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Embora a percepção da variedade de formas de vida seja tão antiga como a própria autoconsciência da espécie humana (MAYR, 1998), o conceito de biodiversidade é bastante recente. Foi idealizado por Walter G. Rosen, do National Research Council / National Academy of Sciences (NRC/NAS), em 1985, enquanto planejava a realização de um fórum sobre diversidade biológica. O evento foi realizado na capital norte-americana, Washington, de 21 a 24 de setembro de 1986, com o nome de National Forum on BioDiversity (Fórum Nacional sobre BioDiversidade), sob os auspícios da NAS e do Smithsonian Institute. (WILSON, 1997; SARKAR, 2002; MEINE; SOULÉ; NOSS, 2006). O fórum aconteceu em um momento em que o interesse pelo conhecimento da diversidade da vida e as preocupações com a sua conservação, tanto entre cientistas como entre uma parcela considerável da sociedade, tomavam impulso. A Society for Conservation Biology (SCB) foi fundada em 1985, e em 1987 foi publicado o primeiro número da revista Conservation Biology, que logo se tornou o principal veículo de divulgação científica e debate sobre as questões relacionadas com a biodiversidade. (SARKAR, 2002; GROOM; MEFFE; CARROLL, 2006; MEINE; SOULÉ; NOSS, 2006; LEWIS, 2007). Estiveram presentes no National Forum on BioDiversity expoentes dos mais variados campos do conhecimento (biologia, agronomia, economia, filosofia, entre outros), representantes de agências de assistência técnica e de financiamento e de organizações não governamentais (ONGs). As palestras e painéis contaram com a presença de centenas de pessoas e tiveram ampla cobertura da imprensa. As questões giraram em torno, sobretudo, da preocupação com a destruição de habitats e com a extinção acelerada de espécies. (WILSON, 1997). José Luiz de Andrade Franco História (São Paulo) v.32, n.2, p. 21-48, jul./dez. 2013 ISSN 1980-4369 23 Norman Myers, ecólogo e ambientalista inglês, publicou, em 1979, o livro The Sinking Ark: A New Look at the Problem of Disappearing Species. Ele discutia um tema familiar aos ecólogos: a extinção. Mas, ao chamar a atenção para a sua relação com a destruição de habitats pelo planeta, sobretudo a devastação das florestas tropicais, alertava para o fato de que a taxa de extinção de espécies estava muito acima do que seria esperado no desenrolar do processo evolutivo. Tratava-se, portanto, de uma crise global de extinção de espécies, como a que dizimou os dinossauros há 65 milhões de anos. A diferença era que, agora, os humanos, e não uma catástrofe natural, se configuravam como a grande causa da crise. Myers argumentava que, até o ano 2000, seria extinto um milhão de espécies. Era um alerta e uma chamada para que os cientistas partissem para a ação. (MYERS, 1979; LEWIS, 2007; QUAMMEN, 2008). Durante os anos 1980, a questão da diversidade da vida esteve em pauta, como objeto de pesquisa para os cientistas e como motivo de preocupação para ativistas e cientistas. Ações para salvar espécies da extinção, sobretudo espécies mais carismáticas da fauna e da flora – como mamíferos, pássaros, árvores grandiosas ou plantas com belas flores – não eram novas. Faziam parte da tradição relacionada com a criação de parques nacionais e reservas, que, além da preservação da fauna e da flora selvagens, objetivava a proteção de paisagens e aspectos geológicos de grande beleza. Para tanto, a noção de “patrimônio natural” era bastante apropriada e suficientemente ampla. Termos como diversidade natural ou diversidade da vida eram comuns quando se tratava de aludir aos componentes vivos da natureza, ou seja, à diversidade de organismos ou espécies. (MCCORMICK, 1992; NASH, 2001; LEWIS, 2007). O termo diversidade biológica apareceu precocemente, em 1968, no livro A Different Kind of Country, de autoria do cientista e conservacionista Raymond