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Rousseau e a educação na infancia

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ROUSSEAU E A EDUCAÇÃO DA INFÂNCIA 
 
GROSS*, Renato– UTP 
grossrenato@yahoo.com.br 
 
GRAMINHO**, Carla – UTP 
carlag@onda.com.br 
 
Resumo 
 
O presente trabalho, de natureza histórico-analítico-descritiva, objetiva resgatar para a 
atualidade as idéias de Rousseau referentes à educação da infância. Este conceito foi uma das 
principais contribuições da modernidade no campo das idéias pedagógicas. Seu caráter se 
reveste de atualidade pois, na pós-modernidade, assiste-se ao esvaziamento da infância no que 
ela tem de potencialmente pedagógico. Analisam-se os primeiros capítulos da obra Emilio, ou 
Da Educação, os quais acompanham a sua formação até a idade de doze anos. Desenvolve-se 
também o conceito rousseaniano de educação negativa. 
 
Palavras-chave: Rousseau; Infância; Educação da infância. 
 
Considerações iniciais 
O presente trabalho visa a analisar e a aprofundar conhecimentos a respeito da obra 
Emílio ou da Educação (1762) do filósofo genebrino Jean-Jacques Rousseau (1712–1778), a 
visão que ele apresenta sobre a infância, o seu pensamento pedagógico, o seu conceito de 
educação negativa e suas contribuições para a educação na atualidade. Rousseau considera 
que não havendo uma Educação conforme a natureza, denominada por ele como educação 
negativa, a conseqüência será a formação de um homem desfigurado, com vícios e 
preconceitos. Homem desfigurado é aquele que somente age segundo os “ditames de uma 
sociedade corrupta”, que só leva o homem a corromper-se, a ficar mais distante da sua 
imagem original. 
A obra Emílio ou da Educação, sendo o Emílio um personagem fictício ou literário, e 
a obra divide-se em cinco partes. Cada uma delas trata de uma maneira particular da 
aprendizagem da criança e de uma fase específica do seu desenvolvimento. 
A primeira parte ou Livro I (do nascimento até os dois anos) ele denomina de idade da 
necessidade. Nessa fase, o autor se preocupa, entre outras questões, com a amamentação, com 
a escolha de uma ama sadia de corpo e alma, para que o leite seja bom, natural e forte. Afirma 
 
*
 Prof. Dr. - PPEG Mestrado em Educação Universidade Tuiuti do Paraná. 
**
 Acadêmica de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná. 
 3158 
que a Educação ideal deve ser recebida pela ama ou quem amamente e pelo pai ou governante 
(sic), estando os dois em pleno acordo, representando para a criança uma só pessoa. Indica 
que o banho seja inicialmente morno e que a temperatura da água seja gradativamente 
reduzida, para que a criança possa se acostumar com todas as temperaturas. 
A segunda parte ou Livro II (dos dois aos doze anos) é denominada a idade da 
natureza. Nessa fase, Rousseau enfatiza que é o momento de exercitar o corpo e os sentidos 
da criança, evitando-se os sermões que a criança ainda não compreende, e mantê-la “tão 
somente na dependência das coisas” (ROUSSEAU, 1995, p. 69). Para ele a criança ainda não 
está apta a raciocinar, é preciso deixá-la gozar sua infância. 
A terceira parte ou Livro III (dos doze aos quinze anos) é denominado a idade da 
força. Nessa fase, o Emílio poderá entrar em contato com a educação intelectual e técnica, 
quando ele aprenderá Física, Geografia, Cosmologia, etc. É o começo de um preparo para a 
vida social, por meio da aprendizagem de um trabalho manual, ligado às artes mecânicas. 
Assim o aprendiz será despertado para a idéia da interdependência dos homens, da utilidade, 
da igualdade, da necessidade de trabalhar. 
A quarta parte ou Livro IV (dos quinze aos vinte anos) é a idade da razão e das 
paixões. Para Rousseau, essa fase representa um segundo nascimento, pois o Emílio entraria 
para o mundo moral e religioso, num aprendizado conjunto entre o corpo e espírito, entre 
razão e sentimento. “É preferível favorecer as paixões naturais que tornam o homem sociável 
(a amizade, a compaixão, a simpatia) e afastar a vaidade, a ambição, a inveja, o ódio, que são 
obras da sociedade” (BROSSE, 1990, p.8). Começa o estudo da sociedade, da religião, da 
igualdade, da justiça através de histórias e de fábulas. 
Finalmente, a quinta parte ou Livro V (dos vinte aos vinte e cinco anos), é a idade da 
sabedoria. Trata da educação política de Emílio e sua inserção na ordem civil e também 
discorre sobre a educação feminina. A formação do aprendiz nessa etapa se dará por meio de 
viagens a outros países, e será exigido um estudo mais aprofundado dessas culturas e lições de 
direito político. Ressalta-se que o recurso “viagem de formação”, principalmente para aquelas 
regiões berço da civilização ocidental como Itália (Roma e Florença especialmente) e Grécia 
(Atenas), era um recurso pedagógico bastante usual na época, (séc.XVIII) para os jovens de 
famílias de recursos. 
 
