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MODERNIZAÇAO DA AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

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4º ENCONTRO NACIONAL DE GRUPOS DE PESQUISA – ENGRUP, São Paulo, pp. 370-392, 2008. 
 
 
MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL 
AGRIUCULTURAL MODERNIZATION AND TERRITORIAL DEVELOPMENT 
 
Antonio Nivaldo Hespanhol 
Faculdade de Ciências e Tecnologia – UNESP – Presidente Prudente 
nivaldo@fct.unesp.br 
Resumo 
O pacote tecnológico da “Revolução Verde” foi difundido no mundo a partir dos anos 
1950 e derivou diretamente do modelo de desenvolvimento produtivista predominante 
até o final dos anos 1970. A produção e a produtividade agrícolas se expandiram 
significativamente. No entanto, os efeitos ambientais e sociais da “Revolução Verde” 
foram muito negativos e provocaram a valorização de perspectivas de desenvolvimento 
ascendentes, tais como a abordagem territorial, a qual se tornou expressiva a partir dos 
anos 1990. 
Palavras-chave: Modernização, desenvolvimento, rural, participação. 
 
Abstract 
The “Green Revolution” technological package was spread out in the world from years 
1950. It was derived from the development model that predominated until the end of 
years 1970. The agricultural production and the productivity had expanded significantly. 
However, the environmental and social effects of the “Green Revolution” were too much 
negative and had induced the valorization of ascending development perspectives, such 
as the territorial approach, which became expressive from years 1990. 
 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
371 
37
1. INTRODUÇÃO 
Após a II Guerra Mundial o pacote tecnológico da chamada “Revolução Verde” 
foi difundido no mundo, atingindo, inclusive alguns países subdesenvolvidos. A 
modernização da agricultura esteve associada ao modelo de desenvolvimento 
produtivista que passou a ser contestado nos anos 1970 e 1980, dando margem ao 
surgimento de novas abordagens de desenvolvimento. 
A abordagem do desenvolvimento territorial ganhou força nos países 
desenvolvidos a partir dos anos 1990. Por meio de tal abordagem tem se procurado 
valorizar as potencialidades locais, a diversidade, o meio ambiente, bem como envolver 
os atores sociais nos projetos de desenvolvimento. 
No presente texto se procurará estabelecer relações entre modernização da 
agricultura e desenvolvimento territorial, com o intuito de responder a três questões: 1) 
A agricultura moderna, associada ao modelo produtivista, perdeu a hegemonia? 2) A 
estratégia do desenvolvimento territorial é protagonista ou coadjuvante nas políticas 
públicas? 3) Como a estratégia do desenvolvimento territorial vem sendo introduzida 
nas políticas públicas brasileiras? 
 