F. Dasmann. Entretanto, foi só na década de 1980 que o seu uso se tornou mais corrente no jargão científico. Foi Thomas Lovejoy, biólogo atuante no World Wildlife Fund (WWF), no prefácio à coletânea organizada por Michael E. Soulé e Bruce A. Wilcox, Conservation Biology: An Evolutionary-Ecological Perspective, de 1980, que resgatou o termo para a comunidade científica. Lovejoy, após alertar para a intensidade do impacto das ações humanas sobre os sistemas biológicos do planeta, argumentava que a redução da diversidade biológica era a questão mais fundamental de nosso tempo. (DASMANN, 1968; SOULÉ; WILCOX, 1980). Ernst Mayr, o reputado evolucionista, em seu livro The growth of biological thought: diversity, evolution, and inheritance, publicado em 1982, afirmava que: “Dificilmente qualquer aspecto da vida é mais característico do que a sua quase ilimitada diversidade”. (MAYR, 1998, p. 161). Para ele, a percepção da diversidade atua, ao longo da história, como a principal força a impulsionar o pensamento biológico: “Com certeza, dificilmente existe um processo biológico, ou O conceito de biodiversidade e a história da biologia da conservação: da preservação da wilderness à conservação da biodiversidade História (São Paulo) v.32, n.2, p. 21-48, jul./dez. 2013 ISSN 1980-4369 24 um fenômeno, em que a diversidade não esteja implicada”. (MAYR, 1998, p. 161). A noção, a observação, a descrição e a contemplação da diversidade da vida, portanto, não é uma novidade, e seu “rastro” pode ser seguido desde os primórdios das ciências biológicas e do ativismo pela conservação da natureza. (MEINE; SOULÉ; NOSS, 2006). Biodiversidade é a forma contraída de diversidade biológica e apareceu pela primeira vez em uma publicação em 1988, justamente no livro organizado pelo prestigiado biólogo Edward O. Wilson que trazia os resultados do National Forum on BioDiversity. A coletânea, com o título de Biodiversity (Biodiversidade),1 é composta de artigos de autoria de 60 das maiores autoridades internacionais no assunto, presentes no fórum, entre as quais se encontram o próprio Wilsom, Paul R. Ehrlich, Norman Myers, David Ehrenfeld, Robert E. Jenkins, Thomas E. Lovejoy, Lester R. Brown, Michael Soulé e James Lovelock. Além do capítulo inicial, de autoria de Wilson, sobre a situação da diversidade biológica, os demais se dividem por 12 temas relacionados com a questão da biodiversidade: Desafios à Preservação da Biodiversidade; A Dependência Humana da Diversidade Biológica; Diversidade em Risco: Florestas Tropicais; Diversidade em Risco: A Perspectiva Global; O Valor da Biodiversidade; Como a Biodiversidade é Monitorada e Protegida?; Ciência e Tecnologia: Como podem ajudar?; Ecologia de Restauração: Podemos recuperar o tempo perdido?; Alternativas à Destruição; Políticas para Proteger a Diversidade; Problemas Atuais e Perspectivas Futuras; e Maneiras de Ver a Biodiversidade. Há também um Epílogo de David Challinor, Secretário Assistente para Pesquisa do Smithsonian Institute, sobre o National Forum on BioDiversity e sobre como o livro deriva dos painéis apresentados nele. (WILSON, 1997; SARKAR, 2002). No prefácio do livro, Wilson alertava para o fato de que: A diversidade de formas de vida, em número tão grande que ainda temos que identificar a maioria delas, é a maior maravilha desse planeta. A biosfera é uma tapeçaria intrincada de formas de vida que se entrelaçam. [...] Este livro oferece uma visão geral dessa diversidade biológica e traz um aviso urgente de que estamos alterando e destruindo os ambientes que criaram a diversidade de formas de vida por mais de um bilhão de anos. (WILSON, 1997). O National Forum on BioDiversity e o livro Biodiversity foram, ao mesmo tempo, ponto de chegada e ponto de partida para os esforços relacionados com a conservação da natureza. Foram um ponto de convergência para a reflexão sobre o conhecimento