 
 
 
 3159 
Perfil de Rousseau e seu personagem 
Jean-Jacques Rousseau nasceu em Genebra, Suíça, a 28 de junho de 1712 e faleceu na 
França em 02 de julho de 1778, aos 66 anos. Foi filósofo, escritor, teórico político e um 
compositor musical autodidata. Teve uma infância conturbada, pois, sua mãe, Suzanne 
Bernard, morre dias depois de seu nascimento, em decorrência do parto, e seu pai, Isaak 
Rousseau, um relojoeiro famoso, morreu quando ele tinha 10 anos. Nessa idade, ele “ficou a 
cargo de uns tios, que confiaram sua educação a um pastor protestante, Lambercier, morador 
no campo, e que lhe ensinou algum latim e outras matérias” (LUZURIAGA, 2001, p. 163). 
Rousseau desde os seis anos aprendeu com seu pai a ler diversos textos (romances que sua 
mãe escrevia) e livros, dentre eles, os clássicos da Grécia e Roma; Vidas, de Plutarco e 
Discursos sobre História Universal, de Bossuet. Com essa infinidade de leituras sentimentais, 
Rousseau começou a formar seu caráter sentimental e de temperamento exaltado. 
Rousseau foi encaminhado pelo seu tio à aldeia de Bossey e, segundo Eby, essa foi a 
“única formação que ele estava destinado a receber” (1976, p. 278). Nesse período, em meio a 
brincadeiras, Rousseau adquiriu um místico amor pela natureza. Na juventude, Rousseau 
começa a trabalhar para um escrivão, depois com um gravador, mas não se adapta. Foge, 
perambula, converte-se ao catolicismo, vai residir na casa de um vigário, torna-se cantor e 
professor de música. Tem várias amantes, viaja bastante, emprega-se como preceptor 
particular para educar crianças de famílias burguesas. Segundo Eby, depois de 1741, 
Rousseau que estava pobre, conheceu Thérèse Levasseur, (criada vulgar) que viveu como sua 
amante durante 23 anos; dessa união, nasceram cinco crianças, todas entregues a “roda dos 
enjeitados”, e anos mais tarde, a despeito de todos os seus esforços, não conseguiu mais 
localizar nenhuma delas. 
 
Se alguém tivesse podido olhar dentro do coração deste descuidado jovem 
vagabundo, nada teria notado que pronunciasse o futuro gênio que deveria afetar 
profundamente o curso da civilização. Era amante apaixonado da música, tinha uma 
afinidade mística com a natureza, um agudo sentimento de justiça, um ligeiro 
interesse por artes manuais, uma consciência sexual anormal, uma natureza um tanto 
tímida e desconfiada, um temperamento instável e um desejo incomensurável de 
independência (Ibid, p.278). 
 
