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biologia de liquens

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Eugênia C. Pereira 
Depto. de Ciências Geográficas 
Centro de Filosofia e Ciências Humanas 
Universidade Federal de Pernambuco 
 
2
Considerações gerais sobre os líquens 
O líquen, ser de difícil posicionamento no reino dos seres vivos, é conhecido 
desde a antiguidade, quando se reporta ter sido encontrado em um vaso de 18a. dinastia 
egípcia (1700 a 1600 A. C.), um fragmento de líquen identificado como Evenia 
furfuracea, espécie que não ocorre naquela região (Abrahan e Florey, 1949), ou mesmo 
o Manah dos desertos citado na Bíblia, que se supõe ser a Aspicilia esculenta, líquen 
comum nas dunas dos desertos e utilizados por habitantes da área, sob forma de farinha 
para pão e bolo (Llano, 1957). 
Dioscorides, cirurgião grego do exército de Nero, aplicou o termo Líquens 
verdadeiros por semelhança desses seres às doenças de pele, para as quais eram 
indicados como remédio, visto que as plantas medicinais eram prescritas pelos médicos 
baseados na doutrina dos sinais , sendo utilizadas de acordo com a semelhança que 
elas tivessem com determinadas enfermidades, ou com órgãos afetados. Por exemplo, os 
longos filamentos de Usnea barbata eram indicados para fortalecer os cabelos; a 
Lobaria pulmonaria, por sua superfície reticulada, era designada para problemas 
pulmonares; a Xanthoria parietina, por sua cor amarela, curava icterícia, e, Peltigera 
aphthosa, cujo talo dotado de verrugas, era recomendada para crianças com erupções na 
boca (afta, estomatite) (Abrahan & Florey, 1949). 
O enfoque botânico, tentando evidenciar estruturas e as partes simbiontes foi 
iniciado por Tournefort que reporta o líquen em 1694-98, porém não os distingue dos 
musgos. Michele em 1729, já utilizava o termo leichen , que deriva do grego e 
significa planta rasteira ou lambechão, mas descreve seus apotécios como receptáculos 
florais. Em 1868, Schwendener o aceita como entidade vegetal, e, em 1890 Beijerinke 
admite a dualidade alga/fungo, afirmando existir parasitismo do fungo sobre a alga. 
Atualmente é aceita a teoria da simbiose estabelecida por Reinke, onde ambas as partes 
são favorecidas, mesmo com a aceitação da perfeita simbiose entre o micobionte e o 
fotobionte, ou seja, o fungo e a alga simbiontes do líquen. Não obstante, ainda não se 
chegou a um consenso em relação à definição exata do que seja um líquen. 
Durante a Reunião Geral da International Association for Lichenology (IAL), 
em 1981 na Austrália, foram lançadas proposições enviadas à revista Newsletter (vol. 
14 (1) : 11) de definições formais para o líquen, entre as quais foram selecionadas as 
cinco melhores, a citar: 
 
3
Um Líquen é uma associação de um fungo e um simbionte fotossintético, resultando 
em talos estáveis de ultraestrutura específica. (Proposto pelo Comitée de 
Terminologia da IAL). 
Líquen é uma associação estável alga/fungo que resulta em talos estáveis e 
usualmente difere significativamente dos simbiontes que estejam em estado de vida 
livre (ex: não liquenizado). Casos excepcionais de associação alga/fungo formando 
talos rudimentares ou mal definidos são considerados líquens, se o micobionte 
parece a outros relatos formadores do TAXA líquen (I. M. Brodo, National Nuseun, 
Canadá). 
Líquen é uma associação estável de fungo e alga (D. L. Harksworth, 
Commonwealth Agricultural Bureaus). 
Um líquen é uma associação de fungo e uma alga, ou cianobactéria, ou ambas, 
resultando em uma estrutura estável (A. L. Huber e D. K. Kidbey, Deptº of Soil 
Science and Plant Nutrition University of Western Australia). 
Líquen é um fungo especializado dominando uma associação simbiótica estável com 
uma alga, na qual, os dois simbiontes formam um único talo com estrutura peculiar 
(W. Tiang-Chun, Institute of Mycrobiology, Peking). 
Das definições propostas um ponto em comum entre elas é evidente: de que o líquen 
é uma associação estável alga/fungo. 
HARKSWORTH (1987) define o líquen como uma associação entre um fungo e 
uma ou mais espécies de algas para formar um talo no qual o fungo é o exohabitante. 
Mesmo sendo a união de dois seres distintos, um clorofilado (o fotobionte) e outro 
aclorofilado (o micobionte), sua definição taxonômica se dá levando em consideração o 
fungo liquênico, obedecendo ao Código Internacional de Nomenclatura Botânica. 
Situar um ser em determinado grupo é tarefa que, além de difícil torna-se um tanto 
quanto individual, visto que cada pesquisador tem sua atenção voltada para um 
determinado caráter componente das diversas formas de vida, classificando-as segundo 
seu ângulo de observação. Como exemplo, temos seres com características que para 
botânicos são vegetais, enquanto para zoólogos são animais. 
Muitos estudiosos propuseram diversos sistemas de classificação dos seres vivos. 
Copeland, grande naturalista, em 1947 apresenta o trabalho Progress report on basic 
classification onde critica o sistema de dois reinos Plantae e Animaliae , 
evidenciando suas falhas e propondo um sistema mais diversificado. 
 
4
Em 1969 Whittaker apresenta o trabalho New concepts of Kingdoms organisms", 
um sistema baseado na evolução dos seres vivos, e ,dessa vez, classificando-os em cinco 
reinos. 
O sistema dos cinco reinos de Whittaker foi aperfeiçoado por Margulis e Schwartz 
(1982), que posicionam os seres em uma escala baseada na evolução celular. Nesse 
sistema de classificação os líquens estão situados dentro do reino Fungi, praticamente 
isolados, e, filogeneticamente acima dos fungos superiores Zygo, Asco e 
Basidiomycota. No estudo de Margulis e Schwartz (1982) o líquen é designado como 
MYCOPHYCOPHYTA, onde MYCO=fungo; PHYCO=alga e PHYTA=planta, 
conforme demonstra a figura 01. 
 
 
Figura 01 . Sistema dos cinco reinos de Margulis e Schwartz (1982), baseado na 
evolução celular. 
As algas dos liquens, os fotobiontes, são unicelulares pertencentes às divisões 
Chlorophycophyta e Cyanophycophyta. Os fungos, ou micobiontes, são determinantes 
na sua classificação. São na maioria Ascomycota e, em, menor proporção Basidio e 
Deuteromycota, formadores dos Asco, Basidio e Deuterolíquens (Xavier e Rizzini, 
1976; Alexopoulos, 1979). 
 
5
A fotobionte e o micobionte se posicionam de forma peculiar dentro do talo 
liquênico em camadas sucessivas, ou seja: o córtex superior, composto de hifas do 
fungo entrelaçadas, visando proteger a camada gonidial (das algas) que vem logo 
abaixo, protegida por outro feixe de hifas frouxas, a medula, seguida de um outro feixe 
de hifas, o córtex inferior (Figura 02). 
 
 
Figura 02. Modelo esquemático ultraestrutura do talo liquênico. (A) Fotobionte, ou 
camada gonidial; (B) Hifas medulares ou medula; (C) Hifas corticais ou córtex superior. 
A reprodução sexuada nos liquens é feita pelo asco ou basidiósporo do micobionte, 
dependendo do fungo simbionte, que germina e logo entra em contato com a alga. Esse 
ponto ainda sugere um sem número de dúvidas, pelo menos em algumas etapas do 
processo de reprodução, pois só se separam as partes simbiontes com o prejuízo de uma 
delas. 
Pesquisas realizadas por Ahmadjian (USA) demonstram resultados interessantes, 
onde em cultura especial, ele consegue unir os simbiontes chegando a primórdios de um 
líquen, ou mesmo a obter substâncias liquênicas a partir do fungo liquenizado. 
Normalmente nos liquens a reprodução se processa de forma vegetativa, 
constituindo na fragmentação do talo, que por vezes, apresenta protuberância, 
macroscopicamente semelhante a verrugas, formadas das partes alga e fungo (Xavier 
Filho e Rizzini, 1976). Essas estruturas são denominadas isídios, que ao se destacar do 
talo, são disseminadas para formação de novos talos liquênicos (Figura 03). 
 
