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159GUIA PR`TICO DE UROLOGIA Capítulo 29 Donard Augusto Bendhack* Marcelo L. Bendhack Câncer da PØlvis Renal e do Ureter *Endereço para correspondência: Rua Mauá, 1.081 80030-200 - Curitiba - PR Tel.: (0--41) 252-5540 - Fax: (0--41) 253-3121 Introdução O câncer do urotélio envolvendo vias excretoras superio- res é uma entidade bastante infreqüente, representando me- nos de 1% dos tumores malignos do aparelho urogenital. A idade média dos pacientes é de 60 anos. Predominam no sexo masculino, na proporção de 3:1 em relação ao feminino. Quan- do localizados no ureter, em 60% dos casos situam-se no ter- ço inferior. Deve sempre ser lembrada a possível característi- ca multifocal desses tumores, o que torna necessária a exclu- são de outros tumores em outras áreas do urotélio (bexiga ou trato superior contralateral). A causa dos carcinomas do trato superior não é conheci- da. Os mesmos fatores envolvidos na origem do câncer da bexiga estariam presentes. A passagem mais rápida da urina pela pélvis e ureter explicaria a menor incidência desses tu- mores em relação aos da bexiga, assim como a distribuição percentual no urotélio (a maior parte se encontra na bexiga). Anatomia patológica Cerca de 95% dos tumores do sistema coletor urinário são carcinomas uroteliais. Carcinomas de células epidermói- des e adenocarcinomas são extremamente raros. No momento do diagnóstico, 25% a 45% dos pacientes apresentam tumores multifocais. A freqüência está correla- cionada ao grau de diferenciação celular: tumores papilares altamente diferenciados demonstram mais freqüentemente um crescimento multifocal e formas anaplásicas crescem sobre- tudo solitariamente. Em 30% a 50% dos casos é encontrado simultaneamente ou algum tempo depois um tumor em nível de ureter ou bexiga. Em termos de distribuição topográfica em relação ao ureter, o terço distal é mais freqüentemente aco- metido: 15% do terço proximal, 22% medial e 63% do terço inferior ou distal. Metástases linfáticas w Dos tumores da pélvis renal: • metástases para os linfonodos da cadeia paraaortal / paracaval. w Dos tumores de ureter: • no terço lombar para os grupos de linfonodos para- aortal e paracaval; • no terço iliacal para os linfonodos ilíacos; • no terço distal para os linfonodos paravesicais e ob- turadores. As metástases hematogênicas se fazem em ordem decres- cente: ossos, fígado, crânio, mediastino e pulmão. Estadiamento tumoral (TNM) T a = Carcinoma papilar sem crescimento infiltrativo. T 1 = Infiltração tumoral na lâmina própria. T 2 = Infiltração tumoral na camada muscular. T 3 = Infiltração tumoral no parênquima renal, gordura perirrenal ou periureteral. T 4 = Crescimento tumoral externamente ao rim ou ure- ter com infiltração de órgãos vizinhos. Diferenciação tumoral G 1 = Carcinoma urotelial bem diferenciado. G 2 = Carcinoma medianamente diferenciado. G 3 = Carcinoma pouco diferenciado. Diagnóstico Quadro clínico A macroematúria está presente em 60% dos casos como sintoma inicial. Outros sintomas importantes incluem dor lom- bar (25% a 30%) e disúria (20%). O exame clínico demonstra em cerca de 10% dos pacien- tes um tumor palpável em nível de flanco ou na região dos 160 GUIA PR`TICO DE UROLOGIA rins, que é causado pelo próprio tumor ou é conseqüência de uma hidronefrose devida à obstrução do fluxo urinário. Sintomas sistêmicos tais como perda de peso, perda do apetite e diminuição da capacidade produtiva são encontrados em menos de 10% dos casos. Métodos de diagnóstico O diagnóstico é realizado por métodos de imagem, en- doscopia e estudo citológico da urina. A urografia excretora demonstra em 50% a 70% dos casos uma falha de enchimento com contornos irregulares em relação ao sistema coletor da pélvis ou ureter (12% a 15%) ou uma diminuição de função renal devida à obstrução causada pelo tumor. Em 10% dos casos, o rim se apresenta sem função à urografia excretora (signif icando um processo avançado). A ureteropielografia retrógrada permite uma chance de diagnóstico de cerca de 75%. Simultaneamente pode ser feita a coleta da urina nativa ou então fluido de lavagem em nível do trato urinário alto para o exame citológico. Excepcio- nalmente se realiza a citologia de escovação por ocasião deste exame. A ureterorrenoscopia é, para o diagnóstico de tumores do trato urinário alto, um dos métodos mais efetivos. Por oca- sião desse exame pode-se colher simultaneamente urina nati- va ou então fluido de lavagem para o exame citológico, o que em cerca de 65% dos casos pode permitir a identif icação vi- sual de células tumorais, principalmente nos tumores mal di- ferenciados. Através da ureterorrenoscopia é possível realizar biópsias dirigidas. O desenvolvimento dos instrumentos en- doscópicos flexíveis também permite que medidas diagnósti- cas e terapêuticas possam ser realizadas com elementos de trabalho apropriados. O exame ultra-sonográfico de um sistema coletor sus- peito para a presença de tumor permite a exclusão de doenças importantes, no sentido de diagnóstico diferencial, tais como cálculos urinários, sobretudo em casos de cálculos radiotrans- parentes. A diferenciação entre processos tumorais e falhas de enchimento com aparência de tecido mole à urografia excre- tora (matriz de cálculos, coágulos) nem sempre é possível com o uso da