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História Contemporânea I
Professor David Maciel
Bianca Cristina Barreto Casanova
FICHAMENTO
A Forma Clássica do Romance Histórico
Gyorgy Lukács
 O romance histórico surgiu no início do século XIX, por volta da época da queda de Napoleão. Nos séculos XVII e XVIII já haviam romances de temática histórica, podendo-se considerar as adaptações de histórias e mitos antigos na Idade Média “precursoras” do romance histórico e ir além, retrocedendo à China e à Índia. Mas por essa via não se encontrará nada que possa iluminar o fenômeno do romance histórico.
 Os chamados romances históricos do século XVII são históricos apenas por sua temática puramente exterior, por sua roupagem. Não só a psicologia das personagens, como também os costumes retratados são inteiramente da época do escritor; somente importa a exposição da curiosidade e da excentricidade do meio, e não o retrato artístico fiel de uma época histórica concreta. O que falta ao pretenso romance histórico anterior ao de Walter Scott é o elemento especificamente histórico: o fato de a particularidade dos homens ativos derivar da especificidade histórica de seu tempo.
 Mas o grande romance social realista do século XVIII, que na figuração dos costumes e da psicologia de seu tempo promove uma abertura seminal para a realidade, também não coloca o problema da determinidade temporal concreta dos homens retratados. O presente histórico é figurado com extraordinária plasticidade e verossimilhança, mas é ingenuamente aceito como um ente: a partir de onde e como ele se desenvolveu é algo que ainda não se põe no ato de figuração do escritor. Esses escritores captam os traços essenciais de seu presente histórico com um realismo ousado e perspicaz, mas não veem historicamente aquilo que é específico de seu próprio tempo.
 Uma análise da história pregressa do romance histórico teria absolutamente de derrubar a lenda romântico-reacionária de que o Iluminismo teria sido estéril de qualquer sentido e compreensão da história e somente os adversários da revolução francesa teriam descoberto o sentido histórico.
 Para nós, porém, trata-se de concretizar o caráter particular desse sentido da história antes e depois da revolução francesa para visualizar com clareza sobre qual solo social e ideológico o romance histórico pôde surgir. A historiografia do Iluminismo foi uma preparação ideológica da revolução francesa. A construção da história, que por vezes revela fatos e contextos novos e grandiosos, serve para provar a necessidade de revolucionar a sociedade “irracional” do absolutismo feudal a fim de extrair das experiências da história aqueles princípios com os quais se pode criar uma sociedade “racional”, um Estado “racional”. Por isso, a Antiguidade se situa no centro da teoria histórica e da práxis do Iluminismo. A investigação das causas da grandeza e do declínio dos Estados antigos é um dos mais importantes pressupostos teóricos para a futura reconfiguração da sociedade.
 Isso se refere sobretudo à França, o país que mais se destacou intelectualmente no período do Iluminismo militante. A situação da Inglaterra é um pouco diferente. No século XVIII o país encontrava-se em um profundo processo de transformação econômica, em plena criação das precondições socioeconômicas da revolução industrial, mas do ponto de vista político era um país pós-revolucionário. Quanto à realização e à crítica da sociedade burguesa, à lapidação dos princípios da economia política, a apreensão concreta da história como história desempenha um papel mais importante na Inglaterra que na França. Mas a consciência e a consistência na execução desses pontos de vista históricos específicos ainda são episódicas no desenvolvimento geral. Por volta do fim do século XVIII o teórico mais importante é Adam Smith.
 O desconhecimento do alcance do sentido histórico que ocorre na prática, da possibilidade de universalização da especificidade histórica do presente imediato, observada corretamente de modo instintivo, caracteriza o lugar que o grande romance social inglês ocupa no desenvolvimento de nosso problema. Foi ele que conduziu o olhar do escritor ao significado concreto do espaço e do tempo, das condições sociais, etc. Mas isso deu-se por um instinto realista e não chegou a uma clareza sobre a história como processo, como precondição concreta do presente.
