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UNIFAE - Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino CAMILA RAMOS MARCAS DO SILÊNCIO: UM ESTUDO DE CASO SOBRE OS SENTIMENTOS DE UMA MULHER FRENTE À VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA SÃO JOÃO DA BOA VISTA 2016 CAMILA RAMOS MARCAS DO SILÊNCIO: UM ESTUDO DE CASO SOBRE OS SENTIMENTOS DE UMA MULHER FRENTE À VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA Monografia apresentada como requisito da disciplina Trabalho de Conclusão de Curso do Curso de Bacharel e Formação de Psicólogo UNIFAE - Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino. Orientadora temática: Profª. Ms. Maria de Fátima Antunes Pinto Catunda Orientadora metodológica: Profª. Mª. Leticia Lo Duca Trentino SÃO JOÃO DA BOA VISTA 2016 CAMILA RAMOS MARCAS DO SILÊNCIO: UM ESTUDO DE CASO SOBRE OS SENTIMENTOS DE UMA MULHER FRENTE À VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA DATA APROVAÇÃO: 02/12/2016 Profa. Ms. Maria de Fátima Antunes Pinto Catunda UNIFAE Profa. Ms. Letícia Lo Duca Trentino UNIFAE Nome do Dr. Guilherme Athayde Ribeiro Franco Promotor de Justiça - Fórum São João da Boa Vista Dedicatória Dedico inteiramente este trabalho ao meu querido avô José Syrto, que sempre vai ser tudo para mim. Me proporcionou momentos alegres, fez de tudo para me ver sorrir e sei que onde estiver vai estar olhando por mim. “Vô, eu consegui! ” Agradecimento Agradeço imensamente todos os meus amigos, meu namorado, familiares, professores e orientadores pela paciência que tiveram e pelo apoio que me deram para eu conseguir finalizar essa pesquisa. Foram momentos difíceis, mas que me deram mais forças para eu continuar nessa caminhada. Por fim, a todos que, direta ou indiretamente, fizeram parte da minha formação: о meu muito obrigada! Resumo Esta pesquisa tem como objetivo caracterizar os sentimentos da violência psicológica em uma mulher. Será feito um estudo de caso dos dados de um processo terapêutico em uma clínica escola usando a abordagem Cognitivo Comportamental. O estudo foi de natureza básica e adotou a metodologia qualitativa. A participante foi uma mulher que procurou atendimento em uma clínica/escola do interior de São Paulo. A coleta de dados foi feita a partir de instrumentos e técnicas terapêuticas utilizadas nas sessões feitas. No procedimento de análise de dados os instrumentos serão interpretados com a utilização de materiais padronizados com referencial teórico da Cognitivo Comportamental. Será realizada uma abordagem qualitativa dos dados a partir do levantamento de unidades de análise. Espera-se publicar os resultados obtidos como projeto de pesquisa em periódico da própria instituição e disponibilizar o projeto para pesquisas de utilidades públicas. Pretende-se também, contribuir para a área acadêmica, incentivando novas pesquisas Palavras chaves: violência, violência doméstica, violência psicológica, sentimentos Sumário 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 8 2. JUSTIFICATIVA .................................................................................................... 18 2.1 PESSOAL ........................................................................................................... 18 2.2 SOCIAL .............................................................................................................. 18 2.3 CIENTÍFICA ......................................................................................................... 18 3. OBJETIVOS .......................................................................................................... 19 3.1 OBJETIVO GERAL ................................................................................................ 19 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ..................................................................................... 19 4. HIPÓTESES .......................................................................................................... 20 5. MÉTODO ............................................................................................................... 21 5.1 DELINEAMENTO DE ESTUDO ................................................................................. 21 5.2 AMOSTRA .......................................................................................................... 22 5.2.1 DADOS DO PARTICIPANTE ................................................................................. 22 5.2.2 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO ............................................................... 22 5.3 PROCEDIMENTOS COLETA DE DADOS .................................................................... 22 5.3.1 INSTRUMENTOS ............................................................................................... 25 5.4 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DE DADOS ................................................................ 26 5.5 RESULTADOS ESPERADOS ................................................................................... 27 6. ASPECTOS ÉTICOS ............................................................................................ 28 7. RESULTADOS E DISCUSSÕES .......................................................................... 29 7.1 VITÓRIA ............................................................................................................. 29 7.2 SENTIMENTOS NEGATIVOS ................................................................................... 30 7.2.1 Domínio de Desconexão e Rejeição ................................................................ 32 7.2.2 Domínio de Autonomia e Desempenho ............................................................ 35 7.2.3 Domínio dos Limites Prejudicados ................................................................... 38 7.2.4 Domínio de Direcionamento para o Outro ........................................................ 39 7.2.5 Domínio da Supervigilância e Inibição ............................................................. 42 7.3 SENTIMENTOS POSITIVOS................................................................................... 44 7.4 SÍNTESE DOS SENTIMENTOS E SEUS SIGNIFICADOS ................................................ 45 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 48 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 49 ANEXO 1 – ANAMNESE .......................................................................................... 54 ANEXO 2 – QUESTIONÁRIO ESQUEMAS DE YOUNG.......................................... 69 ANEXO 3 – TERMO DE AUTORIZAÇÃO ................................................................ 75 ANEXO 4 – TERMO DE CONSENTIMENTO DE USO DE BANCO DE DADOS ..... 76 ANEXO 5 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................. 79 ANEXO 6 – DECLARAÇÃO DE RESPONSABILIDADE......................................... 83 8 1. INTRODUÇÃO “A violência destrói o que ela pretende defender: a dignidade da vida, a liberdade do ser humano. ” João Paulo II A construção histórica ideológica da superioridade do homem em detrimento da mulher ocorre, como registro histórico, há pelo menos 2500 anos. (MENEZES et al., 2013). Nas civilizações gregas, ainda segundo a autora citada, a mulher tinha uma visibilidade de submissão ao homem, uma criatura subumana, a qual era rebaixada moralmente e socialmente e seus direitos não existiam. Menezes et al. (2013), cita que já na Idade Média, a mulher realizava o papel de esposa e mãe. Tinha a função de submeter-se ao marido e gerar filhos. Já na Idade Moderna, havia um cenário de incongruências, em que de um lado havia grupos feministas, que lutava pela liberdade feminina, e de outro, “esposas eram queimadas nas piras funerárias juntas aos corpos dos maridos falecidos, se tivessem sido vítimas de violência sexual” (MENEZES et al., 2013). No Brasil, a partir dos anos 80 a violência contra a mulher tornou-se uma questão a ser discutida no âmbito da saúde pública por trazer danos físicos, psicológicos e sociais). E desde então, esse problema vem sendo reconhecido, sucedendo motivos de lutas e conquistas tanto pelos movimentos feministas, quanto por profissionais do serviço de saúde e organizações internacionais. (Rocha, 2007 apud DRESCH, 2011). Segundo Pimentel (2011, apud PIMENTEL 2013), a violência doméstica é cometida em ambiente privado, por pessoas próximas, como um familiar ou um parceiro íntimo da vítima. Ademais, ela é orientada pela imposição de autoridade tendo em vista a submissão e o domínio da autonomia do outro. “No Brasil, 70% dos crimes contra as mulheres acontecem no âmbito doméstico e os agressores são os maridos ou companheiros” (Brasil, 2006 apud DRESCH, 2011 p. 6), a cada um minuto uma mulher é agredida em seu domicílio por essas mesmas pessoas que conservam e mantém o vínculo afetivo. Hoje em dia em 9 nosso país, 23% da população feminina estão expostas à prática da violência doméstica. (Labronici et al., 2010, apud DRESCH, 2011). Esta violência é uma das vicissitudes que mais preocupam as mulheres brasileiras, pois se trata de um problema que não escolhe classes sociais para se manifestar. É marcada por meio do abuso da força e/ou da opressão, uma forma de crueldade que afeta a autoimagem, autoestima e o autoconceito de um indivíduo. A violência doméstica pode ser dada por meio da agressão física, psicológica ou sexual. (CONCEIÇÃO E MORAIS, 2015). Dentre outras violências, no Art. 7º da Lei Maria da Penha (2012) são formas de violência doméstica e familiar contra a mulher: I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularizarão, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria (Lei Maria da Penha, 2012 p. 27-28). 