, declamar poemas etc. Entre as aproximações conceituais que estão transcritas abaixo, é possível comparar semelhanças e diferenças no entendimento sobre esse fenômeno. Tomemos, por exem- plo, Medeiros (1969) em seu conceito de recreação: Se cada um de nós listasse um rol de atividades recreativas e fosse comparar tais listas lado a lado, encontraríamos as mais diversas ocupações. Figurariam, por certo, coisas tão diferentes como leitu- ra e natação, música e excursionismo, pintura e futebol, cinema e fi latelia, teatro e culinária, dança e pesca, etc. etc. Saltaria a nossos olhos que a recreação compreende um número infi nito de experiên- cias em uma multiplicidade de situações (MEDEIROS, 1969: 21). ão: sem parágrafo, c Seria o tipo de atividade que defi niria o que poderíamos chamar de recreação? A autora continua seu pensamento: E o que falar de comum em atividadestão diversifi cadas, mui- tas vezes contrastantes, a ponto de fazê-las surgir abaixo de um mesmo rótulo? Evidentemente não será o tipo de ocupação... O que caracteriza a todas é a atitude do indivíduo, a disposição mental de quem a elas se entrega, por própria escolha, em suas horas livres. Aquilo que para uns constitui um trabalho pesa- do, para outros é recreio, é passatempo domingueiro. Qualquer ocupação pode ser justamente considerada recreativa, sempre que alguém se dedique a ela por sua vontade, em seu tempo li- vre, sem ter em vista outro fi m que não seja o prazer da própria atividade e que nela encontre satisfação íntima e oportunidade para recrear-se (IDEM: 21). (citação: sem parágrafo, centraliza Entendemos que esta autora se refere à recreação em termos de escolha, especifi camente falando de um sujeito adulto, em escolha de tempo livre. Em outra concepção, podemos citar Loughlin (1971), que rebate esta idéia de tempo livre, mas fala de um tempo próprio, que surge de um interesse profundo, podendo este acontecer até mesmo no tra- balho. Também faz uma menção às diferenças cul- turais, que dão diferentes matizes à recreação, mas que tudo está sujeito à disponibilidade psíquica e biológica para tanto. Hoje, reconhecemos recreação como uma expe- riência onde o sujeito participa por escolha, pela satisfação pessoal, sem esperar dela qualquer ganho adicional que não o próprio prazer, podendo acon- tecer quando e onde houver disponibilidade do su- jeito para tanto. Tratando o assunto de forma não reducionista, po- demos considerá-lo como manifestação humana, com aspectos que envolvem tempo, atitude, situação, crí- tica e criatividade. Em relação às crianças, podemos associar o ter- mo com brincadeira, a atividade livre e, portanto, opcional do brincar. O direito ao brincar aparece nas sociedades modernas garantido como um di- reito fundamental para as crianças porque passou a ser violado. Assim, a Convenção das Nações Unidas sobre os direi- tos da criança faz a seguinte afi rmação no artigo 311: 1) Os Estados reconhecem os direitos da criança ao descanso e ao lazer, ao divertimento e às atividades recreacionais próprias da idade, bem como à livre participação na vida cultural e artística. 2) Os Estados Partes respeitarão e promoverão o direito da criança de participar plenamente da vida cultural e artística e encorajarão a criação de oportunidades adequadas em condi- ções de igualdade, para que participem da vida cultural, recrea- tiva e de lazer (UNICEF, Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, 1990). 1 Aprovada pelo Decreto Legislativo nº 28, de 14 de setembro de 1990, e promulgada pelo Decreto 99.710 de 21 de novembro de 1990. 16 Está dito que os países deverão proteger o tempo da infância como um tempo de cidadania, garan- tindo também às crianças condições de brincar. No Brasil, a Constituição Brasileira de 1988, no seu artigo 227, também afi rma: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profi ssionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comu- nitária, além de colocá-la a salvo de toda forma de discriminação, ex- ploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988: Art. 227). ão: s Esses direitos são reafi rmados no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990. O direito ao brincar é um dos direitos da cidadania. É claro que a atividade do brincar, sozinha, não faz a cidadania, mas não podemos esquecer que nessa ati- vidade a autonomia é um pressuposto e supõe assim o uso da liberdade sem a qual não existe cidadania. Especifi camente para as propostas pedagógicas das instituições voltadas para a educação das crianças pequenas, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil também determinam a ludicida- de como um princípio norteador para a criação das mesmas. Orientando o trabalho das creches e pré-escolas, um outro documento oficial, o Referência Curri- cular Nacional de Educação Infantil (BRASIL, 1998), sinaliza a importância do brincar tanto em situações formais quanto informais. Vai mais além, definindo a brincadeira como linguagem infantil, que vincula o simbólico à realidade imediata da criança. Subjacente a esses encaminhamentos, há o enten- dimento de que a criança é um ser histórico-social, dotado de diferenças, peculiaridades, mas completo dentro de seu nível de desenvolvimento, um cidadão capaz de fazer escolhas, de agir segundo sua vontade, de criar e recriar. Leituras Complementares Procure ler as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, atentando para o artigo que traz a ludicidade como um princípio. Leia no Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil (parte introdutória) o que é colocado sobre o “brincar”. Procure extrair as idéias centrais. 1.21.2 - Educação Lúdica “Depois de acordar, mamar. Depois de mamar, sorrir. Depois de sorrir, cantar. Depois de cantar, comer. Depois de comer, brincar. Depois de brincar, pular. Depois de pular, cair. Depois de cair, chorar. Depois de chorar, falar. Depois de falar, correr. Depois de correr, parar. Depois de parar, ninar. Depois de ninar, dormir. Depois de dormir, sonhar.” Sandra Peres, Paulo Tatit e Edit Deardyk Depois disso, aquilo, depois, aquilo outro... Essa tem sido a lógica da educação dos últimos tempos. A tendência que se verifi ca hoje nas escolas é de or- ganizar o tempo seqüenciando atividades preestabe- lecidas. Esta é uma prática que herdamos de concep- ções educativas que viam a criança/aluno como ser passivo, que necessitava de orientação e organização do seu tempo para que adquirisse um conhecimento também preestabelecido. Isto se verifi ca em todos os segmentos das instituições educacionais – da Educa- ção Infantil à Universidade. Parece ser uma necessidade do ser humano organi- zar o tempo, como se essa organização trouxesse a segurança de dar conta de tudo aquilo que se pretende necessário. Não queremos dizer que a organização não é ne- cessária, porém muitas vezes é “carregada” de uma rigidez que não permite a entrada de acontecimentos inesperados ou outras experiências que possam fazer parte do repertório das crianças/alunos ou professo- res. E, neste esforço por dar conta de alguma coisa, se perde muitas vezes a possibilidade de enriquecer o trabalho com o prazer. Vamos pensar um pouco nas nossas próprias experi- ências de aprendizagem. Será que todas elas tiveram um viés prazeroso? Quais foram as mais intensas? Tradicionalmente, a escola sempre foi vista como um local formal, especialmente a sala de aula, caben- do apenas ao horário de recreio alguma liberdade, risos e brincadeiras. E quantas coisas foram aprendi- 17 das nesses horários! Imagine trazer esta alegria para a sala de aula. Associar o lúdico à aprendizagem. É preciso que os educadores reconheçam nas crianças as crianças que um dia foram. A entrada do prazer nos espaços de educação infan- til, junto com a ludicidade que precisa estar matricu- lada e ter garantida sua vaga em todas as salas dos outros segmentos também, só será possível quando os alunos, seus responsáveis e especialmente os pro- fessores descobrirem que o trabalho escolar pode ser sério e de qualidade sem ser rígido ou repetitivo. O prazer de viver e o prazer de ensinar/aprender ca- minham juntos. E isso pode ser comprovado quando observamos que as crianças mostram-se prontas e ca- pazes para aprender tudo que lhes interessa, buscando outras crianças e adultos, dentro e fora da escola, para na interação com eles construir seus conhecimentos, conceitos e valores. Adultos (nós professores aqui in- cluídos) e também as crianças tanto navida pessoal quanto na profi ssional, costumamos nos “sair bem” na- quilo que fazemos com envolvimento, com desejo de fazer, motivados pelo desejo de descobrir ou inventar. Associar estudo e prazer não é uma idéia nova, já era comentada desde Platão e Aristóteles, e esteve re- lacionada a diversos momentos históricos e concep- ções sobre