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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE
DISCENTE: BLYGIA LETÍCIA LIRA ALVES 
DOCENTE: MARIA DA CONCEIÇÃO M. CARDOSO
 COMPONENTE CURRICULAR: SOCIOLOGIA E ANTROPOLOGIA.
“O QUE É FATO SOCIAL?”
Campina Grande – PB
Outubro, 2017
É necessário saber que fatos podem ser chamados de fatos sociais. Empregam-na correntemente para designar quase todos os fenômenos que passam no interior da sociedade. Todavia, não haveria por assim dizer nenhum acontecimento humano que não pudesse ser chamado de social. Porém, se todos esses fatos fossem sociais, a sociologia não teria objeto próprio e seu domínio se confundiria com o da biologia e da psicologia. 
Na verdade há em toda sociedade um grupo determinado de fenômenos com caracteres nítidos, que se distingue daqueles estudados pelas outras ciências da natureza.
Mesmo estando de acordo com sentimentos que me são próprios, sentindo-lhes interiormente a realidade, esta não deixa de ser objetiva; pois não fui eu quem os criou, mas recebi-os através da educação. Estamos diante de maneiras de agir, de pensar e de sentir que apresentam a propriedade marcante de existir fora das consciências individuais. 
Esses tipos de conduta ou de pensamentos não são apenas exteriores ao indivíduo, são também dotados de um poder imperativo e coercitivo. Não há dúvida de esta coerção não se faz sentir, ou é muito pouco sentida quando com ela me conformo de bom grado, pois então se torna inútil. Mas não deixa de constituir caráter intrínseco de tais fatos, e a prova é que afirma desde que tento resistir. Em outros casos a coerção existe, mas é menos violenta e mesmo assim não deixa de existir. Existe também a coerção indireta, mas mesmo assim é eficaz. 
Estamos diante de uma ordem de fatos que apresenta caracteres muito especiais: consistem em maneiras de agir, de pensar e de sentir exteriores ao indivíduo, dotadas de um poder de coerção em virtude do qual se lhe impõe. Constituem uma espécie nova e é a eles que deve ser dada e reservada a qualificação de sociais. Esta é qualificação que lhes convém; pois é claro que, não tendo por substrato o indivíduo, não pode possuir outro que não seja a sociedade: ou a sociedade política em sua integridade, ou qualquer um dos grupos parciais que ela encerra. Por outro lado, é apenas a eles que a apelação convém; pois a palavra social não têm sentido definido senão sob a condição de designar unicamente fenômenos que não se englobam em nenhuma das categorias de fatos já existentes, constituídas e nomeadas. Estes fatos são, pois o domínio próprio da sociologia. Como professam que o indivíduo é inteiramente autônomo, parece-lhes que o diminuímos todas as vezes que fazemos sentir que não depende apenas de si próprio. Porém já que hoje se considera incontestável a maioria de nossas ideias e tendências não é elaborada por nós, mas nos vem de fora, conclui-se que não podem penetrar em nós senão através de uma imposição. Sabe-se que toda coerção social não é necessariamente exclusiva com relação à personalidade individual. O que não quer dizer que toda coerção seja normal. 
Acredita-se que só existe fato social onde exista uma organização definida. No entanto, há outros fatos que, sem apresentar estas formas cristalizadas, têm a mesma objetividade e o mesmo ascendente sobre o indivíduo. É o que tem sido chamado de correntes sociais.
Ora, se este poder de coerção externa se afirma com tal nitidez nos casos de resistência, é porque, mesmo inconsciente, existe também nos casos contrários. Vítimas de uma ilusão, acredita-se ser produto de nossa própria elaboração aquilo que nos é imposto do exterior. Contudo, a indulgência com que nos deixamos levantar, se mascara a pressão sofrida, não a anula. 
Ora, o que afirmamos a respeito destas explosões passageiras se aplica de maneira idêntica aos movimentos de opinião mais duráveis que se produzem sem cessar em torno de nós, seja toda a extensão da sociedade, seja em círculos mais restritos. 
Esta definição do fato social pode, além do mais, ser confirmada por meio de uma experiência característica : basta, para tal, que se observe a maneira pela qual são educadas as crianças. Toda educação consiste num esforço contínuo para impor às crianças maneiras de ver, de sentir e de agir às quais elas não chegaram espontaneamente. É verdade que, segundo Spencer, uma educação racional deveria reprovar tais procedimentos e deixar a criança agir em plena liberdade; mas como esta teoria pedagógica não foi nunca praticada por nenhum povo conhecido, não constitui senão um desiderato pessoal, não sendo fato que possa ser oposto aqueles que expusemos atrás.
Um pensamento encontrado em todas as consciências particulares, um movimento que todos os indivíduos repetem, não são por isso fatos sociais. Crenças, tendências, práticas do grupo tomadas coletivamente é que constituem os fatos sociais. Na verdade, certas maneiras de agir ou de pensar adquirem, devido à repetição uma espécie de consistência que, por assim dizer, as precipita, as isola dos acontecimentos particulares que as refletem. O hábito coletivo não existe somente em estado de imanência nos atos sucessivos que determina, mas, por um privilégio de que não encontramos exemplo senão no reino biológico, é expresso uma vez por todos numa fórmula que se repete de boca em boca.
Não há dúvida de que a dissociação não apresenta sempre a mesma nitidez. Mas é suficiente que exista de maneira incontestável nos casos importantes e numerosos para provar que o fato social é distinto de suas repercussões individuais. Existem certas correntes de opinião que nos impelem com intensidade desigual, segundo as épocas e os países, ao casamento, por exemplo, ao suicídio ou então a uma natalidade mais ou menos forte, etc. Tais correntes são evidentemente fatos sociais. 
As manifestações privadas têm realmente algo de social também, uma vez que reproduzem em parte um modelo coletivo. 
Um fenômeno não pode ser coletivo se não for comum a todos os membros da sociedade. Mas se ele é geral, é porque é coletivo e está bem longe de ser coletivo por ser geral. Embora o fato social seja, em parte, à nossa colaboração direta, sua natureza não é diferente da que acabamos de expor. 
O fato social é reconhecível pelo poder de coerção externa que exerce ou é suscetível de exercer sobre os indivíduos; e a presença deste poder é reconhecível, por sua vez, seja pela existência de alguma sanção determinada, seja pela resistência que o fato opõe a qualquer empreendimento individual que tenda a violentá-lo. Podemos defini-lo também pela difusão que apresenta no interior do grupo, desde que, de acordo com as precedentes observações, se tenha o cuidado de acrescentar como característica segunda e essencial. A coerção é fácil de constatar quando ela se traduz no exterior por qualquer reação direta da sociedade, como é o caso em se tratando do direito, da moral, das crenças, dos usos e até das modas. A segunda definição não constitui senão uma forma diferente que toma a primeira; pois o comportamento que existe exteriormente às consciências individuais só se generaliza impondo-se a estas. 
Fato social é toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior ; ou então ainda, que é geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando uma existência própria, independente das manifestações individuais que possa ter.

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