Recebe diversas críticas a respeito disso, principalmente: como alguém que não 
educou os próprios filhos poderá escrever sobre educação de crianças? Mas as contradições e 
incoerências foram suas companheiras constantes na vida que levou. 
Rousseau foi um grande teórico da educação, seu pensamento constitui um marco na 
pedagogia contemporânea e suas obras antecipam o ideário da revolução francesa. Seu 
 3160 
pensamento pedagógico não se separa da sua concepção política (expressado na obra 
Contrato Social (1762)), da crítica ao absolutismo, pois elabora os fundamentos da doutrina 
liberal e combatia idéiasantigas e conservadoras que enfatizavam os interesses dos adultos, e 
não das crianças. Sua premissa filosófica é a de que o homem nasce bom e a sociedade o 
corrompe. O Emílio abre com a magistral frase – uma das mais conhecidas da história das 
idéias pedagógicas - “Tudo é certo em saindo das mãos do Autor das coisas, tudo degenera 
nas mãos do homem” (ROUSSEAU, 1995, p.09). 
Rousseau considerava a criança como um ser superior ao adulto porque aquela possui 
uma inocência infantil e natural, e tem em si a condição original de existência humana. 
Segundo Brosse (1997), Ele era contra as rotinas tradicionais da época, em prol da felicidade 
das crianças e das necessidades da vida; seu ideal pedagógico consistia em preservar a 
liberdade natural da criança e depois promover sua liberdade moral. 
Brosse nos lembra também que a Educação, em meados de 1750, apresentava diversas 
lacunas. Era uma época em que os pais deixavam seus filhos sob a guarda de preceptores, 
amas ou governantas desqualificadas para desfrutarem mais suas vidas; ou em conventos e 
colégios que tinham apenas a preocupação de tornar esses pequenos seres em adultos em 
miniatura. Muitos filósofos começaram a questionar sobre essas lacunas, porém, apenas 
Rousseau criou um ideal filosófico de um sistema pedagógico. Era imprescindível para 
Rousseau que esse contexto fosse mudado, que as crianças fossem respeitadas e criadas em 
um meio mais natural, longe dos interesses dos adultos e da injustiça. 
 
No estado em que já se encontram as coisas, um homem abandonado a si mesmo, 
desde o nascimento, entre os demais, seria o mais desfigurado de todos. Os 
preconceitos, a autoridade, a necessidade, o exemplo, todas as instituições sociais 
em que nos achamos submersos abafariam nele a natureza e nada poriam no lugar 
dela. Ela seria como um arbusto que o acaso fez nascer no meio do caminho e que os 
passantes logo farão morrer, nele batendo de todos os lados e dobrando-o em todos 
os sentidos (ROUSSEAU, 1995, p. 9). 
 
O acima citado Brosse (1997) lembra também que Rousseau se preocupa com a 
filosofia da educação, e seu verdadeiro estudo é o da condição humana; a interação do homem 
numa sociedade moral, com a educação permitindo o estabelecimento de um contrato social 
racional. Para se trabalhar essa reeducação em meio a sociedade degenerada, cumpre-se 
inspirar nos direitos da natureza, mas sem crer que a sociedade possa voltar a um estado de 
natureza original. Para Rousseau, a natureza possui três significados distintos: como oposição 
àquilo que é social; como valorização das necessidades espontâneas das crianças e dos 
processos livres de conhecimento e como exigência de um contínuo contrato com um 
 3161 
ambiente físico não urbano. O fim da educação, seu propósito, seria a reapropriação de sua 
natureza pelo homem. Rousseau faz, portanto, uma reflexão sobre a educação, principalmente 
nos primeiros anos da criança, pois o princípio fundamental para ele é que a criança seja 
respeitada desde o seu nascimento, já que ela é naturalmente boa; e que não devemos 
considerá-la apenas como um adulto em miniatura, e sim entender sua simplicidade, sendo-
lhe permitidos os exercícios corporais, a estimulação sensorial, a alimentação vegetariana, o 
contato íntimo com a natureza. É importante deixar a mente de criança em paz, mas 
observando bem as suas ações e formas de conduta para conhecer o temperamento e o caráter 
de cada criança individualmente. Aliás, a arte de efetuar observação é imprescindível para o 
educador captar a verdadeira natureza do caráter infantil – Rousseau deixa isto bastante 
evidenciado ao longo da obra que se está aqui estudando. 
Para Cerizara (1990), o texto rousseauniano provoca o pensamento de maneira a jogá-
lo num movimento pendular entre o possível e o desejável. O contra-senso revela-se o motor 
de um pensamento que não deve apenas se contentar com fórmulas prontas e perfeitas, mas 
sim, sempre buscando o questionamento, uma nova forma de pensar e agir. 
 