a infância. Santo Agostinho expressou assim suas idéias: “O Lúdico é eminentemente educativo no sentido em que constitui a força impulsora de nossa curio- sidade a respeito do mundo e da vida, o princípio de toda descoberta e toda criação.” Santo Agostinho Nas palavras do autor, curiosidade parece ser pala- vra-chave para o conhecimento. Buscamos conhecer e aprender sobre tudo aquilo que nos chama atenção. E nossa atenção está bastante voltada para o que nos traz prazer. Este parece ser o ponto de partida para maiores descobertas. Mas esbarramos na tradição da escola, e não vemos muitas possibilidades de modifi cá-la. Alguns autores, entre eles Snyders, defendem que a escola seja um es- paço onde o prazer e a alegria estejam presentes, não só de forma possível, mas sim de forma necessária. A maior parte das crianças em situação de fracasso são as de classe popular e elas precisam ter prazer em estudar; do contrá- rio, desistirão, abandonarão a escola, se puderem. (...) Quanto mais os alunos enfrentam difi culdades de ordem física e econômica, mais a Escola deve ser um local que lhes traga outras coisas. Essa alegria, não pode ser uma alegria que os desvie da luta, mas eles precisam ter o estímulo ao prazer. A alegria deve ser prioridade para aqueles que sofrem mais fora da escola. (...) (SNYDERS apud PELLEGRINI, 2001: 19-25). Mas também é bom ressaltar que alguns teóricos (entre eles Vygotsky) apontam que nem sempre as si- tuações de ludicidade e brincadeira estão envolvidas em prazer. Em jogos e brincadeiras também há ven- cedores e perdedores, mas ambas as vivências trazem ensinamento/aprendizagens para seus participantes. Lidar com a questão do erro no jogo pode ser uma aprendizagem extremamente relevante para a criança. Independente do nível em que a criança se encontre, jogar é fundamental para o seu desenvolvimento e por isso é imprescindível que o educador proporcione si- tuações-problema a serem solucionadas pela criança, para que estas situações sejam revistas e analisadas e ela mesma faça uma pausa para pensar sobre o jogo, o que colabora para melhorar seu desempenho. Por meio dessas intervenções, a criança vai percebendo, gradativamente, que algumas de suas ações são ina- dequadas, sendo levada a construir outras superiores às anteriormente adotadas. Concluímos assim que, ao jogar, a criança constrói conhecimento e para isso o jogo oferece a ela a oportunidade de mostrar a sua própria capacidade de encontrar soluções. Dessa forma a questão do erro que é tão difícil de ser trabalhada na escola pode, através do jogo, ser di- recionada para a análise e busca de ações que podem oferecer suporte para a criança sentir-se desafi ada a jogar novamente, aproveitando as boas jogadas e eli- minando aquelas que a afastam do sucesso. Em função desta dimensão, a Educação Lúdica bus- ca valorizar um novo processo de desenvolvimento físico, intelectual e social através de jogos, brinque- dos, brincadeiras e outros materiais que favoreçam para que a aprendizagem aconteça de forma mais descontraída, porém efetiva. Para tanto, é necessário que educadores e insti- tuições revejam seu conteúdo e sua prática, e mais que “forçar” a criança numa direção, “seduza” essa criança para um caminho cheio de possibilidades, de entusiasmo pelo novo. É necessário substituir a rigidez burocrática pelo entusiasmo do conhecimen- to, do novo, das possibilidades criativas. Almeida (1995) ressalta: A Educação Lúdica contribui e infl uencia na formação da criança, possibilitando um crescimento sadio, um enriquecimento perma- nente, integrando-se ao mais alto espírito democrático, enquanto investe em uma produção séria do conhecimento. A sua prática exige a participação franca, criativa, livre e crítica, promovendo a interação social e tendo em vista o forte compromisso de trans- formação e modifi cação do meio (ALMEIDA, 1995: 4). 18 Leituras Complementares Visite o site www.rubemalves.com.br e leia os artigos onde o autor fala sobre educação. Visite o site www.faced.ufba.br e leia artigos sobre ludicidade. 1.31.3 - A Ludicidade e o Processo Ensino-aprendizagem É papel da educação formar pessoas críticas e cria- tivas, que descubram, criem, inventem, que sejam ca- pazes de construir conhecimento. Ao pensarmos uma educação lúdica, estamos respeitando essa premissa de que o ser humano é um ser em movimento, perma- nentemente em construção. O que a ludicidade traz de novo acrescentando ao já conhecido é afi rmar que o ser humano, quando age ludicamente, vivencia uma experiência plena. Defi nindo ludicidade, Luckesi (2000) diz que ela é ... um fazer humano mais amplo, que se relaciona não apenas à presença de brincadeiras e jogos mas também a um sentimen- to, atitude do sujeito envolvido na ação, que se refere a um prazer de celebração em função do envolvimento genuíno com a atividade, a sensação de plenitude que acompanha as coisas signifi cativas e verdadeiras (LUCKESI, 2000)2. Como será que as escolas de nosso tempo vêm li- dando com a construção do prazer como um valor, com a “produção” de seres felizes e com o papel da ludicidade para a formação dos sujeitos para seu de- senvolvimento pleno e aprendizagem? Não pretendemos aqui falar apenas do caráter inte- lectual da aprendizagem, mas também de outras apren- dizagens de caráter social e de relação com o mundo, que são amplamente favorecidas pela brincadeira. Observando a criança na brincadeira, podemos ex- plorar o seu caráter subjetivo ao encontro da realida- de, extraindo desse nosso olhar o que é importante conhecer sobre como ela está se desenvolvendo. Exemplifi cando: Crianças brincam. Uma delas de 4 anos levanta um lápis ao ar, imitando um avião. Outra levanta um pa- pel. Produzem um som semelhante ao de um motor, e com a mão, fazem movimentos rápidos e bruscos, simulando piruetas, acompanhadas por modifi cações na intensidade do som do emitido. O que nos mostra esta observação? • A criança tem um conhecimento prévio de que o avião é um transporte aéreo; • O avião faz manobras no ar e é movido por um motor, que alterna seu trabalho de acordo com o movimento; • Outro objeto de forma semelhante pode ser utiliza- do para representar um avião. Partindo destas observações, percebemos o quanto a brincadeira-ludicidade refl ete o conhecimento que as crianças possuem e dá possibilidades de interferên- cias que podem ser feitas no espaço escolar. Há uma estreita relação entre estes parceiros, que se alimen- tam mutuamente durante todo o processo. Não podemos deixar de lado a aquisição cultural que esta observação deixa clara e o relacionamento que estas crianças já estabelecem com ela. De forma lúdica, a cultura vai sendo ressignifi cada e vai assu- mindo lugar cada vez maior a partir da experiência de cada criança. A concepção sociohistórica nos aponta caminhos e nos abre possibilidades para entendermos melhor a relação ensino-aprendizagem e, neste novo pensar, a ludicidade ganha papel de destaque por ser mani- festação humana, cheia de signifi cados e associações à cultura. Substitui-se aqui a idéia de que o conhe- cimento vem do exterior para o interior da criança, abrindo-se uma crítica aos modelos expositivos de transmissão de conhecimento. Ou seja, um ser que participa ativamente de todo o processo, que interage com aspectos diversos que terão signifi cados próprios ao terem contato com as bases culturais que ele possui.Paulo Freire foi um dos primeiros autores nacionais a sublinhar a questão das bases culturais do conhecimento, que no exemplo acima descrito fi caram bastante explícitas. Imaginemos agora se seria possível esta mesma expe- riência vivenciada pela criança de 4 anos ser também uma experiência para uma criança, ainda que na mesma faixa etária ou em faixa etária superior, que não conheça o objeto avião, suas possibilidades e algo do seu funcio- namento. Esta experiência não teria acontecido, porque não faria parte do repertório cultural da criança. Deixando clara a questão da cultura, podemos então avançar em outras questões pertinentes ao tema. A va- lorização do brincar é uma conquista recente. 2 Este material foi obtido através do website de Cipriano Carlos Luckesi. Não há referência de data de elaboração e publicação do texto. 