10 Dentre variados tipos de violência doméstica, a violência psicológica, a qual Fonseca e Lucas (2006) citam, é a que tem início com as tensões normais dos relacionamentos, tais como hábitos que geram incômodo no parceiro, preocupações financeiras provocadas pelos empregos e meras discrepâncias de opiniões. Nestes tipos de relacionamentos agressivos, as tensões aumentam, começando então uma série de agressões psicológicas. Conforme Conceição e Morais (2015), este tipo de violência, é feita através de gritos, humilhações e reclamações e com isso tudo, faz com que a mulher se sinta uma pessoa incapacitada, trazendo danos significativos à estrutura emocional. Essas agressões decorrem de comportamentos que, para Cahú et al (2012), são por meio de condutas que levam a rumores maliciosos e ameaças, no sentido de desvalorizar da mulher. Entre outros fatores, Guimarães, Maciel e Silva (2007 apud COLOSSI e FALCKE, 2013) referem a violência psicológica como uma substituição ao diálogo, tentando comunicar algo que a verbalização não é efetiva. Dentre outros tipos de dependência, Fonseca e Lucas (2006), citam que situações quando está presente uma dependência financeira da mulher em relação ao homem, por exemplo, seja pela comodidade de não ter um emprego ou pela proibição do companheiro da mesma trabalhar, ela se torna obrigada a ir até ao marido sempre que tem a necessidade de dinheiro, e nesta situação a mulher fica vulnerável à violência, pois em muitos casos, o homem frui de seu poder financeiro como forma de violentá-la, seja por ameaça, humilhação física ou verbal. Gomes (1981, apud FONSECA E LUCAS, 2006 p. 10), “enquanto a mulher permaneceu sob a total dependência do homem, aceitou sua dominação absoluta”. Dentro desta dependência, segundo Menezes et al. (2013), surge o tema alienação, que se caracteriza pelo fato de atribuir naturalidade aos fatos sociais, que não são naturais, portanto, gera uma inversão dos valores relacionados ao humano, social e histórico. Um indivíduo, consciente de si, reconhece sua 11 adequação a uma classe social. Em contrapartida, o indivíduo alienado faz o uso da negação à sua adequação, portanto não partilha das mesmas ações e posturas. Em suma, as mulheres vítimas de violência doméstica não têm a sensação de pertencer a sua classe social, mesmo com o desejo de se libertarem da submissão que lhe são impostas. As vítimas se alienam e se negam como sujeitos sociais, em consequência à condição de dependentes material e emocionalmente que são colocadas, em relação ao parceiro. Negam sua identidade, individualidade e acabam ficando numa situação de constrangimento, sofrimento e sucumbem às experiências traumáticas (MENEZES et al., 2013). Nessas situações, citadas a cima, os sintomas psicológicos tendem a se manifestar. Os mais importantes, parecem ser a depressão, desesperança, baixa autoestima, desmotivação, além da autoimagem prejudicada, sentimentos de incapacidade, ansiedade, irritabilidade, perda de memória, como também abuso de álcool e outras drogas. (Roth e Colés apud, ROVINSKI, 2004). Hirigoyen (2006 apud COLOSSI E FALCKE, 2013) categoriza a violência psicológica em diversas maneiras de expressão: controle; isolamento; ciúmepatológico; assédio; aviltamento; humilhação; intimidação; indiferença às demandas afetivas e ameaças. Mesmo sem o ato agressivo estar presente, a ameaça está presente na possibilidade de acontecer algo, pois “a antecipação de um golpe pode fazer tanto mal ao psiquismo quanto o golpe realmente dado, que é reforçado pela incerteza em que a pessoa é mantida, sob a realidade da ameaça” (Hirigoyen, 2006, apud COLOSSI E FALCKE, 2013 p. 311). A mulher frente a esta violência sofre alguns impactos. Sua percepção sobre si é afetada. Isso reflete em sua segurança, em suas relações, gerando impotência. Segundo Fonseca e Lucas (2006) os sentimentos de tristeza, ansiedade e medo foram os mais destacados como decorrência psicológica deste tipo de violência, além do comprometimento de sua saúde mental. Isto porque, segundos os autores citados, a agressão interfere na crença de suas competências, ou seja, 12 na confiança em suas habilidades para usá-las adequadamente no cumprimento de atividades relevantes em sua vida, tal como a habilidade de se comunicar com os outros. Para Miller (1999, apud FONSECA E LUCAS, 2006 p. 13) as alterações psíquicas surgem em função do trauma deixado pela agressão, ou seja, a mulher passa a “desenvolver uma auto percepção de incapacidade, inutilidade e baixa autoestima pela perda da valorização de si mesma e do amor próprio”. São sintomas psicológicos característicos de vivências traumáticas. Griebler e Borges (2013), fizeram uma pesquisa sobre o perfil dos envolvidos em Boletins de Ocorrência da Lei Maria da Penha. Os autores mostram que: (...) em relação à violência psicológica, os sentimentos mais notados nas mulheres vítimas são de tristeza, ansiedade, estresse, agressividade, insegurança, baixa autoestima, medo, isolamento social, culpa, nervosismo e esquecimentos têm sido citados como as principais repercussões entre as mulheres vítimas. Além disso, a depressão, os sintomas psicossomáticos e o Transtorno de Estresse Pós-Traumático foram observados em estudos referentes às consequências psicopatológicas da violência contra a mulher. (GRIEBLER E BORGES, 2013 p. 218) Com as vítimas tendo sentimentos negativos, com a autoimagem e autoconceito prejudicados, pode surgir o receio de ir em busca de seus direitos. Sendo assim, Conceição e Morais (2015), explicam que o receio da falta suporte de políticas públicas brasileiras que as amparassem diante destas violências, as mulheres não denunciavam seu agressor. Porém, “nos anos 80, um movimento feminista lutou e exigiu das autoridades providências para as políticas públicas, para que essa violência pudesse ser combatida” (CONCEIÇÃO E MORAIS, 2015 p. 58). Uma das vitórias da luta feminista no Brasil foi a criação das Delegacias de Polícia Especializadas de Atendimentos à Mulher (DEAM), além da conquista da criação da Lei 11.340/06 no dia 7 de agosto de 2006, que tem como nome “Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher”, mais conhecida como “Lei 13 Maria da Penha” devido à história de Maria da Penha Maia Fernandes natural de Fortaleza-CE. Sobre essa história tem-se que: Em 29/05/1983, Maria da Penha foi vítima de tentativa de homicídio, por meio de um tiro de espingarda desferido no dorso, por seu marido à época, enquanto dormia. Em razão do acometimento, ficou paraplégica irreversivelmente. A versão dada por Marco Antonio foi de que ladrões tinham invadido a casa para roubar e dispararam o tiro contra sua esposa. Entretanto, após ter saído do hospital, quando ainda se recuperava do trauma, ela sofreu novas agressões, como também foi submetida a cárcere privado. Não obstante isso, ele tentou eletrocutá-la no banheiro, no momento em que essa tomava banho. A premeditação da nova tentativa de assassinato ficou evidente, pois este passou a utilizar o banheiro das filhas para tomar banho tempos antes, além de tê-la obrigado a fazer seguro de vida em seu favor. Em 1984, Maria da Penha iniciou luta por justiça junto a órgãos judiciais brasileiros. Somente sete anos depois disso, seu ex-marido enfrentou julgamento e foi condenado a 15 anos de prisão. Com apelação da defesa, a sentença foi anulada em 1992 e, apenas em 1996, foi a novo julgamento; desta vez, condenado a 10 anos de prisão, também saiu do tribunal em liberdade, devido a recursos impetrados por seus advogados. Em 1994, a vítima escreveu o livro “Sobrevivi, posso contar”, na tentativa de divulgar sua história de agressões, tendo sido bem sucedida na empreitada. Passados quinze anos da ocorrência, o agressor ainda continuava em liberdade e nenhuma sentença definitiva havia sido proferida pela justiça brasileira, quando a CEJIL (Centro para a Justiça e o Direito Internacional) tomou conhecimento do caso em tela, por meio do livro publicado pela vítima, e formalizou denúncia, em conjunto com Maria da Penha e o CLADEM8 (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher), junto à OEA, mais precisamente no órgão responsável pela verificação de denúncia de violação dos direitos humanos, em decorrência de descumprimento de acordos internacionais: Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). (OLIVEIRA, 