6
 
 
Figura 03. Modelo esquemático de um isídio. 
Outraforma de reprodução assexuada é a liberação de massas de hifas envolvendo 
células de algas. São estruturas especializadas liberadas pelas (interrupções) ou 
perfurações do talo denominadas sorédios (Figura 04). 
 
 
Figura 04. Modelo esquemático de sorédios. 
Os isídios e os sorédios são geralmente disseminados por agentes dispersantes como 
água, vento e insetos (Seaward, 1977). 
O talo do líquen pode se apresentar de cores e formas variadas, a depender da 
espécie e das substâncias que ele contêm (Thomson, 1967). 
 
7
O talo foliáceo ou folhoso é semelhante a uma folha sobre o substrato, e dele se 
destaca com facilidade, enquanto o talo crustoso ou crustáceo se impregna no substrato 
como se fosse uma mancha nele, sendo impossível destacá-lo. O talo arbustivo ou 
fruticuloso apresenta, como sugere o nome, um arbusto, e, pode ser ereto, ou 
decumbente, semelhante a uma planta epífita. 
Como substrato os liquens habitam desde rochas dos mais diversos tipos, a madeira 
queimada, em decomposição, troncos vivos, folhas, solo, musgos, vidros, entre outros 
mais (Seaward, 1977; Feige & Kremer, 1979). 
Fisiologia 
A simbiose, característica marcante dos líquens, permite dois seres tão distintos, 
um clorofilado, a alga e/ou cianobactéria (fotobionte), e o outro aclorofilado, o fungo 
(micobionte), viverem harmonicamente, fornecendo mútuamente proteção e substâncias 
vitais. O contato alga/fungo facilita a transferência de nutrientes e produtos da 
fotossíntese do fotobionte para o micobionte. Este requer altos teores de açúcares 
elaborados a partir da fotossíntese da alga, para derivar biotroficamente seus 
carboidratos (Hale, 1983; Nash, 1996). 
O metabolismo primário nos líquens consiste da produção específica de um 
único carboidrato pela alga, a partir da fotossíntese, cuja transferência ao micobionte é 
rápida, e em quantidade substancial para transformação e acúmulo. Nele, o 
processamento da molécula gera manitol, transformado de um poliol produzido, cujo 
tipo depende das algas constituintes do líquen: por exemplo as do gênero Trebouxia 
geram ribitol, Hyalococcus, sorbitol e, Trentepohlia o eritritol. As cianobactérias 
produzem glicose. O fungo, por sua vez, é capaz de quebrar moléculas grandes, face à 
sua enorme capacidade enzimática. A transferência de açúcar é tão característica na 
relação alga/fungo que o efluxo rápido e massivo deste produto cessa imediatamente 
após isolamento da alga do talo liquênico (MacFarlane & Kershaw, 1984), também 
sendo comprovado que a parede celular do fotobionte é muito mais permeável para 
perda de carboidratos, quando em comparação com a da alga em estado de vida livre 
(ou não liquenizada) (Hale, 1983; Nash, 1996). 
A fixação de nitrogênio é restrita aos líquens que possuem cianobactérias como 
único fotobionte, ou mesmo quando este se encontra associado com mais duas, três, ou 
quatro outras algas. Por este processo, o fotobionte supre grandes teores de carbono 
requeridos para o acúmulo de polióis, e crescimento do micobionte. Este açúcar facilita 
 
8
a re-hidratação do talo, após longo período de ressecamento (Nash, 1996). MacFarlane 
& Kershaw (1984) referem ainda a glicose como importante componente no equilíbrio 
de carboidratos, e no processo de transferência de produtos entre alga e fungo. 
Subseqüentemente ela é convertida em manitol, dentro da hifa, que é então estocado. 
Hill (1972) sugere um segundo composto, a glucana, que é hidrolizada 
extracelularmente para formar a glicose. Visto este postulado, e a especificidade 
alga/poliol, como anteriormente referido, o conceito de transferência de carboidratos a 
partir de um único açúcar necessita ser revisto, apesar dos estudos mais avançados, 
inclusive com utilização de marcadores radioativos, que auxiliam na identificação do 
material translocado de um simbionte para o outro. 
Sobre as substâncias liquênicas 
Os liquens produzem substâncias resultantes do metabolismo secundário, 
denominadas substâncias liquênicas, antigamente designadas como ácidos liquênicos . 
Atualmente sabe-se que sua natureza é quase na totalidade fenólica e são essas 
substâncias responsáveis pela maioria dos benefícios advindos dos líquens (Xavier & 
Rizzini, 1976). 
A pesquisa sobre as substâncias liquênicas começou com os alemães Zopf (1905), 
Hesse (1898) e Fischer (1913), entre outros, mas recebeu maior atenção dos japoneses 
Asahina e Shibata (1957), que iniciaram um estudo onde desenvolveram métodos mais 
simplificados e específicos de extração. Mas tarde W. & C. Culberson (1972), bem 
como Legaz & Vicente (1983) desenvolveram técnicas cromatográficas para separação 
e identificação dessas substâncias. 
Os produtos do metabolismo primário são processados, e em metabolismo 
secundário, são produzidas as substâncias liquênicas, unicas neste taxon (Culberson, 
1970; Nash, 1996). 
Cerca de quinhentos e cinqüenta produtos naturais, inclusive trezentos e 
cinqüenta metabólitos secundários, são conhecidos nos líquens. As substâncias 
liquênicas, antes designadas como ácidos liquênicos , são na maioria compostos 
fenólicos, dentre eles os ácidos alifáticos, para e meta depsídeos, depsidonas, benzil 
ésteres, dibenzofuranos, ácidos úsnicos, xantonas, antraquinonas, terpenóides, e 
derivados do ácido pulvínico. No interior do talo, tomam forma cristalina e são extra-
celulares, depositados sobre as hifas do micobionte. Tal fato confere ao líquen sua 
capacidade de adaptação às adversidades, visto esses cristais funcionarem como 
 
9
fotorreceptores e/ou fotoindutores, selecionando o tipo de radiação que lhe é 
conveniente. São ainda, as substâncias liquênicas, as responsáveis pelas utilidades 
econômicas, e benefícios curativos advindos dos líquens, tanto para o Homem como 
para os animais (Llano, 1951; Culberson, 1970; Vicente, 1975; Seaward, 1977, Hale, 
1983; Nash, 1996). 
A produção das substâncias liquênicas se dá por três principais vias 
biossintéticas: a do acetato polimalonato, a do ácido chiquímico e a do ácido 
mevalônico. Delas são originados os grandes grupos de compostos. Na primeira são 
formados os ácidos graxos, depsídeos, depsidonas e quinonas, na segunda os pigmentos 
amarelos, na terceira os terpenóides e esteróis. São ainda relatadas as vias dos 
aminoácidos e a dos carboidratos, nesta, onde há a biossíntese dos sacarídeos e polióis. 
Por outro lado, a maioria dos metabólitos secundários têm origem biossintética via 
ácido chiquímico e acetato polimalonato, e perfazem cerca de 10% do peso do talo seco 
(Hale, 1983; Xavier-Filho,1989; Nash, 1996). 
As substâncias liquênicas têm local específico no interior do líquen para sua 
produção. Algumas são de origem medular, outras corticais. A localização pode ser 
ainda mais restrita, como apotécios, sorédios ou himênio. Isto depende sobremaneira da 
natureza do fotobionte (Hale, 1983; Nash, 1996), e provavelmente está relacionado a 
fatores de co-adapatção às peculiaridades do ambiente (Reyes et al.1994 ). 
Além dos compostos hidrófobos, são também produzidas substâncias 
hidrossolúveis como polissacarídeos líquênicos, além de inúmeros outros produtos 
também encontrados em outros organismos vivos, como animais e plantas superiores 
(Culberson, 1970). 
Relação com o ambiente 
O papel tradicionalmente atribuído aos liquens é o de formador de solos, pois 
são os pioneiros a colonizar rochas-mater. Entretanto, muito se tem a colocar em relação 
à sua função na sucessão de seres. Estes vão desenvolvendo-se à medida que os liquens 
decompõem a rocha e criam substrato orgânico, ou seja, preparam um solo 
desenvolvido o suficiente à sua instalação, pois que requerem umidade e nutrientes, a 
exemplo dos musgos, e vegetais fanerogâmicos. 
Atenção à capacidade do líquen de sobreviver às intempéries, habitando 
substratos rochosos, desde as maisáridas e frias e/ou quentes regiões do globo terrestre, 
é dada já há alguns séculos. 
 