19 O brincar não era visto como valioso em termos educacionais quando as escolas de educação infantil iniciais começaram a ser introduzidas na Europa Ocidental nos séculos XVIII e XIX. Acreditava-se que as crianças precisavam de instrução, e, no caso de doutrinas religiosas, de remissão por seus comporta- mentos pecaminosos (MOYLES, 2002: 28). sem parágra- fo, centralizado e fonte menor) O valor da brincadeira, ou do conhecimento espon- tâneo, começou a se alterar a partir da visão de alguns teóricos como Comenius e Rousseau3. Nesta época, criou-se a idéia de criança “naturalmente boa”, e uma certa importância foi estabelecida para o brincar. A partir do século XX, teóricos da Europa Ociden- tal consideraram o brincar um componente essencial para o desenvolvimento social e intelectual da crian- ça, bem como para o desenvolvimento da criatividade e da própria subjetividade. Paralelamente, uma nova concepção de infância foi se desdobrando, se estabelecendo como uma criação cultural muito além de uma classifi cação etária e bio- lógica e agora apoiada na idéia da diversidade, na idéia de Infâncias. Tomando como ponto de partida o jogo em uma pers- pectiva sociointeracionista, isto é, pensando-o como meio de garantir a construção do conhecimento e a interação entre os indivíduos, como vincular a atividade lúdica à função da escola? Como utilizar as brincadeiras no currí- culo escolar de modo a favorecer o desenvolvimento? Em situações específi cas nas escolas, podemos veri- fi car duas situações do brincar: brincar livre e brincar direcionado. Alguns teóricos defendem que especialmente na Educação Infantil toda a atividade da criança seja o brincar livre, que propicia diversão e aprendizagem. Porém, alguns acreditam que certas intervenções podem ser feitas pelo professor, evitando que certas brincadeiras se tornem repetitivas. ...os educadores têm um papel chave a desempenhar: ajudar as crianças a desenvolver o seu brincar. O adulto pode, por assim dizer, estimular, encorajar ou desafi ar a criança a brincar de for- mas mais desenvolvidas e maduras (IDEM: 30). Uma boa forma de ilustrar esta situação é o ofereci- mento de jogos, por exemplo, o quebra-cabeças. Ao se oferecer à criança um quebra-cabeça, oferece-se um desafi o. A partir desta intervenção, novas possibi- lidades de oferecimento de desafi os se ampliam e se ajustam às habilidades das crianças envolvidas. Outra forma é a dramatização dirigida, com papéis e regras defi nidos, aumentando a complexidade do brincar de “faz de conta”. Não estamos falando aqui da substituição de um modelo por outro, mas sim da possibilidade de co- existência dos dois modelos, no intuito de atender e ampliar as experiências infantis. Cabe ressaltar que o brincar com intervenção do adulto necessita de momentos prévios onde a obser- vação do brincar livre o orientará para seus futuros oferecimentos. Para alguns teóricos, como Vygotsky, a participação do adulto é essencial como auxiliar na aprendizagem infantil. É importante ressaltar também outros recursos que possibilitam à escola transformar seu cotidiano em um espaço lúdico, signifi cativo e com forte conotação cultural. Um deles, bastante atual, são as diferentes mídias. Dentre as possibilidades de mídia existentes, devemos ressaltar a televisão como a que, aparente- mente, possui um maior poder de sedução por já estar totalmente integrada como prática em nossa socieda- de. Poder esse que não pode ser ignorado, mas que precisa ser entendido e apropriado pelas instituições de educação. E isto requer ir além do apelo visual, mas utilizar também o seu conteúdo. A mídia seduz, mas ainda temos difi culdade de in- cluí-la nos nossos “esquemas fechados” de ação pe- dagógica. Tentamos transformar estes aparatos em disciplinas escolares. E conseguimos. Basta verifi car o que vem acontecendo com o uso de computadores nas escolas. Já há um processo de escolarização para o seu uso. Com aulas planejadas e estabelecidas para que a criança aprenda a utilizar mais este recurso; o prazer, o desafi o fi caram pelo caminho. Falamos aqui também do desafi o que é para nós educadores pensarmos transformação e pensarmos numa escola cujo foco principal seja a criança. E, assim sendo, não esquecer que ela seja vista em sua totalidade, incluindo suas preferências, seus prazeres, suas relações com objetos e pessoas. Talvez devêssemos observar o sucesso da proposta de trabalho de uma escola através das carinhas felizes das crianças, entusiasmadas pelo que ali descobrem e ansiosas por estar de volta no outro dia, pois aquele é um bom lugar de se estar. 3 Jean-Jacques Rousseau, fi lósofo suíço, um dos percurssores do romantismo, foi o grande responsável pelo surgimento dos conceitos de infância e criança, pois defendia que os homens nascem perfeitos e a sociedade é que os corrompe. Jan Amos Comenius foi um dos maiores educadores do seu tempo (séc. XVII). Foi o criador da didática moderna e percursor de propos- tas que possibilitassem uma nova dimensão na educação de crianças. 20 Leitura Complementar Leia o capítulo I do livro de Adriana Friedmann (2006) O desenvolvimento da criança através do brincar. Procure realizar as atividades propostas ao fi nal do mesmo. 1.41.4 - A Brincadeira, o Brinquedo e o Jogo na Construção do Conhecimento “Enganam-se aqueles que tentam explicar as con- quistas do cientista por uma força de vontade e uma disciplina excepcionais. (...) O estado afetivo que condiciona semelhantes proezas mais se assemelha ao estado da alma dos religiosos ou dos amantes” Einstein (1981:140-1) Interessantes as palavras de Einstein quando ele re- lata sua própria experiência na construção de suas te- orias, pois ressalta que mais importante que força de vontade e disciplina (elementos até hoje preconizados como essenciais à aquisição do conhecimento) é o es- tado de alma dos religiosos ou dos amantes em que transparece a opção, a entrega, a vontade. Einstein era um gênio. E um apaixonado pelo seu tra- balho. Trabalho feito com entrega, busca por respostas a um desejo essencialmente humano – a curiosidade. E a escola, como trabalha? De que forma provoca a curiosidade nas crianças? Nas práticas tradicionais, a ação educativa está cen- trada no professor, e todo o processo de aprendizagem depende dele. A palavra dele é soberana e a função é investida de uma autoridade que, juntos, conduzem toda a atividade da criança. Esta postura ainda pode ser encontrada nos diversos segmentos da educação, inclusive na educação infantil. Com certeza, nesta úl- tima há um espaço maior à ludicidade, mas em pou- cos lugares a relação da brincadeira como facilitadora de aprendizagens é reconhecida. Porém, vivemos um momento onde a concepção de aprendizagem se apóia em novos paradigmas na construção do conhecimento pelo sujeito. Esta idéia fundamenta-se nas teorias de Jean Piaget, assim como Levy Vygotsky e Henri Wallon,cada um no seu con- texto histórico e social de pesquisa e de construção de conceitos acerca do desenvolvimento humano. A idéia do desenvolvimento humano, para esses teó- ricos, sugere um sujeito ativo e interativo, protagonis- ta de suas ações e de seu mundo de cultura, implican- do para a educação escolar alguns questionamentos: como possibilitar este protagonismo? De que forma favorecer que a aprendizagem aconteça em um am- biente onde prazer e curiosidade mobilizem a ativida- de da criança frente ao conhecimento? Com relação à criança pequena, as pesquisas apontam para a educa- ção fundamentada na ludicidade, através de atividades que envolvam jogo, brincadeira e brinquedos. Parece-nos estranho defi nir separadamente esses três elementos, uma vez que, no desenvolvimento infantil, as atividades que envolvem o brincar e a lu- dicidade são as grandes responsáveis pela passagem da vida infantil para a vida adulta, pois permitem à criança explorar o mundo adulto, se apropriar dele e identifi car-se enquanto sujeito desse mundo. Vamos ver como esses três termos foram defi nidos na nossa língua. Segundo o dicionário Larrouse: Jogo – ação de jogar, folguedo, divertimento. Brinquedo – objeto destinado a divertir uma criança. Brincadeira – ação de brincar, divertimento/gracejo, zombaria/festinha entre amigos ou parentes. Observem como a questão do divertimento, da coi- sa descontraída, sem propósito, para entreter é levada em consideração quando se pensa no jogo, no brin- quedo e na brincadeira. Então, como pensá-los na construção do conhecimento? Brincadeiras, brinquedos e jogos podem e devem ser vistos como elementos mediadores e no processo de aprendizagem, componentes fundamentais no cotidia- no das escolas infantis. Essencialmente, brincar moti- va. E, desta forma, vai criando um ambiente especial para a aprendizagem, incluindo aí aprendizes crianças ou adultos. Brincar propicia a todos explorar novas situações, manipular novos objetos, interagir com os companheiros e resolver situações-problemas. Ao explorar novas situações, novas formas de pen- sar vão sendo elaboradas pelas crianças, possibilitan- do reorganizar seu pensamento e ampliar suas com- petências cognitivas. As crianças só têm entendimento real daquilo que elas próprias inventam, e sempre que tentamos ensinar-lhes alguma coisa muito rapidamente nós as impediremos de reinventá-las por si mesmas (PIAGET apud MOYLES, 2002: 40). c 21 Partindo desse pressuposto, relacionamos a