2011 p. 34-35). Esta Lei, de acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres (Lei Maria da penha, 2012), foi aprovada após muita luta do movimento feminista (mais um dos merecimentos deste movimento que luta pelos direitos das mulheres e para que os agressores recebam uma punição). Ela prevê medidas protetivas, que 14 são solicitadas na delegacia de polícia ou ao próprio juiz, o qual “tem o prazo de 48 horas para analisar a concessão da proteção requerida” (Lei Maria da penha, 2012 p. 12). Ainda de acordo com essa Lei, o Estado também prepara com a prevenção desta violência e a proteção das vítimas, além de ter a responsabilidade de ajudar na reconstrução da vida dessas mulheres vítimas. De acordo com a Lei Maria da Penha (BRASIL, 2006), as medidas de prevenção contra a violência doméstica tem como instruções, dentre várias, a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, relacionados às causas, às consequências e à frequência da violência doméstica e familiar contra a mulher, “para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas” (BRASIL, 2006); a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher; a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres, dentro outros. Já em relação à assistência à mulher vítima de violência doméstica para auxílio à reconstrução da vida dessas mulheres, ainda segundo a Lei Maria da Penha (BRASIL, 2006), dentre várias formas de assistência, alguns parágrafos da lei citam o que poderá ser feito, tal como sendo o juiz quem determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal, preservando sua integridade física e psicológica. Dessa forma, para prestar uma assistência qualificada é necessária uma maior atenção para identificar as necessidades e os aspectos delicados que estão relacionados ao processo de adoecimento. Então, por fim, a Lei Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher surgiu com o objetivo de responder adequadamente aos anseios e necessidades das15 mulheres vítimas de violência conjugal e traz revolução e gestão que facilitam para que o agressor seja punido de forma eficiente. (Lei Maria da penha, 2012). E em suma, atualmente, o Brasil ainda sofre com uma sociedade que até então tem altos índices de violência contra a mulher (Brasil, 2006; Labronici et al., 2010, apud DRESCH, 2011), e como Fonseca e Lucas (2006) citam, a violência chega a prejudicar desde a saúde física até a saúde mental da vítima. Além do embasamento teórico citados, essa pesquisa também tem como o mesmo a Teoria Cognitivo Comportamental, que age na tentativa de restaurar, preservar ou prevenir a saúde mental do paciente. Sendo assim, a seguir ela será explicada melhor. A fundamentação teórica da psicoterapia cognitivo-comportamental surgiu a partir dos princípios comportamentais e pesquisas de Pavlov e Skinner. Mais recentemente, Beck (1987, apud ALMEIDA, 2010) contribuiu de forma decisiva na constituição de um modelo psicológico fundamentado em intervenções cognitivas, calcadas sobre a inter-relação da tríade: cognição, pensamento e emoção (ALMEIDA, 2010). Ainda segundo a autora citada, a técnica da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) é conhecida por ter rápida obtenção de resultados quando se trata do combate ao sofrimento psíquico ou até mesmo no trabalho de autoconhecimento. Ela cita que a técnica se difere por uma grande quantidade de pesquisas que examinaram suas teorias básicas e demonstraram êxito no tratamento, sendo assim, vem sido reconhecida cada vez mais por profissionais da área da saúde, assim como pelos pacientes. Utiliza-se a expressão TCC, para se denominar a junção da Terapia Cognitiva e da Terapia Comportamental. No modelo cognitivo-comportamental, a psicoterapia deverá agir nos pensamentos deflagrados por alguma situação estimulante dada, uma vez que tais pensamentos geram os sentimentos e os 16 comportamentos que caracterizam a relação do indivíduo com o ambiente que o cerca. (TAVARES, 2005). “A prática clínica da terapia cognitivo-comportamental (TCC) baseia-se em um conjunto de teorias bem-desenvolvidas que são usadas para formular planos de tratamento e orientar as ações do terapeuta” (WRIGHT, BASCO E THASE, 2006 p. 15). Segundo os autores citados, a TCC é uma abordagem que tem como embasamento dois princípios centrais: um deles acredita há uma influência controladora de nossa cognição sobre nossas emoções e comportamentos; o outro é de que nossos padrões de pensamentos e emoções poderão ser afetados intensamente de acordo com o modo como agimos ou nos comportamos. Dentre os conceitos desta linha teórica tem-se a relação terapêutica que é fundamental para o êxito da prática de trabalho. Através desse relacionamento com o terapeuta que o cliente pode perceber e ter experiências com oportunidades de poder expressar seus sentimentos, valores e crenças. Além do papel de reforçador, modelo e terapeuta, também tem um papel pedagógico, o qual, por sua vez, envolve um domínio teórico e uma percepção apurada na utilização das diversas técnicas. Também são utilizados os esquemas, que são crenças nucleares e tem a função que permite ao cliente codificar, selecionar, filtrar e, principalmente, atribuir significados aos eventos e situações que ocorrem durante o desenvolvimento. Sendo assim, o esquema é uma estrutura cognitiva que filtra, codifica e avalia os estímulos ao qual o organismo é submetido. Tudo isso através de estruturações feitas gradativamente das interpretações às informações que são vindas do meio ambiente e do mundo. Por fim, dentre outros, há o pensamento automático que são cognições que passam rapidamente por nossas mentes quando estamos em meio a situações (ou relembrando acontecimentos). Normalmente, esses pensamentos automáticos são privativos/não-declarados, ocorrendo de forma rápida conforme avaliamos o significado de eventos e acontecimentos em nossas vidas (TAVARES, 2005; WRIGHT, BASCO E THASE, 2006). 17 Por fim, Beck e colaboradores (1979; D. A. Clark et al., 1999 apud Wright, Basco e Thase, 2006 ) descreveram seis categorias principais de erros cognitivos abstração seletiva, inferência arbitrária, supergeneralização, maximização e minimização, personalização e pensamento absolutista (dicotômico ou do tipo “tudo-ounada”). De acordo com o autor, estes erros são mais comuns em pessoas deprimidas, pois tendem a ver o lado mais negativo da situação vivenciada. Em suma, de acordo com a visão de Psicologia Cognitivo Comportamental, diferentes eventos geram distintas formas de agir em diferentes pessoas, não em função do evento em si, mas sim pela interpretação/pensamento que é feita do mesmo, gerando diferentes emoções e comportamentos. Em função disso, uma mudança em qualquer um desses componentes - pensamento, emoção e comportamento, pode iniciar modificações nos demais. (Beck, 1987 apud ALMEIDA, 2014) Então, tendo o embasamento teórico apresentado, e de acordo com a Teoria Cognitivo Comportamental, o presente projeto tem como problema de pesquisa: quais são os sentimentos de uma mulher frente à violência psicológica? 18 2. JUSTIFICATIVA 2.1 Pessoal Atualmente violência doméstica vem sendo algo de muito destaque e motivo de muitas lutas feministas. A violência psicológica, que está inclusa dentro deste conceito, gera um desequilíbrio psicológico na mulher, o que pode afetar sua autoimagem, por exemplo. O interesse no tema surgiu através do atendimento psicoterapêutico de uma mulher em uma clínica escola. 2.2 Social A relevância social desta pesquisa está em abordar reflexões sobre os sentimentos da mulher frente à violência e uma maior conscientização sobre o assunto na sociedade. 2.3 Científica Mesmo existindo grandes estudos sobre o impacto causado às mulheres que sofrem violência doméstica, a pesquisadora sentiu necessidade de explorar mais sobre o assunto tratado relacionando-o com o caso de uma mulher, a partir do referencial teórico da terapia cognitiva comportamental. Espera-se que essa pesquisa possa auxiliar outros pesquisadores a compreenderem como a violência psicológica pode influenciar os sentimentos de uma mulher. 19 3. OBJETIVOS 3.1 Objetivo geral Analisar os sentimentos de uma mulher frente à violência psicológica, sob o referencial da teoria Cognitivo Comportamental. 3.2 Objetivos específicos Identificar sentimentos de uma mulher perante à agressão psicológica; Analisar os sentimentos de uma mulher perante à agressão psicológica Compreender os sentimentos de uma mulher perante à agressão psicológica, a partir da perspectiva cognitiva comportamental. 20 4. HIPÓTESES Tendo em vista os autores citados anteriormente, supõe-se que a vítima se encontre com a autoimagem prejudicada, com um nível de dependência elevado e o autoconceito negativo, a ponto de se achar incompetente. Uma suposição que se faz na tentativa de explicar o problema apresentado, é de que a violência psicológica é entendida como algo que pode causar grande danos emocionais a mulher. Pode estar ligada à questão da dependência financeira ou chantagem, a qual o agressor a ameaça ou a humilha. Por mais que seja um problema antigo, atualmente é algo que vem sendo muito discutido e problematizado pelo mundo todo, assim levando a sociedade a debater e refletir suas causas. 