acumulado durante anos de pesquisas a respeito da diversidade biológica e de práticas voltadas para a conservação dela. O conceito de biodiversidade e o consenso entre cientistas e ativistas sobre a urgência em evitar que a biodiversidade continuasse a ser destruída pelos excessos da espécie humana conduziram a um deslocamento na maneira de enfocar a questão da conservaçãoda natureza. De uma preocupação José Luiz de Andrade Franco História (São Paulo) v.32, n.2, p. 21-48, jul./dez. 2013 ISSN 1980-4369 25 com a preservação da wilderness, com suas paisagens sublimes e com a fauna e a flora carismáticas, aos poucos, houve uma transição para a noção de conservação da biodiversidade. (NASH, 2005; LEWIS, 2007). Este deslocamento não se deu repentinamente, ele já vinha ocorrendo desde, pelo menos, os anos 1930 e 1940. Nesse período, as teorias de Charles Darwin sobre a evolução das espécies e a seleção natural foram confirmadas, o que ficou conhecido como a “grande síntese”, que fez convergir os pontos de vista de biólogos de campo e de geneticistas sobre o modo como se dá a evolução e o surgimento de novas espécies – tiveram um papel fundamental na elaboração desta síntese intelectual Sewall Wright, R. A. Fisher, J. B. S. Haldane, Theodosius Dobzhansky, George Gaylord Hutchinson e Ernst Mayr. Com isto, o papel do processo evolutivo no surgimento e na extinção de espécies e o próprio conceito de espécie se tornaram mais claros. Foi a partir dessas duas décadas, também, que as pesquisas realizadas no campo da ecologia e os próprios ecólogos passaram a desempenhar um papel maior nas questões relacionadas com a conservação da natureza – conceitos formulados por ecólogos como Henry C. Cowles, Victor Shelford, Arthur Tansley, Charles Elton, Joseph Grinnell, Paul Errington, Olaus Murie e os irmãos Howard e Eugene Odum foram aplicados, com frequência crescente, à conservação. O surgimento do conceito de biodiversidade facultou um ponto de referência a partir do qual as pesquisas sobre a diversidade da vida e os discursos e práticas para a sua conservação têm se orientado. (MAYR, 1998; MAYR, 2005; MAYR, 2008; EHRLICH, 1993; WORSTER, 1998; ACOT, 1990; MEINE; SOULÉ; NOSS, 2006; QUAMMEN, 2008). Na literatura científica, os termos intercambiáveis diversidade biológica e biodiversidade surgiram para dar conta de questões relacionadas com os temas fundamentais da ecologia e da biologia evolutiva, relacionados com a diversidade de espécies e com os ambientes que lhe servem de suporte, ao mesmo tempo que são suportados por ela e que são, simultaneamente, o palco e o resultado – sempre inacabado – do processo evolutivo. Biodiversidade e diversidade biológica tornaram-se de amplo uso nos meios científicos e entre os ativistas da conservação. Sarkar (2002) observa que, em 1988, biodiversidade não aparece nenhuma vez como palavra chave nos abstracts de revistas da área de biologia, enquanto que diversidade biológica aparece apenas uma vez. Já em 1993, ele conta 72 aparições para biodiversidade e 19 para diversidade biológica. Ele chama a atenção, também, para o surgimento de quatro revistas científicas que contêm a palavra biodiversidade em seu nome: Canadian Biodiversity foi a primeira, em 1991; Tropical Biodiversity foi a segunda, em 1992; e Biodiversity Letters e Global Biodiversity vieram em seguida, em 1993. O conceito de biodiversidade e a história da biologia da conservação: da preservação da wilderness à conservação da biodiversidade História (São Paulo) v.32, n.2, p. 21-48, jul./dez. 2013 ISSN 1980-4369 26 A noção de biodiversidade ou diversidade biológica permanece bastante vaga, e a medição da biodiversidade no “mundo real” não é tarefa fácil. Wilson (1994), em 1992, no livro The diversity of life, indicou a espécie como a unidade fundamental da biodiversidade: [...] o conceito de espécie é crucial para o estudo