10
 
Linnaeus (1762, apud Smith, 1921) descreve a sucessão das plantas referindo 
que liquens crustosos são os primeiros na origem da vegetação...Quando as rochas 
emergem dos mares elas são polidas pela força das ondas, onde tipo algum de planta 
pode nelas fixar-se, isto mais especialmente próximo à praia. Rapidamente, na verdade, 
minúsculos liquens crustosos começam a cobrir estas rochas áridas, e sustentados por 
minúsculas partículas de solo trazidas a eles através da chuva e pela atmosfera. Estes 
liquens, ao envelhecerem tornam-se uma camada de humus, onde novos liquens 
introduzem seus rizóides para sustentação. Neste momento vários musgos como o 
Hypnum, Bryum e Polytrichum chegam e encontram um local apropriado e alimento. 
No momento da morte desses musgos, há quantidade de solo suficiente para que 
plantas herbáceas e arbustivas estabeleçam-se e mantenham sua existência . 
Observações similares foram feitas por Goeppert (1860, apud Smith, 1921), entretanto 
com liquens típicos de telhados como a Lecanora saxicola. Considerou, ainda, como 
destruidores específicos de rocha algumas espécies foliáceas como Parmelia saxatilis, 
P. stygia e P. encausta. Espécies de Gyrophora e Sphaerophorus têm o mesmo poder 
desintegrador, mas a superfície da rocha pode perder sua coesão até a profundidade de 5 
a 10cm. Espécies crustosas como Lecanora popolytropa, Candelariella vitellina, dentre 
outras, têm poder de ação de um solvente, enquanto L. atra e Acarospora smaragdula 
tornam a rocha tão frágil que se pode parti-la com um canivete. 
A incrível capacidade de adaptação dos liquens às condições adversas, torna esses 
seres bastante versáteis. 
Sua enorme resistência é devida à proteção do córtex superior (camada de hifas), 
associada à cristalização das suas substâncias no talo tanto a nível cortical como 
medular (Vicente, 1986; Hale, 1984; Seaward, 1977), funcionando, por vezes como um 
filtro, selecionando quantidades e tipos de radiações recebidas, ou permanecendo em 
latência durante períodos onde a temperatura e a luminosidade não o permitem 
fotossintetizar (Honegger, 1986; Kershaw, 1985). 
Pela fácil adaptabilidade dos liquens a diversos substratos e ambientes, ele é 
considerado um ser cosmopolita distribuídos dos trópicos aos pólos, existindo espécies 
polares, bipolares e de ampla distribuição. Algumas espécies também designam a área 
onde ocorrem, como a Alcectoria sarmentosa de regiões montanhosas, Caloplaca 
marina e Lichina pygmae de zonas de maré ou mesmo a Orchrolechia parella e a 
Usnea antaratica encontradas no mediterrâneo e na Antárctica, respectivamente. Daí a 
 
11
possibilidade de considerar os liquens como indicadores biogeográficos (Llano, 1957; 
Feige & Kremer 1979). 
Os gêneros que possuem espécies mais cosmopolitas são Lecanora, Caloplaca, 
Lecidea, Buellia, Verrucaria e Parmelia (Seaward, 1977) . 
Por serem pioneiros na colonização de rochas-mater, degrada-as por ação química 
de suas substâncias, e mecânica por incrustação no substrato, favorecendo ao processo 
de pedogênese (Ascaso in Vicente, 1985). 
Alguns líquens saxícolas têm preferência por substratos ricos em silicatos, ferros 
ou calcário. Daí pode-se também, dizer que são indicadores de minerais, como a 
Aspicilia calcarea e a Lecidea silacea que são específicos de rochas calcáreas e 
silicosas respectivamente (Llano, 1957 e Seaward, 1977). 
Guembel (1856, apud Smith, 1921), observou a ação de Lecanora ventosa sobre 
rochas graníticas, ora pela excreção do seu CO2 que acidifica seu substrato, ora pela 
ação mecânica de suas hifas a rizinas. Complementou o autor que rochas expostas à 
ação do tempo não tinham sua superfície tão desintegrada quanto as mesmas cobertas 
por liquens. 
Salter (1856, apud Smith, 1921) foi o primeiro a concluir que o ácido oxálico é o 
principal agente de desintegração da rocha. Ele refere que a substância age em quase 
todas as classes de minerais halogênicos, ou mesmo em material composto de sílica 
como vidro pulverizado. 
Bachmann (1913, apud Smith, 1921) refere que granito pode ser reduzido por 
liquens a uma massa granular amarela semelhante à argila, em período relativamente 
curto de tempo; mas concluiu que, a distribuição do líquen sobre a rocha é direcionada 
pelo teor de umidade e pelas superfícies que lhe dê ponto de apoio. Quando testou 
rochas calcárias descobriu que as que possuíam liquens em sua superfície conseguiam 
reter e absorver mais a água, contribuindo para a instalação de vegetais de maior porte. 
Em regiões tropicais as algas gelatinosas azuis instalam-se em primeiro lugar, 
após os liquens. Três anos após a erupção do Krakatoa, Treub (1888, apud Smith, 1921) 
encontrou camadas verdes escuras dessas algas entre as pedras-pomes e cinzas 
vulcânicas, bem como nas rochas roladas pelas encostas das montanhas, considerando 
que eram da mesma época que os liquens. 
Por serem tão resistentes, e crescerem de forma muito lenta, os liquens possuem 
longevidade incomparável às outras plantas. Daí serem também usados na 
geocronologia, para determinação da idade de monumentos arqueológicos e/ou 
 
12
históricos, quando recursos de 14C não são disponíveis. Esta técnica não é, obviamente, 
a mais eficiente, entretanto possibilita uma estimativa de tempo (Llano, 1951; Feige & 
Kremer, 1979). A liquenometria se dá a partir do acompanhamento do crescimento do 
líquen por diversos anos através de fotografias sucessivas, ou medição direta do seu 
diâmetro na própria rocha (Hale, 1985; Seaward, 1977). Com esses dados é possível se 
estimar o fator de crescimento para cada espécie. Calcula-se, por exemplo, que o 
Rhizocarpon geographicum cresça de 10-25 mm a cada 100 anos (Llano, 1957; 
Seaward, 1977). Essa técnica é também aplicada para estimar a frequência de 
terremotos de uma região, datando-se as rochas roladas. 
Sabendo-se então a taxa de crescimento de determinadas espécies liquênicas, é 
possível estimar a idade de uma rocha, ou monumento histórico. A Tabela 01 
exemplifica alguns liquens e sua respectiva taxa de crescimento. 
 Tabela 01: Taxa anual de crescimento de espécies liquênicas. 
ESPÉCIE CRESCIMENTO (mm/ano) 
Cladina rangiferina 2 5 
Peltigera aphtosa 5 10 
P. canina 18 
P. rufescens 25 27 
Physcia caesia 0,8 1,1 
Parmelia saxatilis 1,7 3,2 
Lecanora muralis 1,3 
Rhizorcarpon geographicum 0,2 0,6 
 
Fonte: Feige & Kremer (1979) 
Vale ressaltar que estes dados são referentes a espécies européias, e que em 
ambientes tropicais a velocidade de desenvolvimento é diferente face às estações do ano 
não serem tão distintas, inclusive não exigindo desses seres um período de latência (por 
frio rigoroso, por exemplo). Seaward (1977) reporta que em uma rocha foi encontrado 
um espécimen de Stereocaulon com cerca de 30cm de diâmetro. Tal amostra deveria ter 
centenas de anos, e estava em excelentes condições morfológicas e fisiológicas. Apesar 
dos liquens subdividirem-se com a idade, existem registros de espécies com mais de 
1000 anos, usadas para datar morainas glaciais na Suíça. 
Relação do líquen com o substrato rochoso 
A decomposição de minerais e rochas se dá, basicamente, de duas formas: a 
biogeofísica e a biogeoquímica. Na primeira, a degradação física sugere dois 
 
