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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DE FOZ DO IGUAÇU - CESUFOZ MAIARA BELO SIMONETT PARENTALIDADE SOCIOAFETIVA E A POSSIBILIDADE DA MÚLTIPLA FILIAÇÃO REGISTRAL FOZ DO IGUAÇU-PR 2017 CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DE FOZ DO IGUAÇU – CESUFOZ CURSO DE DIREITO MAIARA BELO SIMONETT PARENTALIDADE SOCIOAFETIVA E A POSSIBILIDADE DA MÚLTIPLA FILIAÇÃO REGISTRAL Monografia apresentada ao Curso de Direito do Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Marcos Apolloni Neumann FOZ DO IGUAÇU-PR 2017 MAIARA BELO SIMONETT PARENTALIDADE SOCIOAFETIVA E A POSSIBILIDADE DA MÚLTIPLA FILIAÇÃO REGISTRAL Monografia apresentada ao Curso de Direito do Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito COMISSÃO AVALIADORA _____________________________________________________________________ Prof. Marcos Apolloni Neumann Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu _____________________________________________________________________ Prof. Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu _____________________________________________________________________ Prof. Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu Foz do Iguaçu, 16 de Outubro de 2017 DEDICATÓRIA A minha família, em especial minha mãe, Adriana, que nunca mediu esforços para me ajudar a alcançar meus sonhos. Ao meu pai, Nelson (in memoriam), que sempre me ensinou a buscar meus objetivos de uma forma digna e honesta. E a meu marido, Marcelo, por todos esses anos de dedicação e companheirismo. AGRADECIMENTO Primeiramente, agradeço a Deus por mais um sonho realizado, a minha família por sempre me apoiar em minhas decisões e por estar ao lado sempre que eu precisar. Agradeço aos meus amigos por estar sempre junto comigo nos momentos de angustia e alegrias, por não se importarem pela minha ausência em diversas datas especiais. Agradeço ao meu orientador Marcos pelo conhecimento compartilhado e pela orientação prestada até a conclusão deste trabalho, todo o apoio e troca informações foram imprescindíveis para o termino deste trabalho. Se você não é capaz de ser feliz com sua família, dificilmente será feliz com você mesmo. Luiza Gosuen RESUMO O presente trabalho visa analisar alguns institutos sobre a família e apresentar a importância da divulgação de forma clara e objetiva das recentes conquistas no âmbito jurídico. A família vem passando por transformações relevantes e está se renovando de acordo com os valores e costumes da sociedade, neste trabalho serão apresentados os tipos de família, os princípios que norteiam o direito de família, tipos de filiação e os modos de reconhecimento de filho, voluntário e o judicial, as principais mudanças legislativas, bem como, breves comentários ao provimento 12/2010 que regulamenta sobre a investigação de paternidade e também sobre o provimento 16/2012 do CNJ, o qual possibilitou o reconhecimento de filho espontâneo via extrajudicial. Assim, em especial será abordado sobre a família afetiva que, é aquela constituída de amor, carinho e afeto, onde há respeito entre seus membros. Diante disso, com a necessidade de regulamentar o instituto da família socioafetiva, foi instituído o provimento no Paraná 265/17 do Conselho Nacional de Justiça, pois a socioafetividade é uma característica da família atual e será objeto de estudo deste trabalho. E por fim, analisar a possibilidade do reconhecimento da parentalidade socioafetiva e a possibilidade da múltipla filiação registral, demonstrando os principais reflexos jurídicos no âmbito de direito de família e sucessões. Palavras-chave: Socioafetiva; provimento; parentalidade. ABSTRACT The present work aims to analyze some institutes on the family and to present the importance of the clear and objective disclosure of the recent conquests in the juridical scope. The family has undergone significant transformations and is being renewed in accordance with the values and customs of society. In this work, the types of family, the principles that guide family law, types of membership and the ways of recognizing children, voluntary and judicial, the main legislative changes, as well as brief comments on the 12/2010 regulation that regulates the investigation of paternity and also on the provision 16/2012 of the CNJ, which made possible the recognition of spontaneous child via extrajudicial. Thus, in particular will be approached about the affective family, which is that of love, affection and affection, where there is respect among its members. In view of this, with the need to regulate the socio-affective family institute, the Paraná 265/17 of the National Council of Justice was instituted, since socio-affectivity is a characteristic of the current family and will be the object of study of this work. Finally, we analyze the possibility of recognition of socio-affective parenting and the possibility of multiple registration, demonstrating the main legal repercussions within the scope of family law and inheritance. Keywords: Socio-affective; provision; parenting. SIGLAS ADI- Ação Direta de Inconstitucionalidade ANADEP- Associação Nacional dos Defensores Públicos CC- Código Civil CJF- Conselho de Justiça Federal CNJ- Conselho Nacional de Justiça CGJ- Corregedoria-Geral da Justiça CRFB- Constituição da República Federativa do Brasil DF- Distrito Federal DNA- Ácido Desoxirribonucleico ECA- Estatuto da Criança e do Adolescente IBDFAM- Instituto Brasileiro de Direito de Família PR- Paraná STF- Supremo Tribunal Federal STJ- Superior Tribunal de Justiça TJ- Tribunal de Justiça SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10 2 A FAMÍLIA .............................................................................................................. 12 2.1 Evolução legislativa do direito de família ....................................................... 13 2.2 Princípios norteadores do direito de família ................................................... 15 2.3 Entidades familiares.......................................................................................... 20 2.4 Concepção moderna da família ....................................................................... 23 3 PARENTESCO E FILIAÇÃO ................................................................................. 26 3.1 Presunções de paternidade .............................................................................. 27 3.2 Modos de reconhecimento dos filhos ............................................................. 30 3.2.1 Reconhecimentovoluntário .............................................................................. 30 3.2.2 Reconhecimento judicial................................................................................... 32 3.3 Comentários ao provimento 12/2010 e ao provimento 16/2012 do CNJ ....... 33 4 PARENTALIDADE SOCIOAFETIVA ...................................................................... 36 4.1 Conceito ............................................................................................................. 37 4.2 Requisitos da socioafetividade ........................................................................ 38 4.2.1 Da posse de estado de filho ............................................................................. 39 4.3 Parentalidade socioafetiva e biológica ............................................................ 41 4.4 Múltipla filiação registral .................................................................................. 41 4.4.1 O reconhecimento voluntário e o papel do cartório de registro civil ................. 43 4.4.2 Comentários ao provimento 265/2017 CNJ ...................................................... 44 4.4.3 Efeitos da parentalidade socioafetiva ............................................................... 45 4.4.4 Entendimento dos tribunais .............................................................................. 