ativida- de do brincar como provocadora da capacidade criati- va da criança. Brincando, elas (re)inventam a realida- de e vão criando formas muito próprias para torná-la acessível aos seus mecanismos de compreensão. Já na perspectiva Vygotskyana, jogo, brinquedo e brincadeira tornam-se meios para que as crianças sig- nifi quem elementos pertinentes à cultura do adulto e, signifi cando a cultura do adulto, vão percebendo-se parte dessa cultura. Entretanto, isso não será possí- vel se deixarmos que as crianças atuem livremente com o brinquedo, por exemplo, achando que, desta forma, vão sozinhas fazendo suas descobertas. Se não estamos envolvidos, enquanto adultos, diretamen- te, mediando a atividade da brincadeira, temos que proporcionar que o ambiente provoque a imaginação criadora, a exploração de diversos materiais e a inte- ração entre as crianças e observá-las nessa atividade. Analisem atentamente a situação abaixo: Duas crianças de aproximadamente 5 anos brincam de construir com “Lego”. Estão completamente en- volvidas na situação, até que aparece o professor: “Crianças, que interessante! Vamos lá, qual a cor desta peça?” As crianças de imediato respondem: “Amarelo!” O professor continua: “Muito bem ! E aquela outra?” “Verde!” - respondem as crianças. O professor sai satisfeito com a resposta. Não perce- beu e nem se interessou pelo o que estavam construindo. Perdeu a oportunidade de observar a conclusão de um fo- guete espacial que subiria à lua em poucos minutos, para descobrir se há possibilidades de vida humana na Lua. “Vamos continuar. O planeta Terra está com seus dias contados! Nosso foguete vai salvar toda a humanidade.” Certamente este professor vê o jogo do Lego como um recurso para ensinar conteúdos às crianças. Nesse caso, as cores são a grande preocupação. Este pro- fessor oportunizou que as crianças explorassem sua imaginação criadora, inventando mil maneiras para lidar com uma situação que parece assustá-las bas- tante: a degradação do meio ambiente pelo homem. Na brincadeira, elas parecem sentir-se aliviadas pela possibilidade de serem as salvadoras da humanidade, construindo um foguete que lhes permitam levar todos os habitantes da Terra para a Lua, em busca de melho- res condições de sobrevivência. Mas o professor não conseguiu perceber isso, pois se preocupou apenas em saber se os conteúdos trabalhados nas atividades es- colares foram devidamente internalizados pelas crian- ças. Portanto, nesse caso, não houve mediação, apenas a constatação de um conhecimento consolidado. As concepções sociointeracionistas de Vygotsky (1998), que fundamentam o conceito de mediação, partem do pressuposto de que jogos e brincadeiras são impregnados de conteúdos pertinentes à cultura de um grupo e que, portanto, podem oferecer diversas possibilidades para que as crianças internalizem es- ses conteúdos e compreendam como se organizam as práticas sociais nas quais estão inseridas. Analisando a situação descrita anteriormente, é fato que as crianças ouvem e vivem experiências fora do espaço escolar e vão construindo saberes sobre essas experiências, porém é na escola que vão ter a oportu- nidade de transformar esse saber cotidiano num saber científi co, enriquecido de conhecimentos que vão aju- dá-las a compreender melhor a forma como as coisas se dão no mundo adulto. Trocando em miúdos, o professor perdeu a oportunidade de iniciar um trabalho bastante interessante sobre a ação do homem no ambiente, para ajudar as crianças a entenderem que não se trata de salvar as pessoas numa retirada em massa do planeta Terra, mas de construir atitudes mais respeitosas e soli- dárias com relação ao ambiente em que vivemos. Portanto, podemos concluir que, ao se falar na me- diação do professor, estamos afi rmando que há neces- sidade que ele tenha um olhar sensível às descobertas que estão acontecendo bem ali na sua frente e faça interferências produtivas de modo que essas desco- bertas possam oferecer às crianças possibilidades de avançar no seu conhecimento. Já nos ensinava Piaget que as verdadeiras aprendizagens não se fazem copiando do quadro ou prestando atenção na tarefa do professor, mas sim em um processo de inves- tigação pessoal, com avanços, recuos, tristezas e alegrias. Leituras Complementares Procure ler o livro Jogo, brinquedo e brincadeira organizado por Tizuko Morchida Kishimoto para ampliar seu conhecimento sobre esses termos. Procure conhecer o site www.tvebrasil.com.br/SALTO/boletins2003. 22 1.51.5 - O Jogo e as Teorias Sendo um tema de grande importância para a educa- ção, diversos teóricos registraram seus pensamentos e estudos acerca da importância do jogo no desenvolvi- mento das crianças. Nesse item da Unidade I, vamos sintetizar um pouco o pensamento de alguns dos prin- cipais autores que falam sobre o assunto. Johann Huizinga Professor e historiador, escreveu uma obra que é re- ferência no tema – Homo Ludens – 1938. Segundo o autor, o jogo é uma das noções mais primitivas da re- alidade humana, mais primitivo que a própria cultura, sendo uma das coisas que o homem tem em comum com os animais, visto que estes também brincam. É do jogo que nasce a cultura, assumindo as formas de poesia, rituais, práticas etc. Encontra-se também comopano de fundo nas artes e nas competições, nos tribunais de justiça – palco dos advogados – assim como nas guerras e contendas. O jogo é o fato mais antigo que a cultura, pois esta, mesmo em suas defi nições mais rigorosas, pressupõe sempre a sociedade humana; mas os animais não esperaram que os homens os ini- ciassem nas atividades lúdicas (HUIZINGA, 1980: 3).grafo, centralizado e fonte menor) Este posicionamento é único, já que as discussões atuais situam o jogo como produto da cultura. Porém, vê o jogo como uma manifestação não só biológica, mas rica em sentidos e signifi cados. Seus apontamentos nos levam a um questiona- mento: o jogo é sério? Ao utilizar a palavra “spit”, que tem tradução próxima à gracejo, e “spatz” que se traduz em achar graça em algo ou alguma coisa, com prazer, tenciona mostrar que o jogo é diverti- mento prazeroso, que absorve o jogador de forma intensa. Coloca algumas características fundamentais do jogo, como sendo um ato voluntário, que se concreti- za como evasão da vida real, com orientação própria, ocorrendo dentro de limites de tempo e de espaço, criando a ordem através de uma perfeição temporária e limitada. Huizinga enfatiza a importância da tensão, pois não se conhece o desfecho de um jogo antes de seu térmi- no. As regras têm papel fundamental em um jogo: “e não há dúvida de que a desobediência às regras im- plica a derrocada do mundo do jogo” (IDEM: 14). Desta forma, o autor situa o jogo numa perspectiva an- tropológica e bastante original e busca explicar as mani- festações humanas a partir do uso que o homem fez (e faz) do jogo na sua existência ao longo da história. Friedrich Froebel Dentro de uma abordagem fi losófi ca comentaremos as concepções de Froebel, o introdutor dos jogos na educa- ção infantil e considerado como o psicólogo da infância. Froebel foi o primeiro a colocar o jogo como parte es- sencial do trabalho pedagógico, ao criar o jardim da in- fância privilegiando a utilização de jogos e brincadeiras. Antes de Froebel o jogo infantil na educação era vis- to: a) como recreação; b) para favorecer a aprendi- zagem de conteúdos escolares; c) como diagnóstico da personalidade infantil e como meio de adaptar o ensino as necessidades das crianças. Froebel foi o pioneiro ao reconhecer que a criança expressa sua visão de mundo através do jogo que é também a principal fonte de desenvolvimento na pri- meira infância. Para ele, a primeira infância é o perío- do mais importante da vida humana. Diz Froebel: (...) A brincadeira é a atividade espiritual mais pura do homem nesse estágio e, ao mesmo tempo, típica da vida humana en- quanto um todo – da vida natural interna do homem e de todas as coisas. Ela dá alegria, liberdade, contentamento, descanso externo e interno, paz para o mundo... a criança que brinca sem- pre, com determinação auto-ativa, perseverando, esquecendo sua fadiga física, pode certamente tornar-se um homem deter- minado, capaz de auto-sacrifício para promoção do seu bem e dos outros... Como sempre indicamos, o brincar em qualquer tempo não é trivial, é altamente sério e de profunda signifi ca- ção (FROEBEL apud KISHIMOTO, 2005: 68).parágrafo, centralizado e fonte menor) Para esse fi lósofo, um adulto que observa o jogo e a fala de uma criança poderá compreender o nível de desenvolvimento em que ela se encontra, o que é de grande importância para o êxito das atividades educa- tivas. Reconhece-se assim a seriedade da brincadeira. Segundo Froebel, a brincadeira desenvolve as ca- racterísticas humanas das crianças e auxilia meninos e meninas a encontrarem e exercerem desde cedo o papel que lhes cabe na sociedade. Para ele, o jogo varia de acordo com a idade da criança e há diferenças entre as brincadeiras da pri- meira infância e as da infância. Na primeira infância, as brincadeiras estão mais centradas no movimento, no início do processo de exteriorização da criança. Já na infância há um privilégio da brincadeira grupal que produz o desenvolvimento moral e prepara para a convivência em harmonia. 