13
mecanismos importantes: a) a penetração das rizinas no substrato, com o movimento de 
expansão/contração; b) em segundo lugar tem sido afirmado que o 
umedecimento/ressecamento dos liquens produzem alterações mecânicas mais 
importantes do que a decomposição química causada pelas substâncias liquênicas. A 
invasão das fendas das rochas pelas hifas dos liquens, demonstrada por diversos 
trabalhos de Ascaso, leva a supor que estes seres, neste caso, tomam nutrientes de seu 
substrato. 
Adecomposição biogeoquímica pode ser realizada a partir da produção de água 
acidificada pelo CO2 nela dissolvido, da elaboração, pelos liquens, de compostos 
bioquímicos hidrossolúveis, ou pela produção do ácido oxálico. Estes dois últimos 
processos são considerados os mais importantes. 
A habilidade dos liquens de decompor rochas se dá, essencialmente, pela 
atividade do micobionte (do fungo) de certas espécies, principalmente o Rhizorcarpon 
geographicum e espécies do gênero Umbilicaria. 
Os mecanismos de adaptação que permitem estas espécies habitar rochas nuas , 
e perpetuação em ambientes inóspitos a outras formas de vida incluem, resistência à 
secura do ar e temperatura extremas, longevidade e taxa de crescimento comensurada 
com a baixa liberação de nutrientes da rocha não intemperizada. 
Outro mecanismo de adaptação dos liquens é a penetração e digestão de suas 
substâncias. Pouca informação se tem acerca da profundidade alcançada na penetração. 
Degelius (1962, apud Seaward, 1977) reporta 19mm para Verrucaria marmorea; 
Seaward (1977) apenas 10mm para Baeomyces rufus, em uma clivagem de xisto. Syers 
(1964, apud Seaward, 1977) encontrou uma rizina liquênica a 16mm em uma rocha 
calcárea. 
Talos endolíticos ocorrem, principalmente, em liquens calcícolas. Por outro lado, 
espécies calcífugas exploram linhas de pouca resistência de granitos ou xistos onde 
crescem. 
Explicações iniciais acerca da decomposição das rochas, e outras superfícies se 
dão através de efeitos mecânicos de penetração da hifa, alternando seu estado 
intumescido quando úmida, e contráctil quando seca. 
A decomposição da rocha pelo líquen pode enfatizar a microestrutura lamelar de 
vários minerais. 
 
14
Sobre as substâncias liquênicas e quelação 
As substâncias liquênicas são, na maioria, de natureza fenólica, antigamente 
designadas como ácidos liquênicos (Culberson, 1977). Como já amplamente referido, 
estas estão envolvidas nos mecanismos de decomposição de rochas-mater, através da 
quelação. 
A quelação se trata de uma reação química onde uma substância, no caso a 
liquênica, tem a capacidade de captar íons de outra (proveniente da rocha, neste 
exemplo). Jones (1988) refere a capacidade quelante das substâncias liquênicas, que 
podem solubilizar cátions de substratos minerais, com ênfase aos ácidos estítico e 
fisódico (Fahlset, 1994), que são particularmente ativos na decomposição de rochas. Por 
outro lado, Brown & Beckett (1985) consideram proteínas localizadas na parede e 
membrana celular do micobionte, e o ácido oxálico (Wilson, 1992) como os mais 
importantes agentes de decomposição mineral (Bigarella et al., 1996). 
O estágio inicial de decomposição de minerais primários por liquens, 
essencialmente, envolve o ataque da solução ácida (da substância liquênica) em locais 
vulneráveis, nos quais os elementos constituintes da rocha são completamente 
removidos. 
Muitos liquens crustosos produzem o ácido oxálico em abundância, assim como 
uma grande variedade de substâncias fenólicas, que reagem com os minerais das rochas, 
para formar complexos (metálicos ou não). Liquens incrustados em minérios de Fe e 
Mn formam oxalatos destes elementos, o que confirma uma relação próxima entre eles e 
o substrato rochoso. Bigarella et al. (1996) reportam a interação de liquens com o Mg 
contido na pedra-sabão utilizada por Aleijadinho em suas obras expostas em Congonhas 
(MG). Segundo Feige & Kremer (1979) e Vicente (comunicação pessoal), fatos de 
ataque de liquens a monumentos históricos na Europa são frequentemente reportados, e 
um tratamento adequado é requerido para interrupção do processo. 
Ascaso et al. (1982) estudaram a ação de líquens sobre calcáreo comum e o 
dolomítico, ambos cristalinos. Sob o talo de Caloplaca callopisma ambas as rochas 
formaram oxalato de cálcio monohidratado, e na dolomítica altos teores de oxalato de 
ferro. A interação desta rocha com o líquen não resultou na produção do oxalato de 
magnésio, como era de se esperar. Isto levou os pesquisadores a concluir que este 
composto, na forma dihidratada, não é formado sob condições naturais. 
A atividade química que provoca decomposição da rocha foi inicialmente 
atribuída ao CO2 proveniente da respiração do fungo, que se encontra dissolvido no 
 
15
interior do talo liquênico. Este postulado não foi ainda conclusivo a nível experimental. 
Especulações iniciais sobre o assunto indicam ser o ácido oxálico, neste referido 
processo, o que pode ser verdadeiro para as espécies calcícolas. Wade (1965) observou 
que talos de Caloplaca crescidos em substratos calcários têm, frequentemente, uma 
aparência pruinosa, devida ao depósito de cristais de oxalato de cálcio enquanto os 
calcícolas obrigatórios como Caloplaca heppiana, Aspicilia calcarea e Rhizocarpon 
umbilicatum são muito mais ricos neste tipo de sal do que os não obrigatórios. Isto 
sugere que o envolvimento do metabolismo liquênico com o oxalato de cálcio confere 
uma adaptação para o crescimento em substratos calcários. Por outro lado, rochas 
calcárias macias podem ser também protegidas da erosão pelo talo liquênico (Pentecoste 
& Fletchen, 1974). Um pequeno grupo, por conseguinte, está ligado a rochas ricas em 
ferro. Daí metabolizarem e excretarem óxidos desses elementos. Isto inclui e 
Acarospora sinopica, Rhizocarpon oederi, Lecidea atrata e L. silacea (Brodo, 1974). 
Os silicatos são menos ativos quimicamente que os carbonatos. Por isso, Schatz 
et al. (1963) sugeriram que os ácidos liquênicos exercem importante papel na 
pedogênese através da quelação. Este processo pode ser demonstrado 
experimentalmente. Iskandar & Syers (1971; 1972) demonstraram que muitos ácidos 
liquênicos eram hidrossolúveis em pequeno grau, entretanto mensurável, e que alguns 
formavam complexos com apreciáveis quantidades de cátions de minerais e rochas 
pulverizadas. Tanto o ácido fumarprotocetrárico, como o talo de Parmelia conspersa, 
foram capazes de degradar quimicamente o granito (Syers, 1969). 
Ascaso et al. (1976) demonstraram a capacidade de reação de quatro substâncias 
liquênicas com rochas ricas em Si, usando o ácido oxálico como referência. A partir dos 
resultados concluíram que a capacidade quelante das substâncias liquênicas não está 
diretamente relacionada à sua solubilidade em água, pois compostos com ação 
diferenciada apresentaram hidrossolubilidades similares. Por outro lado, a modificação 
no pH, principalmente os mais baixos, propiciaram uma maior capacidade de formar 
complexos entre as substâncias liquênicas e íons inorgânicos dos minerais e rochas. 
Estes mesmos autores constataram que fragmentos de talo liquênico incubados com 
amostras de minerais e rochas, são mais efetivos na indução de transformação desse 
material do que combinações ou soluções das substâncias liquênicas extraídas do 
material vivo (líquen). 
As alterações químicas induzem também a mudanças morfológicas em minerais 
e rochas. Por exemplo os feldspatos potássicos podem ser mais facilmente alterados que 
 