2. MODELO PRODUTIVISTA DE DESENVOLVIMENTO E MODERNIZAÇÃO 
DA AGRICULTURA 
Entre o final da II Guerra Mundial e os primeiros anos da década de 1970, a 
economia mundial apresentou grande expansão. Foram efetuados significativos 
investimentos em atividades produtivas, não somente nos países desenvolvidos, mas 
também em países subdesenvolvidos. No referido período, os conhecimentos da 
ciência e da tecnologia passaram a ser aplicados diretamente aos processos 
produtivos de todos os setores, inclusive da agropecuária, conforme salienta Santos 
(1985). 
A modernização da agricultura ocorrida em vários países derivou deste 
movimento expansionista caracterizado pelo expressivo crescimento econômico e pelo 
grande avanço tecnológico. Foi sob este modelo econômico que a União Européia, os 
Estados Unidos e muitos outros países, inclusive subdesenvolvidos, promoveram 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
372 
alterações na sua base técnica de produção e ampliaram a oferta de alimentos e 
matérias-primas. 
Graças à modernização da agricultura e ao estabelecimento da Política Agrícola 
Comum (PAC), alguns países europeus que apresentavam forte dependência da 
importação de alimentos, não somente se tornaram auto-suficientes, como se 
converteram em exportadores líquidos de produtos agrícolas a partir dos anos 1980. 
Os EUA, o Canadá, a Austrália, o Brasil, a Argentina, o México e muitos outros países, 
expandiram significativamente a produção agropecuária em decorrência da adoção do 
pacote tecnológico da “Revolução Verde”. 
Apesar do aparente sucesso da modernização da agricultura, o passivo 
ambiental dela decorrente é muito grande. A expansão de monoculturas e o uso 
indiscriminado de máquinas, implementos, fertilizantes químicos e de biocidas 
comprometeram a qualidade ambiental de vastas áreas dos países desenvolvidos e 
subdesenvolvidos. 
Nos países mais avançados da União Européia (França, Alemanha, Holanda, 
Bélgica, entre outros), as críticas aos efeitos ambientais negativos decorrentes da 
produção agrícola intensiva, emergiram nas décadas de 1960 e 1970 e ganharam 
amplitude e repercussão em outros países, a partir dos anos 1980. 
A perda da qualidade ambiental, os problemas sanitários como a encefalopatia 
espungiforme bovina (mal da vaca louca), a incidência da febre aftosa e a 
contaminação de frangos, evidenciaram a insuficiência da gestão da qualidade e da 
segurança dos alimentos gerados pela agricultura moderna e processados pelas 
agroindústrias de grande porte (DELORME, 2004). 
Diante de tal quadro, os alimentos produzidos sem a aplicação de biocidas e o 
processamento artesanal têm sido valorizados pelos consumidores dos países 
desenvolvidos, bem como pela população de média e alta renda dos países 
subdesenvolvidos. 
Cada vez mais se passou a reconhecer que o modelo produtivista, próprio do 
modelo no qual se insere a agricultura moderna, não proporcionou a superação da 
pobreza das zonas rurais, nem proporcionou a melhoria da qualidade de vida das suas 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
373 
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populações. A agricultura moderna também não levou a superação do problema da 
fome no planeta, apesar de ter havido a ampliação da oferta de alimentos, os 
problemas relacionados à sua distribuição perduraram e até se agravaram. 
As preocupações ambientais e sanitárias em relação à agricultura intensiva 
redundaram em alterações nas políticas agrícolas, principalmente nos Estados Unidos 
da América (EUA) e na União Européia. O emprego indiscriminado de sistemas 
intensivos de produção passou a ser combatido por meio de reformulações nas 
políticas agrícolas. 
Nos EUA foi criado, no ano de 1984, o Low-Input/Sustainable Agriculture (LISA) 
com o objetivo de desenvolver sistemas de produção menos agressivos ao meio 
ambiente, conforme salienta Ehlers (1999). 
Na União Européia, foram empreendidas reformulações na PAC nos anos de 
1992, 1999 e 2003 por meio das quais se procurou estimular formas extensivas de 
exploração com o intuito de reduzir a pressão sobre os recursos naturais e de valorizar 
a qualidade ambiental. 
As novas políticas agrícolas, além de valorizarem a exploração extensiva, 
procuraram reduzir a oferta de produtos agrícolas subsidiados. 
Apesar da tomada de consciência em relação aos problemas ambientais e 
sociais gerados pela agricultura moderna, os interesses econômicos prevalecem e o 
modelo produtivista continua hegemônico. 
Os questionamentos e denúncias em relação ao comércio desleal de produtos 
agrícolas praticado pelos países desenvolvidos se tornaram recorrentes, pois tais 
países protegem os seus mercados com tarifas alfandegárias elevadas aos produtos 
agroalimentares e concedem fortes subsídios aos seus agricultores. 
Os segmentos produtivos voltados ao abastecimento de grandes mercados são 
dominados por corporações transnacionais cujas sedes se localizam nos EUA e na 
União Européia, a exemplo da Bunge, Cargill, Nestlé, Danone, Louis Dreyfus e ArcherDaniels Midland Company (ADM), entre outras. Estas empresas operam com base na 
agricultura praticada em larga escala e com intensa utilização de máquinas, 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
374 
implementos mecânicos, fertilizantes químicos, sementes selecionadas e biocidas, 
cujas empresas produtoras também estão sediadas naqueles países. 
Nos países desenvolvidos, não somente os pequenos agricultores, mas também 
os médios e grandes vinculados aos segmentos produtivos modernos são subsidiados 
e protegidos por tarifas alfandegárias. 
As questões relacionadas à concessão de subsídios agrícolas e a manutenção 
de elevadas tarifas alfandegárias aos produtos agroalimentares provenientes de países 
subdesenvolvidos vêm causando fortes embates na Organização Mundial do Comércio 
(WTO - World Trade Organization). 
A rodada de negociações da OMC iniciada em Doha (Qatar) no ano de 2001 até 
hoje não foi concluída em virtude do não entendimento entre os países desenvolvidos e 
subdesenvolvidos em relação aos subsídios agrícolas concedidos pelos EUA e União 
Européia e as tarifas alfandegárias praticadas para proteger os respectivos mercados. 
Os EUA e a União Européia se predispõem a reduzir as tarifas alfandegárias aos 
produtos agropecuários e a diminuírem o volume de subsídios concedidos aos seus 
agricultores, mas exigem, em contrapartida, que os países subdesenvolvidos, inclusive 
a China e a Índia, reduzam as suas tarifas alfandegárias sobre produtos manufaturados 
e serviços especializados. 
Na mais recente reunião realizada no mês de julho de 2008, em Genebra, na 
Suíça, se esperava concluir a rodada de Doha, no entanto, mais uma vez, o ciclo de 
negociações multilaterais foi fracassado1. 
O incremento da produção de alimentos, fibras e agrocombustíveis para fazer 
frente ao crescimento da demanda internacional, decorrente, em grande parte, da 
elevada expansão econômica que vem ocorrendo na China e na Índia está sendo 
realizado com base neste modelo de desenvolvimento reconhecidamente insustentável 
dos pontos de vista social e ambiental. 
 