da biodiversidade. É o graal da biologia sistemática. Não ter uma tal unidade natural seria lançar uma grande parte da biologia em queda livre, passando do ecossistema direto para o organismo. Seria aceitar a idéia de variação amorfa e limites arbitrários para entidades intuitivamente óbvias como os olmos americanos (espécie: Ulmus americana), as borboletas brancas (Pietris rapae) e os seres humanos (Homo sapiens). Sem as espécies naturais, os ecossistemas só poderiam ser analisados nos termos mais amplos, usando-se descrições grosseiras e mutáveis dos organismos que os constituem. Os biólogos encontrariam dificuldades em comparar os resultados de um estudo com os de outros. Como poderíamos avaliar, por exemplo, os milhares de monografias sobre a Drosophila, que formam boa parte do alicerce da genética moderna, se ninguém pudesse distinguir um tipo de Drosophila de outro? (WILSON, 1994, p. 48). Com a crescente preocupação com a conservação da biodiversidade, na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, foi lançada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB). Nela se chegou a uma definição bastante ampla e funcional de diversidade biológica ou biodiversidade, abrangendo-se três níveis: diversidade de espécies, diversidade genética e diversidade de ecossistemas. A convergência entre o uso do conceito de biodiversidade e a afirmação da biologia da conservação como uma nova disciplina conduziu a uma nova configuração dos estudos relacionados com a interação, a adaptação, o surgimento e o desaparecimento de espécies de organismos. Aproximou, também, as especulações científicas e os próprios cientistas das preocupações cotidianas de manejadores de áreas protegidas e de ativistas da conservação da natureza. Daniel H. Janzen (1986), no artigo The Future of Tropical Ecology, exortou os ecologistas a empreenderem o ativismo político necessário à conservação. Ele expressava um estado de espírito já bastante difundido entre ecólogos, biólogos da conservação, sistematas, botânicos e zoólogos. A biologia da conservação se tornou a principal arena para a reflexão e o debate teórico sobre as questões relacionadas com a conservação, e a biodiversidade, seu principal foco. (GROOM; MEFFE; CARROLL, 2006; LEWIS, 2007; QUAMMEN, 2008).
 1 -A interferência desordenada humana no meio ambiente é a grande causadora da perda da biodiversidade mundial. Plantas e animais têm sido exterminados de maneira muito rápida pela ação humana. A taxa de extermínio de espécies ocasionada pelo homem é 50 a 100 vezes superior aos índices de extinção por causa natural.
Veja alguns exemplos da ação do homem e suas conseqüências na biodiversidade do planeta:
eliminação ou alteração do habitat pelo homem - é o principal fator da diminuição da biodiversidade. A retirada desordenada da camada de vegetação nativa para construção de casas ou para atividade agropecuária altera o meio ambiente. Em média, 90% das espécies extintas acabaram em conseqüência da destruição de seu habitat;
super-exploração comercial - ameaça muitas espécies marinhas e alguns animais terrestres;
poluição das águas, solo e ar - estressam os ecossistemas e matam os organismos;
introdução de espécies exóticas - ameaçam os locais por predação, competição ou alteração do habitat natural
2 -mas à velocidade com que estão desaparecendo. Hoje em dia, as espécies estão desaparecendo de 100 a 1.000 vezes mais rapidamente do que em épocas anteriores à existência do homem na terra, e a extinção adicional das espécies ameaçadas pode acelerar substancialmente essa perda (Chapin et al., 1998). Além disso, para cada 10.000 espécies que se extinguem, somente uma nova espécie chega a evoluir (Chapin et al., 1998). Portanto, a velocidade de perda de biodiversidade atual supera largamente a velocidade com que a natureza consegue efetuar uma compensação e se adaptar.