16
os cálcicos, enquanto a biotita é um mineral bastante alterável. Este, quando submetido 
à ação de compostos liquênicos, libera SiO2, e halositas são recuperadas em meio 
aquoso. Tais reações quando ocorrem sob condições favoráveis como pH apropriado, 
proporção adequada de cátions no meio, etc., propiciam a formação de novos minerais 
(Ascaso, 1985). 
A gênese de minerais em laboratório pode ser demonstrada. Rhizorcarpon 
geographicum é capaz de transformar feldspato em halosita. Este fato foi verificado in 
natura, além de sua transformação em geotita (Ascaso, 1985). 
A interação entre o talo liquênico e a superfície rochosa tem sido também 
estudada através da difração por raios X e microscopia eletrônica. No contato de 
Parmelia conspersa com seu substrato de granito foi detectada a presença de cristais decaulinita, halosita e sílica amorfa. O mineral mais frequentemente formado na interface 
de R. geographicum e o granito é a halosita, enquanto as micas e feldspatos demonstram 
alterações para a geotita. Tais postulados conduzem a concluir que minerais de halosita 
e caulinita podem ser formados, na natureza, por ação dos liquens (Ascaso, 1985). 
O líquen Umbilicaria pustulata não gera minerais na natureza como o faz em 
laboratório. Neste caso, a montmorilonita é produzida. Estes resultados demonstraram 
que liquens característicos de um determinado tipo de rocha são capazes de modificá-la 
in vitro tão bem quanto in vivo (Ascaso, 1985). 
A importância da interação líquen/rocha para a formação de solos primitivos, a 
partir de minerais alterados, levou Galvan et al. (1981) a estudarem a capacidade dos 
liquens na alteração de rochas metamórficas. Os autores concluíram que na interface 
talo/rocha havia retenção de quartzo menor do que na rocha. As micas foram retidas sob 
o talo liquênico, enclausuradas entre as hifas, e também encontradas em liquens 
aderidos à rocha, em superfície reduzida. O teor de retenção então depende da 
compactação da rocha e/ou o teor de minerais de mica na rocha-mater. 
Os feldspatos são também alterados pelos liquens. O efeito de Pertusaria 
corallina sobre o basalto, que consiste basicamente de plagioclásio, foi da sua alteração 
pelo ácido oxálico (Jones et al., 1980). 
Face aos estudos amplamente relatados, é possível concluir que os liquens que 
utilizam determinado substrato rochoso de forma específica, são capazes de modificá-lo 
tanto in vivo como in vitro (Ascaso, 1985). Por outro lado, quando não há especificidade 
líquen/substrato, os processos de alteração morfológica (decomposição), transformação 
 
17
mineral, e ação mecânica podem diferir quando observado na natureza, ou quando 
submetido a ensaios laboratoriais. 
A interação do líquen com o meio ambiente depende sobremaneira do microclima 
da área e da pureza do ar, visto que a umidade atmosférica é fator vital no 
comportamento desse ser. Quanto mais úmido o ambiente mais gelatinoso, é às vezes 
colorido, será o líquen, e, à medida que a umidade diminui ele se torna quebradiço 
(Seaward, 1977). 
A partir daí, pode-se também sugerir os liquens como indicadores de umidade como 
a Acaspospora oxytona,
 
que também indica a direção do vento, e, o Peltigera aphthosa 
que indica a umidade do ar atmosférico (Llano, 1957). 
A pureza do ar atmosférico é um fator crucial na presença e sobrevivência do líquen, 
que se alimenta basicamente de forma higroscópica, fixando elementos do nele 
dispersos, notadamente o nitrogênio (Seaward, 1977; Guzmán, Xavier e Pereira, 1984) 
Quando o ar torna-se poluído, por exemplo na instalação de indústrias no perímetro 
urbano, algumas espécies tendem a desaparecer como Physcia stellaris, Xanthoria 
parietina e Candelariella vitellina,
 
podendo-se inclusive medir o grau de poluição da 
área, a partir do desaparecimento das espécies menos resistentes, através do 
levantamento periódico dos líquens componentes do meio ambiente em estudo. Estes 
assimilam dióxido de enxofre e elementos radioativos, entre outras substâncias nocivas. 
Alguns esquimós e lapões foram afetados pela radioatividade absorvida pelos liquens 
utilizados como alimento pelas renas e caribús da região, que tiveram sua carne e leite 
contaminados por tais elementos (Seaward, 1977; Richardson, 1986). 
Isto ratifica a inclusão dos liquens na cadeia trófica, quando constata-se que na 
região Antárctica, tais seres possuem carotenóides provenientes do "Krill", crustáceo 
abundante na região, e alimento básico (cerca de 99,6%) do pingüim. Através do guano 
desses animais, por onde são excretadas tais substâncias, os líquens absorvem esses 
carotenóides, integrando, dessa forma, os ecossistemas marinho e terrestre (Kolakowska 
e Xavier Filho, 1984; Guzmán, Xavier-Filho e Pereira, 1984). 
Na Antarctica os liquens desempenham importante papel no fluxo de nutrientes 
entre os organismos de sua tundra aproveitando os sais da água do mar pulverizados 
pelos ventos fortes da região. O Ca++ e o Mg++ das rochas e ossos de baleias, focas e 
pingüins lentamente decompostos por conta da baixa temperatura, são também 
incorporados aos liquens através da água do mar. 
 
18
Nas regiões subpolares, os liquens encontram condições ambientais distintas das 
zonas semi-áridas, áridas e litorâneas. Nesse caso, há estações marcadas por alta e baixa 
intensidade luminosa, ou seja, quase 24 horas de luz ou escuridão e neve, a cada 6 
meses do ano. Para isso eles têm a capacidade de regular seu metabolismo, 
permanecendo em latência ou aumentando sua capacidade fotossintética em 
temperaturas extremas. O acúmulo de pigmento no talo e apotécios possibilita maior 
absorção de radiação solar, propiciando um aumento de sua temperatura, derretendo a 
neve que o cobre, possibilitando, dessa forma, a realização da fotossíntese, por menor 
que seja o período de luminosidade (Seaward, 1977). 
Então pode-se dizer que líquen tem interação com cada elemento componente do 
meio ambiente. Sua relação vai desde com os mamíferos, aos pássaros, anfíbios e 
invertebrados aquáticos ou terrestres (Seaward, 1977). 
Utilização econômica das substâncias liquênicas 
O papel antibiótico dos fenóis liquênicos se conhece desde a antiguidade clássica 
(Vartia, 1973). Esses fenóis se comportam como agentes bacteriostáticos e bactericidas, 
frente às bactérias Gram positivas mas não frente as Gram negativas. Também inibem o 
crescimento de certos fungos (Tolpisheva, 1979). 
Desde a descoberta dos efeitos quimioterápicos, o fenômeno da antibiose tem 
atraído a atenção, além de ser estimulada a investigação do fato em todos os grupos de 
plantas. 
A atividade das substâncias liquênicas contra bactérias e fungos foi amplamente 
difundida por Bustinza (Espanha), discípulo de Fleming. A partir do seu trabalho, bem 
como de outros pesquisadores, foi comprovada a eficiência do ácido úsnico e outras 
substâncias de natureza lipofílica. 
A partir da década de quarenta foram surgindo os primeiros estudos referentes à 
eficiência das substâncias liquênicas. Burkholder et al. (1944) e Burkholder & Evans 
(1945) iniciaram testes elaborando um trabalho a nível de detecção de compostos 
liquênicos antibacterianos. Bustinza, foi também um dos precursores neste tema de 
investigação, estudando a eficiência antimicrobiana de compostos oriundos de líquens, 
notadamente o ácido úsnico, isômeros e derivados (Bustinza & Caballero, 1948; 
Bustinza, 1951). 
O ácido úsnico, um dos compostos liquênicos mais eficazes contra enfermidades 
e de amplo estudo, demonstrou eficácia contra bacilos da tuberculose humana, bovina 
 