1
 Na rodada de negociações ocorrida em Genebra houve divergências em relação ao 
posicionamento de importantes países subdesenvolvidos. O Brasil posicionou-se favoravelmente ao 
acordo que previa a redução de tarifas alfandegárias aos produtos manufaturados e a Argentina, China e 
Índia se posicionaram contrariamente ao acordo, pois não abrem mão de proteger as suas indústrias e 
exigem maior redução das tarifas alfandegárias aos produtos agropecuários pelos países desenvolvidos. 
 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
375 
37
No caso do Brasil, o processo de modernização da agricultura reduziu o seu 
ritmo a partir do início dos anos 1980, em razão da crise econômica mundial e das 
crises fiscal e financeira que atingiram o Estado brasileiro. 
Mesmo assim, a agricultura moderna em bases empresariais se expandiu e 
continua em marcha por meio do crescimento das áreas de cultivo de soja e milho nas 
zonas de cerrado do Centro-Oeste, Nordeste e Norte do país, de algodão mecanizado 
nos Estados de Mato Grosso e Bahia, de cana-de-açúcar nos Estados de São Paulo, 
Paraná, Mato Grosso do Sul e Goiás. 
A agricultura moderna produtora de commodities vem ampliando a sua 
importância na geração de divisas, por meio da expansão do agronegócio, o qual tem 
sido responsável por mais de um terço do valor das exportações e tem garantido os 
sucessivos superávits na balança comercial do país. 
Diante do exposto, pode-se afirmar que o modelo econômico produtivista ao 
qual se vincula a agricultura moderna, apesar dos seus perversos resultados sociais e 
ambientais e das alterações que foram feitas nas políticas agrícolas da União Européia 
e dos Estados Unidos para desencorajar as explorações intensivas, continua 
prevalecendo em âmbito global e nacional. 
Portanto, a resposta à primeira pergunta (A agricultura moderna, associada ao 
modelo produtivista, perdeu a hegemonia?) é negativa, a despeito da adoção de 
medidas paliativas e do recorrente discurso dos organismos internacionais sobre o 
estímulo a promoção do desenvolvimento economicamente viável, ambientalmente 
sustentável e socialmente justo. 
 
3. DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL: MUDANÇA DE PARADIGMA OU 
APRIMORAMENTO DO DISCURSO? 
O período compreendido entre o final da Segunda Guerra Mundial e o início da 
década de 1970 foi marcado pela grande expansão da economia mundial e expressiva 
atuação do Estado na coordenação, regulação e estímulo às atividades produtivas. 
Neste período a ação do Estado se deu por meio do planejamento centralizado, com 
preocupações essencialmente econômicas e sem a participação da população 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
376 
envolvida. O planejamento regional foi caracterizado pelo seu perfil tecnicista e 
monodisciplinar (economia), conforme ressalta Boisier (1989). 
A competição entre dois sistemas econômicos (capitalismo e socialismo) 
estimulou os governos de países desenvolvidos a estabelecerem o planejamento 
macroeconômico e setorial e a estimularem à dinamização de regiões deprimidas. 
O perfil keynesiano das políticas públicas e o bom desempenho da economia, 
entre o final da II guerra e o início dos anos 1970, propiciaram a melhoria do padrão de 
vida da população dos países desenvolvidos, sendo instituído o chamado Welfare State 
(Estado do bem estar social). Nos países desenvolvidos, no período em apreço, se 
atingiu quase o pleno emprego e as conquistas dos trabalhadores foram significativas. 
Nos países subdesenvolvidos, a intervenção do Estado também foi significativa 
no mesmo período, mas ela se deu mais para complementar a ação do capital privado 
do que para prover a população com os serviços públicos básicos, diferentemente, 
portanto, do que ocorreu nos países desenvolvidos. 
No caso brasileiro, a partir da segunda metade dos anos 1950, o Estado passou 
a investir diretamente em infra-estrutura e em setores produtivos pouco atrativos às 
empresas privadas, com o intuito de atrair capitais estrangeiros, e foram criadas 
facilidades para o ingresso de empresas multinacionais no país. 
Depois do primeiro choque do petróleo em 1973, as perspectivas keynesianas 
perderam força nos países desenvolvidos e, desde então, houve o enfraquecimento 
dos Estados e o fortalecimento do liberalismo econômico nos países desenvolvidos e 
subdesenvolvidos. 
Para Castro (1991, p. 14) “a crescente interdependência e simultânea 
exacerbação da competição oligopólica internacional desestruturou os fundamentos da 
concepção, até então vigente, de planejamento e de intervenção do Estado.” 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
377 
37
Lipietz (1988) considera que os princípios do liberalismo se impuseram com a 
 
(...) chegada ao poder de coligações monetaristas ou simplesmente 
menos keynesianas: na Inglaterra, pela vitória dos conservadores; nos 
Estados Unidos, pela subida de Volker à direção do FED antes do 
acesso de Reagan à presidência; na Alemanha Federal, pela 
hegemonia dos liberais na coligação de centro-esquerda (LIPIETZ, 
1988, p. 178). 
 