21 5. MÉTODO 5.1 Delineamento de estudo Trata-se de uma pesquisa de natureza básica, a qual “envolve verdadese interesses universais, procurando gerar conhecimentos novos úteis para o avanço da ciência, sem aplicação prática prevista” (PRODANOV E FREITAS, 2013). O método científico utilizado na presente pesquisa será o dedutivo que segundo Prodanov e Freitas (2013 p.27), parte do geral para a questão particular, destacando que “por intermédio de uma cadeia de raciocínio em ordem descendente, de análise do geral para o particular, chega a uma conclusão”. Em relação ao objetivo de estudo, como a pesquisa tem o intuito de proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses, o objetivo de estudo é exploratório. Envolve levantamento bibliográfico; entrevistas e análise de exemplos que estimulem a compreensão. (PRODANOV E FREITAS, 2013; Gil, 2007 apud GERHARDT e SILVEIRA, 2009). O procedimento técnico utilizado será o estudo de caso, que pode ser definido como uma exploração de um caso, obtida por meio de uma detalhada coleta de dados, envolvendo múltiplas fontes de informações, e uma forte atuação do pesquisador e do objeto de pesquisa. É um estudo aprofundado de um indivíduo a fim de estudar aspectos variados de sua vida, de acordo com o assunto da pesquisa (PRODANOV E FREITAS, 2013) Os autores citados ainda destacam que o estudo de caso vem sendo utilizado com frequência pelos pesquisadores sociais, com o propósito de descrever a situação do contexto em que está sendo feita determinada investigação; 22 Por fim, a pesquisa terá uma abordagem qualitativa, pois considera-se presente a relação dinâmica entre o sujeito e o mundo real, ou seja, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não podem ser demonstrados em números. 5.2 Amostra 5.2.1 Dados do participante A participante será identificada pelo nome fictício: Vitória, com idade de 54 anos, sexo feminino, escolaridade com o nível Superior completo e, por fim, com a formação do grupo familiar (Iniciais e nomes fictícios) como Marido (Jorge, 57 anos), Filha (C. 20 anos) e Filho (T. 30 anos). 5.2.2 Critérios de inclusão e exclusão Como critério de inclusão da presente pesquisa foi escolhido uma mulher maior de 18 anos que procurasse atendimento terapêutico em uma clínica/escola no interior de São Paulo. Como critério de exclusão foram descartadas as mulheres que não apresentaram as especificações escolhidas. 5.3 Procedimentos coleta de dados A presente pesquisa se trata de uma observação direta extensiva, que para Prodanov e Freitas (2013, p. 102) “ocorre através do questionário, do formulário de medidas de opinião e de atitudes, história de vida, análise de conteúdo e testes “. 23 As sessões foram realizadas semanalmente numa clínica/escola e tinham duração de 50 minutos. O processo ocorreu com o total de treze sessões, sendo duas sessões de anamnese e três faltas justificadas. Iniciou-se o processo com a Anamnese (Anexo 1) para compreender melhor a queixa trazida por ela bem como a dinâmica familiar da mesma. A sessão de Anamnese foi feita através de entrevista na qual a estagiária conduzia a sessão para alguns tópicos específicos, mas, deixando a paciente falar livremente. Foram utilizadas algumas técnicas durante o procedimento que de acordo com Castro (1978), é a ação metodológica de uma teoria, a qual não existe sem uma base epistemológica que a fundamente. É apenas um meio intervencional de uma grande contribuição teórica, mas não o principal fundamento em um contexto clínico, e sim algo que acrescentará informações. Sendo assim, ao utilizar alguma técnica psicoterápica, necessariamente relaciona-se diretamente a um procedimento metodológico utilizado no processo terapêutico. A utilização da técnica é segundo a demanda do paciente, segundo o momento da sua vida. Para esta pesquisa, foi utilizada a técnica: “Eu Real/Eu ideal”, que visa trilhar a autonomia da paciente. O objetivo da técnica é fazer uma reflexão acerca de suas colocações questionando cada ponto que a paciente escreveu em seu Eu real (o que ela acha que é) e o Eu ideal (o que ela gostaria de ser). Também foi aplicada a técnica “Qualidades e Defeitos”, que trabalha com a autoestima, ou seja, o sentimento de valor que uma pessoa tem de si mesmo. Tem o objetivo de ser feita uma reflexão acerca das colocações de suas qualidades e defeitos, questionando cada ponto que a paciente escreveu. Além disso, foram feitos os Esquemas Cognitivos, que são divididos em: uma situação que a paciente cite e algum pensamento automático, emoção e comportamento que ela tenha na situação descrita. É um instrumento de coleta de dados pois retrata os esquemas, que são crenças nucleares (regras globais e absolutas para interpretar as informações ambientais relativas à autoestima) 24 que agem como base ou regras para o processamento de informações no cotidiano do indivíduo, ou seja, como ele percebe as situações de seu cotidiano. Foi aplicado o questionário “Esquemas de Young” (Anexo 1), elaborado por Jeffrey E. Young, que tem o objetivo de avaliar esquemas iniciais desadaptativos (são esquemas fortalecido ao ponto no qual estimula e impulsiona o fluxo de pensamentos automáticos negativo). E por fim, foi utilizado o Questionamento Socrático: Tem o objetivo de ajudar a paciente a reconhecer a relação entre o terapeuta e ele, e de ajudá-lo a reconhecer e modificar o pensamento desadaptativo (pensamentos que podem gerar reações emocionais dolorosas e comportamento disfuncional). Este Questionamento consiste em fazer perguntas ao paciente que provoque sua curiosidade e o desejo de inquirir, fazendo assim o paciente se envolver no processo. Uma forma especial de questionamento socrático é a descoberta guiada, “por meio da qual o terapeuta faz uma série de perguntas indutivas para revelar padrões disfuncionais de pensamento ou comportamento” (Wright, Basco e Thase, 2006 p. 28). O procedimento de coleta de dados será através da análise de dados de atendimentos psicoterapêuticos uma clínica escola mediante aprovação da responsável pala instituição. Para isso, será utilizado o Termo de Autorização assinado que se encontra no Anexo 3. Para coleta de dados para fins da pesquisa científica será utilizado o Termo de Consentimento de Uso de Banco de Dados, que se encontra devidamente assinado por sua orientadora e pela pesquisadora no Anexo 4. Os dados que serão utilizados da psicoterapia ocorreram de março a junho. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 5) deve ser assinado ela paciente, após aprovação do CEP. 25 É importante destacar que a pesquisa só será iniciada e os dados analisados a partir da aprovação Do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), em que a pesquisadora responsável assume o compromisso e responsabilidade de informações coletadas ao longo do processo psicoterápico, cuja declaração de responsabilidade se encontra no Anexo 6. 5.3.1 Instrumentos Foram utilizadas as técnicas: a. “Eu Real/Eu ideal”, em que foi dado à paciente uma folha dividida ao meio com um lado escrito Eu real, e o outro Eu ideal. Foi pedido para que ela escrevesse como ela acha que é (características da personalidade e do seu jeito de ser) naquele, e como ela gostaria de ser (se imagina) neste. Após isso, foi feito uma reflexão acerca de suas colocações questionando cada ponto que a paciente escreveu, levando em conta que o Eu real, é o eu verdadeiro, aquele que representa a essência. O acesso ao eu real ocorre, muitas vezes, através dosseguintes pensamentos: “Isso é realmente verdade? ” ou “ Apesar de não querer admitir isso, sei que é assim”. Já o Eu ideal abrange os ideais quanto a si próprio. Tanto aquilo que se deseja ser, quanto o que se acredita ser. Sendo assim, há um desejo ou cobrança de ser diferentes do que se é hoje e aí pode surgir uma não aceitação da maneira atual de ser. Foi utilizada a técnica “Qualidades e Defeitos”, que trabalha com a autoestima, ou seja, o sentimento de valor que uma pessoa tem de si mesmo. Trata-se da auto avaliação das características individuais. O procedimento é o mesmo da técnica anterior. É dada uma folha dividida ao meio e de um lado a paciente escreve quais qualidades acha que possui e do outro os defeitos que acha que possui, também. O questionário “Esquemas de Young” é listado por 75 perguntas, as quais devem ser respondidas de acordo com uma Escala de Avaliação que vai de 1 a 6, sendo 1- inteiramente falsa; 2- em grande parte falsa; 3- levemente mais verdadeira do que falsa; 4- moderadamente verdadeira; 5- em grande parte verdadeira e 6- 26 descreve perfeitamente. As questões são mapeadas por meio do somatório dos resultados de cada grupo de 5 domínios: Desconexão e rejeição: domínio ligado ao sentimento de frustração vivenciado pela pessoa com relação às expectativas de