19
ou avium, além de regredir por completo casos de lupus vulgaris, ou tuberculose de 
pele. Seu preparado hidrossolúvel é conhecido na Finlândia e Alemanha como Usno e 
Usniplant, respectivamente, indicado para casos de afecções dermatológicas e como 
balsâmico. Na União Soviética é referido como Binan e indicado para uso antes de 
práticas cirúrgicas, para evitar a formação de quelóides e contra infecções urinárias 
(Pätiälä, 1949; Vartia, 1950; Kortenkangas & Virtanen, 1956). 
A Evosina, mescla dos ácidos úsnico e evérnico, é eficaz contra furunculoses, 
impetigo e mastite bovina (Marshak, 1947). 
Por outro lado, a forma de sal sódico do ácido úsnico, e sua associação a 
antibióticos comerciais, como a penicilina e estreptomicina, conferiram ao composto 
resultante uma maior eficácia contra microrganismos resistentes, inclusive as bactérias 
Gram negativas (Klosa, 1948; Klosa, 1949; Vartia, 1950; Bustinza, 1951). 
A ação farmacológica é também satisfatória, tanto para extratos brutos, como 
para substâncias purificadas. Na literatura é reportada ação antiespasmódica, 
espasmolítica,histamínica, hipotensiva, hipoglicemiante, neuromuscular e analgésica, 
tanto periférica como central (Appa-Rao & Prabhakar, 1987; Catanho et al., 1994; 
Souza et al., 1996; Silva et al., 1996a; Silva et al., 1996b; Silva et al., 1997). 
Atualmente, sabe-se da capacidade inibidora desses compostos, tanto contra 
fungos como frente às bactérias, até as Gram negativas (Cavalcanti et al., 1983; Silva et 
al., 1986; Xavier-Filho et al., 1987; Ingolfsdottir et al., 1985; Pereira et al., 1991; 
Pereira et al., 1996). 
Na literatura é também reportada a ação farmacológica nos seus mais variados 
aspectos, como atividades antiespasmódica e espasmolítica (Correia da Silva, 1976), 
histamínica (Correia da Silva, 1979), hipotensiva, hipoglicemiante, neuromuscular, e 
analgésica (Appa-Rao & Prabhakar, 1987; Catanho et al.,1994; Souza et al., 1996; Silva 
et al., 1996a; Silva et al., 1996b). 
Visto tanta utilização a nível popular, e resultados satisfatórios, foram 
produzidos medicamentos ainda utilizados na atualidade, a partir de compostos 
liquênicos, principalmente nas formas hidrossolúveis do ácido úsnico (Kortenkkangas & 
Virtanen, 1956; Hirayama et al., 1980). 
A Tabela 02 resume alguns dados sobre o tema, tanto no que se refere a 
compostos testados, como aos produtos comerciais. 
 
20
Tabela 01: Utilização popular dos líquens 
ESPÉCIE ENFERMIDADE 
Xanthoria parietina* Icterícia 
Usnea barbata* problemas capilares 
 
propriedades secantes e antissépticas 
 
distúrbios uterinos 
 
pé de atleta (micose) 
Pertusaria amara malária 
Lobaria pulmonaria* problemas pulmonares 
Usnea longíssima problemas pulmonares 
Cladina rangiferina problemas pulmonares 
 
anemias 
Cetraria islandica problemas pulmonares 
 
má digestão 
 
diarréia 
 
falta de apetite 
 
inflamação na garganta 
 
catarro brônquico crônico 
Peltigera canina* mordida de cães raivosos 
 
picadas de cobra 
Espécies de Roccelaceae tosse e febre 
Espécies de Parmeliaceae anti epilépticos 
Letharia vulpina e Cetraria pinastri venenosos 
Espécies foliáceas (Índia) inseticidas e narcóticos 
* espécies referidas pela Doutrina dos Sinais 
Fonte: Abrahan & Florey (1949); Llano (1951); Hale (1983). 
Na atualidade, o câncer é uma das doenças que mais causa óbitos, ao lado das 
cardiopatias e SIDA. Os fatores pré disponentes atuais diferem um pouco dos cânceres 
detectados há décadas. A poluição, exposição direta aos raios ultra violeta, visto o 
prejuízo causado à camada de ozônio, são assuntos da modernidade. Por outro lado, 
câncer de escroto em limpadores de chaminé na Inglaterra, pelo contato direto com o 
carvão e fuligem, assim como nos trabalhadores de destilarias de alcatrão, são 
referências dos séculos XVIII e XIX (Nobre & Junqueira, 1967). 
O cigarro, a partir de 1965, passou a ser considerado o maior causador do câncer 
de pulmão, com percentual de 90% para as neoplasias identificadas neste órgão, e 
responsáveis por 30% dos cânceres, de uma maneira geral (Hirayama, 1978; Faber, 
1980; Cairns, 1981; Helzlsouer et al., 1994). 
Em proporção menor, 5 a 10% dos cânceres são de origem ocupacional 
(exposição a radiação, solventes ou asbesto) e 30% de origem viral, genética, ou 
mutações espontâneas (Voet & Voet, 1990; Murad & Katz, 1996). De uma maneira 
geral, são provocadas as modificações/danos ao ADN, ou interferência na sua 
 
21
replicação e/ou reparo. Da mesma forma procedem os agentes físicos, provocando com 
facilidade a leucemia em cobaias. Outra característica da célula neoplásica é a 
resistência às drogas quimioterápicas, após determinado período de desenvolvimento da 
doença. É aceito que a resistência tumoral é similar à bacteriana, ou seja, podem surgir 
variedades resistentes por mutação da célula anormal (Litter, 1970; Ames, 1984). 
Tabela 02: Compostos isolados e produtos comerciais de líquens de ação terapêutica 
COMPOSTO ATIVIDADE 
Ácido rocélico, monoésteres e monoamidas
 
bactérias Gram positivas e tuberculose 
Ácido úsnico bactérias em geral 
 
lupus vulgaris 
USNO* (Finlândia) afecções dermatológicas 
USNIPLANT* (Alemanha) afecções dermatológicas 
 
balsâmico 
BINAN* (União Soviética) antes de cirurgias 
 
evitar cicatrizes 
 
infecções urinárias 
Evosina* impetigo 
 
mastite bovina 
Usnato de sódio + penicilina aumento de ação antibiótica 
Usnimicina(1) bactérias Gram negativas e espécies 
resistentes 
Usnidihidromicina(2) bactérias Gram negativas e espécies 
resistentes 
Ácido usnínico ação semelhante à penicilina 
 
Ácido úsnico antagonismo competitivo com a 
histamina, antiinflamatória, analgésica 
Ácido leprapínico hipotensiva, analgésica, antiinflamatória, 
 
anti espasmódica, neuromuscular 
Atranorina hipoglicemiante, antiinflamatória, 
analgésica 
* produtos comercializados 
Fonte: Klosa (1948); Klosa (1949); Pátiälä (1949); Vartia (1950); Bustinza (1951); 
Kortekangas & Virtanen (1956). 
Sobre os antineoplásicos 
Com o crescente número de casos dos cânceres clínicos, a medicina atual vem 
desenvolvendo esforços para a sua cura, recorrendo a quimioterápicos, cada vez mais 
eficientes, contando também com os adjuvantes. O problema, na maioria das vezes, é a 
ação tóxica dos medicamentos sobre os pacientes, com efeitos colaterais dos mais 
variados, principalmente náusea e vômito, além de lesões tissulares locais de severas a 
 