Após o primeiro choque do petróleo de 1973 e o estancamento do ciclo 
expansivo da economia, os postulados neoliberais tornaram-se hegemônicos. Os 
organismos internacionais, especialmente o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o 
Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD – Banco Mundial) 
passaram a apresentar e a impor medidas de cunho neoliberal para controlar a 
inflação, estabilizaras economias e superar as recorrentes crises em países 
subdesenvolvidos. 
O FMI interferiu diretamente na gestão da política econômica de muitos países 
subdesenvolvidos, especialmente na primeira metade dos anos 1980, em decorrência 
do aprofundamento da crise econômica. No caso do Brasil, num primeiro momento, o 
FMI fez intervenções de cunho recessivo, buscando frear o consumo para reduzir a 
inflação. 
No final dos anos 1980 e, principalmente, no decorrer da década de 1990, o FMI 
e o Banco Mundial passaram a forçar vários países subdesenvolvidos, inclusive o 
Brasil, a abrirem os seus mercados, a controlarem os gastos públicos, a privatizarem 
empresas estatais e a concederem a exploração de serviços públicos básicos à 
iniciativa privada, por meio da implementação de um receituário neoliberal que ficou 
conhecido como “Consenso de Washington”. 
As medidas neoliberais aplicadas não atingiram os resultados apregoados pelos 
organismos internacionais em termos de dinamização da economia e de redução da 
pobreza, conforme enfatiza Stiglitz (2002). 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
378 
Em contraposição ao processo liberalizante e homogeneizador e, de certa 
forma, a ele associado, surgiram nos anos 1990 iniciativas que passaram a valorizar a 
diversidade das regiões, se buscando promover o desenvolvimento a partir do 
aproveitamento das potencialidades locais. A experiência da terceira Itália, nesse 
sentido, é paradigmática e serviu de base para o fortalecimento desta perspectiva de 
desenvolvimento baseada na organização dos atores e na melhoria da governança 
local. 
As expressões desenvolvimento local, desenvolvimento endógeno, 
desenvolvimento de baixo para cima, entre outras, tornaram-se comuns. O 
enfraquecimento da ação do Estado fez com que as comunidades regionais 
chamassem para si a responsabilidade pela promoção do seu próprio processo de 
desenvolvimento. 
O capital humano e o capital social passaram a ser valorizados e as 
preocupações com a qualidade ambiental foram ampliadas, tornando significativas as 
experiências bem sucedidas de desenvolvimento local com base no envolvimento 
direto de atores sociais, no aproveitamento de conhecimentos tradicionais e de 
atributos locais, especialmente nos países que integram a União Européia, 
Neste contexto a União Européia lançou, no ano de 1991, o Programa Ligações 
Entre Ações do Desenvolvimento da Economia Rural (LEADER) com o objetivo de 
dinamizar os espaços rurais a partir do financiamento de projetos inovadores, 
elaborados por atores públicos e privados locais, a partir da instituição da abordagem 
ascendente. 
Os projetos LEADER se voltaram preferencialmente ao melhor aproveitamento 
dos conhecimentos tradicionais, a valorização dos patrimônios culturais e naturais, a 
implantação de infra-estrutura para a melhoria da qualidade de vida da população rural, 
a atração de empresas e população para as zonas rurais e o aprimoramento e 
agregação de valor aos produtos locais. 
O Programa LEADER apresentou boa receptividade e se expandiu ao longo do 
tempo, sendo que atualmente se encontra na quarta edição. 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
379 
37
A primeira edição do programa (LEADER I) foi realizada entre os anos de 1991 e 
1994, contou com aportes financeiros da ordem de 417 milhões de Euros, sendo 
financiados 217 projetos. Na segunda edição (LEADER II), realizada entre os anos de 
1995 e 1999, foram investidos 1,75 bilhão de euros e apoiados 906 projetos. Na 
terceira edição do programa (LEADER+) executada entre os anos 2000 e 2006 foram 
alocados 2,02 bilhões de euros e financiados 893 projetos. 
Além das iniciativas do Programa LEADER, a própria PAC, a partir da segunda 
reforma realizada no ano de 1999 passou a reconhecer e a destinar recursos de 
maneira diferenciada à garantia agrícola (mercado) e ao desenvolvimento rural, por 
meio do estabelecimento de dois pilares: o primeiro vinculado à política de mercado, e 
o segundo, ligado ao desenvolvimento sustentável das zonas rurais. 
Na terceira reforma da PAC, realizada no ano de 2003, foi estabelecido o direito 
ao pagamento único, sendo os subsídios concedidos diretamente aos agricultores 
independentemente de sua produção. Em contrapartida, a concessão dos subsídios 
passou a ser condicionada ao cumprimento de normas ambientais e sanitárias, bem 
como a exigências quanto ao bem estar dos animais. 
Entre os anos 2000 e 2006 foram disponibilizados pela PAC mais de 300 
bilhões de euros, dos quais 90% foram destinados às políticas de mercado (primeiro 
pilar) e apenas 10% ao desenvolvimento rural (segundo pilar), dirigindo-se, neste caso, 
a quatro medidas de acompanhamento2 e a 18 medidas de diversificação e 
modernização das explorações agrícolas3. 
 