segurança, estabilidade, carinho, empatia, compartilhamento de sentimentos, aceitação e consideração. Que estariam vinculados a este grupo - privação emocional, abandono, desconfiança/abuso, isolamento social e defectividade/vergonha. Autonomia e desempenho: domínio que avalia sentimentos de incapacidade experimentados pelo indivíduo no que tange à possibilidade de se separar dos demais conquistando a autonomia necessária para sobreviver de forma independente e com bom desempenho. Limites Prejudicados: possível de ser identificado pela deficiência nos limites internos, pela ausência de responsabilidade com os demais e/ou pela dificuldade de orientação para a concretização de objetivos distantes. Caracteriza prejuízos com relação a respeitar os direitos dos outros, a cooperar e a se comprometer com metas ou desafios. Os esquemas associados a este domínio são os de merecimento e autocontrole/autodisciplina insuficientes. Orientação para o outro: trata-se de um funcionamento que quando presente na personalidade ocasiona um foco excessivo para os desejos e sentimentos dos outros em função da constante busca de obtenção de amor. Muitas vezes, a pessoa suplanta suas próprias necessidades com o intuito de obter aprovação, podendo suprimir sua consciência, sentimentos e inclinações naturais. Os esquemas de subjugação e autossacrifício compõem este grupo. Supervigilância e Inibição: refere-se ao bloqueio da felicidade, autoexpressão, relaxamento, relacionamentos íntimos e ao comprometimento da própria saúde devido à ênfase excessiva na supressão dos sentimentos, dos impulsos e das escolhas pessoais espontâneas. Regras e expectativas rígidas internalizadas sobre desempenho e comportamento ético geralmente integram este padrão de funcionamento. Inibição emocional e padrões inflexíveis são os dois esquemas que integram este contexto (CAZASSA, 2007 p.16). 5.4 Procedimento de análise de dados O procedimento de análise de dados teve como critério o encadeamento lógico de evidências, no qual o estudo permite que o leitor acompanhe o processo do desenvolvimento da pesquisa até as conclusões. Após a aprovação do CEP, os instrumentos descritos nos itens 5.3.1 foram interpretados com a utilização de materiais padronizados. O referencial teórico e a técnica utilizada para a análise foi a partir da abordagem cognitivo comportamental para um melhor entendimento e também para a exposição dos resultados obtidos. 27 Foi realizada uma abordagem qualitativa de dados a partir do levantamento de unidades de análise. 5.5 Resultados esperados Através da conclusão desta pesquisa, espera-se publicar os resultados obtidos como projeto de pesquisa em periódico da própria instituição e disponibilizar o projeto para pesquisas de utilidades públicas. Pretende-se também, contribuir para a área acadêmica, incentivando novas pesquisas. 28 6. ASPECTOS ÉTICOS Foi garantido total sigilo da identificação de todos os envolvidos, pois segundo o Código de Ética do Psicólogo (2014): Art.9° - É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, q que tenha acesso no exercício profissional. O artigo 5° da mesma resolução também foi seguido, o qual relata que: Os psicólogos pesquisadores obterão o consentimento informado dos indivíduos a serem pesquisados com garantia de efetiva proteção dos participantes, devendo ser oferecidos os seguintes critérios: I, que os indivíduos, assegurada a sua capacidade legal, cognitiva e emocional para entender os objetivos e possíveis consequências da pesquisa, devem decidir se desejam participar ou não. Devido á esta pesquisa envolver seres humanos, esta segue a Resolução 466/12 do Ministério da Saúde, em que prorroga o respeito aos participantes em caráter voluntário decidindo ou não a participar á pesquisa. Caso a pesquisa seja suspensa os dados ficarão armazenados com o pesquisador durante o período de cinco anos, e serão comunicados ao CEP as razões da suspensão. Também será seguido o que se propõe o Código de Ética do Psicólogo e demais resoluções emitidas pelo Conselho Federal de Psicologia. 29 7. RESULTADOS E DISCUSSÕES Os resultados obtidos nesta pesquisa foram divididos em forma de subitens para haver melhor compreensão do estudo de caso. Para que a compreensão seja facilitada, foi apresentada a história de vida da mulher, visto que esta possui o nome fictício de Vitória, a fim de preservar o sigilo e seu anonimato. A análise dos testes e técnicas e falas de V. que foram retiradas das sessões e foram divididas em sentimentos negativos e sentimentos positivos para um melhor entendimento. Para entender essa divisão, Milred (2009) explica que o sentimento pode ser definido como influências psicológicas nas atitudes e vivências dos seres humanos, sendo elas conscientes ou inconscientes de acordo com cada indivíduo. Na técnica do Questionário dos Esquemas de Young, explicado no item 5.3.1, as respostas que foram avaliadas são as que obtiveram uma avaliação acima de 3. Tanto as respostas do mesmo, quando falas de Vitórias trazidas durante as técnicas se sessões estarão divididas entre sentimentos negativos e positivos abaixo. 7.1 Vitória Vitória tem 54 anos e atualmente vive em uma cidade do interior de São Paulo com seu marido (para manter o anonimato, será citado como Jorge) e sua filha. Tem mais um filho, mas ele é casado e mora com sua esposa. Ela é casada há, aproximadamente, 38 anos. Relata nas sessões que Jorge, no namoro e no começo do casamento, sempre foi muito carinhoso. As agressões começaram quando ele começou a beber e chegar tarde em casa. Vitória relata ter um relacionamento não muito satisfatório com Jorge. Trouxe durante as sessões se sentir ansiosa quando ele sai para beber, e muito triste 30 quando ele a agride verbalmente e psicologicamente, chegando a se trancar no banheiro para chorar. Durante várias sessões, Vitória relata também que de tanto Jorge dizer que ela é uma incompetente, burra e incapaz, se sente assim. 7.2 Sentimentos negativos Segundo Milred (2009), os sentimentos negativos bloqueiam as percepções do indivíduo quando semanifesta, e muitas vezes ele se sente culpado por isso. Eles podem ser gerados por diversos fatores, tais como sofrimento antecipado, pensamentos negativos, problemas e preocupações. E como consequência, o ser fica à mercê de distorções do pensamento, podendo dar origem a comportamentos não desejados, também contribuir para o desenvolvimento de alguns problemas psicológicos, e consequentemente problemas pessoais, constatando-se como um obstáculo ao desenvolvimento pessoal. Os sentimentos negativos que Vitória trazia para as sessões, foram demonstrados em falas ou nos resultados das técnicas e instrumentos utilizados. Foram detectados alguns erros cognitivos durante todo o processo. Um deles é que Vitória trazia o pensamento absolutista, o qual trata que seus julgamentos sobre si mesmo, as experiências pessoais ou com os outros foram totalmente negativas. Isto pode ser detectado a partir da fala que a mesma trouxe em uma das sessões, em que seu marido dizia que ela não passaria em um concurso público, pois não passou em alguns que tinha prestado, e então era incompetente e burra. Sendo assim, ela trazia a seguinte frase: “é o que ele diz. Então eu acabei aderindo isso. Não acredito que tenho capacidade para fazer uma prova e passar” (sic), ou seja, ela teve uma experiência pessoal ruim: de não passar em um concurso e o marido utilizar os adjetivos apresentados para atingi-la. 31 O segundo erro cognitivo detectado foi a personalização, que é quando eventos externos são relacionados a ela mesmo, quando há pouco ou nenhum fundamento para isso. Vitória se culpava por eventos que considerava negativos que não tinha relação com ela. Isto pôde ser visto em suas falas, como, por exemplo, ela se culpar pelo marido beber demais. “Me culpo por ele beber assim hoje em dia. Eu poderia ter colocado um limite, poderia ter ajudado ele, mas não fiz isso. Acho sim, que tenho culpa por chegar onde chegou” (sic). Percebe-se, então, que Vitória começou a internalizar o que o marido disse e achar que era aquilo mesmo, tendo não só sua autoimagem totalmente afetada, mas todo um autoconceito e passou a pensar assim, a achar que era realmente tudo aquilo. Deixando até seus objetivos e vontades de lado. Além desses erros cognitivos, foram demonstradas também falas durante as sessões e acolhimento com conteúdos de sentimentos negativos. Uma delas é que Vitória se sente muito sozinha. “Eu sinto muita solidão, sabe... muito medo de ficar doente e dependente fisicamente de alguém” (sic). Traz muitas vezes que quando o marido sai, fica ansiosa esperando pela volta dele, apenas para ter certeza de que ele chegou. Mesmo com o sentimento de solidão, Vitória traz também o sentimento de não se sentir feliz com a dependência financeira e a relação que possui do marido. Relata que “queria ser independente. Se eu ganhasse bem e fosse bem-sucedida, não estaria casada” (sic). Sendo assim, percebe-se que a mesma não sente feliz no relacionamento, trazendo