22
moderadas. Por isso, a busca por antineoplásicos de poder menos tóxico possível, e 
maior eficácia contra o câncer, é objeto de incansável estudo dos pesquisadores da 
atualidade. Nisto, os produtos de origem natural têm correspondido de forma satisfatória 
aos testes laboratoriais (Wallerstein Jr., 1991). 
São denominados específicos os quimioterápicos que, de uma maneira geral, 
afetam as células que estão se dividindo. Os não específicos agem, inclusive, sobre as 
que estão em repouso durante seu ciclo. Uma das primeiras drogas antineoplásicas 
referida na literatura é a mostarda nitrogenada, que ainda ocupa lugar de destaque na 
terapêutica. Em seguida surgiram os antimetabólitos, e uma série de análogos da purina. 
Atualmente, graças a tais substâncias, é possível se afirmar ser passível de cura uma 
série de doenças neoplásicas, apesar desses indiscutíveis progressos não indicarem 
resultados promissores para outros tantos tipos de cânceres humanos resistentes às 
intervenções quimioterápicas. De uma forma geral, as drogas utilizadas no tratamento 
do câncer são consideradas antimitóticas. Atuam sobre a célula afetando, 
principalmente, a biossíntese dos ácidos nucleicos e nucleoproteínas. São consideradas 
agentes citotóxicos,
 
pois agem destruindo as células cancerígenas, ou impedindo seu 
crescimento e multiplicação - os venenos celulares (Nobre & Junqueira, 1967; Litter, 
1970; Gilman et al., 1985; Wallerstein Jr., 1991). 
A dificuldade na detecção de diferenças entre células normais e cancerosas 
impede a utilização de quimioterápicos altamente seletivos. A maioria desses agentes 
danifica os tecidos de rápida proliferação, apesar de alguns deles serem saudáveis como 
os da medula óssea, células germinativas, folículos pilosos e epitélio gastrointestinal 
(Wallerstein Jr., 1991). 
A capacidade antiblástica das substâncias liquênicas é fato. Os primeiros 
trabalhos sobre o assunto foram publicados no final da década de 50, onde foi 
demonstrada a eficiência do ácido polipórico de Sticta coronata contra leucemia 
linfocítica (Burton & Cain, 1959; Cain, 1960). 
Testes com extratos brutos e frações polissacarídicas contra tumores sólidos do 
tipo sarcoma-180 e adenocarcinoma de mama demonstraram resultados significativos 
(Shibata et al., 1968; Fukuoka et al., 1968; Nishikawa et al., 1970; Tokuzen & 
Nakahara, 1971; Takeda et al., 1972). 
Alguns produtos liquênicosnitrogenados impediram por completo o 
desenvolvimento de tumores ascíticos do tipo carcinoma de Ehrlich; entretanto estes 
mesmos compostos foram ineficazes contra o sarcoma-180 do tipo sólido. Já 
 
23
heteroglicanos obtidos de distintas espécies foram moderadamente ativos (Fujiama et 
al., 1973; Takahashi et al., 1981; Nishikawa et al., 1974). 
Os compostos liquênicos de natureza fenólica são também eficazes contra 
neoplasias. O ácido úsnico apresentou alta atividade contra o carcinoma de Lewis 
(Kupchan & Koppermann, 1975) e baixa para leucemia linfocítica P388 (Takai et al., 
1979). Este ácido foi, ainda, o responsável pela ação antitumoral e citotóxica de extratos 
de Usnea fasciata, que possui altos teores do referido composto (Pereira et al., 1994a). 
A atranorina, bem como os ácidos protoliquesterínico e nefrosferínico, exibiram forte 
inibição contra o carcinoma de Ehrlich sólido (Hirayama et al., 1980; Santos, 1996). 
No Brasil, líquens nordestinos e amazônicos vêm sendo avaliados quanto à 
presença de compostos antineoplásicos e à produção sazonal de compostos bioativos. 
Em 1990, Lima et al. comprovaram a eficiência de diferentes extratos obtidos de 
Cladoniaceae contra tumores sólidos do tipo sarcoma-180 e carcinoma de Ehrlich, com 
inibição de até 80%, bem como contra células KB (carcinoma nasofaríngeo) com CI50 
(concentração que inibe 50% do crescimento celular) de 12 g/ml. Esses mesmos 
extratos foram altamente eficazes quando testados frente a mais quatro diferentes linhas 
celulares (in vitro), notadamente os que continham maiores teores de atranorina e dos 
ácidos úsnico e estítico (Nascimento et al., 1994). Líquens de distintas procedências 
como da Chapada da Diamantina (BA), Antárctica e tabuleiros arenosos da Paraíba, 
demonstraram CI50 de 4 g/ml e 7 g/ml, resultados considerados altamente satisfatórios 
para testes com extratos brutos, onde a concentração dos princípios ativos é muito baixa 
(Silva et al., 1994). 
Quanto à produção em função da época do ano, foi verificado que em 
exemplares de Cladonia verticillaris ocorrentes em tabuleiros arenosos da Paraíba havia 
maior produtividade de compostos ativos durante o período seco do ano (verão). Aí 
foram detectados maiores teores de atranorina e ácido fumarprotocatrárico, princípios 
ativos de natureza fenólica, assim como a liquenina, polissacarídeo liquênico também 
ativo contra tumores sólidos experimentais testados in vivo (Santos, 1996; Santos et al., 
no prelo). 
Shibata et al.(1968) isolaram um homopolímero de Gyrophora esculenta e 
Lasallia papulosa, altamente ativo frente ao sarcoma-180. Análises estruturais e 
bioquímicas revelaram que este polissacarídeo é uma -1,6 glucana parcialmente 
acetilada (pustulana acetilada). Um sulfato derivado deste composto inibe o efeito 
 
24
citopático do HIV, e suprime a expressão do antígeno em células Molt - 4. Por outro 
lado, este composto não inibe a atividade da transcriptase inversa (Hirabayashi et al., 
1989). 
A isoliquenina, açúcar comum a diversas espécies liquênicas, exibe atividade 
moderada frente ao sarcoma-180 e carcinoma de Ehrlich. Todavia, a rafinose isolada de 
Usnea fasciata inibe em mais de 90% a proliferação celular de ambas as linhas de 
tumores (Pereira et al., 1994a). 
Líquens da caatinga e de brejos nordestinos foram também estudados. 
Teloschistes flavicans, Ramalina celastri e Heterodermia leucomela, procedentes da 
caatinga, apresentaram extratos orgânicos e aquosos com inibição de até 85,8% contra o 
carcinoma de Ehrlich, e CI50 de 7,5 g/ml contra células KB (Pereira et al., 1992; 
Alcântara et al., 1994; Lima et al., 1994); Ramalina complanata, ocorrente em brejo de 
altitude (PB), foi eficaz contra tumores (80%) e apresentou CI50 de 8 g/ml contra as 
mesmas células acima mencionadas (Pereira et al., 1994b). 
Encontram-se também referências sobre a atividade antineoplásica das substâncias 
liquênicas, notadamente os polissacarídeos, com inibição de até 99,1% de tumores do 
tipo sarcoma e carcinoma, segundo trabalhos de Fukuoka, entre outros autores. Também 
é comprovada a atividade citotóxica de extratos liquênicos contra células da linha KB 
(Carcinoma naso-faríngeo) com uma DI50 (Doses Inbitórias de 50% do crescimento 
celular) satisfatória segundo Nascimento e Pereira. 
Realmente não só as atividades mencionadas fazem do líquen um ser útil, suas 
substâncias coloridas são, desde séculos passados, utilizadas na indústria têxtil para 
tingir tecidos, notadamente as extraídas de Rocella fuciformes. 
Essas tinturas de liquens foram utilizadas principalmente na Escandinávia em 
indústrias artesanais, tingindo lã e diversos tipos de tecidos, indicadas, nesse caso, para 
maior durabilidade das roupas, visto que, quando tingidas com liquens elas não eram 
atacadas pelas traças. 
Os liquens eram também usados como corantes para vinhos, licores, óleos, graxas, 
além de tintas para mármore e papel. Liquens com essa capacidade são segundo Avellar 
Brotero (1824), abundantes nas Ilhas do Cabo Verde, Angola, África, Madagascar, 
Ceilão, Índias, Austrália, Chile, Peru e Costa Oeste da América do Norte. São espécies 
de Pertusaria, Lecanora, Umbilicaria, Rocella e Dendrographa. Por sua capacidade de 
indicar o pH das substâncias, eram utilizados na fabricação do papel tornassol. 
 