23 Os brinquedos que Froebel criou para auxiliar a brincadeira infantil estão registrados em sua obra Pedagogia dos jardins-de-infância (1917). Tais brin- quedos ou materiais educativos foram chamados de “dons”, já que eles eram considerados como as ferra- mentas que vão ajudar as crianças a descobrirem os dons que Deus lhes deu. Com a utilização de seus brinquedos Froebel traz importantes concepções: • o jogo só funciona se as regras são bem entendidas; • a introdução de novas idéias e materiais garante a continuação do jogo e a presença do adulto junto à criança mantém vivo seu interesse. Utilizando jogos que envolvem os “dons”, Froebel percebeu a grande força que os símbolos possuem para a criança. Entretanto, esse foi um viés pouco percebido da sua teoria. Sintetizando, poderíamos afi rmar que para Froebel a brincadeira e os brinquedos são mediadores tanto do processo de apreensão do mundo pela criança (interiori- zação) quanto do processo de conhecimento de si mes- mo (autoconhecimento), por meio da exteriorização. Jean Piaget A partir da observação dos próprios fi lhos e de ou- tras crianças, estabeleceu que elas têm uma forma singular de pensar, porém pensam por si próprias, construindo hipóteses acerca do mundo adulto. Ba- seado nisso, desenvolveu uma teoria para explicar o desenvolvimento da inteligência humana e a forma como as crianças se apropriam do conhecimento. Para Piaget, o jogo constitui uma atividade funda- mental no desenvolvimento das crianças pequenas. Ele considera a ludicidade como um aspecto da in- teligência e defi ne um estágio evolutivo para o surgi- mento do jogo na atividade infantil, associando o uso do jogo às fases do desenvolvimento da inteligência da criança, sendo elas: o jogo de exercício, o jogo simbólico e o jogo de regras. O jogo de exercício se defi ne na própria característica da inteligência da criança nessa fase de sua vida: entre 0 e 2 anos de idade. O jogo do exercício aparece desde o período sensório-motor, quando a criança exercita toda nova conduta formada pelo simples prazer de dominar o que aprendeu. Envolve a repetição de seqüências já estabelecidas de ações e manipulações, não com pro- pósitos práticos ou instrumentais, mas por mero prazer derivado da mestria de atividades motoras. Segundo o autor, verifi ca-se o jogo do exercício, primeiramente pela exploração da nova situação de pertencer ao mundo, estimulada pelas sensações de- correntes dessa exploração. Mais tarde, quando co- meça a locomover-se, essa exploração torna-se mais elaborada e a criança inicia a fase da imitação de todas as ações que observa do adulto. Piaget explicou com a sua teoria, que a imitação representa, para a crian- ça, um passo para o desenvolvimento da inteligência simbólica, que trataremos mais adiante. Para o autor, a imitação não é um ato mecânico, pois a criança jamais vai copiar a atividade adulta tal como esta acontece, mas sim representá-la ao seu modo, de acordo com as possibilidades que a sua atividade inteligente lhe per- mitir. Piaget complementa que, nessa fase de sua vida, a criança ainda não possui condições cognitivas para atuar socialmente, visto que as regras sociais são cons- truções simbólicas, signifi cadas por um determinado grupo social. Por esse motivo, tem difi culdades de par- tilhar a brincadeira com outra criança e, na maioria das vezes, mesmo estando em grupinhos, vamos observar cada criança com seu brinquedo, brincando sozinha. Entre 2 e 6 anos, o surgimento da linguagem repre- senta um marco no desenvolvimento da atividade in- fantil, pois a linguagem permite à criança operar com a simbologia. Tem início, nessa fase, o jogo simbólico, em que a criança se utiliza de símbolos para representarobjetos ausentes – uma comparação entre um elemento dado e um elemento imaginado. Entram aí as primeiras dramatizações, e o uso de objetos para representar ou- tros, por exemplo: um sapato que vira um automóvel. A função do jogo simbólico consiste em assimilar a re- alidade. É através do faz-de-conta que a criança realiza sonhos e fantasias, revela confl itos interiores, medos e angústias, aliviando tensões e frustrações. O jogo sim- bólico é também um meio de auto-expressão: ao repro- duzir os diferentes papéis (de pai, mãe, professor, do amiguinho etc.), a criança representa situações da vida real. Nele, aquele que brinca dá novos signifi cados aos objetos, às pessoas, às ações, aos fatos, inspirando-se em semelhanças mais ou menos fi éis às representadas. Dentro dessa categoria destacam-se os jogos de faz-de- conta, de papéis e de representação. A última categoria é a do jogo de regras. Nesse caso, a introdução de regras implica necessariamente em relações sociais ou interindividuais. Por volta dos sete anos, para Piaget, a criança deixa o jogo egocêntrico, substituindo-o por uma atividade mais socializada onde as regras têm uma aplicação efetiva na qual as relações de cooperação entre os jogadores são fun- damentais. No adulto, o jogo de regras subsiste e se desenvolve durante toda a vida por ser a “atividade lúdica do ser socializado”. Lev Vygotsky Do ponto de vista psicológico, Vygotsky atribui ao brinquedo um papel importante, aquele de preencher 24 uma atividade básica da criança, ou seja, ele é um motivo para a ação. Considerado um teórico sociointeracionista, seus estudos se voltaram para a questão da linguagem no desenvolvimento do pensamento humano. Com isso, Vygotsky criou conceitos fundamentais na ação edu- cativa com crianças, como o conceito da mediação. No caso da escola, esta mediação é feita pelo educa- dor, em relação à criança e sua aprendizagem. O ponto central de sua teoria é o conceito de a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), em que consi- dera haver um desenvolvimento real, no qual é pos- sível a criança realizar atividades de forma indepen- dente, sem a ajuda do adulto, e um desenvolvimento potencial (proximal) que lhe permite realizar tarefas com ajuda de outras pessoas mais experientes. O que estamos aqui denominando ajuda é, para Vygotsky, a tarefa da mediação. Com relação à ZDP, podemos en- tender como o espaço entre aquisições consolidadas e aquisições que estão no momento de consolidação. Vamos ilustrar esse conceito com a situação abaixo. Uma criança de quatro anos senta-se com a mãe para brincar de vestir a bonequinha: (mãe) Olha, a camisinha é igual a sua, tem botões. Vamos colocar o botão na casinha... (a criança faz na blusa da boneca). Agora faça na sua blusa, coloque o botão dentro da casinha (a criança faz na sua blusa). Então, agora vocês duas estão com a camisinha abotoada. Há uma infi nidade de brinquedos estruturados para ensinar as crianças a realizar tarefas sozinhas, porém, como vimos acima, a presença da mãe foi fundamen- tal para que a criança conseguisse realizar a tarefa. De nada adiantaria dar o brinquedo à criança e achar que somente na exploração, ela conseguiria aprender a abotoar a camisa da boneca. Na mediação, o papel do adulto se dá através da ajuda deste na atividade, para que a criança possa sentir-se segura em demonstrar o que já consegue fazer realizando junto com o adulto e, mais adiante, experimentando sozinha. Isto quer di- zer que ao se propor uma atividade para a criança que ainda não seja de seu domínio, estaremos estimulan- do a zona de desenvolvimento proximal, com relação a uma nova habilidade. Para Vygotsky, a brincadeira possui três caracterís- ticas: a imaginação, a imitação e a regra que estão presentes em todos os tipos de brincadeiras infantis, assim como está também presente no desenho, quan- do esse é realizado como atividade lúdica. Todos conhecemos o grande papel que nos jogos da criança desempenha a imitação, com muita freqüência estes jogos são apenas um eco do que as crianças viram e escutaram aos adul- tos, não obstante estes elementos da sua experiência anterior nunca se reproduzem no jogo de forma absolutamente igual e como acontecem na realidade. O jogo da criança não é uma recordação simples do vivido, mas sim a transformação cria- dora das impressões para a formação de uma nova realidade que responda às exigências e inclinações da própria criança (VYGOTSKY, 1999: 12). Regra e situação imaginária são elementos funda- mentais no jogo para este autor. Além disso, a capa- cidade criadora, fruto do exercício da imaginação, também