52 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 58 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 60 10 1 INTRODUÇÃO O direito de família é um ramo do direito que sofreu mudanças ao longo dos tempos, e essas mudanças vieram inclusive para os novos moldes de família que estão se formando, ou seja, aquelas diferentes da convencional, composto por um pai e uma mãe, unidos ou não pelo matrimônio. As mais relevantes em relação à família ocorreram entre o Código Civil de 1916 e o de 2002, bem como ainda com a promulgação da Constituição Federal de 1988 que, trouxe uma realidade atual de conceito de família. Diante disso, para resguardar direitos e deveres aos membros das novas formações familiares utilizam-se princípios constitucionais, os quais serão citados neste trabalho aqueles que têm aplicabilidade direta as novas entidades familiares, em especial a família afetiva. Atualmente, ordenamento jurídico estabelece os modos de reconhecimento de filhos, tanto no Código Civil- como também em provimentos que regulamentam o reconhecimento dos filhos via extrajudicial. Vale ressaltar ainda, que, existem vários projetos pelos estados brasileiros, que realizam campanhas para obtenção do reconhecimento dos filhos. Diante dessa perspectiva, no Estado do Paraná foi instituído pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) alguns provimentos, o mais conhecido foi o “programa pai presente” que se refere ao reconhecimento espontâneo do filho via extrajudicial ou até mesmo do filho ou a mãe que queira indicar a paternidade. Neste ano, foi instituído o provimento 265 do CNJ que trata sobre o reconhecimento de paternidade/maternidade socioafetivo. Esse procedimento até então, veio para facilitar esse o reconhecimento afetivo e contribuir para um processo de desburocratização na vida das pessoas, que buscam tais recursos. Tendo a família socioafetiva um eixo hermenêutico no princípio da dignidade da pessoa humana, os valores da família contemporânea buscam base nos princípios constitucionais. Desse modo, considerando que somos um estado democrático de direito, o Estado tem o dever de garantir o respeito pelos direitos humanos e pelas garantias fundamentais, neste caso para esta formação familiar. No entanto se faz necessário esclarecer os requisitos exigidos para a aplicação, pois este reconhecimento socioafetivo gera direito e deveres entre as 11 partes, no que concerne ao direito ao nome, parentesco, direito a sucessão, a guarda e deveres como, por exemplo, a prestação alimentar. A presente monografia fundamenta-se na análise bibliográfica e jurisprudencial, está dividido em cinco capítulos e tem como objetivo apresentar a importância da divulgação de forma clara e objetiva das recentes conquistas no âmbito jurídico acerca da parentalidade socioafetiva, uma vez que essa nos dias atuais exerce características muito acentuadas na sociedade em geral. 12 2 A FAMÍLIA A família é um ramo do direito que está se renovando e se modificando com o decorrer dos anos. Em meados do século XX pouco importava se havia afeto ou felicidade, o matrimônio era o que constituía a família e o seu objetivo era a procriação. Neste sentido, tem-se o ensinamento de Maria Berenice Dias: A família tinha uma formação extensiva, verdadeira comunidade rural, integrada por todos os parentes, formando unidade de produção, com amplo incentivo à procriação. Era uma entidade patrimonializada, cujos membros representavam força de trabalho. O crescimento da família ensejava melhores condições de sobrevivência a todos. O núcleo familiar dispunha de perfil hierarquizado e patriarcal. (DIAS, 2015. p. 30). Diante disso, a família para ser reconhecida e ter a aceitação social, tinha que ser moldada pelo modelo familiar único que era representado pelo casamento indissolúvel. Naquela época o homem é que tinha o poder supremo e provia a segurança e a proteção da família, sendo a mulher submissa, pois ele era o principal titular do pátrio poder. Nos dias atuais o cenário modificou, tendo essas características sofrido alterações significantes na sociedade. A moldura predefinida de família já não existe mais, uma vez que a constituição familiar está se dando de formas variadas. Para Maria Berenice Dias: “as mais diversas conformações de convívio passaram a ser aceita pela sociedade, tal revela a liberdade dos sujeitos de constituírem a família da forma que lhes convier, no espaço de sua liberdade”. (DIAS, 2015, p.35). Sendo assim, hoje a família pode ser composta por laços sanguíneos ou pelo afeto, é onde o indivíduo encontra-se feliz e satisfeito, pois lhe é garantido por lei livre arbítrio de viver como melhor lhe convier. Portanto, a ideia de família precisa ser construída a partir dos valores existentes no indivíduo e na sociedade, de modo a preservar o afeto, amor, carinho, companheirismo, cumplicidade, respeito, enfim, pilares para uma família sólida e promissora. 13 2.1 Evolução legislativa do direito de família As leis que regulam as relações da família passaram por alterações legislativas substanciais no decorrer dos anos até os dias atuais, as mudanças culturais e sociais de cada indivíduo contribuíram para formação de novos modelos de família. O Código Civil de 1916, retratou uma época em que a família era conhecida por ser hierarquizada e patrimonialista, e só era constituída se fosse pelo matrimônio, tendo como requisito para o casamento a virgindade da mulher. Desse modo, a mulher tinha total dependência do homem, pois, para praticar qualquer ato, dependia da anuência do marido, ele que ditava as regras dentro do lar, sendo o único que trazia o sustento para a casa. No Código civil anterior, os Capítulos II, III e IV, tratavam dos modos de reconhecimento dos filhos, que eram identificados como legítimos, ilegítimos e legitimados. Insta esclarecer que, existia essa diferença porque os filhos legítimos eram os filhos gerados na constância do casamento, os ilegítimos concebidos fora do casamento estes se classificavam em naturais e espúrios, e por último os legitimadoseram os filhos que só poderiam ser reconhecidos em situações especificas, sendo que o filho jamais poderia reivindicar a paternidade em juízo. (BRASIL, 1916). Diante disso, houve um grande processo de transformação, a Constituição Federal de 1988 significou um marco no progresso da família, trazendo então proteção à família contemporânea. Nesse novo modelo de família e estado democrático de direito, houve importantes alterações no texto constitucional e nos textos legais abrindo horizontes aos institutos jurídicos da família. A CRFB estabeleceu a igualdade entre o homem e a mulher, conforme previsto no art.5º, I – “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição.” Neste sentido Maria Berenice Dias explica que: 14 Instaurou a igualdade entre o homem e a mulher e esgarçou o conceito de família, passando a proteger de forma igualitária todos os seus membros. Estendeu proteção à família constituída pelo casamento, bem como à união estável entre o homem e a mulher e à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, que recebeu o nome de família monoparental. (DIAS. 2015.p 29). E determinou o tratamento igualitário entre os filhos não importando sua origem, conforme artigo 227, §6 “Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.” Após a constituição estabelecer a igualdade de filiação, houve à substituição no Código Civil, do capítulo II de “Família legitima” para “Da filiação”, proibindo qualquer discriminação relativa à filiação ou hierarquia entre os tipos de filiação (art.1.596). Houve também, alteração no Capítulo do “Pátrio Poder” para o de “Poder Familiar”, a expressão pátrio poder, era utilizada porque no código anterior trazia a figura paterna com exclusividade, onde o pai é que tinha poder sobre seus filhos. (BRASIL, 2002). Diante disso, o novo Código Civil, tratou de modificar esses termos, devido à igualdade da filiação estabelecida na CRFB/88, desse modo, incluiu em seu texto a presunção de filhos (art. 1.597), bem como, os modos de reconhecimento dos filhos (art. 1.609), de modo que, se subdividiram em dois capítulos e excluiu os termos utilizados que os diferenciavam. (BRASIL, 2002). Neste sentido Maria Berenice Dias entende que: Talvez o grande ganho tenha sido excluir expressões e conceitos que causavam grande mal-estar e não mais podiam conviver com a nova estrutura jurídica e a moderna conformação ela sociedade. Foram sepultados dispositivos que já era letra morta e que retratavam ranços e preconceitos, como as referências desigualitárias entre o homem e a mulher, as adjetivações ela filiação, o regime datal etc. (DIAS, 2015, p.33). Assim, instituiu novos valores sociais, e impôs à valorização da pessoa humana. A família hoje tem como uma estrutura funcional que busca a proteção dos seus membros para melhor desenvolvimento e realização plena. Portanto, conclui-se que, a família esta se reinventando e se construindo de acordo com o momento e espaço, logo, seu conceito também estará naturalmente se renovando, visto que o afeto passou a ser considerado um sentimento que 15 vincula os membros mudando assim a função social da família. 