 Somente no último período do Iluminismo o problema do espelhamento artístico de épocas passadas emerge como uma questão central da literatura. Isso ocorreu na Alemanha; todavia, a ideologia do Iluminismo alemão segue, antes de tudo, a trilha do Iluminismo francês e inglês. O drama de Goethe não apenas traz consigo um reflorescimento do drama histórico, mas também exerce uma influência forte e direta na formação do romance histórico de Walter Scott. Essa ascensão consciente do historicismo, que encontra sua primeira expressão teórica nos escritos de Herder, tem suas raízes na situação particular da Alemanha, na discrepância entre o atraso econômico e político do país e a ideologia dos iluministas alemães, que, apoiando-se em seus predecessores ingleses e franceses, levaram as ideias do Iluminismo a um patamar mais elevado. Com isso, não só as contradições gerais que estão na base de toda a ideologia do Iluminismo aparecem de modo mais agudo que na França, como também a oposição específica entre essas ideias e a realidade alemã são alçadas energicamente ao primeiro plano.
 Na Inglaterra e na França a preparação econômica, política e ideológica, a consumação da revolução burguesa e o processo de constituição do Estado nacional são um único e mesmo processo. O patriotismo revolucionário burguês ainda pode ser forte e produzir obras importantes, mas, ao orientar-se para o passado, o que predomina é a crítica iluminista do “irracional”. Na Alemanha, a situação é totalmente diferente. O patriotismo revolucionário colide com a desunião nacional e com uma fragmentação política e econômica cuja expressão cultural e ideológica é uma mercadoria importada da França; pois tudo que foi produzido nas pequenas cortes alemãs em termos de cultura e, sobretudo, de pseudocultura não passou de uma imitação servil da corte francesa. As pequenas cortes são, portanto, não apenas um empecilho político para a unidade alemã, mas também estorvam ideologicamente o desenvolvimento de uma cultura que teria de originar-se das necessidades da vida burguesa alemã. 
 A Revolução Francesa, as guerras revolucionárias, a ascensão e queda de Napoleão fizeram da história uma experiência das massas em escala europeia. Entre 1789 e 1814 as nações europeias viveram mais revoluções que em séculos inteiros. E a celeridade das mudanças confere a essas revoluções um caráter especial, apaga nas massas a impressão de “acontecimento natural”, torna o caráter histórico das revoluções muito mais visíveis do que costuma ocorrer em casos isolados.
 Essa diferença apresenta-se também entre essas guerras e todas as anteriores. As guerras dos Estados absolutistas da época pré-revolucionária foram travadas por pequenos exércitos mercenários. O comando da guerra tinha por princípio afastar o máximo possível o exército da população civil. 
 Isso muda de um só golpe com a Revolução Francesa. Em sua guerra defensiva contra a coalizão das monarquias absolutas, a República Francesa foi forçada a criar exércitos de massa. No entanto, a diferença entre os exércitos mercenários e os de massa é qualitativa e diz respeito precisamente à relação estabelecida com a massa da população. Se se trata de formar um exército de massas, em vez de recrutar pequenos contingentes de marginais para o serviço militar ou forçá-lo a servir, então o conteúdo e a finalidade da guerra têm de ser expostos à população de maneira clara, na forma de propaganda. Isso ocorreu na própria França, no momento da defesa da revolução e em guerras ofensivas posteriores, mas outros Estadostambém foram obrigados a lançar mão desses meios quando tiveram de criar exércitos de massa. A vida interior do povo está ligada ao moderno exército de massas de modo muito diferente daquele com os exércitos absolutistas. Na França, cai a barreira social entre o oficial nobre e a tropa: a ascensão aos mais altos postos do Exército está aberta a todos, e sabe-se que tais barreiras caem precisamente por obra da Revolução; e mesmo nos países em luta contra a Revolução é inevitável que surjam ao menos algumas brechas nas barreiras sociais.
 Enquanto as guerras dos exércitos mercenários do absolutismo consistiam em sua maioria de pequenas manobras em torno das fortalezas, agora é a Europa inteira que se transforma em palco de guerra. O que antes somente indivíduos isolados e com vocação aventureira podiam vivenciar, isto é, conhecer a Europa, torna-se, nesse período, uma experiência de massa, acessível a milhões de pessoas. Assim, criam-se possibilidades concretas para que os homens apreendam sua própria existência como algo historicamente condicionado, vejam na história algo que determina profundamente sua existência cotidiana, algo que lhes diz respeito diretamente, com todas as convulsões sociais.