cria situações favoráveis à aprendizagem. Vygotsky estabeleceu uma relação estreita entre o jogo e a aprendizagem. Para ele, o que conta no jogo não é o caráter de espontaneidade, mas sim o exercí- cio no plano da imaginação, a capacidade de planejar, imaginar situações, representar situações do cotidia- no, conviver com regras e com o caráter social das situações criadas pelas crianças. Porém, para Vygotsky nem todos os jogos podem atuar com tanta qualidade sobre a zona de desenvolvi- mento proximal como o jogo simbólico, porque este une os dois elementos muito importantes na constitui- ção do pensamento: regra e imaginação. No jogo sim- bólico, a criança experimenta atitudes, atribui valores e signifi cados às situações vividas por adultos, e, atu- ando desta forma, cria uma zona de desenvolvimento proximal formada por processos elementares em de- senvolvimento. Nesse sentido, a brincadeira fornece possibilidades para mudanças de atitude, criando ou- tra consciência em relação à realidade. Por valorizar a mediação, Vygotsky propõe que haja intervenções nas brincadeiras, ajudando as crianças a brincarem, brincando com elas e oferecendo no- vas possibilidades de brincadeiras. Estamos enten- dendo, agora, o porquê concluímos que no caso da brincadeira com o Lego ilustrada anteriormente, não houve mediação? Segundo o autor, o lúdico tem grande infl uência no desenvolvimento da criança. É através do jogo que a criança aprende a agir, sua curiosidade é estimula- da, adquire iniciativa e autoconfi ança, proporciona o desenvolvimento da linguagem, do pensamento e da concentração. W.D. Winnicott Para entendermos um pouco melhor o pensamento deste autor em relação à importância dos jogos, precisa- mos conhecer alguns conceitos básicos de seus estudos. O psicanalista inglês W. D. Winnicott dedicou seus trabalhos ao estudo do desenvolvimento emocional, partindo do vínculo entre mãe e fi lho. 25 Na esfera educacional, deu sua contribuição ao ela- borar teorias a respeito do brincar e da criatividade. Conceituou criatividade como a força motriz do ser humano, como postura de vida e expressão genuína do pensamento humano. É ver tudo com “novos olhos”, e é conceito-chave para sua teoria do desenvolvimento. Para que o ser humano possa desenvolver todo o seu po- tencial criativo, certas condições de caráter afetivo são indispensáveis desde os primeiros momentos de vida. No sentido de melhor explicar os processos criativos na criança, Winnicott nos fala sobre objeto transacional como um processo mental subjacente à criatividade. Vemos o bebê sugar os dedos ou a adotar uma técnica de brincar com o rosto ou a murmurar um som ou a pegar um pedaço de pano e sabemos que ele está reivindicando um controle mágico sobre o mundo destas maneiras, prolongando (se o permitimos) a onipotên- cia que foi atendida e, assim, implementada pela adaptação da mãe (...) Existe um estado temporário pertencente à primeira infância em que se permite ao bebê reivindicar um controle mágico sobre a realidade externa (WINNICOTT apud AUTER, Nilce da Silva. Winnicott e Vygotsky: um diálogo possível por meio da “criativida-de” sobre o “jogo” na construção dos saberes individuais.)4 Simplifi cando um pouco: para o autor, na medida em que o bebê percebe que ele e a mãe (seio materno) são seres separados por um espaço físico, faz inúmeras ten- tativas para preencher este vazio e diminuir sua angústia. Cria então, um substituto, enquanto a mãe não vem, que pode ser uma chupeta, uma mamadeira, um paninho etc. Estes objetos que minimizam a angústia do bebê foram chamados por Winnicott de objetos transacio- nais e representam uma solução que a criança encon- tra para resolver o problema que lhe é causado pela separação momentânea da mãe. O uso de objetos tran- sacionais é, para Winnicott, uma solução criativa. O desenvolvimento intelectual, cognitivo e social depende essencialmente da relação da criança com o objeto transacional, que é o ponto inicial do bom de- senvolvimento emocional do indivíduo. O brincar contribui para o crescimento e a saúde, conduzindo a criança aos relacionamentos grupais, e, na psicoterapia, pode ser considerada uma boa forma de comunicação. O autor interpreta o ato de brincar como uma liqui- dação de confl itos e como forma de comunicação, e alerta para o fato de que, se a criança não brinca, é necessária uma investigação de possíveis patologias. “O brincar é essencial, porque é através dele que se manifesta a criatividade” (WINNICOTT, 1975: 80). Para Winnicott, a brincadeira traz a oportunida- de para o exercício da simbolização e é também uma característica humana. A brincadeira é uni- versal e própria da saúde: facilita o crescimento e, portanto, a saúde. O brincar conduz aos relaciona- mentos grupais, podendo ser também uma forma de comunicação na psicoterapia. Leituras Complementares Consulte o site www.labrinjo.ufc.br/artigos. Consulte o livro O brincar e as teorias de Tizuko Morchida Kishimoto. Foi pioneira na Educação. 4 Disponível em: http://www.projetoacolhendo.org. 1.61.6 - O Jogo e a Educação Diversifi cadas são as concepções sobre o lugar e a importância da brincadeira na prática pedagógica. Fontana e Cruz (1997) dizem que há pelo menos três concepções que podem assim ser sintetizadas: a) a brincadeira é pura diversão e, portanto, só deve acontecer na hora do recreio. b) brincadeira não é “tarefa séria”. Embora haja ne- cessidade de a criança brincar e do tempo para essa atividade variar de acordo com a idade e a programa- ção pedagógica é necessário separar a brincadeira das outras “tarefas que são sérias”. c) “brincando a criança aprende”. Nessa perspecti- va os métodos educacionais valorizam a brincadeira que, na educação infantil, passa a ser a condutora do trabalho pedagógico. Nessa última perspectiva, Friedmann (2006: 37) introduz o capítulo II do seu livro O brincar no co- tidiano da criança com a seguinte pergunta: “E se a escola fosse o lugar da criança brincar para crescer e aprender?”. Propõe então um instrumento meto- dológico para que os professores possam conhecer a realidade lúdica das crianças que, sem dúvida, pode contribuir para a prática pedagógica daqueles que com objetivos claramente defi nidos optem por traba- 26 lhar com atividades lúdicas dirigidas na sua ação com as crianças pequenas. A autora acima citada coloca que é através da obser- vação da atividade lúdica das crianças em brincadei- ras espontâneas que o professor poderá diagnosticar o estágio de desenvolvimento em que se encontram, quais são seus interesses e necessidades, conhecer quais são seus valores, idéias, seus confl itos e pro- blemas e também quais habilidades demonstram cada uma das crianças envolvidas na brincadeira. No seu instrumento sinaliza que essa observação precisa ser registrada e analisada de forma que o pro- fessor ganhe subsídios para lançar às crianças outros desafi os, só que agora através de atividades por ele propostas. Essas atividades dirigidas devem estimu- lar o desenvolvimento afetivo, cognitivo, social, fí- sico-motor, lingüístico, moral, espiritual ou de outras aprendizagens específi cas que sejam necessárias ao avanço de cada criança e/ou do grupo. A análise do registro feita pelo professor e a sua propos- ta de desafi os deve ser socializada com seus pares e com a coordenação, buscando assim outros olhares e experiên- cias que possam vir a contribuir para a sua ação/refl exão. Ao propor as situações lúdicas que são desafi os para estimular certos tipos de aprendizagem o professor pode lançar mão de diferentes jogos e brincadeiras que devem fazer parte de seu próprio repertório lú- dico. Listamos abaixo alguns. Conhecê-los é funda- mental dentro dessa proposta de trabalho: • jogos de perseguir, procurar e pegar. Exemplos: lenço-atrás (corre-cutia), barra-manteiga, alerta etc.; • jogos de correr e pular. Exemplos: corrida de obs- táculos, pular corda (ABC, aumenta-aumenta); • jogos de agilidade, destreza e força. Exemplos: dança das cadeiras, estátua, macaco Simão (mestre manda); • jogos de força. Exemplo: cabo de guerra; • brincadeiras de roda; • canções, jogos de bater palmas, parlendas, rimas, trava-línguas; • jogos de cócegas. Exemplo: dedo-mindinho; • jogos de adivinhar e pegas. Exemplos: passar anel, forca, vaca amarela; • jogos de representação (mímica); • jogos de faz-de-conta; • jogos com brinquedos construídos. Exemplos: pa- pagaio (pipa, pandorga, raia etc.), perna de pau; • jogos de salão. Exemplo: terra-ar-mar; • jogos de amor. Exemplo: beijo, abraço, aperto de mão; • jogos de mesa. Exemplo: bingo. Colocamos abaixo o esquema que sintetiza as prin- cipais características do instrumento metodológico de análise da atividade lúdica: DEFINIÇÃO DOS OBJETIVOS DA ATIVIDADE LÚDICA A. DIAGNOSTICAR • estágio de desenvolvimento; • idéias, valores, interesses e necessidades do grupo; • comportamento das crianças; • habilidades individuais; • confl itos, problemas. A partir da observação: • registrar o brincar espontâneo; • analisar a atividade desenvolvida; • elaborar um arquivo de atividades lúdicas. B. PROPOR DESAFIOS A partir da escolha de atividades dirigidas, estimular: • desenvolvimento cognitivo, afetivo, social, físico-motor, lingüístico, moral, espiritual; • aprendizagens específi cas. C. TROCAR EXPERIÊNCIAS E OBSERVAÇÕES Troca de experiências e observações entre os professores e com a coordenação, ampliando o olhar. Fonte: FRIEDMANN, Adriana. O brincar no cotidiano da criança. São Paulo: Moderna, 2006: 43. 