ultra-sonografia. Possíveis achados da tomografia computadorizada (TAC) são falhas de enchimento de contraste, uma captação de contraste mínima e diferente captação de contraste em ní- vel do parênquima renal. Linfonodos hilares aumentados, in- filtração vascular e trombos, assim como metástases à distân- cia em outros órgãos abdominais podem ser bem visualizados ou identif icados pela TAC e pela ultra-sonografia (certamente com diferentes possibilidades de acerto). Na comparação entre TAC e ressonância nuclear magné- tica (RNM), a RNM apresenta uma taxa preditiva positiva mais alta e também uma sensibilidade maior. Metástases no fígado, corpos vertebrais e vasos sangüíneos podem ser melhor vi- sualizados através da RNM. A cistoscopia (com eventual biópsia randomizada da be- xiga) é imperativa, pois entre 30% e 60% dos casos apresen- tam neoplasia vesical concomitante. Tratamento Devido ao fato de serem radiorresistentes e por apre- sentarem respostas muito precárias aos esquemas de qui- mioterapia, o tratamento desses tumores é basicamente ci- rúrgico. Câncer da pélvis renal Nefrouretectomia É a forma ideal de tratar estes casos, desde que nos está- dios T a -T 3 , com remoção do rim em bloco com a gordura pe- rirrenal, fáscia de Gerota e todo o ureter (com retirada do ure- ter intramural e “botão” vesical). Em casos selecionados (tumor de baixo grau e estádio) e levando-se em consideração a possibilidade de tumor contra- lateral, o que ocorre em 8% dos casos, é admissível o trata- mento conservador, com as seguintes alternativas: CÂNCER DA PÉLVIS RENAL ALGORITMO DE TRATAMENTO Ta - T1 T2-T3 Nefroureterectomia Ressecção do coto ureteral Linfadenectomia Nefroureterectomia Ressecção do coto ureteral Linfadenectomia Casos especiais Nefrectomia parcial Ressecção parcial da pélvis, ou excisão endoscópica Cirurgia? T3 irressecáveis T4 QT QT Sem respostaBoa resposta RxTCirurgia 161GUIA PR`TICO DE UROLOGIA • ressecção parcial da pélvis renal; • nefrectomia parcial; • cirurgia percutânea; • ureteropieloscopia e retirada endoscópica. Essas formas de tratamento devem ser levadas em consi- deração principalmente em casos de rim único, insuficiência renal ou idade avançada do paciente, sendo a recidiva local da ordem de 6%-10%. A linfadenectomia retroperitoneal em combinação com a nefroureterectomia é recomendada por alguns autores. Na realidade, parece ter mais importância nosentido de estabele- cer o prognóstico do que a terapêutica. Em caso de positivida- de, a sobrevida é muito curta. Câncer do ureter A indicação clássica é a nefroureterectomia. Em casos de câncer de ureter inferior (60% dos casos) e com baixo grau e estádio, pode-se considerar uma intervenção conservadora, com ressecção do segmento distal do ureter e reconstituição do trato com reimplante do ureter, bexiga psóica, técnica de Boari, interposição de alça ileal ou autotransplante renal. Nos tumores do terço médio e superior, em casos seleci- onados pode-se realizar ureterectomia segmentar com anasto- mose término-terminal. O inconveniente seria a possibilidade de recorrência do tumor em outro ponto do ureter (30%-50%). Tratamento endoscópico só é admitido nos tumores de muito baixo grau e estádio inicial (T a -G 1 ). Quimioterapia Em se tratando de tumores uroteliais metastáticos, têm-se utilizado em relação à quimioterapia conceitos diferentes so- bretudo daqueles estabelecidos para o tratamento do câncer de bexiga. Até o presente não se dispõe de um relato com número suficiente de casos que possa ter comprovado a eficiência de tal tratamento mesmo que indutivo, adjuvante ou neoadjuvante. Em casos raros admite-se a possibilidade de uma terapia tópica (por exemplo, Mitomicina C ou BCG) após uma opera- ção conservadora ou na qual se preserva o rim, com remoção de um tumor superficial do trato urinário alto. Também nesta situação não existem relatos estatisticamente relevantes. Radioterapia Com relação à radioterapia adjuvante de tumores urote- liais com alto grau de malignidade ou invasivos pode ser veri- ficada uma taxa diminuída de recidivas locais (11% contra 46% para operações sem radioterapia adjuvante). A taxa de sobrevi- da pode ser melhorada apenas discretamente (17% contra 27%). Prognóstico O prognóstico é menos dependente do método de trata- mento empregado do que do estádio e do grau de diferencia- ção celular. As operações conservadoras podem ser considera- das em casos de tumores superf iciais de baixo grau e quando se tratar de rim único, insuficiência renal ou idade avançada. A taxa de sobrevida em cinco anos corresponde a cerca de 40% a 65%. Não existem diferenças entre tumores de pél- vis e tumores ureterais no mesmo estádio. Adenocarcinomas e carcinomas de células epiteliais apresentam pior prognóstico. CÂNCER DO URETER ALGORITMO DE TRATAMENTO T3-T4 G3 Nefroureterectomia Terço superior e médio RxT adjuvante (?) QT (?) Cirurgia conservadora Casos especiais T a - T1 G1-G2 Lesões residuais Cirurgia conservadora em casos especiais RxT QT T4T2-T3 Nefroureterectomia Cirurgia Terço inferior Bibliografia recomendada 1. MESSING EM, CATALONA W. In: Walsh PC, Retik AB, Vaughan ED Jr., Wein AJ. Campbell’s Urology. 7th ed., Philadelphia, 1998; 2327-91. 2. SROUGI M. In: Srougi M, Simon SD. Câncer urológico. 2a ed., São Paulo, 1996; 143-71.
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