 É da essência da revolução burguesa, quando levada seriamente até o fim, que o pensamento nacional seja apropriado pelas massas. Foi somente em consequência da revolução e do domínio napoleônico que o sentimento nacional se tornou vivência e propriedade do campesinato, das camadas mais baixas da pequena burguesia, etc. Essa foi a única França que eles vivenciaram como país próprio, como pátria criada por eles.
 Mas o despertar do sentimento nacional e , consequentemente, da sensibilidade e do entendimento para a história nacional não ocorre apenas na França. As guerras napoleônicas provocam por toda parte uma onda de sentimento nacional, de revolta nacional contra as conquistas napoleônicas, uma experiência de entusiasmo pela autonomia nacional. A reivindicação da autonomia e da particularidade está necessariamente ligada a um novo despertar da história nacional, com recordações do passado, da glória passada, dos momentos de humilhação nacional, e pouco importa se isso resulta em ideologias progressistas ou reacionárias. 
 Assim, nessa vivência da história pelas massas, por um lado, o elemento nacional vincula-se aos problemas da reconfiguração social, e, por outro, o vínculo da história nacional com a história mundial torna-se consciente em círculos cada vez maiores. Essa consciência progressiva do caráter histórico do desenvolvimento também começa a se evidenciar no juízo crítico sobre as condições econômicas e as lutas de classes. No século XVIII apenas alguns críticos isolados do capitalismo incipiente compararam a exploração do trabalho pelo capital às formas de exploração dos períodos anteriores, revelando assim o capitalismo como a forma mais desumana. Na luta ideológica contra a revolução francesa essa comparação em larga escala entre a sociedade antes e depois da revolução torna-se o grito de guerra do romantismo legitimista. A desumanidade do capitalismo, o caos da concorrência, a eliminação do pequeno pelo grande o rebaixamento da cultura pelo fato de todas as coisas se tornarem mercadoria, tudo isso é contrastado, em geral de forma reacionária e tendenciosa, com o idílio social da Idade Média, como o período da cooperação pacífica de todas as classes, como a era do crescimento orgânico da cultura. Mas, se em geral a tendência reacionária predomina nesses escritos polêmicos, não devemos esquecer que é apenas nesse período que surge a primeira representação do capitalismo como um período historicamente determinado do desenvolvimento da humanidade, e isso não nos grandes teóricos do capitalismo, mas em seus oponentes.
 Fica claro que a tendência do historicismo a tornar-se consciente atinge seu ápice no período após a queda de Napoleão, na época da Restauração, da Santa Aliança. É evidente que o espírito desse historicismo, que pela primeira vez domina e torna-se oficial, é reacionário e, em sua essência, pseudo-histórico. A concepção da história, o periodismo e a beletrística do legitimismo desenvolvem o espírito histórico em áspera oposição ao Iluminismo, às ideias da Revolução Francesa. O ideal do legitimismo é o retorno às condições anteriores à Revolução Francesa, expurgando da história as maiores realizações da época.
 A história, segundo essa concepção, é um crescimento calmo, imperceptível, natural, “orgânico”. Quer dizer: um desenvolvimento da sociedade que em essência é estagnação, que não altera em nada as instituições legítimas e consagradas da sociedade e, sobretudo, não altera nada de modo consciente. A atividade do homem na história deve ser totalmente descartada. A Escola Histórica do Direito alemã confisca ao povo até mesmo o direito de dar novas leis a si mesmo e defende que tudo deve ser deixado a cargo do “crescimento orgânico” dos antigos e variegados direitos consuetudinários feudais.
 Surge nesse terreno, sob a bandeira do historicismo, do combate ao espírito “abstrato” e “anistórico” do Iluminismo, um pseudo-historicismo, uma ideologia do imobilismo, do retorno à Idade Média. No interesse desses objetivos políticos reacionários, o desenvolvimento histórico é inescrupulosamente distorcido, e o caráter mentiroso intrínseco à ideologia reacionária é ainda mais intensificado pelo fato de que a restauração na França é forçada por razões econômicas a conformar-se socialmente com o capitalismo, que cresceu nesse ínterim, e até a apoiar-se nele econômica e politicamente.
 Apesar dessa mediocridade ideológica do pseudo-historicismo legitimista, ele tem um efeito extraordinariamente forte. É uma expressão distorcida e mentirosa, mas historicamente necessária do grande período de convulsão provocado pela revolução francesa. E o novo grau de desenvolvimento que começa justamente com a Restauração obriga os defensores do progresso humano a criar uma nova armadura ideológica. 