3 - Contudo, os organismos classificados por nós como idênticos em função muitas vezes demonstraram diferir o suficiente para adquirir uma importância significativa no funcionamento do ecossistema. Mesmo que algumas espécies sejam redundantes em termos da função que desempenham, elas geralmente têm diferentes condições ambientais favoráveis ao seu crescimento e reprodução, o que é uma proteção contra as mudanças no ecossistema se as condições ambientais se alterarem (Chapin et al., 1995). Conseqüentemente, a perda de espécies pode não só causar efeitos diretos num ecossistema,mas também afetar sua capacidade de proteção contra futuras mudanças ambientais.
4 Para testar realmente os efeitos da biodiversidade, um estudo deve utilizar espécies escolhidas aleatoriamente em um amplo grupo de espécies. A maioria dos estudos, contudo, utilizou determinadas espécies, ou composições de espécies aleatórias, colhidas em grupos menores e, portanto, não conseguiu tirar conclusões sobre os efeitos da biodiversidade propriamente dita. Em vez disso, os resultados podem ser relevantes somente para as espécies utilizadas no estudo. Embora possa ser interessante investigar se existe algum efeito geral da perda de biodiversidade no funcionamento do ecossistema utilizando-se espécies escolhidas aleatoriamente, a extinção de espécies muitas vezes segue padrões previsíveis, dependendo da espécie do sistema e do tipo de perturbação. Portanto, a melhor maneira de estudar os efeitos da perda de biodiversidade seria sujeitar uma comunidade natural a uma perturbação (Petchey et al., 1999), ou utilizar uma ordem de extinção previsível (Jonsson et al., 2002). Isso, é claro, limita a aplicabilidade geral dos resultados, mas, ao mesmo tempo, fornece resultados mais realistas e um conhecimento específico dos efeitos da perda de espécies no sistema estudado.
5- que leve em conta tanto a conservação dos seus extraordinários recursos naturais como a promoção do desenvolvimento social e econômico dos quase vinte milhões de habitantes que vivem nessa região. O conhecimento científico sólido acumulado durante décadas pelas instituições regionais de pesquisa ocupou um papel irrelevante nessa discussão. Apesar de toda a literatura publicada até então, que indicava que a diversidade e a fragilidade dos ecossistemas amazônicos exigiam uma ocupação cuidadosa e bem planejada, a colonização da Amazônia a partir do final da década de 1960 foi marcada pelo processo violento de ocupa- ção e degradação ambiental característica das “economias de fronteira”, nas quais o progresso é entendido simplesmente como crescimento econômico e prosperidade infinitos, baseados na exploração de recursos naturais percebidos como igualmente infinitos (Becker, 2001). Com base no ferro e no fogo e sem levar em consideração as peculiaridades dos diversos espaços ecológicos amazônicos e os desejos e anseios da população regional, um modelo exógeno baseado na extra- ção predatória dos recursos florestais, seguidos pela substituição da floresta por
6 A sociedade brasileira recebe anualmente a estimativa de perda de floresta na Amazônia, a qual é realizada com o uso de imagens de satélite e medida em quilômetros quadrados. O que não se conhece é o quanto de recursos naturais se perde a cada quilômetro quadrado de floresta destruída. Felizmente, pesquisas recentes sobre a densidade de alguns grupos de organismos na Amazônia permitem-nos uma primeira estimativa da magnitude real da tragédia causada pelo desflorestamento registrado no último ano na região: cerca de 26.130 km2 . ESTUDOS AVANÇADOS 19 (54), 2005 155 As plantas atingem uma extraordinária biodiversidade na Amazônia. Estima-se que a região abrigue cerca de quarenta mil espécies vasculares de plantas, das quais trinta mil são endêmicas à região (Mittermeier et al., 2003). Estudos sobre a densidade de plantas na Amazônia têm sido focalizados principalmente sobre um grupo restrito de plantas: as árvores com troncos com diâmetro a altura do peito acima de 10 cm. Em um hectare de floresta amazônica podem ser encontradas entre quatrocentas e 750 árvores. Um estudo recente estimou que, na região do arco do desmatamento, o número de árvores