2
 Aposentadoria rural, medidas agroambientais, ajuda as áreas desfavorecidas e reflorestamento. 
3
 Investimento nas explorações agrícolas, instalação de jovens agricultores, formação, transformação e 
comercialização dos produtos agrícolas, outras medidas florestais, melhoria das terras, agrupamento de parcelas de 
terras, revitalização dos serviços e ajuda a gestão agrícola, comercialização de produtos agrícolas de qualidade, 
serviços essenciais para a economia e a população rural, renovação dos núcleos rurais e proteção do patrimônio 
rural, diversificação das atividades agrícolas ou próximas da agricultura, gestão da água destinada a agricultura, 
melhoria da infra-estrutura ligada ao desenvolvimento da agricultura, estímulo as atividades turísticas e artesanais, 
proteção do ambiente e bem estar dos animais, reconstituição do potencial de produção agrícola em áreas atingidas 
por catástrofes naturais e implementação de meios de preservação e, finalmente, investimentos na engenharia 
financeira. 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
380 
No período 2007-2013 o Fundo Europeu Agrícola para o Desenvolvimento Rural 
(FEADER) destinará volume maior de recursos aos projetos de desenvolvimento local, 
sendo que serão destinados mais de 20 bilhões de euros ao Programa LEADER, agora 
convertido num dos quatro eixos do FEADER4. 
As experiências de desenvolvimento local associadas aos espaços rurais, 
passaram a receber a abordagem territorial, em virtude de reconhecerem o caráter 
multifuncional dos espaços rurais; de serem estabelecidas com base nas co-relações 
de forças existentes nos territórios; e; por valorizarem a participação dos atores sociais. 
A partir das experiências de desenvolvimento local processadas em países 
desenvolvidos, os organismos internacionais, especialmente o Banco Mundial, 
passaram a valorizar a abordagem territorial e a exigir que países subdesenvolvidos 
adotassem estratégias de desenvolvimento ascendentes, sem se levar em conta as 
grandes diferenças existentes entre as respectivas realidades. 
Os níveis de desigualdade social e regional são enormes e a prática da 
participação é pouco expressiva na maioria dos países subdesenvolvidos, o que 
dificulta a implementação de estratégias de desenvolvimento ascendentes. 
No caso da América Latina, a Organização dos Estados Americanos (OEA), por 
meio do Instituto Interamericano de Cooperação para Agricultura (IICA), passou a 
promover o desenvolvimento rural sustentável na perspectiva da valorização dos 
atributos dos territórios. 
 
4
 Eixo I – ampliação da competitividade dos setores agrícola e florestal; Eixo II – melhoria do 
ambiente e da paisagem rural; Eixo III – Qualidade de vida nas zonas rurais e diversificação da 
economia rural; Eixo IV – abordagem LEADER. 
4º ENGRUP,São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
381 
38
De acordo com o Sepúlveda et al (2005, p. 1) 
 
El enfoque territorial es esencialmente integrador de espacios, agentes, 
mercados y políticas públicas de intervención. (…) el territorio es 
considerado como un produto social e histórico – lo que le confere un 
tejido social único -, dotado de una determinada base de recursos 
natureles, ciertas formas de producción, consumo e intercambio, y una 
red de instituciones y formas de organización que se encargan de darle 
cohesión al resto de los elementos. 
 
As diretrizes dadas pelos organismos internacionais e a descentralização 
político-administrativa promovida desde os anos 1980 têm levado ao fortalecimento da 
chamada abordagem territorial em vários países da América Latina, inclusive no Brasil. 
O sofisticado discurso do desenvolvimento territorial desenvolvido e pensado 
para outras realidades passou a ser incorporado às políticas públicas. Contudo, as 
instituições nos diferentes âmbitos encarregadas da execução das políticas continuam 
atuando como no passado, ou seja, de maneira setorial, numa lógica produtivista e com 
reduzido envolvimento dos atores sociais. 
Diante do exposto, pode-se afirmar que a abordagem territorial foi incorporada 
ao discurso das políticas públicas de vários países. Na União Européia a abordagem 
territorial é expressiva e resultou em ações relevantes voltadas ao desenvolvimento 
local. Na América Latina a abordagem territorial não passou de um discurso sofisticado 
e muitas vezes mal interpretado pelas autoridades e agentes locais. 
Apesar da sua importância, a abordagem territorial não é protagonista e sim 
coadjuvante, pois tal perspectiva foi apenas parcialmente adotada e se restringe aos 
projetos voltados a dinamização de espaços rurais economicamente deprimidos de 
países desenvolvidos. 
Na América Latina, a abordagem territorial foi incorporada a partir do estímulo e 
da imposição de organismos internacionais, passando a ser adotada por técnicos e 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
382 
autoridades. No entanto, as condições básicas para a implementação de estratégias 
ascendentes e participativas de desenvolvimento não existem de fato. 
Portanto, a estratégia do desenvolvimento territorial não é protagonista e sim 
coadjuvante nas políticas públicas dos países desenvolvidos e apenas começam a ser 
esboçadas nos países subdesenvolvidos, por meio da transposição de experiências 
que foram bem sucedidas em contextos econômicos, sociais, ambientais, institucionais, 
históricos e culturais bastante distintos daqueles existentes nestes países. 
 
4. MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO 
TERRITORIAL NO BRASIL 
A modernização da agricultura se processou de forma bastante rápida no Brasil, 
especialmente nas regiões sul e sudeste, onde as alterações na base técnica e 
econômica da agropecuária se deram de maneira bastante pronunciada a partir dos 
anos 1960. 
O crédito rural oficial, principal instrumento utilizado para promover a 
modernização da agricultura foi altamente seletivo, pois a sua oferta se restringiu aos 
médios e grandes produtores rurais. Os pequenos arrendatários, parceiros e meeiros 
com reduzido ou nenhum patrimônio não tiveram acesso ao crédito oficial em razão de 
não disporem das garantias exigidas pelo sistema financeiro. 
No início dos anos 1980 o padrão de financiamento público da agricultura 
brasileira se esgotou em decorrência do aprofundamento da crise fiscal do Estado. A 
partir de 1984 as taxas de juros que incidem sobre o crédito rural oficial se tornaram 
positivas. 
O período que se estende de 1980 até o início dos anos 1990, foi marcado pela 
instabilidade macroeconômica. O Estado se voltou para a gestão da crise, não sendo 
estabelecidas políticas públicas com horizontes de médio e longo prazo. 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
383 
38
No ano de 1994 foi lançado o Plano Real, por meio do qual a economia foi 
estabilizada, a inflação controlada e a moeda sobrevalorizada, ao mesmo tempo em 
que os processos de desregulamentação e de abertura da economia à competitividade 
internacional foram ampliados. 
No ano de 1996 o governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) instituiu o 
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), voltado ao 
atendimento de produtores rurais com áreas não superiores a quatro módulos fiscais e 
que contratam até dois trabalhadores. Desde então tais produtores passaram a usufruir 
de tratamento diferenciado, tendo acesso ao crédito oficial em condições bastante 
favoráveis. 
No decorrer dos anos 1990 ocorreram mudanças importantes na maneira de se 
entender o campo no Brasil, pois passaram a ser consideradas, pelo menos em tese, 
as especificidades locais na formulação de políticas públicas. Com isto, se procurou 
favorecer a representação dos atores sociais por meio da participação de suas 
organizações coletivas na elaboração e implementação de políticas voltadas ao meio 
rural, além de serem fortalecidos os canais de participação criados na constituição 
federal promulgada no ano de 1988, com destaque para os conselhos municipais. 
Apesar das dificuldades enfrentadas para se democratizar as políticas públicas, 
os documentos oficiais romperam com a visão produtivista e setorial e passaram a 
adotar a perspectiva territorial. 
A adoção da abordagem do desenvolvimento territorial no país tem como marco 
inicial o Programa Comunidade Ativa instituído pelo governo FHC no ano de 1999, por 
meio do qual se procurou induzir o desenvolvimento local das regiões menos 
dinâmicas. A gestão de programas sociais também foi descentralizada com o intuito de 
se evitar a dispersão e estimular a gestão participativa de recursos públicos. 
No ano de 2003 o governo Lula criou a Secretaria de Desenvolvimento 
Territorial, a qual se vincula ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. A referida 
secretaria tem a incumbência de estimular e coordenar projetos de desenvolvimento de 
territórios rurais, os quais, de acordo com os documentos oficiais devem dirigir “o foco 
das políticas para o território, destacando a importância das políticas de ordenamento 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
384 
territorial, de autonomia e de autogestão, como complemento das políticas de 
descentralização” (BRASIL, 2003, p. 30). 
De acordo com a referida secretaria 
 
Na abordagem territorial o foco das políticas é o território, pois ele 
combina a proximidade social, que favorece a solidariedade e a 
cooperação, com a diversidade dos atores sociais, melhorando a 
articulação dos serviços públicos, organizando melhor o acesso ao 
mercado interno, chegando até ao compartilhamento de uma identidade 
cultural, que fornece uma sólida base de coesão social e territorial, 
verdadeiros alicerces do capital social (BRASIL, 2003, p. 30). 
 
Apesar da adoção de tal perspectiva, as ações do governo federal na promoção 
do desenvolvimento dos chamados territórios rurais ainda têm sido inexpressivas. A 
Secretaria de Desenvolvimento Territorial vem desenvolvendo o Programa Nacional de 
Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais (PRONAT), mas as suas ações 
ainda são pouco representativas. 
O Ministério do Desenvolvimento Agrário5 tem se incumbido da condução da 
política de assentamentos rurais, inadequadamente cognominada de reforma agrária, e 
do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). As metas 
quantitativas e qualitativas estabelecidas para os assentamentos não têm sido 
atingidas. O PRONAF, por sua vez, permanece estritamentevinculado à oferta de 
crédito rural com subvenções diferenciadas de acordo com a dimensão e o perfil dos 
beneficiários, ou seja, se restringe a oferta de crédito. 
 