27 1.71.7 - O Jogo e seus Valores Interdisciplinares Depois de termos discutido o jogo em diversos fo- cos, este é o momento de discutirmos um outro as- pecto, muito importante no contexto educacional: a interdisciplinaridade. Este tema vem sendo alvo de inúmeras discussões e gerado diferentes concepções, mas para efeito de orga- nização de pensamento, utilizaremos a seguinte citação: A necessidade de romper com a tendência fragmentadora e desarticulada do processo do conhecimento, justifi ca-se pela compreensão da importância da interação e transformação re- cíprocas entre as diferentes áreas do saber. Essa compreensão crítica colabora para a superação da divisão do pensamento e do conhecimento, que vem colocando a pesquisa e o ensino como processo reprodutor de um saber parcelado que consequente- mente muito tem refl etido na profi ssionalização, nas relações de trabalho, no fortalecimento da predominância reprodutivista e na desvinculação do conhecimento do projeto global de socie- dade (SIQUEIRA & PEREIRA, 1995).5 A interdisciplinaridade tem sido discutida como uma possibilidade para aproximar o conhecimento escolar da realidade cotidiana dos educandos. Os defensores da interdisciplinaridade ressaltam a necessidade dos educadores compreenderem que a atividade humana, em qualquer contexto, não acontece organizada emáreas de conhecimento; trocando em miúdos, não pre- cisamos ser sabedores dos conhecimentos da Química, enquanto ciência, para fazer uma gelatina ou entrar numa farmácia e comprar remédios. Entretanto, discu- timos sobre o signifi cado que os conhecimentos adqui- ridos nas diversas atividades que os sujeitos realizam no seu dia-a-dia têm para que o saber formal, na escola, faça sentido em sua aprendizagem. Vygotsky estabele- ceu em seus estudos uma relação entre os conhecimen- tos adquiridos pelos sujeitos nas práticas da vida, que denominou de conhecimentos cotidianos (alguns au- tores denominam de empíricos) e aqueles construídos através da instrução formal, e que tem na escola seu lugar de excelência (conhecimentos científi cos). Para o teórico, os saberes cotidianos conferem signifi cado ao saber formal. É como se pudessem ilustrar e exem- plifi car o conteúdo trabalhado na escola. Já o conheci- mento científi co possibilita uma elaboração por parte do sujeito que passa a compreender outras dimensões acerca daquelas coisas, que só foram possíveis de se- rem compreendidas no âmbito da experiência. É nesse sentido que queremos discutir o caráter in- terdisciplinar do jogo. Enquanto opção metodológica, o jogo representa uma possibilidade para o trabalho interdisciplinar, pois envolve a criatividade, as dife- rentes leituras do mundo, aumenta a capacidade de decisão, o trabalho com a corporeidade, permitindo que os saberes sejam vivenciados integralmente, sem a fragmentação histórica que existe na escola. Com isso, ao valorizar o jogo como fazer pedagógico, a es- cola estará proporcionando a ampliação do repertório cultural do aluno, numa perspectiva criadora, e, acima de tudo, consciente, sabedora de todos os ganhos que esta atividade dará à construção do conhecimento. No jogo estão presentes troca, cooperação, diálogo, respeito às regras, que não são constructos específi - cos desta ou daquela disciplina, mas percorrem toda a atividade humana. Ivani Fazenda, em seu livro Interdisciplinaridade, diz: a metodologia interdisciplinar parte de uma liberdade científi - ca, alicerça-se no diálogo e na colaboração, funda-se no desejo de inovar, de criar, de ir além e exercita-se na arte de pesquisa – não objetivando apenas uma valorização técnico-produtiva ou material, mas, sobretudo, possibilitando uma ascese huma- na, na qual se desenvolva a capacidade criativa de transformar a concreta realidade mundana e histórica numa aquisição maior de educação em seu sentido lato, humanizante e liberador do próprio sentido de ser-no-mundo (FAZENDA, 2002: 70). Ao falar na metodologia interdisciplinar, a autora ci- tou aspectos que estão presentes no jogo, reforçando sua relação. Vamos pensar em uma situação concreta: Na hora do recreio em uma escola, uma cena corri- queira acontece: crianças jogam queimado. Dois times separados por uma linha desenhada no chão, jogam a bola no sentido oposto ao seu time, objetivando que o colega não consiga segurá-la e a deixe cair, ou que bata em alguma parte do seu corpo. É uma brinca- deira comum. Entretanto, vamos analisá-la pensando sobre os conhecimentos envolvidos: cooperação, res- peito às regras, escolha do adversário mais possível de acertar, medir a força da bola, a posição da qual se deverá jogar a bola, calcular quantos jogadores será necessário acertar, pensar em que lugares do corpo a bola poderá bater e causar ou não algum dano físico, elaborar estratégias de fuga da bola, pensar em como ajudar aquele colega que foi “queimado”. Tantas aprendizagens e de tantas áreas diferentes! Enquanto professores falamos muito mais do desenvolvimento cognitivo, social, psicológico e afetivo. Quando falamos sobre o jogo, nem sem- pre o desenvolvimento moral fica explicitado. É bom ressaltar que a criança constrói normalmente seu próprio sistema de valores com base em sua necessidade de confiança nas outras. Esse proces- so é uma verdadeira construção interior. Por meio 5 Disponível em: http://www.angelfi re.com/sk/holgonsi/interdiscip3.html. Este texto faz parte de um trabalho maior publicado em forma de “Caderno de Pesquisa” (n.o 68 - Setembro de 1995) pelo programa de pós-graduação em Educação da UFSM, sob o título: Uma nova perspectiva sob a ótica da interdisciplinaridade. 28 da construção autônoma, forma-se uma boa con- cepção de si, um ego íntegro e uma mente saudá- vel. Tanto o conhecimento quanto o senso moral são elaborados pela criança em interação com o meio físico e social, passando por um processo de desenvolvimento. Num contexto em que a relação criança-criança e criança-adulto é marcada pelo respeito mútuo, pelo afeto e pela confi ança, também a autonomia tem espaço para se desenvolver, quer do ponto de vista intelectual, quer do socioafetivo: a descentraliza- ção e a cooperação são essenciais para o equilíbrio afetivo da criança e desse equilíbrio depende seu desenvolvimento geral. O processo pelo qual o jogo acontece no espaço escolar permite uma participação interessante entre educandos e educadores, numa relação de mediação e aprendizagens constante. É possível admitir que a escola ainda não descobriu o jogo como uma atividade interdisciplinar, que pode abrir um leque de possibilidades no desenvolvimento integral da criança de forma lúdica, estimulando com- petências e habilidades diversifi cadas. Exercícios de Auto-avaliação 1) Leia o trecho abaixo, retirado do texto Gaiolas e Asas, de Rubens Alves, disponível no site do próprio autor: wwwrubemalves.com.br. “O sujeito da educação é o corpo porque é nele que está a vida. É o corpo que quer aprender para poder viver. É ele que dá as ordens. A inteligência é um instrumento do corpo cuja função é ajudá-lo a viver. Nietzsche dizia que ela, a inteligência, era ‘ferramenta’ e ‘brinquedo’ do corpo. Nisso se resume o programa educacional do corpo: aprender ‘ferramentas’, aprender ‘brinquedos’. ‘Ferramentas’ são conhecimentos que nos permitem resolver os problemas vitais do dia a dia. ‘Brinquedos’ são todas aquelas coisas que, não tendo nenhuma utili- dade como ferramentas, dão prazer e alegria à alma. No momento em que escrevo estou ouvindo o coral da 9ª sinfonia. Não é ferramenta. Não serve para nada. Mas enche a minha alma de felicidade. Nessas duas palavras, ferramentas e brinquedos, está o resumo. Ferramentas e brinquedos não são gaiolas. São asas. Ferramentas me permitem voar pelos caminhos do mundo. Brinquedos me permitem voar pelos caminhos da alma. Quem está aprendendo ferramentas e brinquedos está aprendendo liberdade, não fi ca violento. Fica alegre, vendo as asas crescer... Assim todo professor, ao ensinar, teria que perguntar: ‘Isso que vou ensinar, é ferramenta? É brinquedo?’ Se não for é melhor deixar de lado.” Faça um comentário relacionando as palavras do autor com o que discutimos no item 1.2 – Educação Lúdica. 2) Faça um quadro comparativo com o pensamento dos três últimos teóricos. Verifi que semelhanças e dife- renças entre eles. Registre no seu material de estudo. 3) Pense em um jogo infantil. A partir dele, liste os conhecimentos interdisciplinares que você percebe. Re- gistre no seu material de estudo. 29UNIDADE II A RECREAÇÃO NO CONTEXTO EDUCACIONALA RECREAÇÃO NO CONTEXTO EDUCACIONAL 2.12.1 - O Papel do Brincar no Desenvolvimento Infantil: como a Escola Percebe tal Relação? Estamos propondo, nesta Unidade, rever algumas questões acerca do jogo, seu surgimento na história da humanidade, para que possamos trazê-lo enquanto possibilidade concreta no desenvolvimento de crian- ças, na Educação Infantil. Comecemos, retomando a Unidade I, com as contri- buições de Huizinga para o desenvolvimento de uma teoria do jogo na atividade humana ao longo da his- tória. Os estudos antropológicos de Johann Huizingasão considerados referência teórica nas concepções de jogo e ludicidade. Em sua obra Homo Ludens6, consi- derada um clássico nesses estudos, Huizinga afi rma ser o jogo a base para o surgimento da cultura. Segundo o pesquisador, para que se tenha cultura “é necessária a existência de uma sociedade com formas de organiza- ção mais elaboradas do que as formas de relaciona- mento do homem primitivo com outros homens, com a natureza e com os animais” (HUIZINGA, 1999: 3). Em seus estudos, Huizinga coloca que o homem primitivo já disputava o alimento e o espaço com os outros animais, assim como convivia numa espécie de partilha que, na sua concepção, esta forma de rela- cionamento foi defi nida, embora de maneira bastante rudimentar, como jogo. A partir desses pressupostos, podemos considerar que, para Huizinga e muitos es- tudiosos do assunto, jogo e cultura, na sua essência, são coisas distintas, embora, atualmente, as teorias que fundamentam as concepções sobre o jogo afi rmam que não há como pensá-lo distanciado do contexto cultural em que acontece nas sociedades e, além do mais, há uma diversidade de contextos que vão conferir sentidos distintos à palavra jogo. Observe as situações abaixo: “Vamos jogar dominó?” “Você está fazendo um jogo sujo!” “Ainda há vagas na ofi cina de jogos teatrais.” “Jogos cantados fazem parte do acervo popular.” Jogo-instrumento, jogo-comportamento, jogo-ativi- dade ou jogo-brincadeira, em todas as situações de- nominamos jogo, mas cada uma delas, e em tantas outras, o jogo vai possuir uma especifi cidade. Pode estar em questão a imaginação, como no caso do faz- de-conta; as regras podem ser a condição para que o jogo aconteça, como no caso do jogo de bola-de-gude; o movimento e a linguagem podem ser os meios pelos quais o jogo se defi ne, como no caso dos jogos canta- dos, ou a estratégia que o sujeito lança mão para chegar ao seu objetivo, como no caso dos jogos pessoais, vão conferir um caráter específi co a cada uma das defi nições que o jogo pode assumir numa determinada cultura. Ve- jamos o que nos diz Kishimoto sobre essa questão: Assumir que cada contexto cria sua concepção de jogo não pode ser visto de modo simplista, como mera ação de nomear. Empregar um termo não é um ato solitário. Subentende todo um grupo social que o compreende, fala e pensa da mesma forma. Considerar que o jogo tem um sentido dentro de um contexto signifi ca a emissão de uma hipótese, a aplicação de uma experiência ou de uma categoria fornecida pela sociedade, veiculada pela língua enquanto instru- mento de cultura dessa sociedade (KISHIMOTO, 2005: 16). m Podemos entender com isso que cada idéia que se faz do jogo numa sociedade está implicitamente liga- da às formas pelas quais essa sociedade relaciona o jogo na sua cultura. Retomando Huizinga, o fato de o jogo, nos povos primitivos, apresentar uma natureza biológica, observada, inclusive, em animais, é possí- vel considerar que sempre houve um sentido para que o jogo acontecesse que “transcendia a sua dimensão biológica” (HUIZINGA, op. cit., 3). Kishimoto, em suas pesquisas sobre a importância do jogo no desenvolvimento de crianças, coloca que pesquisadores franceses organizaram um conjunto de idéias que pudessem melhor explicar as tantas defi - nições que o jogo assume nos variados contextos em que acontece:” pode ser visto como o resultado de um sistema lingüístico que funciona dentro de um contex- to social, como um sistema de regras ou implícito em um objeto” (KISHIMOTO, op. cit., 16). No primeiro caso, a linguagem se torna o meio pelo qual o jogo vai se constituir e ganhar sentido para os participantes. Seja através de uma música, do próprio movimento ou das expressões corporais, mediados ou não por objetos, esta forma do jogo se caracteriza pe- las representações que os sujeitos fazem dos seus de- sejos e experiências cotidianas (KISHIMOTO, 2005). Com relação ao sistema de regras, segundo a autora, a regra torna-se a especifi cidade do jogo. Há casos em que o tempo, o espaço e o contexto cultural podem 6 Huizinga, Johann. Homo Ludens. Perspectiva: São Paulo, 1999. 30 provocar variações nas regras do jogo, como “As Três Marias” (um joguinho com três pedrinhas ou, tempos distantes, três saquinhos de areia), ou os piques, que vão atravessando gerações e ganhando variações para acompanhar a realidade na qual acontecem (já ouviu falar no pique-lateiro?); em outros casos, o jogo pode atravessar os tempos na história de uma sociedade, pode até mesmo circular pelo mundo, mas mantém-se fi el em suas regras, como no caso do futebol e tantos outros que conhecemos. Nesse sentido, a regra torna- se o elemento-chave na signifi cação e na identifi cação do jogo, em qualquer cultura em que ele aconteça. No jogo-objeto, terceiro item do conjunto organizado pe- los estudiosos franceses, assim como no sistema de re- gras, o objeto é o instrumento pelo qual o jogo se cons- titui e passa a ser identifi cado nos diversos contextos sociais. O xadrez é um exemplo desta forma de jogo, assim como o dominó, citado anteriormente. Segundo Kishimoto, o sentido do jogo está no próprio objeto e é este que vai defi nir e proporcionar interação entre os participantes; materializando o jogo (IBIDEM: 17). É importante trazer essa discussão para que nós, edu- cadores da infância, possamos incluir o jogo no nosso contexto de trabalho como um provocador de aprendi- zagens desafi adoras e signifi cativas para as crianças. Além disso, é fundamental ressaltar o jogo como um meio pelo qual crianças pequenas vão aprendendo que há outras formas de organização diferentes daquelas que estão acostumadas a lidar no ambiente familiar. Em outras palavras, o jogo torna-se um aliado do adulto na construção da regra como organizadora e mediadora das relações sociais entre as crianças e os diferentes ambientes em que convivem e atuam. Uma grande parte dos educadores associa o jogo a di- vertimento, a passatempo, à distração, desconsiderando a infi nidade de possibilidades que esta atividade pode proporcionar na sua prática pedagógica. Mas, se analisar- mos as diversas nuanças do jogo na sociedade, podemos encontrar esta atividade relacionada também à compe- tição, ao trabalho, à guerra, enfi m, a situações em que são necessárias a concentração, a seriedade e escolhas, tornando o jogo uma atividade “séria”. Partindo dessa premissa, vamos pensar o jogo como fundamental no de- senvolvimento físico, social e cognitivo das crianças. Especialmente na escola infantil, a necessidade que o adulto-educador tem de direcionar a atividade da crian- ça em função de torná-la fonte de aprendizagem não permite, muitas vezes, que ela manifeste livremente expressões (e impressões) sobre si mesma, sobre o que lhe parece familiar e sobre as novas situações que desa- fi am a pensar sobre o mundo que a cerca. Muitas vezes a ação do adulto cria uma situação que a atividade da criança acaba se tornando artifi cial e não signifi cativa, como deveria ser para que possibilitasse aprendizagem. O jogo é um grande aliado no trabalho dos educadores, entretanto, para tornar-se um aliado no processo edu- cacional, o jogo deve proporcionar o desafi o, criando situações interessantes para que as crianças possam re- solvê-las individual ou coletivamente. Observe a situação abaixo: Uma criança de dois anos lança mão de várias es- tratégias para transpor alguns objetos de uma mesa para uma cadeira. Os objetos caem pelo caminho, ela tenta pegá-los, vê que não consegue trazê-los de uma só vez e vai fazendo várias tentativas: ora pega um por um, ora joga tudo no chão para pegá-los todos ao mesmo tempo, e, nessas tentativas, acaba conseguin- do sua meta que era trazer todos os objetos para a cadeira. Feito isso, começa tudo outra vez, tentando
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