2.2 Princípios norteadores do direito de família Os princípios regulam as relações jurídicas e tem como objetivo a interpretação de todas as normas em geral, pois, algumas regras não conseguem acompanhar a evolução social e por essa razão, é necessária uma interpretação para melhor aplicação do direito na sociedade. Esclarece Elda Maria Gonçalves Menezes apud Rodrigo da Cunha Pereira: Os princípios exercem uma função de otimização do Direito. Sua força deve pairar sobre toda a organização jurídica, inclusive preenchendo lacunas deixadas por outras normas, independentemente de serem positivados, ou não, isto é, expressos ou não expressos. Eles têm, também, uma função sistematizadora. (MENEZES, 2010 apud PEREIRA, 2004, p.34). Sendo assim, os princípios buscam sempre viabilizar o alcance da dignidade humana, exercem uma função de otimização do direito, diante disso, dentre os inúmeros princípios que existem, serão abordados neste trabalho os que são pertinentes ao tema. Desta forma, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, expressamente previsto no artigo 1º, III da Constituição vigente, é o princípio da dignidade da pessoa humana, sendo o mais universal de todos, considerado um superprincípio, uma vez que, conduz outros princípios como o da liberdade, cidadania, da busca da felicidade, entre outros. Ainda, pautado neste princípio, o art. 227 da CRFB, prescreve ser da família, da sociedade, do estado o dever de assegurar a criança e ao adolescente com absoluta prioridade o direito à vida, a saúde a educação, o lazer, a alimentação, a cultura, a dignidade, o respeito à liberdade e a convivência familiar e comunitária, pois são garantias mínimas de uma vida tutelada sobre o digno da dignidade da pessoa humana. (BRASIL, 1988). Assim Entende Matheus Antonio da Cunha apud Maria Berenice Dias: O princípio da dignidade humana não representa apenas um limite à atuação do Estado, mas constitui também um norte para a sua ação positiva. O Estado não tem apenas o dever de abster-se de praticar atos que atentem contra a dignidade humana, mas também deve promover essa dignidade através de condutas ativas, garantindo o mínimo existencial para 16 cada ser humano em seu território. (CUNHA, 2011.p.10 apud DIAS, 2009.p.62). Deste modo, inclui-se a idéia da busca pela felicidade, que tem fundamental importância para as famílias socioafetivas e a multiparentalidade, considerando que, o Estado tem do dever de garantir o mínimo existencial para estas famílias que estão se formando, pois seria indigno dar tratamento diferenciado as novas formações familiares. Neste sentido Rolf Madaleno leciona: O Direito de Família tem a sua estrutura de base no princípio absoluto da dignidade humana e deste modo promove a sua ligação com todas as outras normas ainda em vigorosa conexão com o direito familista, pois configurando um único sistema e um único propósito, que está em assegurar a comunhão plena de vida, e não só dos cônjuges, dos unidos estavelmente, mas de cada integrante da sociedade familiar. (MADALENO, 2015.p 81). Diante disto, sabe-se que a dignidade de cada indivíduo, só será atendida se respeitada for sua individualidade, o que não exige não só do direito, mas de toda sociedade. Desta forma, outro princípio importante é o da solidariedade familiar (art. 3º. I CRFB) a solidariedade implica na responsabilidade para com o outro, de modo que, devemos proteger às crianças, os adolescentes, os idosos e aos filhos. Acolhida pelo ordenamento jurídico atribui primeira a família, a sociedade e depois ao estado o dever de garantir com prioridade os direitos ao indivíduo em formação. (BRASIL, 1988). Desta forma Rolf Madaleno leciona: A solidariedade é princípio e oxigênio de todas as relações familiares e afetivas, porque esses vínculos só podem se sustentar e se desenvolver em ambiente recíproco de compreensão e cooperação, ajudando-se mutuamente sempre que se fizer necessário. (MADALENO, 2011, p.90). Assim, como menciona o autor, a solidariedade é o oxigênio das relações familiares, esse princípio é visto como o objetivo fundamental de construir uma sociedade livre, justa e solidária. O Princípio da diversidade Familiar e o do pluralismo das entidades familiares, estes princípios tem fundamentoem uma das grandes mudanças no 17 direito de família, e a proteção da família diversa da tradicional, como por exemplo: o reconhecimento da união estável e das relações homoafetivas como entidades familiares. Assim menciona Rolf Madaleno apud Rodrigo da Cunha Pereira: Podem existir várias outras entidades familiares além daquelas previstas na Carta Federal, porque “a família não se constitui apenas de pai, mãe e filho, mas é antes uma estruturação psíquica em que cada um dos seus membros ocupa um lugar, uma função, sem estarem necessariamente ligados biologicamente. (MADALENO, 2015 apud PEREIRA, 2004, p.68). Sendo assim, a democracia no direito de família, implica na liberdade de constituir qualquer família, garante ao indivíduo a escolha da entidade familiar que melhor lhe convier, e que qualquer que seja sua família terá a proteção estatal. Existe também, o princípio da Afetividade que, apesar de não estar explícito na constituição é interpretado como o princípio que rege todo o fundamento das relações familiares, pois se tornou um valor jurídico, o afeto, amor e carinho. Rolf Madaleno entende que: A afetividade deve estar presente nos vínculos de filiação e de parentesco, variando tão somente na sua intensidade e nas especificidades do caso concreto. Necessariamente os vínculos consanguíneos não se sobrepõem aos liames afetivos, podendo até ser afirmada a prevalência desses sobre aqueles. (MADALENO, 2015.p 124). Portanto, a afetividade é um dos principais elementos para o desenvolvimento humano, visto que, as novas concepções de família têm como base o afeto. Assim, destaca-se o trecho do acórdão do Superior Tribunal de Justiça: O que deve balizar o conceito de “família” é, sobretudo, o princípio da afetividade, que “fundamenta o direito de família na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia sobre as considerações de caráter patrimonial ou biológico. (STJ, REsp n. 945.283, Rio Grande do Norte. Rel. Luis Felipe Salomão, j. em 15/09/2009). Desta maneira, os casos da parentalidade, reconhecimento dos filhos socioafetivos e da multiparentalidade, tem como alicerce esse princípio que a cada dia está ganhando força na jurisprudência. Dentre esses princípios, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente tem grande destaque na família socioafetiva, seu amparo encontra-se 18 no artigo 227 da CRFB vigente, que proíbe a discriminação entre os filhos e presta prioridade absoluta ao direito à vida, saúde a educação, entre outras garantias e imputou á todos a responsabilidade por essas pessoas em fase de desenvolvimento. O artigo 227 CRFB/88 preceitua que: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988). Da mesma forma, a lei 8.069/1990 dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente e tem por objetivo proteger e assegurar os direitos fundamentais destas, mediante efetivação de políticas sociais. (BRASIL, 1990). A criança e o adolescente merecem total proteção, devendo ser observado o melhor interesse para ambos, todavia, essa definição do “melhor” só será possível quando houver averiguação no caso concreto. Sendo assim, a busca o melhor interesse, é aplicado também nos casos de guarda compartilhada, adoção e parentalidade socioafetiva, atendendo sempre com prioridade absoluta a eles, que tem a especial condição de pessoas em desenvolvimento. Outro princípio importante é o da função social da família, que preconiza sobre o funcionalismo de proporcionar o crescimento dos indivíduos e o desenvolvimento de seus integrantes, mediante valores dignos para uma convivência em sociedade. Neste sentido, esclarece Flavio Tartuce apud Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho: A principal função da família e a sua característica de meio para a realização dos nossos anseios e pretensões. Não é mais a família um fim em sim mesmo, conforme já afirmamos, mas, sim, o meio social para a busca de nossa felicidade na relação com o outro. (TARTUCE, 2017.p.30 apud GAGLIANO; FILHO, 2011. p. 98). Sendo assim, a função da família é buscar a felicidade, a realização do outro e essa função engloba toda a estrutura da família, que se caracteriza com a proteção de uns aos outros e fazer ao máximo o outro feliz. Destaca-se também, o Princípio da Igualdade (art. 5 caput) e Isonomia dos 19 Filhos (art. 227 §6), previsto na Constituição Federal, proíbe qualquer discriminação relativa aos filhos biológicos e adotivos no exercício do poder familiar e a igualdade no que diz respeito aos homens e mulheres na sociedade conjugal. (BRASIL, 1988). Todavia, estas proibições designatórias referem-se também ao respeito dos dados constantes no registro da criança, aqueles lavrados e arquivados nas serventias. Desse modo, o Código de Normas Extrajudicial no artigo 130, estabelece que o oficial ou registrador quando lavrar o registro, não poderá mencionar o estado civil dos pais e nem que o documento deriva de um processo de adoção/mandado judicial ou que nele conste reconhecimento de