5
 A missão oficial do Ministério do Desenvolvimento Agrário é “criar oportunidades para que as 
populações rurais alcancem plena cidadania”. 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
385 
38
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento6 estabelece e conduz a 
política de apoio à agricultura empresarial, restringindo-se basicamente a ofertar crédito 
oficial a médios e grandes produtores rurais a taxas de juros inferiores às vigentes no 
mercado financeiro. 
A divergência de interesses e a dubiedade das políticas públicas voltadas ao 
meio rural ficam evidentes na própria maneira como a administração federal se 
estrutura para atender as demandas provenientes do agronegócio e da chamada 
agricultura familiar. 
Nos territórios rurais selecionados pelo governo federal, atualmente 
cognominados de territórios da cidadania, os interesses divergentes e os conflitos 
existentes no âmbito dos respectivos territórios são negligenciados. Prioriza-se o 
atendimento dos segmentos ligados à agricultura familiar e aos movimentos sociais, 
sendo que as demais forças vivas, inclusive as hegemônicas, não participam das 
discussões e decisões sobre a alocação dos recursos públicos destinados aos 
referidos territórios, o que descaracteriza a própria abordagem territorial de 
desenvolvimento. 
Schneider e Tartaruga (2005, p. 23) enfatizam que: 
 
(...) a abordagem do desenvolvimento territorial deve ser capaz de criar 
e proporcionar instâncias para o debate das demandas entre os 
diversos atores de um território. Pior do que tentar evitar e suprimir o 
conflito social é não perceber a sua existência. 
 
No que concerne à adoção da abordagem do desenvolvimento territorial há 
algumas ressalvas a serem feitas quando são considerados os países 
subdesenvolvidos, a exemplo do que no Brasil. 
 
6
 A missão oficial do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento é “promover o 
Desenvolvimento Sustentável e a Competitividade do Agronegócio em Benefício da Sociedade 
Brasileira”. 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
386 
Desde o final dos anos 1990 a abordagem do desenvolvimento endógeno na 
perspectiva territorial vem sendo fortalecida, tendendo-se a considerar que as 
iniciativas locais são suficientes para dinamizar a economia e superar problemas 
sociais e ambientais. 
Para Brandão et al (2005) há exagero nesta perspectiva endogenista. Para os 
referidos autores em todo o mundo considera-se: 
 
(...) a necessidade da “territorialização” das políticas de 
desenvolvimento. Situação em que todos os atores sociais, econômicos 
e políticos estão cada vez mais plasmados, “diluídos”, em um 
determinado recorte territorial. Dentre várias mistificações, parece existir 
no discurso uma opção por substituir o Estado (‘que se foi”), por uma 
nova condensação de forças sociais e políticas chamada de território. O 
território passa a ser como que o grande regulador de relações, 
encarnando projetos sociais (BRANDÃO et al, 2005, p. 2). 
 
A partir da adoção de tal perspectiva, o poder central passa a estimular as 
comunidades locais a se organizarem, a participarem e a reivindicarem o acesso a 
direitos básicos que deveriam ser garantidos pelo poder público sem qualquer 
burocracia, dispêndio de tempo e desgaste. 
A excessiva descentralização de políticas públicas, apesar das boas intenções, 
pode ter resultados adversos dos esperados e reduzir o nível de democratização das 
decisões ao enviés de ampliá-lo, dada à concentração de riqueza e do poder nas mãos 
das oligarquias no âmbito das localidades e das regiões do país, conforme demonstra 
Arretche (1996, p.10). 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
387 
38
 
(...) não há uma relação necessária entre determinada escala de 
prestação de serviços públicos e o grau de apropriação privada ou 
patronagem política que a prestação de tais serviços pode viabilizar. A 
proximidade não é, assim, condição suficiente para evitar que 
determinadas necessidades dos cidadãos sejam atendidas segundo 
padrões clientelistas. 
 
No país ainda prevalecem arcaicas relações de poder com “comportamentos e 
atitudes ainda enraizados no paternalismo, populismo, clientelismo e coronelismo” 
(SAYAGO, 2007, p. 13), aos quais podem ser acrescentamos mais alguns perversos 
“ismos” tais como: comodismo, individualismo, egoísmo, nepotismo, machismo, 
racismo, entre outros. 
Para Boisier (2002): 
 
Es casi evidente que una democracia madura supone una amplia 
distribución social del poder político, o sea, supone una 
descentralización, pero es un error común asignar causalidades 
unidireccionales, como si un proceso necesariamente generase 
linealmente el otro, desconociéndose el carácter recursivo de ambos. 
Desde luego, el términos territoriales la transferencia de poder a 
regiones por ejemplo, puede resultar completamente antidemocrática si 
en tales regiones no existe un receptor socialmente adecuado, en 
cuyo caso el poder transferido solo reforzaría estructuras oligárquicas y 
clientelísticas (BOISIER, 2002, p. 4). 
 