muitas vezes a questão de não saber o porque está com R: “não sei porque estou com ele. Não temos nada em comum, nem gostos musicais, comida, política, maneira de pensar... nada” (sic). Durante muitas sessões, Vitória trouxe o sentimento de tristeza quando ele a agredia psicologicamente e verbalmente. Em algumas vezes trouxe por escrito: “estou ficando cansada e desanimada, muito confusa com a minha vida, (...) hoje acho que não vale a pena continuar nessa relação e sofrimentos, penso se isso vale a pena passar por tudo isso. Pode ser que 32 amanhã eu estarei melhor, menos triste” (sic); “Estou cansada com essa situação, queria poder ir embora, mas tenho a C.” (sic); “Estou muito triste muito mesmo. Gritos e berros. Estou cansada, sem querer penso quando isso vai terminar, estou cansada. Está bêbado novamente, cansada cansada cansada... muita falta de respeito pela minha pessoa só Deus para dar forças e resignação para eu continuar essa vida, sem sentido” (sic); “Mais uma vez fui agredida verbalmente. Que não faço nada, durmo até as 10h, que não sirvo pra nada, que não passo a roupa dele, que n/ faço comida. Tudo mentira!! Hora que ele chega a mesa do almoço está arrumada e a comida está pronta ou quase pronta” (sic). E, por fim, outro sentimento que Vitória traz é o medo: “tenho muito medo de meu filho ser igual ao meu marido” (sic), ou seja, ela não quer que o filho seja o reflexo do pai, repetindo as atitudes e falas do mesmo. Até aqui, Vitória trouxe muitos sentimentos decorrentes da violência psicológica, tanto no momento em que aconteceu quanto depois, como consequência. Os sentimentos foram: solidão ou o medo de ficar sozinha ou dependente fisicamente, ou do seu filho ser igual ao seu marido; infelicidade, desânimo e confusão com seu casamento; tristeza e cansaço com a situação da violência psicológica. Por último nos sentimentos negativos, foi aplicado o questionário de Esquemas de Young (Anexo 2). Como foi explicado no item 5.3.1, é dividido em 5 domínios contendo 15 esquemas. Foram observados vários esquemas prejudicados em Vitória. Todos os esquemas e domínios serão explicados, divididos em tópicos por domínios, e analisados segundo Young, Klosko e Weishaar (2008). 7.2.1 Domínio de Desconexão e Rejeição Young, Klosko e Weishaar (2008) demonstram em sua obra que o domínio de Desconexão e Rejeição se trata da falta de ambiente seguro e estável, com vivências primitivas de experiências sociais negativas como abuso, 33 frieza, rejeição ou isolamento social, e possui cinco esquemas. O primeiro esquema de Abandono traz a sensação de que as pessoas importantes para o indivíduo não serão capazes de manter e lhe proporcionar apoio emocional, não merecem confiança, ligação e tudo isso por ela acredita que a qualquer momento poderá ser trocada por outra pessoa melhor ou abandonada. No questionário, Vitória responde que acha em grande parte verdadeira a afirmação de que se preocupa com a possibilidade de as pessoas que ela gosta a deixarem ou abandoná-la. Sendo assim, ela demonstra possuir esta preocupação e medo de perder alguém. De acordo com esses pensamentos, vive com medo de que alguém poderá sair de sua vida, ou seja, de acordo com a resposta de Vitória. Ela também traz esse medo em suas falas e experiências: “quando R. sai para beber eu fico muito ansiosa. Sinto muito medo, principalmente depois que ele levou a facada” (sic), ou até mesmo quando cita que acha que deu marido já a traiu, já que ele viaja demais. O segundo esquema é o de Desconfiança/Abuso. A pessoa que possui esse esquema prejudicado possui a expectativa de que os outros irão a machucar, humilhar, traí-la, enganar, mentir ou até mesmo abusa-la. Normalmente, se envolve a percepção de que o prejuízo é o resultado da negligência extrema ou injustificada. Pode ser incluída a sensação de que sempre “leva a pior” ou está sendo enganada por terceiros, incluindo a sensação de acreditar que os outros irão obter vantagens sobre elas de várias maneiras. Nas questões, Vitória responde que acha levemente mais verdadeira do que falsa a afirmação de que sente que não pode baixar a guarda na presença dos outros, pois eles a prejudicariam intencionalmente. Sendo assim, percebe-se que Vitória, de acordo com a sua resposta, possui o medo trazido pelos autores. Nas sessões, ela também trouxe falas relacionadas a este esquema, como por exemplo a já citada a cima, que é acreditar que o marido já a traiu. O terceiro esquema é o de privação emocional. Os autores trazem que o indivíduo que possui este esquema afetado tem uma expectativaque acredita que não será atendida pelos outros: o desejo de ter um certo e adequado apoio emocional. Segundo eles, existem três tipos de privações: 34 a- Privação de cuidados: ausência de atenção, afeto, carinho ou companheirismo. b- Privação de empatia: ausência de compreensão, de escuta, de uma postura aberta ou de compartilhamento mútuo de sentimentos. c- Privação de proteção: ausência de força, direção ou orientação por parte de outros (YOUNG, KLOSKO E WEISHAAR , 2008 p. 28). De acordo com as perguntas de número um e dois Vitória acha moderadamente verdadeira as afirmações de que na maior parte do tempo, não tem ninguém para dar carinho, compartilhar e se importar profundamente com o que acontece com ela, assim como não havia pessoas para a dar carinho, segurança e afeição. Acredita que seja em grande parte verdadeira a afirmação (questão cinco) que raramente tem alguma pessoa forte para a ajudar, dar bons conselhos ou orientação quando não tem certeza do que fazer. Por fim, também traz como levemente mais verdadeira do que falsa as questões três e quatro, em que em grande parte de sua vida não se sentiu especial para alguém, e que, em geral, não tem ninguém que realmente a escute, compreenda-a ou esteja sincronizado com suas verdadeiras necessidades e sentimentos. Segundo o que os autores trazem pode-se observar em algumas falas trazidas por Vitória, como “eu sinto que meu marido não é o mesmo de antes. Ele em respeitava, e depois do casamento não tive mais isso. Ele começou a beber e não era mais carinhoso e amoroso como antes. Ele não me demonstra nada e quando eu demonstro ele já vem perguntando o que eu quero” (sic). Relacionando a teoria com a prática, acredita-se que Vitória tenha esse sentimento de que o amor que recebeu, foi incompleto, não sendo o que ela esperava ou até mesmo recíproco, ou seja, a privação de empatia. O quarto esquema apresentado é o de defectividade/vergonha. A pessoa trás o sentimento de que é indesejado, mau, inferior ou inválido em vários aspectos, ou até mesmo se acha não merecedor do amor de pessoa importantes em sua vida. Pode até desenvolver uma insegurança quando está junto ao outro, ou vergonha dos defeitos percebidos, sendo assim, 35 costumam ter vergonha de si. Vitória, de acordo com sua resposta na questão de número 23, traz que a afirmação de que ela não é digna do amor, da atenção e do respeito dos outros, a descreve perfeitamente. Vitórias também traz algumas falas durante as sessões, tais como “falo que sou aposentada, pois tenho vergonha” (sic), ou até mesmo algumas falas já demonstradas acima nos erros cognitivos, como se considerar incapaz de algo, como por exemplo não passar em uma prova de concurso (o que ela relata ter vontade de fazer). Sendo assim, acredita-se que ela tem vergonha de algumas coisas sobre si, consequentemente isso afeta sua autoimagem/auto percepção. O último esquema trazido, é o de Isolamento social. Porém, Vitória não colocou respostas acima de 1 nas perguntas trazidas. Sendo assim, este esquema será tratado nos sentimentos positivos. De acordo com a análise desde Domínio, percebe-se que Vitória trouxe vários sentimentos, tanto em suas falas quando em suas respostas no questionário. Os sentimentos notados, foram os de incompetência, culpa, medo, carência, inferioridade e vergonha de si, os quais serão definidor melhor no item 7.4. Todos esses sentimentos ela relata, de forma implícita ou explicita que são consequências da violência psicológica por parte do marido, e que afetam de alguma forma a vida dela. 7.2.2 Domínio de Autonomia e Desempenho O segundo domínio apresentado pelos autores já citados a cima, é o de Autonomia e Desempenho prejudicados. É composto por quatro esquemas, e trata, em geral, de expectativas do indivíduo, relacionadas a si mesmo e o ambiente, que interfere na auto percepção da capacidade do indivíduo de sobreviver, funcionar de forma independente ou até mesmo ter um bom desempenho. O primeiro esquema explicado é o de dependência/incompetência, em que Vitória só trouxe uma questão que chamasse atenção para os sentimentos 36 negativos. Ela traz como levemente mais verdadeira do que falsa a afirmação de que acha que falta bom senso para si. René Descartes traz a definição de bom senso em seu Discurso do Método, sendo entendida como a razão: (...)