paternidade, isto, para não diferenciá- lo dos demais. (CGJ- Código de Normas Extrajudicial, 2013). Desta forma, Flavio Tartuce explica: Em suma, juridicamente, todos os filhos são iguais perante a lei, havidos ou não durante o casamento. Essa igualdade abrange também os filhos adotivos, os filhos socioafetivos e aqueles havidos por inseminação artificial heteróloga (com material genético de terceiro). Diante disso, não se pode mais utilizar as odiosas expressões filho adulterino ou filho incestuoso que são discriminatórias. Igualmente, não podem ser utilizadas, em hipótese alguma, as expressões filho espúrio ou filho bastardo, comuns em passado não tão remoto. Apenas para fins didáticos utiliza-se o termo filho havido fora do casamento, eis que, juridicamente, todos são iguais. Isso repercute tanto no campo patrimonial quanto no pessoal, não sendo admitida qualquer forma de distinção jurídica, sob as penas da lei. Trata-se, desse modo, na ótica familiar, da primeira e mais importante especialidade da isonomia constitucional. (TARTUCE, 2017, p. 23). Diante desta grande isonomia constitucional, homens e mulheres assumem mútuas funções, as mulheres deixaram de ser coadjuvantes e tornaram-se responsáveis tanto quanto os homens nas relações e decisões da família. E dentro deste novo cenário, um princípio fundamental é o da paternidade responsável e do Planejamento Familiar, princípios estes que, trazem o que prevêem no ordenamento jurídico, a obrigação dos pais com seus filhos, dar a melhor educação e criação possível. Daniel Ferreira Vinicius da Silva apud Rodrigo da Cunha Pereira faz o seguinte apontamento: Independente da convivência ou relacionamento dos pais, a eles cabe a responsabilidade pela criação e educação dos filhos, pois é inconcebível a ideia de que o divórcio ou termino da relação dos genitores acarrete o fim da convivência entre os filhos e seus pais. (SILVA, 2017, p.22 apud PEREIRA, 2012, p.246). 20 Desta forma, a paternidade responsável está atrelada ao dever de cuidado, não apenas no dever de prestação da assistência material, sendo assim, independentemente do estado civil dos pais, é necessário haver cuidado e a responsabilidade em relação aos filhos.Diante disso, a Constituição Federal dispõe no artigo 226 §7 sobre esse princípio: Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. (BRASIL, 1988). Em suma, o princípio do planejamento familiar é também regulado pela lei, 9.263/1996, é um dos mais importantes para a socioafetividade, visto que, é livre a decisão do casal na escolha entre ter ou não filhos. 2.3 Entidades familiares Com o surgimento de novas entidades familiares, a CRFB passou a reconhecer, por exemplo: a união estável entre o homem e a mulher (art. 226, §3), a família monoparental (art.226, §4) que é aquela constituída por pais ou qualquer deles e seus filhos, visto que, essas são as entidades explícitas na constituição federal. (BRASIL, 1988). Ademais, na busca pela realização pessoal calcada no afeto e igualdade, foram nascendo novas formações familiares e todas com suas necessidades e particularidades. Importante salientar que existem as entidades implícitas na Constituição, uma delas é a família homoafetiva formada por pessoas do mesmo sexo, no entanto, é implícita, mas, a constituição em seu artigo 5° caput, proibiu a distinção de pessoas do mesmo sexo. (BRASIL, 1988). Em relação ao artigo 226 §3, Maria Berenice Dias se posiciona: Só pode ser por preconceito que a Constituição emprestou, de modo expresso, juridicidade somente às uniões estáveis entre um homem e uma mulher. Ora, a nenhuma espécie de vínculo que tenha por base o afeto pode-se deixar de conferir status de família, merecedora da proteção do 21 Estado, pois a Constituição (l. º III) consagra, em norma pétrea, o respeito à dignidade da pessoa humana. (DIAS, 2015.p. 134). Acerca disso, diante de inúmeras decisões judiciais atribuindo a concepção da família homoafetiva, o STF decidiu reconhecê-la como união estável (ADI 4277- DF ano 2011), em seguida, a justiça passou admitir a conversão da união estável em casamento. Vejamos a ementa: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). PERDA PARCIAL DE OBJETO. RECEBIMENTO, NA PARTE REMANESCENTE, COMO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNIÃO HOMOAFETIVA E SEU RECONHECIMENTO COMO INSTITUTO JURÍDICO. CONVERGÊNCIA DE OBJETOS ENTRE AÇÕES DE NATUREZA ABSTRATA. JULGAMENTO CONJUNTO. Encampação dos fundamentos da ADPF nº 132-RJ pela ADI nº 4.277-DF, com a finalidade de conferir “interpretação conforme à Constituição” ao art. 1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação. 2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SÓCIO- POLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA. CLÁUSULA PÉTREA. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de “promover o bem de todos”. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana “norma geral negativa”, segundo a qual “o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido”. Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da “dignidade da pessoa humana”: direito a auto-estima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea. 3. TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE QUE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO “FAMÍLIA” NENHUM SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA. A FAMÍLIA COMO CATEGORIA SÓCIO-CULTURAL E PRINCÍPIO ESPIRITUAL. DIREITO SUBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO NÃO-REDUCIONISTA. O caput do art. 226 confere à família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão “família”, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade 22 cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por “intimidade e vida privada” (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação não-reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da Constituição Federal de 1988 no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sócio-político-cultural. Competência do Supremo Tribunal Federal para manter, interpretativamente, o Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da coerência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual das pessoas. 4. UNIÃO ESTÁVEL. NORMAÇÃO CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA. FOCADO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER RELAÇÕES JURÍDICAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS DO GÊNERO HUMANO. IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE “ENTIDADE FAMILIAR” E “FAMÍLIA”. A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no § 3º do seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de não se perder a menor oportunidade para favorecer relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros. Impossibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969. Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu parágrafo terceiro. Dispositivo que, ao utilizar da terminologia “entidade familiar”, não pretendeu diferenciá-la da “família”. Inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado “entidade familiar” como sinônimo perfeito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub judice. Inexistênciado direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não-equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do § 2º do art. 5º da Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem “do regime e dos princípios por ela adotados”, verbis: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. 5. DIVERGÊNCIAS LATERAIS QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. Anotação de que os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar Peluso convergiram no particular entendimento da impossibilidade de ortodoxo enquadramento da união homoafetiva nas espécies de família constitucionalmente estabelecidas. Sem embargo, reconheceram a união entre parceiros do mesmo sexo como uma nova forma de entidade familiar. Matéria aberta à conformação legislativa, sem prejuízo do reconhecimento da imediata auto-aplicabilidade da Constituição. 6. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL EM CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL (TÉCNICA DA “INTERPRETAÇÃO CONFORME”). RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES. Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização 23 da técnica de “interpretação conforme à Constituição”. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva. (STF - ADI: 4277 DF, Relator: Min. AYRES BRITTO, Data de Julgamento: 05/05/2011, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-198 DIVULG 13-10-2011 PUBLIC 14-10-2011 EMENT VOL-02607-03 PP-00341). Desta maneira, após o reconhecimento do STF o Conselho Nacional de Justiça admitiu por meio da resolução 175, de 14 de maio de 2013, a habilitação do casamento de pessoas do mesmo sexo, sem mesmo precisar da união estável podendo habilitar diretamente no registro civil. (CNJ, Resolução, 2013). Portanto, pode se constatar que o direito de família está se modificando, e é imprescindível a proteção do Estado às novas constituições familiares, de modo que garanta os direitos e garantias fundamentais previstas na CRFB. 2.4 Concepção moderna da família Diante dos avanços e transformações observados, atualmente não existem apenas as famílias tradicionais, com as variáveis mudanças entre os indivíduos e as novas instituições familiares, a família deixou de ser patriarcal e está moldada pela afetividade. Sendo assim, a manutenção da família atual busca a felicidade, visto que, hoje não é mais necessário manter uma família apenas por tradição ou que desempenha funções procriativas e religiosas. Neste sentido, Maria Berenice Dias leciona: A família, apesar do que muitos dizem, não está em decadência. Ao contrário, houve a repersonalização das relações familiares na busca pelo atendimento aos interesses mais valiosos das pessoas humanas: afeto, solidariedade, lealdade, confiança, respeito e amor. (DIAS, 2015. p.34). É visto que, a família ganha características e responsabilidades diferentes, e não a dúvidas que a repersonalização nos núcleos familiares ocasionaram transformações na própria sociedade. Dentre todas as formas de concepção familiar, a primeira família constituída foi à matrimonial, família esta, derivada do direito romano conhecida também como família natural, foi adaptada assim pela igreja católica. (CUNHA, 2010.p.12). 24 Diante disso, começaram gradualmente a surgir famílias informais que são as decorrentes de união estável, as homoafetivas formadas por pessoas do mesmo sexo, as famílias monoparentais que se formam pelo vínculo de um dos genitores com seus filhos. Logo ademais, a família eudemonista que, refere-se à busca da realização plena, configurando o afeto recíproco e respeito mútuo entre os membros, que se compõe independentemente do vínculo biológico, pois o que importa é a felicidade e a realização pessoal. Enfim, a família anaparental aquela decorrente da convivência entre parentes e entre outras pessoas, as famílias recompostas e as socioafetivas são as que se enquadram nos casos da multiparentalidade, pois, muitas vezes as famílias se reconstituem e passam a formar outras famílias que se estabelecem pelo afeto e muitas vezes buscam a permanência do laço biológico com o afetivo. (BARONI, 2016.p.3). Neste Sentido a ANADEP publicou uma notícia referente a essa realidade social, nesse caso da família socioafetiva com reconhecimento da dupla paternidade. Vejamos: MS: ACORDO EXTRAJUDICIAL GARANTE SOBRENOME DE PAIS BIOLÓGICO E AFETIVO EM REGISTRO CIVIL - FONTE: ASCOM/DPE-MS ESTADO: MS Nos últimos anos a Defensoria Pública tem conseguido na Justiça garantir que os sobrenomes de pais biológico e afetivo sejam inseridos no registro civil. Desta vez, nem foi preciso entrar com uma ação. Um acordo extrajudicial, intermediado pela Defensoria, deu a uma menina de quatro anos de idade o direito ao reconhecimento da dupla paternidade. O acordo foi proposto pelo defensor público substituto Giuliano Stefan Ramalho de Sena Rosa, que atua no município de Pedro Gomes, a 260 quilômetros da Capital, após ser procurado pela mãe e o pai biológico da criança. Eles tinham dúvida quanto a paternidade e por isso realizaram o exame de DNA, que deu positivo. No entanto, a menina já tinha em seu registro civil o nome do pai afetivo, com quem a mãe conviveu na época do nascimento da criança. Apesar do resulto do exame, segundo a família nada influenciou no relacionamento de pai (afetivo) e filha. Por isso, a Defensoria realizou reuniões com os pais e a mãe que demonstraram ter bom relacionamento. Diante disso, o defensor oficiou ao Cartório de Registro Civil para obter o reconhecimento da dupla paternidade. Depois de algumas reuniões, o acordo foi feito e os dois pais foram reconhecidos e passaram a ter responsabilidades em relação à filha. (Fonte: ANADEP, 2017). Neste vértice, para uma definição contemporânea de família, a lei 11.340/2006, conhecida como lei Maria da penha dispõe em seu artigo 5°, II que, “a família é compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se 25 consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa”. (BRASIL, 2006). Portanto, conclui-se que, o rol que contém na Constituição Federal é exemplificativo, podendo assim existir outras manifestações familiares além daquelas expressas em seu texto. 26 3 PARENTESCO E FILIAÇÃO As relações de parentesco são vínculos de afinidade e de consanguinidade que ligam as pessoas no seio familiar. Assim estabelece o artigo 1.593 do Código Civil que “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.” (BRASIL, 2002). Rolf Madaleno conceitua o parentesco como: São parentes as pessoas que descendem umas das outras ou de um tronco comum, e, no caso da afinidade, o que aproxima cada um dos cônjuges dos parentes do outro, e também há vínculo de parentesco na relação estabelecida por ficção jurídica entre o adotado e o adotante, subdividindo- se o parentesco em: a) consanguíneo ou natural, quando as afinidades decorrem das relações de sangue; b) por afinidade, quando resultante dos vínculos de casamento ou da união estável, onde o elo se forma entre um componente da entidade familiar e os familiares dooutro parceiro e, por fim; c) o parentesco civil emanado dos vínculos de adoção. (MADALENO, 2015, p.536). Desta forma, o parentesco é a relação que une duas ou mais pessoas por vínculos de sangue, que são os descendentes e ascendentes ou por vínculos de afinidade que se constituem pelo casamento ou adoção. (Art. 1.591 a 1.595 CC). Assim ensina Maria Berenice Dias: As distinções entre parentesco em linha reta, em linha colateral e por afinidade são de duas ordens. Os parentes em linha reta descendem uns dos outros. São parentes na linha colateral quem tem um ascendente comum. O parentesco em linha reta é ilimitado e, na linha colateral, limita-se ao quarto grau, ao menos para efeitos jurídicos. Os vínculos em linha reta são perpétuos - quer decorram de parentesco, quer de afinidade -, não se extinguindo nem quando findo o casamento ou a união estável (CC 1. 595 § 2. º). Quanto à linha colateral, se a relação é por consanguinidade, o parentesco se estende até o quarto grau. Em se tratando de afinidade, o limite é o segundo grau. Ambos terminam quando finda o relacionamento. (DIAS, 2015.p. 376). Por se tratar de um vinculo jurídico, atende o critério da proximidade, pois conforme for à proximidade a lei estabelece deveres e direitos entre elas. Segundo Carlos Roberto Gonçalves, (2014. p.320 apud MONTEIRO, 1995.p.305): “Todas as regras de parentesco consangüíneo se estruturam a partir da noção de filiação, pois a mais próxima, a mais importante, a principal relação de parentesco é a que se estabelece entre pais e filhos.” Sendo assim, a filiação é uma relação de parentesco consanguíneo ou não 27 mais valoroso no âmbito familiar, atualmente devido à equiparação constitucional a classificação entre os filhos, que eram identificados como legítimos e ilegítimos não é mais utilizada, sendo que, hoje é empregada a todos a chamada filiação. Assim menciona Lívia Ronconi Costa apud Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald: A liberdade de cada pessoa de efetivar a filiação pode ser realizada através de mecanismos biológicos (através de relacionamentos sexuais, estáveis ou não), da adoção (por decisão judicial), da fertilização medicamente assistida ou por meio do estabelecimento afetivo puro e simples da condição paternofilial. Seja qual for o método escolhido, não haverá qualquer efeito diferenciado para o tratamento jurídico (pessoal e patrimonial) do filho. (COSTA, 2012, p.01 apud ROSENVALD, 2010. p.564). Desse modo, diante dessa liberdade de escolha, as relações familiares de origem biológica ou afetiva, por fecundações artificiais, adoção ou de reconhecimento socioafetivo, todos são filhos não havendo qualquer tratamento diferenciado entre eles. 3.1 Presunções de paternidade O critério jurídico legal é pautado na confiança do casamento, o qual tem a paternidade por meio de presunções, pois, independente de verdade biológica a regra derivada do direito romano que prevaleceu durante muito tempo é que a maternidade será sempre certa (mater semper certa) e o marido é o pai de seus filhos, sendo essa presunção conhecida como “pater is est quem nuptiae demonstrant”. (VENCELAU, 2010.p.21). Desse modo, naquela época a presunção era absoluta, sendo assim a tradução desse critério é que: pai é aquele que as núpcias demonstram, e qualquer que seja a origem o filho é do marido, até porque adultério era crime na época dessa expressão latina. Desta maneira entende Rolf Madaleno: E mesmo assim, é só no casamento que prevalece a presunção de paternidade pelo princípio do pater is est quem nuptias demonstrant (CC, art. 1.597), criada sobre um cálculo de probabilidades, capaz de ceder ante a realidade delegada ao marido de contestar livremente o vínculo de filiação e provar não ser ele o pai. Trata-se de uma presunção legal de direito, iuris tantum ou relativa, porque admite prova em contrário. (MADALENO, 2015, p 614). 