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Na indústria de perfumes e cosméticos os liquens, através de suas substâncias 
liquênicas, são utilizados desde o século XVI no fabrico de talcos, sachets e perfumes. 
As espécies das famílias Cladoniaceae, Stictaceae, Parmeliaceae e Usneaceae são as 
comumente empregadas, sendo a Evenia prunastri, E. furfuraceae e Lobaria 
pulmonária mais populares, além de possuírem substâncias aromáticas similares. 
Na manufatura de perfumes, sabonetes e cremes, os óleos essenciais dos liquens são 
importantes não só pelo aroma agradável, mas também como fonte de glicerol, além de 
outras substâncias liquênicas, como a atranorina, que têm a propriedade de fixar 
perfumes. 
No século XVIII o pó de "Cyprus", uma combinação de Evernia prunastri, 
Anasptychia ciliaris e espécies Usnea, era utilizado em conjunto com o âmbar cinzento, 
almiscar, óleo de rosas, jasmim ou flor laranjeira, como pó de toilete e também para 
alvejar e limpar os cabelos. A Ramalina calicaris, utilizadas no lugar do amido, servia 
para clarear as cabeleiras pois a existência de liquens comestíveis, vem da antiguidade. 
O seu valor nutritivo deve-se, principalmente, ao alto teor de carboidratos, dos quais os 
polissacarídeos são os mais comuns. A quantidade desses compostos é alta, 
notadamente a liquenina em cerca de 66% na Cetraria islandica e Cladina rangiferina, 
que possuem 3,35 e 2,5 vezes mais açúcar do que a batata, respectivamente. 
A abundância desses líquens torna viável seu consumo. No Norte da Noruega, em 
áreas selecionadas, a C. islandica produz aproximadamente 700 Kg (peso seco) por 
Km2 e a Cladonia alpestris 1,4 a 1,5 Kg por m2. 
Os liquens comestíveis cobrem extensas áreas livres do gelo na Groelândia, 
Escandinávia, Sibéria, Alaska, Nordeste do Canadá, Labrador e o Arquipélago do mar 
Ártico. Aí são conhecidos como "musgo das renas e caribús", fazendo parte da dieta 
desses animais, bem como de búfalos, principalmente no inverno quando os arbustos 
perdem suas folhas e ficam cobertos pela neve. Nessas áreas são comumente 
encontradas a Cladina rangifernia e C. sytvalica principalmente, além de espécies de 
Cetraria, Stereocaulon e Alectotia.
 
Durante a Guerra as Forças Armadas dos EUA recomendavam a seus soldados que, 
em condições de emergência, durante jornadas pela região Ártica, se alimentassem de 
Umbilicaria cozida. 
No Japão a Umbilicaria esculenta, conhecida como "iwatake"ou "cogumelo de 
rocha", faz parte de alguns pratos e a Parmelia abessinica, além de empregada 
medicinalmente, é designada por "Rathipuvvu",o famoso "curry". 
 
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O líquen serve de alimento não só para pessoas e animais de grande porte. São 
também utilizados pelos invertebrados, que preferem os gelatinosos, por maior 
facilidade na digestão. 
Os polissacarídeos liquênicos são facilmente hidrolisados para glicose. Por isso, são 
utilizados na fermentação para produção de álcool, onde 40 Kg de material, produzem 
aproximadamente 5 L de álcool. 
Stenberg (1868) descreve a produção de conhaque de liquens detalhando com 
figuras, planos para uma destilaria. Em 1893 a manufatura do conhaque a partir do 
álcool de liquens é incrementada na Suécia, que se vê obrigada a fechar suas indústrias 
pela exploração não racional da matéria prima. 
Apesar do lúpulo ser usado na fermentação das cervejas, tem sido mencionado o uso 
dos liquens em vários monastérios (mosteiros) da Rússia e Sibéria, que têm boa 
reputação por servir cervejas bastante amargas e não tóxicas aos viajantes. 
Sabe-se ainda que os liquens são utilizados na decoração de ambientes, em conjunto 
ou não com arranjos florais para igrejas e residências em motivos diversos como 
religiosos, nativos, etc, e, bem como em túmulos e funerais, principalmente nas épocas 
do ano em que plantas não florescem. Os liquens fazem parte também da decoração 
externa das casas na Suécia enfeitando jardineiras colocadas no para-peitos de janelas. 
Imobilização celular e enzimática 
Na proposição da bioprodução de metabólitos liquênicos para fins industriais e 
científicos, sem destruição da liquenoflora, observou-se que são ainda incipientes as 
técnicas de ressíntese do talo liquênico, ou mesmo sua cultura in vitro, apesar de 
atualmente estas técnicas virem ocupando espaço, e terem demonstrado ser bastante 
promissoras. Estas metodologias não chegaram à reprodução do líquen segundo sua 
forma original. Ahmadjian (1980) atribui tal fato à intensidade luminosa empregada 
para desenvolver a cultura sintética. Por outro lado, fatores como composição e 
concentração dos elementos do meio de cultivo, temperatura, entre outros devem 
também ser levados em consideração. Por exemplo, o talo ressintetizado de Cladonia 
cristatella com seu próprio ficobionte, Trebouxia ereci, produziu fenóis característicos 
da espécie, exceto o ácido úsnico (Ahmadjian & Jacobs, 1981). 
O micobionte de Lecanora chrysoleuca, unido ao ficobionte Pseudotrebouxia, 
desenvolveu, em laboratório, um talo que produzia ácido úsnico, mas nunca o ácido 
 
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pseudoplacodiólico, apesar de ambos fenóis serem produzidos pelo talo in natura 
(Culberson & Ahmadjian, 1980). 
Muitos fenóis liquênicos são produzidos utilizando-se a técnica de cultura de 
tecidos, a partir de porções do talo liquênico (Yamamoto, 1991). Kinoshita et al.(1993) 
referem a necessidade de, por vezes, se realizar processos de dessecação para uma 
síntese mais eficiente. Mesmo nestes casos, não existe uma relação estrita entre os 
fenóis produzidos pela cultura de tecido e aqueles que correspondem ao talo no seu 
estado natural (Yoshimura et al., 1993). 
De uma forma geral, as imobilizações enzimáticas servem para síntese de 
compostos resultantes da ação de uma enzima específica. Trata-se, normalmente, da 
separação da enzima das misturas de reação, e diminuindo a inativação enzimática 
(Mozhaev et al., 1987). 
Os líquens produzem compostos fenólicos que são únicos deste taxon, e não 
registrados em representantes do reino Plantae (Culberson et al., 1977). Existem poucas 
informações sobre enzimas que sintetizam ou catabolizam estes compostos, e menos 
ainda se conhece sobre sua regulagem metabólica. 
A pesquisa sobre a biossíntese de fenóis liquênicos é muito dificultada por estes 
seres crescerem muito lentamente (Hill, 1984; Seaward, 1977). 
Face à probabilidade de larga utilização econômica de produtos liquênicos, o 
interesse em sua bioprodução vem aumentando com o passar dos anos. 
Assim como os fenóis e polissacarídeos dos líquens são de comprovada 
utilização econômica, outros derivados de açúcares produzidos pelos líquens, como os 
polióis, têm também potencial interesse industrial. 
É possível a bioprodução tanto de polióis (açúcares alcoólicos), como fenóis e 
produtos intermediários de sua rota metabólica. Inicialmente os trabalhos de produção 
de substâncias liquênicas foi direcionado por utilização da poliacrilamida como matriz 
de enclausuramento das células liquênicas, entretanto foi verificado que este material as 
plasmoliza. Daí foram adotados outros procedimentos como o uso do alginato de algas, 
cujas esferas que contém as células dos liquens, são enduredcidas por uma solução de 
cloreto de cálcio. Isto conferiu certos problemas ao sistema imobilizado, visto que o 
precursor (acetato de sódio) realizava uma troca catiônica com o cálcio, desmanchando 
as esferas. Isto impossibilitava o aumento da concentração do precursor, e 
conseqüentemente a estimativa de sua condição ótima para bioprodução. A inclusão da 
 
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caulinita nos sistemas de imobilização permitiu não apenas o manuseio nas 
concentrações do acetato, mas também reduziu sobremaneira os custos dos ensaios. 
Sistemas de imobilização com espécies de Cladoniaceae de distintas partes do Brasil 
funcionaram satisfatoriamente, o que abre mais uma perspectiva na utilização racional 
de liquens, com vistas a bioconservação. 
A partir desta exposição não detalhada sobre os liquens, espera-se que, seja 
modificado a conceito do estudante-biólogo, de que esses seres sejam apenas o 
resultado de uma harmônica simbiose entre dois diferentes organismos. 
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