“A capacidade de bem julgar e de distinguir o verdadeiro do falso, que é propriamente o que denominamos ‘bom senso’ ou razão, é naturalmente igual em todos os homens”1 (Descartes, 1996, p. 2 apud PATY, M. 2003, p. 11). Durante as sessões, Vitória trouxe que a falta desse bom-senso está relacionada com: “falta eu ser mais firme com as pessoas. Ter uma firmeza em minha opinião e atitude” (sic) e “Eu não sou firme com o R. quando ele me agride. Ou eu choro ou respondo com agressividade também. Não tenho um meio termo de conseguir conversar com ele e colocar que eu não gosto das coisas que ele fala. Eu apenas vou deixando levar, porque já falei uma vez e não adiantou” (sic). Sendo assim, relacionando a definição apresentada e a fala de Vitória, com a teoria de Young, Klosko e Weishaar (2008) esse esquema prejudicado na paciente trouxe um elemento explicado pelos autores: a incompetência, em que o indivíduo não confia em sua capacidade de decisão, já que Vitória traz não conseguir ser firme em relação ao que ela acredita. O próximo esquema é a vulnerabilidade ao dano e a doença, em que o paciente com esse esquema prejudicado acredita que algo terrível possa lhe acontecer, além de seu controle. Vitória acredita que três, das cinco perguntas feitas, são em grande parte verdadeira. Acredita que não consegue deixar de sentir que algo ruim irá acontecer; sente que algum desastre (seja natural, criminal, financeiro ou médico) irá acontecer a qualquer momento; e tem medo de pegar uma doença séria, mesmo que nada de sério tenha sido diagnosticado pelos médicos. No caso, Vitória trouxe como comentário para essas perguntas o medo 1 “La puissance de bien juger et de distinguer le vrai d’avec le faux, qui est proprement ce qu’on nomme le bon sens ou la raison, est naturellement égale en tous les hommes” (Descartes, 1996, p. 2 apud PATY, M. 2003). 37 de que acontecesse algo com seu irmão, que aquele dia ela estava com este receio, ou seja, algo fora de seu controle. Além de trazer também o conteúdo de ela não ter medo da morte, “tenho medo apenas de ficar doente do nada e depender fisicamente de alguém” (sic), ou seja, algo terrível pode acontecer, mas que não tem como ela prever. O esquema posterior é o Emaranhamento, e Vitória trouxe apenas uma questão ligada a isso, em que acha levemente mais verdadeira do que falsa a afirmação de que seus pais e ela tendem a se envolver excessivamente cm a vida e com os problemas uns dos outros. Neste esquema, os autores trazem mais uma questão de o indivíduo ter uma dificuldade em de envolvimento emocional e intimidade em excesso com pessoas importantes, no caso os pais, dificultando a individuação integral e desenvolvimento social normal. Vitória relata que tinha um ótimo relacionamento com os pais, os quais já faleceram. Mas durante as sessões, não trouxe nenhum relato sobre esse emaranhamento em excesso, além da resposta para esta pergunta. Por fim, o último esquema deste domínio é o Fracasso. Este foi um dos esquemas que mais chamaram a atenção devido ao fato de ser uma das principais queixas da paciente como consequência da violência psicológica. Young, Kloskoe Weishaar (2008) citam que o indivíduo com esse esquema prejudicado acha que fracassou em relação a outras pessoas em diversas áreas. Sente-se basicamente inadequados em comparação com outros do mesmo nível, considerando-o inadequado, burro, sem talento ou malsucedido. Vitória paciente trouxe, no questionário, que acha moderadamente verdadeira as afirmações (questões 29 e 30) de que não tem tanto talento quanto a maioria das pessoas tem em sua profissão; e não é tão inteligente quanto a maioria das pessoas no que se refere a trabalho. Em relação as suas falas, ela traz o sentimento de fracasso relacionado a profissão e dinheiro, e ainda demonstra também os sentimentos de incapacidade, que já foi comentado nos erros cognitivos. “Tenho dificuldade em assimilar as coisas. Achava que demoro para 38 aprender, mas a faculdade me ajudou a ver que não é tudo isso. Mas, R. ainda colocou na minha cabeça que eu sou incapaz e incompetente. Então passei a acreditar nisso! ” (sic). Dentro das falas e resposta relacionadas a este domínio, Vitória traz o medo de acontecer algo, alguma catástrofe que não está sob seu controle ou não depende dela, o fracasso (em relação a profissão e ao dinheiro) e o sentimento de incapacidade e incompetência. Percebe-se que a violência psicológica do marido a fez tão mal a ponto de acreditar que ela realmente é incompetente e incapaz, como o marido coloca, ou a afeta de alguma forma a ponto de prejudicar sua própria autoimagem. 7.2.3 Domínio dos Limites Prejudicados O domínio seguinte é o dos Limites prejudicados e possui apenas um esquema avaliado na forma curta do questionário. Se trata de um indivíduo que evidencia prejuízos com relação a respeitar os direitos dos outros, a cooperar e a se comprometer com metas ou desafios. O esquema é o de Autocontrole/ Autodisciplina insuficientes. O indivíduo que possui esse esquema prejudicado, geralmente, carece de autocontrole e autodisciplina. Os autores trazem a dificuldade/recusa do indivíduo em executar o autocontrole e a tolerância em relação aos próprios objetivos ou a limitação de expressar excessivamente as emoções e impulsos. Em sua forma mais leve, o paciente apresenta ênfase exagerada na evitação de desconforto: evitando dor, conflito, confrontação e responsabilidade, à custa da realização pessoal, comprometimento ou integridade (YOUNG, KLOSKO E WEISHAAR 2008, p. 29). Vitória acredita que as questões 73 e 74 são em grande parte verdadeiras, as quais respectivamente se tratam dela acreditar que é muito difícil sacrificar uma gratidão imediata para atingir um objetivo a longo prazo; e não consegue se 39 obrigar a fazer coisas que não gosto, mesmo sabendo que é para o próprio bem. E acredita que a descreve perfeitamente a afirmação 72, em que quando não consegue atingir algum objetivo, fica facilmente frustrada e desiste. Relacionando as respostas de Vitória com a teoria trazida pelos autores, percebe-se que ela possui uma certa dificuldade em persistir em seus objetivos. Ela traz isso em alguns contextos, como a dependência financeira do marido e culpa-lo por algumas situações. Relata ter vontade de trabalhar ou fazer algo que gosta, porém não persiste nisso. “Eu quero trabalhar com o que eu gosto, mas ao mesmo tempo eu acho que estou numa idade onde eu quero curtir mais, sabe. Eu sei que estou cômoda, mas R. quem me acostumou assim. Eu parei de trabalhar e ele começou a me sustentar. É assim até hoje, e ele joga muito na minha cara. Mas quem me acostumou foi ele. Fala que joguei meu diploma na lata do lixo, que sou uma inútil e não faço nada. Ele também não me incentivou a tirar minha carteira de trabalho, e hoje ele ou a C. quem me leva para onde preciso ir. Então eu me acomodei! “ (sic). Por fim, percebe-se que, pelo comodismo citado no último parágrafo, Vitória prefere não enfrentar seus objetivos e o que quer, apenas jogar a culpa no outro e não executa o autocontrole, assim como o de sua vida, de seus objetivos ou até mesmo na situação de violência. Traz o sentimento de frustração (por não conseguir atingir alguns objetivos) e a dependência financeira do marido. 7.2.4 Domínio de Direcionamento para o Outro Este domínio possui dois esquemas (na forma curta, utilizada nesta pesquisa) e se trata no foco exagerado nas solicitações dos outros, sentimentos e desejos, à custa das próprias necessidades ou consciência, muitas vezes excedendo-as, para assim obter aprovação. Portanto, trata-se de uma aceitação condicional, ou seja, há um foco no que o outro espera. O primeiro esquema apresentado é do de Subjugação, em que há uma submissão excessiva pelo controle do outro, por sentir-se coagido e para 40 evitar a raiva ou o abandono, submete-se ao outro. Acredita que seus desejos, opiniões e sentimentos como pouco importantes para os outros. Os autores trazem duas formas: a) Subjugação das necessidades: supressão das próprias preferências, decisões e desejos. b) Subjugação das emoções: supressão de emoções, principalmente a raiva (YOUNG, KLOSKO E WEISHAAR 2008, p. 30). Com esses esquemas prejudicados, o aumento da raiva pode-se se manifestar em sintomas e pensamento desadaptativos (que podem gerar reações emocionais dolorosas e comportamento disfuncional), como por exemplo, explosões de descontroles, podendo ser emocional ou até mesmo o controle de certos objetivos que o indivíduo carrega consigo, sintomas psicossomáticos, baixa autoestima, retirada do afeto etc. Vitória trouxe no questionário que as afirmações de número 48 e 50 a descrevem perfeitamente, em que seus relacionamentos ela deixa a outra pessoa ter o controle; e concorda que tem grande dificuldade em exigir que os direitos dela sejam respeitados e que seus sentimentos sejam levados em conta. E trouxe que acredita ser em grande parte verdadeira a questão 49, sempre deixa os outros escolherem por ela, de modo que não sabe o que realmente quer. Vitória traz muito a questão de não conseguir colocar o que pensa em seu casamento, principalmente quando há a agressão psicológica: “quando ele