28 De fato, tal presunção é consagrada no Código Civil no artigo 1.597 no inciso I - presumem-se os filhos havidos na constância do casamento após 180 dias do casamento, também no mesmo artigo, mas no inciso II os filhos ainda que os pais tiverem até 300 dias após a dissolução conjugal. (BRASIL, 2002). Diante disso, Maria Berenice Dias enfatiza: Mas o que a lei presume, ele fato, nem é o estado de filiação, é a fidelidade ela esposa ao seu marido. “Com base no “dever” de fidelidade da mulher, e não na sua fidelidade” efetiva “, é que se formou a regra pater est. Presumida a fidelidade da mulher, a paternidade torna-se certa. Com isso regula-se a geração de sucessores. Há justificativas históricas para essa certeza. A mulher era obrigada a casar virgem, não podia trabalhar, ficava confinada no lar cuidando do marido, a quem devia respeito e obediência. Claro que os seus filhos só podiam ser filhos do marido. (DIAS, 2015, p.390). Desta forma, com o uso expressão latina referida acima, muito usada pelos antigos e a lei de fato, imputa a paternidade jurídica presumida, pois não presumi apenas a filiação, mas a fidelidade da esposa ao marido. Todavia, a lei não estende a presunção de paternidade à união estável que são as relações extramatrimoniais, motivado pela ausência de registro oficial e a não alteração do estado civil, pois, o artigo corresponde à presunção aos concebidos na constância do casamento. Neste sentido, Maria Berenice Dias faz seu apontamento: A diferenciação é de todo desarrazoada. Se a presunção é de contato sexual exclusivo durante o casamento, esta mesma presunção existe na união estável. Cabe um exemplo. Falecendo o genitor durante a gravidez, ou antes, de ter registrado o filho, esse teria de intentar ação declaratória de paternidade. A ação precisaria ser proposta pelo filho representado pela mãe e, no polo passivo, teria de figurar sua mãe, na condição de representante da sucessão. A saída seria nomear um curador ao autor para iniciar uma demanda que pode durar anos. Enquanto isso, o filho ficaria sem identidade. Claro que a melhor solução é admitir a presunção da filiação também na união estável. Assim, ainda que a referência legal seja à constância do casamento, a presunção de filiação, de paternidade e de maternidade deve aplicar-se à união estável. (DIAS, 2015.p 390). Nesta mesma linha Rolf Madaleno aponta que: Não pode existir para o instituto da união estável uma proteção diferente daquela outorgada ao matrimônio, em cuja instituição a lei presume ser a prole originária do casamento, especialmente quando em seu resultado final discrimina os filhos. Também na estável convivência deve prevalecer esta 29 mesma presunção de paternidade, haja vista que a presunção de os filhos serem fruto do matrimônio não advém exatamente da instituição “casamento”, mas, decorre sim, da coabitação dos cônjuges, tanto que a paternidade pode ser elidida pelo marido, se ele provar, por exemplo, ausência de coabitação. A convivência sob o mesmo teto é elemento secundário no dever de coabitação, posto que sua principal função está na prestação sexual, para permitir a satisfação do débito conjugal. O dever coabitacional não é diferente na união estável, como dever implícito de convivência pública, constante do artigo 1.723 do Código Civil. Induvidoso, portanto, que a coabitação dos cônjuges é a primeira presunção de fato da Lei e esta mesma coabitação serve como presunção para a união estável, e presunção de que os filhos decorrem desta pública convivência, podendo também a companheira que deu à luz, no ato do registro da perfilhação, atribuir ao seu companheiro a paternidade do filho que pariu. (MADALENO, 2015.p. 615). Portanto diante desta grande diferenciaçãoentre união estável e casamento, hoje apenas pais casados têm o direito registrar seu filho sozinho, respeitando o prazo estabelecido para ter o direito de registrar em nome de ambos, podendo apenas apresentar a certidão de casamento e incidirá a presunção legal. Assim sendo, com a evolução da sociedade e da ciência, o Código Civil dispõe sobre os filhos havidos por inseminação artificial, fecundação artificial homologa inseminação artificial heteróloga, fertilização in vitro ou proveta, visto que, nem sempre a filiação decorre de ato sexual podendo decorrer de intervenção médica. Conforme prescreve o artigo 1.597, do Código Civil: Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal; II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga; V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido. (BRASIL, 2002). Portanto, a presunção que o Código estabelece é com base na probabilidade, é aquela que o casamento demonstra, ou seja, que o filho gerado é do marido, até que ele mesmo prove ao contrário, e nos demais incisos a garantia ao feto da presunção nos casos de fecundação por intervenção médica, quando o genitor falece ou se divorcia da genitora antes do nascimento. 30 3.2 Modos de reconhecimento dos filhos O reconhecimento dos filhos é um ato jurídico que, se reveste de características por ser um ato personalíssimo, porque somente os pais têm legitimidade, visto que, é um ato unilateral porque se perfaz com a declaração de vontade somente pela atuação de quem irá reconhecer na forma da lei. O ato de reconhecimento de filho é irrevogável, pois, uma vez praticado não pode ser desfeito, nem mesmo quando feito em testamento pelo falecido (art.1.610 CC), salvo se houver vício de vontade. (BRASIL, 2002). Desta maneira, existem dois modos de reconhecimento dos filhos, o voluntário e o judicial. 3.2.1 Reconhecimento voluntário O reconhecimento voluntário é decorrente da vontade do pai e da mãe que poderá ser feito diretamente ao Cartório de registro civil, conforme art.1.607, de maneira que, poderá ser procedido conjunta ou separadamente pelos pais. (BRASIL, 2002). Atualmente são quatro, os modos de reconhecimento, conforme estabelece o artigo 1.609 do Código Civil sobre as formas de reconhecimento voluntário: I. no registro de nascimento, II- por escritura pública feita em tabelionato de notas ou escrito particular, a ser arquivado no cartório, III- por testamento, o que se torna irrevogável, mesmo embora o testamento seja essencialmente revogável, não poderá sê-lo na parte em que o testador reconheceu o filho, IV- por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém. (BRASIL, 2002). Diante disso, o reconhecimento voluntário tem efeito erga omnes, e seu efeito é absoluto. Visto que, é um ato que se torna irrevogável (art. 1610 cc) e irretratável depois de formado. (BRASIL, 2002). Flavio Tartuce faz seu apontamento: Ainda com relação à análise do reconhecimento voluntário, trata-se de ato irrevogável, justamente porque envolve estado de pessoas. Pelo art. 1.610 do CC/2002, essa irrevogabilidade ocorre mesmo que o reconhecimento 31 seja feito por testamento, que, como se sabe, é ato revogável. O conteúdo pessoal ou existencial do testamento relativo ao reconhecimento de filho não pode ser atingido pela revogação do seu conteúdo patrimonial. O ato de reconhecimento de filhos é incondicional, não estando sujeito a condição (evento futuro e incerto). Também não pode estar sujeito a termo (evento futuro e certo). Nos dois casos, devem ser considerados sem efeito, ineficazes, somente a condição e o termo apostos no reconhecimento, aproveitando-se o restante do ato, o que é aplicação do princípio da conservação do negócio jurídico (art. 1.613 do CC). Em outras palavras, a condição e o termo, como elementos acidentais, não atingem a validade do ato referente ao reconhecimento. Vale o reconhecimento, sendo ineficazes os elementos acidentais apostos. (TARTUCE, 2017.p 273). Desse modo, é um ato pessoal dos genitores, não podendo outra pessoa fazer, apenas pessoas munidas de poderes especiais por meio de procuração ou instrumento particular para tal reconhecimento. (CNJ, Código de Normas Extrajudicial, 2013). Nesse sentido, Maria Berenice Dias entende que: O reconhecimento voluntário da paternidade independe da prova da origem genética. É um ato espontâneo, solene, público e incondicional. Como gera o estado de filiação, é irretratável e indisponível. Não pode estar sujeito a termo, sendo descabido o estabelecimento de qualquer condição (CC 1.613). É ato livre, pessoal, irrevogável e de eficácia erga omnes. Não é um negócio jurídico, é um ato jurídico stricto sensu. Assim, inadmissível arrependimento. Não pode, ainda, ser impugnado, a não ser na hipótese de erro ou falsidade do registro. O pai é livre para manifestar sua vontade, mas seus efeitos são os estabelecidos na lei. (DIAS, 2015, p 412). Ademais, é um ato jurídico que tem como característica a voluntariedade de manifestação de vontade, pois o reconhecimento voluntário tem natureza declaratória e jamais poderá ser feito mediante condição ou termo. Importante ressaltar que, para o reconhecimento de filho maior é necessário seu consentimento e, caso menor o mesmo poderá impugná-lo nos quatro anos que seguirem sua maioridade ou emancipação. (BRASIL, 2002). Portanto, além das formas previstas em lei, hoje existem provimentos que regulamentam os reconhecimentos de filiação de forma voluntária, o qual será abordado no decorrer do trabalho. 