 O Iluminismo combateu com inescrupulosa energia a legitimidade e a continuidade dos requícios feudais. O legitimismo pós-revolucionário detectou sua conservação como essência da história. A defesa do progresso após a Revolução Francesa tinha de resultar necessariamente em uma concepção que demonstrasse a necessidade histórica da Revolução Francesa, apresentasse provas de que esta fora o apogeu de um desenvolvimento histórico longo e gradual, e não um súbito obscurecimento da consciência da humanidade, uma “catástrofe natural” na história da humanidade, e de que a evolução futura da humanidade só é possível por esse caminho.
 Com isso, porém, operou-se uma grande mudança de visão de mundo na concepção do progresso humano, em comparação com o Iluminismo. O progresso deixa de ser visto como um progresso na luta essencialmente anistórica da razão humanista contra a razão feudal absolutista. Entendem que a racionalidade do progresso humano é desenvolvida de modo cada vez mais acentuado a partir do conflito interno das forças sociais na própria história; assim, a própria história deve ser a portadora e a realizadora do progresso humano. Fica cada vez maior a consciência histórica do papel decisivo que a luta de classes desempenha no progresso histórico da humanidade. O novo espírito de historicidade, que pode ser visto com mais nitidez nos grandes historiadores franceses do período da Restauração, concentra-se precisamente nesta questão: nas provas históricas de que a sociedade moderna surgiu das lutas de classes entre a nobreza e a burguesia, das lutas de classe que fulminaram a “Idade Média idílica” e cuja última e decisiva etapa foi a grande Revolução Francesa. Desse círculo de ideias surge pela primeira vez uma tentativa de periodização racional da história, uma tentativa de apreender de modo racional e científico a especificidade histórica e a gênese do presente.
 Essa nova etapana defesa intelectual do progresso humano encontrou sua expressão filosófica em Hegel. A questão histórica central era provar a necessidade da revolução francesa, provar que revolução e desenvolvimento histórico não se opõem, como sustentavam os apologistas do legitimismo feudal. A filosofia hegeliana dá a essa concepção histórica sua fundamentação filosófica.
 Opera-se sobre essa base uma suprassunção filosófica da concepção iluminista do homem. O maior obstáculo para a compreensão da história estava no fato de que o Iluminismo pensava a essência humana como imutável, de modo que a mudança no decorrer da história significaria, em casos extremos, apenas uma alteração do costume e, em geral, uma mera oscilação moral do homem. A filosofia hegeliana extrai todas as consequências do historicismo progressista que surgia; ela vê o homem como produto de si mesmo, de sua própria atividade na história. O pensamento da época antiga oscilava no interior da antinomia entre uma concepção fatalista-legalista de todo evento social e uma sobrevalorização das possibilidades da intervenção consciente no desenvolvimento da sociedade. Nos dois lados da antinomia, os princípios eram pensados como “supra-históricos”, como provenientes da “essência eterna na razão”. Hegel, ao contrário, vê na história um processo impulsionado pelas forças motoras intrínsecas da história, cujo efeito atinge todos os fenômenos da vida humana, inclusive o pensamento. Ele vê a vida da humanidade como um grande processo histórico.
 Com isso, surge um novo humanismo, um novo conceito de progresso, tanto do ponto de vista histórico concreto quanto filosófico. Um humanismo que quer preservar as conquistas da revolução francesa como fundamento irrenunciável do futuro desenvolvimento humano, que concebe as revoluções como parte indispensável do progresso humano. Certamente, esse novo humanismo histórico também é produto de seu tempo e não pode ultrapassar seu horizonte, a não ser de forma fantasiosa, como fizeram os grandes utopistas. Os grandes humanistas burgueses desse período encontram-se em uma situação paradoxal: embora compreendam a necessidade das revoluções no passado e vejam nelas o fundamento de tudo o que é racional e afirmativo do presente, concebem o desenvolvimento futuro como uma evolução pacífica a partir dessas conquistas.
 O acento sentimental é muito semelhante em todos eles. Apenas a Revolução de 1848 pôs os sobreviventes dessa época diante da alternativa de reconhecer a perspectiva do novo período de desenvolvimento da humanidade e afirmá-la, mesmo com uma cisão trágica do sentimento.

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