Perfil e descrição do Emílio. 
Emílio é um menino órfão, robusto e sadio fisicamente, vive na França, nos campos, 
longe dos costumes da cidade, e é acompanhado por um preceptor desde seu nascimento até 
os 25 anos. Pelas próprias palavras de Rousseau, “Emílio é órfão. Pouco importa que tenha 
pai e mãe”. Mais adiante, “[...] uma criança bem formada, vigorosa, sadia” (1995, p.30). Para 
o autor, é imprescindível que esse personagem tenha um corpo sadio, pois dele dependerá seu 
crescimento, e o fortalecimento de sua alma. “Quanto mais fraco o corpo, mais ele comanda; 
quanto mais forte, mais obedece” (Ibid, p.31). 
Rousseau prefere a França devido este ser um país de clima temperado como indica na 
seguinte frase: “a terra não é diferente à cultura dos homens; eles só são o que podem ser nos 
climas temperados. Nos climas extremados a desvantagem é visível” (Ibid, p.29). Ele 
demonstra preocupação com a escolha de regiões onde o clima seja muito quente ou muito 
frio, pois as mesmas podem acarretar algumas desvantagens na educação de uma pessoa. 
Rousseau propõe que o preceptor seja seu único companheiro, e este, quando 
assumir esse dever não deve mais voltar atrás, “Ele deve honrar seus pais, mas só deve 
obedecer a mim. É minha condição primeira, ou melhor, minha única condição” (Ibid, p.30). 
Assim, o autor faz um pacto entre discípulo e governante que prevê que o aluno aceite ser 
conduzido pelo governante, numa relação de amor e amizade mútua e o Emílio seguirá a 
 3162 
marcha da natureza. Não questiona a questão de desigualdade entre os pactuantes, um adulto e 
uma criança. Pelo contrário, ressalta a categoria tempo, e afirma: 
 
Mas quando eles se vêem como devendo passar a vida juntos, importa-lhes fazerem-
se amar mutuamente e por isso mesmo se tornam caros um a outro. O aluno não se 
envergonha de acompanhar na infância o amigo que deverá ter em crescendo; o 
governante toma interesse pelos cuidados cujo fruto deverá colher, e todo o tempo 
que dá a seu aluno é um capital que aplica em proveito de sua velhice (Ibid, p.30). 
 
O preceptor, para Rousseau, pode escolher seu filho, diferentemente do pai, que não 
tem escolha por assumir um dever que a natureza lhe impõe, ele deve prever tudo para poder 
cumprir bem sua missão. Logo, a escolha de um jovem saudável e robusto é justificada. “Não 
quero saber de um aluno sempre inútil a si mesmo e aos outros, que só se ocupe com se 
conservar e cujo corpo prejudique a educação da alma [...] não sei ensinar a viver a quem não 
pensa senão em não morrer” (Ibid, p.31). 
 
A idade da necessidade - O Emílio do nascimento aos 2 anos 
Nesse capítulo do livro primeiro, Rousseau refere-se mais sobre as crianças em geral 
do que especificamente sobre seu personagem fictício, o Emílio. 
Segundo Eby (1976), as fases de desenvolvimento da vida individual já existiam desde 
Aristóteles e Comenius; porém, foi Rousseau quem tornou o reconhecimento dessas fases um 
princípio vital para a educação, mostrando seu maior significado. Para ele, o filósofo francês 
foi o primeiro a introduzir a teoria do desenvolvimento por saltos, e seu crescimento estava 
em concordância com suas próprias experiências temperamentais. 
O autor francês acreditava que a educação do homem começava com seu nascimento. 
“Repito-o, a educação do homem começa com seu nascimento; antes de falar, antes de 
compreender, já ele se instrui. A experiência adianta-se às lições; no momento em que 
conhece sua ama, já muito ele adquiriu” (ROUSSEAU, 1995, p.42). E nessa perspectiva, o 
autor denuncia o modo como a criança era tratada em seu tempo. “O homem civil nasce, vive 
e morre na escravidão; ao nascer, envolvem-no em um cueiro; ao morrer, encerram-no em um 
caixão; enquanto conserva sua figura humana está acorrentado a nossas instituições” (Ibid, 
p.17). Assim, ele fezcorrespondência entre a prática do uso de faixas, cueiros, toucas que 
amarram e impedem as crianças de movimentar-se livremente com o costume que as mães 
tinham de entregar seus filhos aos cuidados de amas de leite ou em cativeiros. 
A criança, nessa faixa etária, requer muitos cuidados e atenção de seus pais. Como na 
época do Emílio, as famílias tinham o costume de entregar os recém-nascidos aos cuidados de 
 3163 
amas de leite para serem criados por elas, não havia o contato inicial e primordial da mãe com 
seu bebê. E Rousseau combatia a idéia de as crianças só se tornavam objeto de atenção dos 
adultos após os oito anos. No caso do Emílio, a escolha de uma ama de corpo e alma sãs é 
fundamental, uma vez que ela deverá ser a única na vida de Emílio. 
 