32 3.2.2 Reconhecimento judicial O reconhecimento do filho via judicial é um ato jurídico irrevogável, não podendo desconstituir o registro formalizado, podendo haver a anulabilidade, apenas se constatar vício de vontade. (BRASIL, 2002). É Caracterizada por uma ação investigatória imprescritível, conforme prevê o artigo 27 do ECA: O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça. (BRASIL, 1990). E, por se tratar de um direito personalíssimo e indisponível, a ação pode ser proposta a qualquer tempo, e os efeitos da sentença que declara a paternidade são os mesmos do reconhecimento voluntário e será ex tunc, ou seja, retroage a data do nascimento. Assim ensina Rolf Madaleno: Essa ação tem natureza declaratória, porque a decisão judicial não constitui a filiação biológica existente desde a concepção. O reconhecimento forçado da paternidade é uma ação de estado da pessoa, com o escopo de declarar a relação jurídica de filiação, considerada um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, não obstante todos estes conceitos estejam sendo relativizados pela doutrina e pela jurisprudência, a começar pela legitimidade extraordinária conferida ao Ministério Público, pela Lei n. 8.560/1992, para investigar em nome próprio, e não por representação do menor, a paternidade de quem só tem em seu assento de nascimento o estabelecimento da maternidade. (MADALENO,2015.p 626). Diante disso, a referida lei 8.560/1992 citada pelo autor, tratou de regular a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento, e criou o instituto da averiguação oficiosa de paternidade. (BRASIL, 1992). Neste sentido, Rolf Madaleno tem seu entendimento: A Lei n. 8.560/1992 não entra em rota de colisão com a codificação civil brasileira, mas antes uma e outra se complementam, porque a função precípua da lei de averiguação oficiosa da paternidade foi a de incentivar o pronto reconhecimento voluntário da perfilhação, e só num segundo momento impulsionar a ação judicial de investigação compulsória da 33 paternidade, inclusive com a legitimação processual ativa do Ministério Público. Isso porque muitos nascimentos terminavam registrados apenas em nome da mãe, omissa no ajuizamento da investigatória de paternidade, e assim agia pelos mais diferentes motivos, privando o filho do registro paterno e causando previsíveis traumas psicológicos, dificuldades e frustrações. (MADALENO, 2015.p. 616) No entanto, essa lei não teve seu objetivo alcançado, mas sua prática é reforçada pelos Provimentos 12/2010 e 16/2012 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)-PR, pois existe certa preocupação por parte do judiciário, em correr atrás de uma solução para a falta do pai, e ou da mãe do registro. 3.3 Comentários ao provimento 12/2010 e ao provimento 16/2012 do CNJ No Paraná existem provimentos que regulamentam o reconhecimento de filiação, tais provimentos, são criados por atos administrativos e estabelecem sobre reconhecimento do filho via extrajudicial, com intuito de desjudicializar e facilitar a vida de pessoas, garantindo para aqueles, o direito de ter sua filiação reconhecida. Desta forma, o Provimento 12/2010, foi instituído em razão de, que durante as inspeções realizadas em inúmeras varas e serviços extrajudiciais do País, a Corregedoria de Justiça observou que o número de averiguações de paternidade impostas pela lei 8.560/92, era insignificante. (CNJ, Provimento, 2010). Diante disso, o provimento dispõe em seu artigo 1°: Determina que seja remetido, em forma que preserve o sigilo, para cada uma das 27 Corregedorias Gerais dos Tribunais de Justiça, o CD (cadastros) com os nomes e endereços dos alunos que, naquela unidade da Federação, não possuem paternidade estabelecida, segundo os dados do Censo escolar. (CNJ, Provimento, 2010). Desta maneira, o art. 3° estabelece que, recebida a informação sobre os cadastros dos alunos sem a paternidade, o juiz competente notificará a mãe, para que compareça ao ofício/secretaria, para que, querendo, informes os dados do suposto pai, e, no caso de filho maior, ele que será notificado pessoalmente para que indique a paternidade. (CNJ, Provimento, 2010). A finalidade deste provimento é facilitar mães de filhos menores já registrados sem paternidade estabelecida, com intuito de sanar a lacuna e apontar os supostos pais e assim adotar providências já estabelecidas na lei n° 8.560/92. 34 Diante disso, observa-se que existe uma grande preocupação com os filhos que não tem a paternidade estabelecida no documento, desta maneira considera-se um passo inicial muito importante para incentivar o reconhecimento, pois mostra o quão importante é este ato de cidadania. Assim, com alentadores resultados do programa, e com o alto alcance social foi instituído o provimento 16/2012. O Provimento n° 16 de 17 de fevereiro de 2012 da Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ), tem a finalidade de facilitar o reconhecimento dos filhos já registrados sem a paternidade por meio de indicações, bem como, o reconhecimento espontâneo dos filhos no cartório, também com objetivo de aplicar as medidas adotadas pela lei 8.560/1992. Sendo assim, o provimento n° 16/2012, em uma das hipóteses, estabelece que as mães ou os filhos maiores possam indicar os supostos pais via extrajudicial, perante o cartório de registro civil, desta forma o oficial colherá as informações e assinatura da genitora ou do filho maior e assim colherá maior número possível de elementos para identificação do genitor. E assim, remetera o termo de reconhecimento ao magistrado competente que notificará o suposto pai para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída. (CNJ, Provimento, 2012). O provimento procurou dar mais efetividade à averiguação oficiosa, e tem como fulcro atender ao “Programa Pai Presente”. Assim determina na cartilha do CNJ sobre a investigação de paternidade oficiosa: De acordo com a Lei n. 8.560/1992, a investigação de paternidade oficiosa é o processo administrativo que envolve todas as etapas de apuração (conduzidas pelo juiz) das informações fornecidas pela mãe em relação ao suposto pai. Trata-se de um procedimento obrigatório, uma iniciativa do Estado que assegura a todos o direto à paternidade, mesmo que apenas em forma de documento, na certidão/registro de nascimento. (Fonte: CNJ, Notícia, 2014). É, uma etapa fundamental na garantia da cidadania plena dos brasileiros. O provimento já beneficiou várias famílias, primeiro por facilitar o reconhecimento e tornar menos burocrático para os pais e os filhos. Conforme Notícia do CNJ: 35 O programa Pai Presente, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), desde 2010 facilita o reconhecimento de paternidade no país e já possibilitou mais de 40 mil reconhecimentos espontâneos tardios, geralmente em mutirões realizados em escolas, sem necessidade de advogado e sem custos para o pai ou mãe. (Fonte: CNJ, Notícia, 2015). Assim sendo, aplica-se também aos pais que querem reconhecer seus filhos espontaneamente, é necessário comparecer ao registro civil, o pai e o filho maior, e quando filho menor de idade, o pai e a mãe, com os documentos necessários e declarar a paternidade, o oficial vai lavrar a declaração e fará os procedimentos previstos em lei e concluirá. (CNJ, Provimento, 2012). Neste sentido vejamos a notícia publicada na página do CNJ sobre a campanha do programa “pai presente”: A campanha busca orientar mães pais e filhos sobre a importância e a facilidade de realizar o registro, mesmo que tardiamente. Em fevereiro deste ano, a corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, publicou o Provimento 16, que facilitou o procedimento, permitindo às mães, cujos filhos não possuem o nome do pai na certidão de nascimento, recorrer a qualquer cartório de registro civil do país para dar entrada no pedido de reconhecimento de paternidade. O mesmo procedimento pode