A descentralização das políticas públicas tem enfrentado dificuldades de várias 
ordens no Brasil, pois a realidade da grande maioria das localidades situadas no 
interior do país, normalmente, é de dispersão populacional, heterogeneidade, baixo 
nível de organização e dificuldade de acesso às infra-estruturas e serviços públicos, 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
388 
elementos que comprometem a qualidade do processo de descentralização 
administrativa, conforme enfatiza Schejtman (1997). 
A operacionalização do desenvolvimento territorial é praticamente impossível de 
ser implementada quando perduram a elevada concentração da propriedade da terra, a 
grande concentração social e regional da renda, o esgarçamento do tecido social e a 
falta de dinamismo econômico. Tais características associadas a permanência de uma 
estrutura institucional ainda vinculada a lógica produtivista e setorial obstam as 
iniciativas ligadas a implementação da abordagem territorial de desenvolvimento. 
Favareto (2007, p.20) salienta que: 
 
(...) a passagem do compromisso setorial ao territorial nas instituições e 
políticas para o desenvolvimento rural torna-se incompleto, uma espécie 
de ‘inovação por adição’ no vocabulário, no discurso e nas políticas de 
órgãos governamentais e agentes sociais como organizações e apoio e 
movimentos sociais sem, ainda, uma correspondente em termos de 
mudança institucional. 
 
Diante do exposto, como responder a terceira questão proposta (Como a 
estratégia do desenvolvimento territorial vem sendo introduzida nas políticas públicas 
brasileiras?). Considera-se aqui que embora a estratégia do desenvolvimento territorial 
seja relevante, ela ainda é limitada e se restringe ao discurso oficial que vem sendo 
adotado para justificar a falta de um projeto nacional de desenvolvimento e para 
atender aos desígnios de organismos internacionais que financiam vários projetos no 
país. 
A permanência de problemas estruturais relacionados à concentração da 
riqueza e do poder, a ineficiência das instituições, a persistência de práticas 
clientelistas e o despreparo da população para participar de maneira autônoma e 
qualificada dificultam a implementação de abordagens ascendentes de 
desenvolvimento.4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
389 
38
 
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
Apesar das evidências e do reconhecimento do caráter perverso do modelo 
econômico associado à agricultura moderna, ele não perdeu a hegemonia. Nos anos 
1990 e 2000, entretanto, ocorreram expressivos avanços em relação, principalmente, 
ao reconhecimento do caráter multifuncional e multidimensional dos espaços rurais e 
da instituição de abordagens ascendentes de desenvolvimento com base na 
valorização dos atributos dos territórios e no envolvimento dos atores locais, 
especialmente em países desenvolvidos. 
O enfraquecimento do Estado provedor, de perfil keynesiano, nos países 
desenvolvidos, o aprofundamento do processo de globalização, a crescente 
descentralização político-administrativa e o fortalecimento das perspectivas 
econômicas neoliberais levaram ao repasse da responsabilidade pela promoção do 
desenvolvimento das mãos dos governos centrais para a escala local. Entre as 
abordagens ascendentes de desenvolvimento merecem destaque as experiências 
LEADER na União Européia. 
A estratégia do desenvolvimento territorial pensada, a princípio, para a realidade 
dos países desenvolvidos, passou a ser incorporada às políticas públicas de países 
subdesenvolvidos sem que existissem as pré-condições para tanto. Mesmo nos países 
desenvolvidos a abordagem territorial não é protagonista e sim coadjuvante. Apesar de 
inovadora, tal abordagem se restringe aos projetos voltados à dinamização de regiões 
rurais deprimidas. 
Em alguns países subdesenvolvidos tal abordagem de desenvolvimento foi 
incorporada ao discurso a partir da imposição de organismos internacionais, mas na 
prática permanecem os graves problemas estruturais e faltam os requisitos 
fundamentais para que a estratégia territorial de desenvolvimento decole. 
No Brasil, a não superação de problemas relacionados a elevada concentração 
da riqueza, a ineficiência das instituições e ao despreparo da população dificultam a 
execução da estratégia territorial de desenvolvimento. 
Modernização da agricultura e desenvolvimento territorial, pp. 370-392 
 
 
 
390 
Nos territórios rurais criados e reconhecidos pelo governo central, as instituições 
federais diretamente envolvidas (MDA, INCRA etc.) adotam a estratégia do 
desenvolvimento territorial de maneira parcial, pois deixam de ouvir, envolver e buscar 
parcerias com agentes e atores chaves dos respectivos territórios, o que descaracteriza 
a abordagem territorial de desenvolvimento. 
 
4º ENGRUP, São Paulo, 2008. HESPANHOL, A. N. 
 
 
 
391 
39
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