começa a me agredir verbalmente, me chamar de incompetente e muitas vezes de palavras que eu não imaginava, eu começo a chorar. Chego a me trancar no banheiro e ficar lá chorando. Já teve vezes também em que esperei passar a situação, mesmo tendo ficado muito mal, e no outro dia eu explodi com ele” (sic). Houve vezes que ela relatou também a ausência de afeto: “Por conta de tudo isso que ele fez, de me agredir verbalmente, eu sinto que me afastei dele. Teve até momentos em que não senti sua falta quando ele foi viajar” (sic). E também houve momentos em que ela trouxe a baixa autoestima e autoimagem prejudicada: “eu não me sinto capaz e inteligente. De tanto ele me xingar, eu acabei me sentindo assim e acabei esquecendo de mim” (sic). De fato, esse é um dos esquemas que mais chama 41 atenção nas falas de Vitória, pois envolve a maneira como ela se vê e lida com seus sentimentos e pensamentos. O segundo esquema é o Auto sacrifício, em que a pessoa busca suprir as necessidades de terceiros à custa de suas próprias necessidades. Os autores citam que muitas vezes, há ressentimento nas relações, pois sentem que suas necessidades não estão sendo satisfeitas. As causas para isso acontecer, normalmente são para não causar sofrimento a outros, ou até mesmo evitar a culpa por se achar egoísta. Vitória trouxe com suas respostas no questionário que se preocupa com isso. Concordou que as questões de número 51, 52 e 53 a descrevem perfeitamente, as quais são, respectivamente:É aquela que geralmente acaba cuidando das pessoas de quem é próximo; é uma boa pessoa, pois pensa mais nos outros do que em si; as pessoas a veem fazendo demais pelos outros e pouco por si mesmo. E acredita que as questões 53 e 54 sejam levemente mais verdadeiras do que falsas, as quais são, respectivamente: fica tão ocupada fazendo coisas para as pessoas de quem gosta que tem muito pouco tempo para si; sempre foi aquela que escuta os problemas de todo mundo. De acordo com as respostas colocadas e os conteúdos trazidos por Vitória nas sessões, percebe-se que ela é uma pessoa que é preocupada em agradar mais os outros do que a si. No final do estudo e semanas após a aplicação do questionário, ela trouxe algumas falas relacionadas a esse tema “eu tinha esquecido que existia. Não pensava em mim e colocava os outros em primeiro lugar. Tentava agradá-los, mas eu resolvi mudar! ” (sic). Por fim, percebe-se que já neste domínio Vitória traz mais a respeito de si mesmo, de como se vê. Demonstrou os sentimentos de submissão, baixa autoestima, autoimagem prejudicada e até mesmo a ausência de afeto. E ainda explica que muitos desses sentimentos são causados pela violência que sofre do marido, o qual os reforçam. 42 7.2.5 Domínio da Supervigilância e Inibição Este domínio traz dois esquemas e se trata da ênfase em excesso na supressão dos sentimentos do próprio indivíduo e um cumprimento de regras e expectativas internalizadas e rígidas sobre o desempenho e comportamento ético, à custa de sua própria felicidade. Também pode acontecer um descuido com relacionamentos íntimos ou com a saúde. O primeiro esquema trazido pelos autores, na forma curta, é o de Inibição emocional. O indivíduo integra as regras e expectativas rígidas e internalizadas sobre o comportamento ético, ou seja, acaba tendo uma inibição excessiva da ação. Em geral, para evitar a desaprovação alheia, sentimentos de vergonha ou de perda de controle dos próprios impulsos. As áreas mais comuns da inibição envolvem: inibição da raiva e da agressão; inibição de impulsos positivos (por exemplo, alegria, afeto, excitação sexual, brincadeira); dificuldade de expressar vulnerabilidade ou comunicar livremente seus sentimentos, necessidades e assim por diante; ênfase excessiva na racionalidade, ao mesmo tempo em que se desconsideram emoções (YOUNG, KLOSKO E WEISHAAR 2008, p. 31). No questionário, Vitória trouxe apenas a questão 56 com a resposta acima de um. Ela acredita ser em grande parte verdadeira a firmação de que tem muita vergonha de demonstrar sentimentos positivos em relação aos outros (como afeição, mostrar que se importa). Nas sessões, ela trouxe que tem dificuldade em mostrar o que sente pelo marido e acredita que isso é pelo fato de ele agredi-la tanto psicologicamente. Relata o seguinte: “quando namorávamos, não era assim. Ele era romântico, cuidadoso e amoroso. Com o passar do tempo e depois que começou a beber, virou meio que agressivo. E por conta disso criei uma casca e não demonstro tanto quando antes” (sic). Então, Vitória relata acreditar que por conta da violência sofrida ela desenvolveu esse esquema, em que não consegue mais demonstrar seus sentimentos como antes, ou seja, inibiu-os. 43 Por fim o último, mas não menos importante dos esquemas, os Padrões inflexíveis/postura crítica exagerada. Trata-se da crença implícita que deve se fazer um imenso esforço para atingir certos e elevados padrões internalizados de comportamento e desempenho, para assim evitar críticas. Costuma resultar em sentimentos de pressão ou dificuldade de relaxar e em posturas críticas exageradas com relação a si mesmo e a outros. Deve envolver importante prejuízo do prazer, do relaxamento, da saúde, da autoestima, da sensação de realização ou de relacionamentos satisfatórios. Os padrões inflexíveis geralmente se apresentam como: (a) perfeccionismo, atenção exagerada a detalhes ou subestimação de quão bom é seu desempenho em relação à norma; (b) regras rígidas e ideias de como as coisas “deveriam” ser em muitas áreas da vida, incluindo preceitos morais, éticos, culturais e religiosos elevados, fora da realidade; (c) preocupação com tempo e eficiência, necessidade de fazer sempre mais do que se faz (YOUNG, KLOSKO E WEISHAAR 2008, p. 31). No questionário, Vitória traz acreditar que a afirmação 63 seja em grande parte verdadeira: precisa cumprir todas as suas responsabilidades; e a afirmação 64 a descreve perfeitamente: sente que existe uma pressão constante sobre ela para conquistar e fazer as coisas. Nas sessões, ela trouxe essa pressão por parte de R.: “Ele fala que eu não faço nada e me manda ir trabalhar. Uma vez estávamos almoçando algo meio que diferente e eu comentei com ele que poderíamos fazer aquilo mais vezes. Ele me respondeu falando que se eu trabalhasse poderia fazer isso” (sic). Mesmo com essa cobrança do marido, ela traz nas sessões o que ela pensa sobre não trabalhar agora: “Eu acho que já fiz muito a vida inteira pra ele. Já trabalhei demais, gastei dinheiro também e fiz tudo o que pude. Poderia voltar a trabalhar, mas não sei se consigo acostumar com a rotina novamente. Tá na hora dele fazer um pouco para mim também. Então acho que ele tem que me dar dinheiro quando quero comprar algo, por exemplo” (sic). Percebe-se que o padrão inflexível de regras rígidas se aplica levemente nesta situação, em que há uma grande dependência financeira e ela acredita que ele tem o dever de dar o que ela precisa. 44 Dentro deste domínio podemos perceber que há o sentimento de vergonha para demonstrar sentimentos, pois, por consequência da violência psicológica ela acabou os inibindo e prefere não demonstrá-los. Por fim, percebe-se que são muitos os sentimentos negativos causados pela violência psicológica, podendo afetar vários aspectos, desde a autoimagem da pessoa até como ela vai agir e enfrentar os problemas, diversidades e objetivos da vida. No caso de Vitória, puderam ser notados vários desses sentimentos causados pela violência, e que que foram citados na introdução desta pesquisa por Grielber e Borges (2013), Roth e Colés (apud, ROVINSKI, 2004) dentre outros. 7.3 Sentimentos positivos Segundo Lucas (2011), sentimentos positivos geram pensamentos positivos, os quais não se resumem em apenas afirmações positivas ou capacidades. A estratégia que mais conta, é a estruturação de um encadeamento de ações que suportadas pelas afirmações irão expressar as forças, valores, objetivos e crenças adaptativas da pessoa ou grupo de pessoas. As pessoas que pensam de forma otimista, capacitadora e positiva, escolhem fazer um uso diferente da imaginação humana. A imaginação que cada um de nós possui deveria ser usada, não para fugir à realidade, mas para criar (LUCAS, 2011). No esquema Isolamento Social trazido no questionário, dentro do domínio desconexão e rejeição, Vitória colocou como falsa todas as questões, ou seja, acredita-se que ela não se sente isolada ou excluída de grupos. Pelo contrário, disse que conversa bem e se integra bem a grupos, inclusive fala que gosta muito de sair para tomar café com as amigas e socializar. Dentro do domínio Limites prejudicados e do esquema de merecimento, trouxe a questão de que acredita ser mais verdadeira do que falsa a 45 afirmação de que detesta ser obrigada a fazer alguma coisa ou impedida de fazer o que deseja. Sendo assim, percebe-se que mesmo havendo a violência psicológica e havendo a submissão trazida nos sentimentos negativos, a mesma ainda sim, não aceita ser privada
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