em 1 km2 de floresta pode variar de 45 mil a 55 mil (Ter Steege, 2003). Multiplicando-se estes valores pela área desflorestada entre 2003 e 2004, estimamos que entre 1.175.850.000 e 1.437.150.000 árvores foram cortadas nesta região. As aves formam um dos grupos de vertebrados mais bem conhecidos do planeta. Estima-se que a Amazônia abrigue mais de mil espécies de aves e que, em um único quilômetro quadrado de floresta amazônica, podem ser registradas cerca de 245-248 espécies. Estudos recentes no Peru e na Guiana Francesa indicam que em um quilômetro quadrado de floresta amazônica, vivem 1.658 indiví- duos na Guiana Francesa (Thiollay, 1994), e 1.910 no Peru (Terborgh et al., 1990). Multiplicando estes números pela área desflorestada entre 2003 e 2004 na Amazônia, estima-se que cerca de 43 a cinqüenta milhões de indivíduos foram afetados. Os primatas também são bem conhecidos cientificamente. Eles formam um dos grupos mais diversos e interessantes de mamíferos. Estudos feitos em várias regiões na Amazônia mostram que a densidade de primatas varia bastante na região (Peres e Dolman, 2000). Na Amazônia ocorrem 14 gêneros de primatas, dos quais 5 ocorrem exclusivamente nesta região. Em um quilômetro quadrado de floresta amazônica, pode-se registrar até 14 espécies de primatas. Assim, para estimar quantos indivíduos de primatas foram afetados com o desflorestamento, utilizamos somente os estudos de primatas feitos em Rondônia, Mato Grosso e Pará, os estados campeões do desflorestamento. Eles indicam que um quilômetro quadrado de floresta pode abrigar entre 35 e 81 indivíduos (Peres e Dolman, 2000). Multiplicando estes números pela área desflorestada, estimamos que entre 914.550 e 2.116.530 indivíduos foram afetados. De forma bastante simplificada, estes números ilustram quantas árvores, aves e primatas foram perdidos por causa da última onda de desflorestamento na Amazônia e servem para dar uma idéia da magnitude da perda e do desperdício de recursos naturais associados a esse processo. Se incorporarmos a esses cálculos os outros grupos de organismos, tais como anfíbios e répteis, talvez a perda real seja estimada em algumas centenas de milhões de indivíduos. Entretanto, é difí- cil para a população compreender a magnitude desta perda sem uma comparação adequada. No caso da perda das árvores, se colocarmos todas as árvores derrubadas lado a lado e assumirmos que cada uma tem o tronco com largura máxima de 10 cm, podemos estimar, de forma bastante conservadora, que estas árvores se estenderiam entre 117.585 e 143.715 km, o que representa cerca de três a três
 7 Em 2003, o Museu Paraense Emílio Goeldi e a Conservação Internacional elaboraram um documento sugerindo, entre outras coisas, o desmatamento zero na Amazônia, com especial ênfase no chamado “arco do desmatamento”, uma ampla região que se estende do Maranhão até Rondônia. Muitas recomendações propostas pelas duas instituições foram incorporadas pelo governo federal no Plano de Controle e Prevenção do Desmatamento. Entretanto, a recomendação principal não foi adotada. O alto custo político de se tomar uma decisão forte como esta pode ter limitado a ação governamental. Voltamos a insistir que determinar o desmatamento zero na Amazônia por meio de um mecanismo legal é uma necessidade real estratégica para o país, pois tem como propósito evitar a perda de recursos naturais importantes, garantir a ordenação do espaço amazô- nico e promover o desenvolvimento sustentável na região
8 , adquiridas legalmente e com registros em cartórios, ocupam um espaço restrito na região e estão concentradas em zonas de fronteiras antigas, nos estados do Maranhão, Pará, Mato Grosso e Rondônia. A grande ESTUDOS AVANÇADOS 19 (54), 2005 157 maioria destas terras possui passivos ambientais enormes para com a sociedade brasileira, pois muitas já removeram mais de 80% das florestas nessas propriedades, violando, portanto, a legislação mais recente que define a área de reserva legal na Amazônia brasileira. Para esses proprietários, um decreto como desmatamento zero pouco afetaria as suas atividades econômicas. Na verdade, seria uma grande oportunidade para que estes proprietários pudessem