Mudanças freqüentes de ama levam a criança a diminuir sua estima pelos que a 
governam e, consequentemente, por sua autoridade. Na verdade, essas advertências 
só revelam que tanto a ama é a verdadeira mãe, quanto o preceptor é o verdadeiro 
pai. A criança não deve ter como superiores senão o pai e mãe, e, na ausência deles, 
o preceptor e a ama. Embora sejam dois, devem atuar com tal consonância que 
pareçam uma só pessoa para a criança (CERIZARA, 1990, p.60). 
 
Rousseau também se preocupa com a alimentação que essas camponesas dispunham, 
informando que o regime a base de vegetais é mais adequado e benéfico ao leite materno do 
que o regime alimentar das mulheres que viviam nas cidades. Ele é contra o excesso de 
tempero e frituras. 
 
Reformai as regras de vossa cozinha; evitai a manteiga queimada e as frituras; que 
nem a manteiga, nem o sal, nem os laticínios passem pelo fogo; [...] a dieta, ao invés 
de perturbar a ama, dar-lhe-á leite em abundância e da melhor qualidade 
(ROUSSEAU, 1995, p.37). 
 
Ele ainda ressalta que uma mudança radical no estilo de vida de uma camponesa, por 
exemplo, pode também ser prejudicial tanto à sua saúde quanto a de seu bebê. Se a 
camponesa é retirada de seu lar para ficar confinada com seu bebê num quarto da cidade 
grande, essa troca de ar prejudica da mesma forma a criança. Rousseau afirma que: 
 
É principalmente nos primeiros anos de vida que o ar atua sobre a constituição das 
crianças. Numa pele delicada e mole, ele penetra por todos os poros, afeta 
fortemente os corpos em desenvolvimento, deixa-lhes impressões que não se 
apagam. Não sou por isso favorável a que se tire uma camponesa de sua aldeia para 
fechá-la num quarto da cidade e se faça amamentar a criança em casa; prefiro que 
ela vá respirar o bom ar dos campos a respirar o mau da cidade (Ibid, p.37). 
 
E Rousseau teoriza sobre o choro “como todas as suas sensações são afetivas, quando 
são agradáveis elas as apreciam em silêncio; quando penosas, elas o dizem em sua linguagem 
e pedem alívio. [...] Todas as nossas línguas são obras de arte. [...] Essa língua não é 
articulada, mas é acentuada, sonora, inteligível.” (ROUSSEAU, 1995, p.45). Para ele, ao 
estudarmos as crianças, estamos na verdade reaprendendo com elas. E os nossos professores 
nessa questão são as amas, pois elas entendem tudo o que seu bebê diz, ou por meio de gestos 
e expressões corporais ou por meio do grito e choro. Ele assinala que a linguagem da voz une-
se com a do gesto, principalmente, o gesto facial. 
 3164 
 
É de espantar ver a que ponto essas fisionomias mal formadas já têm expressão; seus 
traços mudam de um momento para outro com inconcebível rapidez; vêem-se nelas 
o sorriso, o desejo, o pavor nascerem e passarem como relâmpagos (Ibid, p. 46). 
 