ser adotado pelo pai que desejar espontaneamente fazer o registro do seu filho. O procedimento é gratuito. (Fonte: CNJ, Notícia, 2012). Desse modo, dependendo da forma do reconhecimento, se o registro do filho for da mesma serventia que ocorreu o reconhecimento, poderá entregar a certidão de nascimento já constando o nome do pai, nome dos avos e o sobrenome do pai que o reconheceu. Todavia, se o registro for de outra serventia o oficial comunicará o ato do reconhecimento para que o oficial responsável faça a devida anotação do reconhecimento. A conclusão do procedimento dependerá da concordância desse filho, se maior, ou de sua mãe, caso o filho seja menor. (CNJ, Provimento, 2012). Portanto, esses provimentos e campanhas do conselho nacional de justiça, têm a finalidade de demostrar à importância do registro, para a vida e a formação dos filhos, sejam eles crianças, adolescentes ou maiores de 18 anos, de modo que, além do valor afetivo, o reconhecimento de filiação assegura aos filhos os direitos e garantias previstas na CRFB. 36 4 PARENTALIDADE SOCIOAFETIVA A parentalidadesocioafetiva é um novo modelo de família, a qual passa dar maior importância aos laços afetivos, o que, não necessariamente precisa ser de descendência genética ou civil, mas sendo fundamental o afeto. Rolf Madaleno conceitua a filiação socioafetiva como: É um vínculo de filiação construído pelo livre-desejo de atuar em interação entre pai, mãe e filho do coração, formando verdadeiros laços de afeto, nem sempre presentes na filiação biológica, até porque a filiação real não é a biológica, e sim cultural fruto dos vínculos e das relações de sentimento cultivados durante a convivência com a criança e o adolescente. (MADALENO, 2015, p.545). Nesse mesmo sentido, Caio Mario da Silva Pereira enfatiza: Os vínculos de afetividade projetam-se no campo jurídico como a essência das relações familiares. O afeto constitui a diferença especifica que define a entidade familiar. É o sentimento entre duas ou mais pessoas que se afeiçoam pelo convívio diuturno, em virtude de uma origem comum ou em razão de um destino comum que conjuga suas vidas tão intimamente, que as torna cônjuges quanto aos meios e aos fins de sua afeição até mesmo gerando efeitos patrimoniais, seja de patrimônio moral, seja de patrimônio econômico. (PEREIRA, 2014.p.35). É um vínculo de filiação construído pelo livre desejo, formando verdadeiros laços de afeto, onde existe o vínculo afetivo construído durante a convivência e a pessoa detém a posse de estado de filho. O Superior Tribunal de Justiça tem o posicionamento de que o ordenamento jurídico brasileiro acolhe sobre a parentalidade socioafetiva: RECURSO ESPECIAL - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL-FAMÍLIA - AÇÃO DECLARATÓRIA DE MATERNIDADE SOCIOAFETIVA- INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE EXTINGUIRAM O FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, SOB O FUNDAMENTO DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA AUTORA. CONDIÇÕES DA AÇÃO - TEORIA DA ASSERÇÃO -PEDIDO QUE NÃO ENCONTRE VEDAÇÃO NO ORDENAMENTO PÁTRIO - POSSIBILIDADE JURÍDICA VERIFICADA EM TESE -RECURSO ESPECIAL PROVIDO. Ação declaratória de maternidade ajuizada com base com os laços de afetividade desenvolvidos ao longo da vida (desde os dois dias de idade até o óbito da genitora) com a mãe socioafetiva, visando ao reconhecimento do vínculo de afeto e da maternidade, com a consequente alteração do registro civil de nascimento da autora. 1. O Tribunal de origem julgou antecipadamente a lide, extinguindo o feito, sem resolução do mérito, por ausência de uma das condições da ação, qual seja a possibilidade jurídica do pedido. 1.1. No exame das condições da 37 ação, considera-se juridicamente impossível o pedido, quando este for manifestamente inadmissível, em abstrato, pelo ordenamento jurídico. Para se falar em impossibilidade jurídica do pedido, como condição da ação, deve haver vedação legal expressa ao pleito da autora. 2. Não há óbice legal ao pedido de reconhecimento de maternidade com base na socioafetividade. O ordenamento jurídico brasileiro tem reconhecido as relações socioafetivas quando se trata de estado de filiação. 2.1. A discussão relacionada à admissibilidade da maternidade socioafetiva, por diversas vezes, chegou à apreciação desta Corte, oportunidade em que restou demonstrado ser o pedido juridicamente possível e, portanto, passível de análise pelo Poder Judiciário, quando proposto o debate pelos litigantes. 3. In casu, procede à alegada ofensa ao disposto no inciso VI do artigo 267 do Código de Processo Civil e ao artigo 1.593 do Código Civil, visto que o Tribunal de origem considerou ausente uma das condições da ação (possibilidade jurídica do pedido), quando, na verdade, o pedido constante da inicial é plenamente possível, impondo-se a determinação de prosseguimento da demanda. 4. Recurso especial PROVIDO, para, reconhecendo a possibilidade jurídica do pedido, determinando-se o retorno dos autos à instância de origem, de modo a viabilizar a constituição da relação jurídica processual e instrução probatória, tal como requerido pela parte." (Superior Tribunal de Justiça- REsp 1291357/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 20/10/2015, DJe 26/10/2015). No caso em tela, a mãe socioafetiva conviveu com a criança desde seus dois anos de idade, após o falecimento de sua mãe biológica e depois de um tempo a mãe socioafetiva buscou o reconhecimento do vínculo entre elas, a decisão deu provimento ao reconhecimento à filiação afetiva, configurando assim a múltipla filiação registral. Sendo assim, pode-se constatar que o ordenamento jurídico tem reconhecido as relações socioafetivas mesmo não tendo óbice legal, pois a socioafetividade tornou-se um valor jurídico, e é uma realidade na sociedade atual. 4.1 Conceito A parentalidade socioafetiva é a filiação ligada no afeto entre seus membros, é caracterizada pelo vínculo afetivo, podendo ser exercida a paternidade e a maternidade em prol dos filhos independentemente da ascendência biológica. Desta forma, a parentalidade constitui uma modalidade de parentesco civil, conforme preceitua o enunciado 256 do Conselho da Justiça Federal: “A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil”. (CJF, Enunciado, 2013). Diante disso, às denominações de filiação, paternidade e maternidade sociofetiva, decorrem do reconhecimento do estado de filho. 38 Assim, menciona Paulo Luiz Netto Lobo: A posse do estado de filiação constitui-se quando alguém assume o papel de filho em face daquele ou daqueles que assumem os papéis ou lugares de pai ou mãe ou de pais, tendo ou não entre si vínculos biológicos. A posse de estado é a exteriorização da convivência familiar e da afetividade (…). Na experiência brasileira, configuram posse de estado de filiação a adoção de fato, em que muitas vezes se converte a guarda, os filhos de criação e a chamada ‘adoção à brasileira. (LOBO, 2004.p.49). Desse modo, pode ser conceituada como o vínculo de parentesco civil entre duas ou mais pessoas que não possuem entre si o vínculo biológico, sendo o afeto e amor um sentimento forte entre elas, e assim vivem como se parentes fossem, pois detém a posse de estado de filho. Portanto, conclui-se que, a parentalidade socioafetiva é a posse do estado de filho, formado através dos laços criados no âmbito familiar onde existe o afeto recíproco e o indivíduo molda a sua personalidade e suas aptidões. 4.2 Requisitos da socioafetividade Ao tratar de filiação temos a fonte jurídica da paternidade e/ou maternidade que se divide em três: a presumida, que é aquela que o Código Civil dispõe no art. 1.597 CC, a biológica, formada por laços sanguíneos que se comprava com exames de DNA e por ultimo a afetiva, que é construída com o tempo (1.593 CC). Para esta última, um dos requisitos é a existência de afeto recíproco entre os membros no seio familiar, tanto que tem tribunais que não reconhecem a filiação pela inexistência de vínculo afetivo. Assim é o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais: Ação negatória de paternidade. Pedido de anulação de registro de nascimento e de extinção de obrigação alimentar. Paternidade reconhecida em ação anterior de investigação de paternidade. Exame de DNA. Paternidade afastada. Paternidade socioafetiva. Não comprovação. Relativização da coisa julgada. Recurso provido. Procedência da ação. Embora a paternidade que se pretende desconstituir tenha sido reconhecida e homologada em ação de investigação de paternidade anterior, in casu, impõe-se a relativização da coisa julgada, considerando que àquela época não se realizou o exame de DNA, o que somente veio a ser feito nestes autos, anos depois, concluindo-se pela
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