regularizar suas situações junto aos órgãos ambientais através de compromissos mediados pelos Ministérios Públicos Estadual e Federal. Tais acordos teriam como objetivo a recomposição da floresta nativa em setores estratégicos da propriedadevisando à manutenção de processos ecológicos, tais como manutenção dos cursos d’água e inibição de processos erosivos, necessários para garantir a sustentabilidade da produção agropastoril. Institutos de pesquisa e organizações não-governamentais poderiam estabelecer parcerias com os proprietários rurais para mapeamentos e apoio técnico para a gestão ambiental eficaz das propriedades. O governo federal também poderia incentivar a criação de reservas privadas do patrimônio natural (RPPNs) nas reservas legais e áreas de proteção permanente das propriedades que abrigassem populações de espécies de animais ameaçados de extinção ou que garantissem conectividade entre unidades de conservação e/ ou terras indí- genas. As grandes empresas compradoras de produtos da região poderiam também oferecer melhores preços e prioridade de compra para aquelas propriedades que criassem RPPNs e mantivessem sistemas de gestão ambiental eficazes em suas propriedades. No caso das poucas propriedades legalizadas e que ainda não tivessem ocupado mais de 20% da área em atividades econômicas não florestais, o governo federal poderia fornecer isenção de impostos, facilidades de crédito e apoio técnico para o aumento da produtividade nas áreas que já estão sendo
Tiveram destino...
Entre as primeiras estão as unidades de conservação, as terras indígenas e os projetos de desenvolvimento sustentável (PDSs), que são gerenciadas pelos órgãos públicos. Cabe ao poder público investir sozinho ou estabelecer parcerias estratégicas para que essas áreas sejam implementadas de forma consistente e passem a desempenhar, de forma adequada, as funções sociais para as quais foram criada
Não tiveram destino
Entre as áreas públicas que não tiveram seus destinos definidos, podemos reconhecer três grandes categorias: a) as áreas não ocupadas; b) as áreas ocupadas e ainda cobertas por florestas; e c) as áreas ocupadas e já alteradas. As‘áreas não ocupadas deveriam ser transformadas prioritariamente em unidades de conservação de proteção integral. Essas unidades devem ser grandes (mais de 500 mil ha), pois elas formam a espinha dorsal de um sistema de unidades de conservação regional. Elas protegem a diversidade biológica da região com nenhuma ou pouca influência humana e desempenham um papel muito importante, como verdadeiros bancos naturais de recursos genéticos para aproveitamento econô- mico futuro. As áreas ocupadas e cobertas por florestas precisam ser estudadas 158 ESTUDOS AVANÇADOS 19 (54), 2005 detalhadamente para verificar as diferentes categorias socioambientais que usam o território. Se forem populações indígenas, então a área deveria ser demarcada como terras indígenas. Se forem populações tradicionais, então estas áreas poderiam ser destinadas à criação e à implementação de unidades de conservação de uso sustentável, tais como reservas extrativistas ou de desenvolvimento sustentá- vel. Se os ocupantes da terra não são populações tradicionais, então estudos mais detalhados precisam ser realizados para definir o melhor destino das terras. Hoje existe a possibilidade de se estabelecer Projetos de Desenvolvimento Sustentável (PDSs), ou mesmo utilizar o mecanismo de concessão florestal por tempo limitado, caso este venha a ser implementado. Porém, nesse caso, o sucesso dessa iniciativa dependerá da fiscalização da exploração ilegal de madeira, uma vez que a existência de madeira ilegal no mercado desestabiliza os preços e inviabiliza a exploração sustentável. Finalmente, no caso das áreas públicas ocupadas e já alteradas, a estratégia mais eficaz seria regularizá-las dentro de um amplo programa de ordenamento fundiário, e apoio ao pequeno produtor. Nesse programa, experiências como o Proambiente e apoios a sistemas agroflorestais podem ser essenciais para garantir a recuperação das reservas legais e das áreas de proteção permanente destas áreas. A proposta do desmatament

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