A criança sente muitas necessidades, e estas só são expressas no choro, no riso e nas 
expressões corporais, pois ainda não dominam as palavras. Nesse contexto, há uma 
preocupação muito grande com relação ao tratamento dado pelas amas no sentido de não 
saber como atender ao choro da criança. Muitas delas tornam-se brutais e ríspidas, pois 
perdem a paciência e acabam batendo na criança sem saber o verdadeiro motivo desse choro. 
Essa atitude cria nas crianças um sentimento de mágoa, desconforto e ressentimento. “Afastai 
delas com o maior cuidado os criados que as excitam, as irritam, as impacientam: são-lhe cem 
vezes mais perigosos, mais funestos que as injúrias do ar e das estações” (Ibid, p. 47). 
A maneira como o autor analisa a comunicação das crianças, valorizando aspectos 
comuns e facilmente desprezados, demonstra sua aguda percepção do perfil psicológico da 
criança. Assim, o choro mal interpretado pode determinar o medo da criança em relacionar-se 
com o mundo. Por isso, o adulto, ao ter contato com o choro infantil, deve tomar consciência 
dos seus aspectos e levar em consideração a tendência das crianças à raiva, à teimosia e à 
manha. 
No entanto, ele ressalta que devemos ter muito cuidado para não ficarmos a mercê 
desse choro, pois ele pode representar o desejo de uma criança e este, na sua opinião, não 
deve ser atendido sempre, pois é um capricho. 
O educador ou preceptor deve mostrar à criança todas as formas e estilos de objetos ou 
coisas, animais, figuras, brinquedos e máscaras. Ela, então, acostumar-se-á a essa variedade 
de coisas e não irá mais se assustar com nada na vida adulta. Rousseau diz, “As crianças 
criadas em casas limpas, onde não existem aranhas, têm medo das aranhas e esse medo se 
prolonga na idade adulta. Nunca vi camponês, homem, mulher ou criança, ter medo de 
aranha” (Ibid, 1995, p.43). 
Rousseau também considera outros dois fatores determinantes para o desenvolvimento 
da criança: a sensação e o movimento. Afirma que: 
 
No princípio da vida, quando a memória e a imaginação são ainda inativas, a criança 
só presta atenção àquilo que afeta seus sentidos no momento; sendo suas sensações 
o primeiro material de seus conhecimentos, oferecer-lhas numa ordem conveniente é 
preparar sua memória a fornecer-lhas um dia na mesma ordem a seu entendimento; 
mas como ela só presta atenção a suas sensações, basta primeiramente mostrar-lhe 
bem distintamente a ligação dessas sensações com os objetos que as provocam (Ibid, 
p.44) 
 3165 
 
Quanto à linguagem, Rousseau afirma que a linguagem, nesta fase, é um processo de 
construção própria, pois a criança inicia com uma gramática de sua idade e cuja sintaxe tem 
regras mais gerais que a dos adultos. O que importa mais para a criança nessa idade é 
aprender a escutar corretamente as palavras, sem preocupação com a escrita, a princípio. “É 
um pedantismo insuportável e um cuidado por demais supérfluo insistir em corrigir nas 
crianças todos esses pequenos erros contra os usos, erros de que nunca deixam, elas próprias, 
de se corrigir com o tempo” (apud CERIZARA, 1990, p.74). Cabe ao adulto falar sempre 
corretamente diante das crianças, sem repreendê-las. 
 
A idade da Natureza - O Emílio dos 2 aos 12 anos 
Na segunda parte da obra Rousseau trata da educação do Emílio dos 2 aos 12 anos, 
período este denominado, a idade da natureza. 
Como a criança pequena, ao andar, amplia o estado físico de sua atuação e o seu 
contato com objetos novos também se amplia suas possibilidades de se machucar. Para o 
autor, “sofrer é a primeira coisa que deve aprender e a que terá mais necessidade de saber” 
(Ibid, p.59). Ele considera que a liberdade está ligada ao sofrimento, e que a criança ao 
experienciar um novo mundo com seus próprios pés, está sujeito a correr vários riscos; isso 
será benéfico na medida em que a dor habilita a criança a enfrentá-la. Para o autor, o educador 
deve conduzir a criança a novas experiências para que a mesma possa se fortalecer e não só 
afastá-las do perigo, e complementa “nossa mania pedante de educar é sempre a de ensinar às 
crianças o que aprenderiam muito melhor sozinhas e esquecer o que somente nós lhes 
poderíamos ensinar” (Ibid, p.59). 
O autor também se preocupa com a autonomia da criança, pois paraele, ela começa 
sozinha a realizar suas primeiras ações e tornar-se consciente de si mesma; com isso valoriza 
o período básico da formação do homem. Como lembra Cerizara, “se queremos pessoas aptas 
a pensar com autonomia, é preciso que tenhamos crianças capazes de fazê-lo” (1990, p.80). 
A palavra autonomia vem do grego autós (por si próprio) e nómos (lei, que regula) que 
significa, portanto, ser regido por sua própria lei. No caso do Emílio, o pacto estabelecido 
entre ele e seu educador, supõe o seu aval para que haja liberdade e autonomia. Assim, o 
pacto transforma a submissão em ato de liberdade, e isso só ocorre enquanto existir esse 
pacto. Para Rousseau, tanto a criança (no seu estado natural) quanto o homem (na sociedade) 
gozam de uma liberdade imperfeita e semelhante. Na criança essa imperfeição é conseqüência 
de seu estado de fraqueza, no homem é resultado da sua dependência com a sociedade. Assim, 
 3166 
devem ser respeitados os limites da criança para que ela possa quando adulta, saber seu lugar 
no mundo e saber respeitar os outros, exigindo também os seus direitos. 
 
Rousseau e a educação da criança - A educação negativa 
Um dos conceitos fundantes da filosofia rousseauniana da educação e da pedagogia, é 
o da “Educação Negativa”. Esta é concebida como sendo aquela originária da própria 
natureza, em contato com os animais, as plantas e fenômenos físicos que o homem urbano 
mantém distância, sem a interferência da sociedade, dos homens. Uma Educação em que a 
criança usufrui de total liberdade, ligada diretamente ao que é mais natural do ser humano. 
“Uma Educação Negativa, isto é, a criança é educada na região rural, protegida pela ausência 
de contato com a família, a sociedade, os livros” (BROSSE, 1995, p.8). 
Assim, Rousseau propõe que a educação negativa, por meio do Emílio, siga, 
sistematicamente, a “marcha da natureza”. Para isso é preciso que se faça uma distinção dos 
vários momentos da formação do espírito humano através do tempo. O autor considera aqui o 
tempo do ponto de vista do indivíduo moderno, na experiência subjetiva como se houvesse 
para o homem algum acesso imediato ao que nele há de natural ou original. Essa é uma das 
grandes contribuições do Emílio para entendermos melhor os conflitos entre natureza e 
sociedade, e uma compreensão do homem moderno. 
O filósofo marca três planos sobre a educação com considerações pedagógicas. O 
primeiro trata da educação da natureza - desenvolvimento dos órgãos e das faculdades 
humanas que já é intrínseco ao homem; o segundo plano é o da educação dos homens – 
educação que é aprendida por meio do homem, fazendo uso do próprio desenvolvimento; e o 
terceiro é o da educação das coisas, dos objetos – não depende imediatamente da educação 
dos homens ou da natureza, trata-se da experiência. É claro que essa experiência supõe, para 
Rousseau, além da realidade das coisas mesmas, a objetividade daquilo que é colocado na 
nossa frente e a influência do experimentador. Assim, todo o Emílio também representa essa 
exposição a uma interioridade contraditória, do eu que vive nas sociedades modernas. Como a 
expressão, experiência, só é aplicável ao ser humano, o verdadeiro estudo para Rousseau é o 
da condição humana. 
Ao distinguir os três planos da educação, ele considera a educação da natureza a 
primeira em relação aos outros dois tipos, pois é a única educação que não depende de nós, e 
não requer provas para isso; admite-se a natureza como fim da ação humana. O filósofo 
afirma que, se toda educação é uma arte, ela ambiciona a perfeição; é mais perfeito o que é 
 3167 
mais independente, deste modo, a educação que menos depender do exterior para existir 
comanda as outras. 
Na obra do Emílio, Rousseau não considera a natureza como sendo uma finalidade do 
homem, pois ela é passível de mudança, assim como o homem, daí suas contradições. A 
infelicidade e a miséria do homem são decorrentes de sua vida em sociedade, não ligadas as 
suas disposições mais primitivas e sim recebidas como resultado de um acelerado 
aperfeiçoamento, onde suas faculdades e limites não são respeitadas. 
Ora, a educação negativa proposta por Rousseau consiste em seguir os preceitos da 
natureza, respeitando suas fases e não se adiantar a elas, tampouco no desenvolvimento da 
razão. Se, como diz nosso autor, "cada idade, cada condição na vida tem sua perfeição 
conveniente, sua espécie de maturidade própria" (ROUSSEAU, p.164), o período do 
nascimento até os doze anos é considerado o mais perigoso, no sentido de que é nele que os 
erros e os vícios tendem a surgir. É por isso que Rousseau prega a educação negativa, que 
preserva a inocência e a pureza da criança da degeneração dos homens, “não ensinar a virtude 
ou a verdade, mas preservar o coração do vício e o espírito do erro” (Ibid, p.80). 
Conforme informa Cerizara (1990), educação negativa para Rousseau não é ociosa, ela 
dispõe a criança a tudo o que possa levá-la ao verdadeiro quando ela está em condições de 
entendê-lo. Seu princípio básico é evitar proclamar deveres passíveis de se tornar odiosos às 
crianças, ou até impraticáveis, por serem incompreensíveis a elas. Dessa forma, torna-se 
contrário a educação positiva que, pensando pregar a virtude, faz com que as crianças 
apreciem todos os vícios. O que deve ser incentivado nas crianças são o exercício do corpo, 
dos órgãos e dos sentidos, onde esses aspectos serão transformados em instrumentos para a 
criança construir o seu conhecimento. 
 
Considerações finais 
Estudar a obra do Emílio ou da Educação e o seu autor é de grande valia para um 
educador atual, pois muitas das suas idéias deveriam ser mais e melhor utilizadas na educação 
atual. Nossas crianças são ainda incompreendidas pelo adulto. 
Rousseau foi o filósofo da contradição, pois seus textos muitas vezes são antagônicos. 
Quando ele mostra a dupla natureza das finalidades educativas (internas e próprias para cada 
idade) está, na verdade, apontando os novos rumos para a escolaridade, rumos estes que foram 
trilhados pelos seus seguidores, como Pestalozzi e Fröebel. 
Com Rousseau, percebemos o nascimento do conceito de infância, conceito este que 
norteou a pedagogia durante três séculos. Hoje se assiste ao fim da infância, pois nossas 
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crianças não têm mais tempo para brincar, se divertir e serem livres. Com a era da 
informatização, as crianças passam a maior parte do dia em frente a um computador, a uma 
televisão ou em jogos de vídeo games. Assim, a fase de maior espontaneidade, de liberdade 
que vai dos zero aos oito, nove anos fica prejudicada. Sua inocência infantil foi posta de lado 
pela indústria do entretenimento. 
Buscar as idéias de Rousseau, sobre liberdade, espontaneidade, natureza, preocupação 
com a criança na sua totalidade e aplicá-las novamente, nos dias atuais, é primordial para se 
resgatar a infância perdida. A criança deve aprender a ler, a escrever, mas deve também, 
correr, cair, brincar, ser respeitada e ser estimulada desde o momento em que nasce. Só assim, 
teremos uma educação que, ao valorizar a infância e a criança, irá contribuir para um mundo 
mais fraterno. 
 
REFERÊNCIAS 
 
BROSSE, Emilie. A educação segundo Rousseau. Curitiba: Secretaria de Estado da 
Educação, 1997. 
 
CERIZARA, Beatriz. Rousseau: a educação na infância. São Paulo: Scipione, 1990. 
 
EBY, Frederick. História da Educação Moderna: teoria, organização e práticas 
educacionais. 2. ed. Porto Alegre: Globo, 1976. 
 
LUZURIAGA, Lorenzo. História da Educação e da pedagogia. 19. ed. São Paulo: 
Companhia Editora Nacional, 2001. 
 
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou da Educação. Trad. Sérgio Milliet. 3. ed. Rio de 
Janeiro: Bertrand Brasil, 1995.

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