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RESENHA O que é a propriedade, de Pierre Joseph Proudhon

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Universidade Federal do Pará.
Grupo de Pesquisa “Direito de Propriedade e Justiça Distributiva: A proteção da propriedade privada como elemento de promoção dos Direitos Humanos”.
Resenha crítica do Capítulo III da obra “O que é a Propriedade?”, de Pierre-Joseph Proudhon.
Docente responsável: Prof. Dr. João Daniel Sá.
Acadêmico: Lucas Willian Meneses Ribeiro.		Data: 22 de setembro de 2017.
Credenciais da obra:
PROUDHON, Pierre-Joseph. Do trabalho, como causa eficiente do domínio da propriedade. In: ________. O que é a propriedade?. Editorial Estampa: Lisboa, 1975. p. 73-130.
Credenciais do autor:
Nascido em Besançon, França, em 1865, Pierre-Joseph Proudhon foi filósofo e jornalista, responsável por lançar as bases do anarquismo libertário individualista.
Resenha:
“O que é a Propriedade?” deflagra o pensamento filosófico de Pierre-Joseph Proudhon, na forma de uma mordaz crítica ao modelo filosófico da propriedade instaurado nos meados do século XIX. É considerada a obra seminal do anarquismo, nascida em período anterior às divergências entre os correligionários do comunismo marxista e os partidários da ideologia proudhoniana durante a 1ª Associação Internacional de Trabalhadores, em 1864. Ao longo das suas 248 páginas, Proudhon guiará argumentação tendente a desconstituir os ideais moderno-liberais de propriedade privada, ressaltando tez exploratória, hierarquizante e opressora das grandes apropriações de terra e capital. Tal raciocínio, porém – não obstante revelar um autor preocupado com as formas coercitivas advindas do “esbulho” – não o privará da defesa de modelo um possessório calcado na preservação da igualdade e liberdade entre os indivíduos. 
Da mais imediata leitura do Capítulo III (“Do trabalho, como causa eficiente do domínio da propriedade”), percebe-se a profunda rejeição do autor francês para com as teorias econômicas e filosóficas predominantes na literatura oitocentista. Proudhon parte de um pressuposto igualitário em termos de apropriação – será ela justa se garantir equanimidade entre os membros do corpo social. Marco que o autor francês não vê compatibilizado às teorias de ocupação primitiva ou de apropriação mediante o trabalho empreendidas sobre a terra. Os argumentos para tanto, Proudhon libera-os em um rompante que se mescla à exaltação de sua linguagem, próprios do discurso crítico-filosófico do século XIX. Tal poderá facilmente fastidiar o leitor desavisado; o autor prescinde de maior objetividade em seu discurso, critica pesada e por vezes injustamente seus opositores (“a igualdade tão oidosa ao economista, deve tudo à economia política”), ainda que possua argumentos plenamente consideráveis para sustentar seu posicionamento.
Quanto a ocupação primitiva, tanto a naturalidade da terra, ofertada espontaneamente pelo Criador (p. 77), como seu caráter limitado, findo perante a coletividade, e portanto impreterivelmente indispensável à conservação humana, contradizem o paradigma no qual “a terra é do primeiro que a ocupar” (p. 75). Da necessidade mútua entre indivíduos nascerá um direito (p. 80) – e desta máxima extrai-se o contraponto coletivista de Proudhon ao individualismo proprietário de Locke no século XVII, de melhor consonância às problemáticas contemporâneas em torno do direito à terra, seja no âmbito urbano ou agrário. Para além disso, consequentemente, o autor francês repele teorização adensada ao consentimento universal da humanidade enquanto elemento sancionador do direito à propriedade da terra (p. 82). Contratualista, tal posição surge como justificadora das desigualdades entre os seres humanos, que teriam abdicado reciprocamente ao direito comunal para entregar-se a igualdade territorial – pressuposto do cumprimento do pactuado.
Porém, sabe-se da histórica disparidade na distribuição da terra ao longo da história dos corpos sociais; a ideia contratualista nasce como justificativa deslocada da faceta política inerente à propriedade, que fornece ao seu detentor poderio ideológico e econômico sobre os demais indivíduos. Há impertinência da hipótese contratual, vez que o contexto fático denuncia a desigualdade das apropriações; aceitá-la é atestar a concordância e pacificidade dos homens quanto a um pacto descumprido, inócuo. Assim, Proudhon consegue fechar raciocínio em torno da (in)validade do postulado consentimental da propriedade, de sorte que com tal entendimento nada é somado à discussão (p. 82).[2: 	 ASSIS, Luiz Gustavo Bambini de. A evolução do direito de propriedade ao longo dos textos constitucionais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 103, p. 781-791, jan. 2008. ISSN 2318-8235. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67828/70436>. Acesso em: 22 sep. 2017]
Sobre os processos históricos de apropriação/manutenção da propriedade privada, o autor prepara posição contrária ao instituto da prescrição – e aqui retoma o fervor argumentativo desprendido anteriormente. Ao manter-se cético quanto aos dogmas lançados sobre os institutos, ciências e pensamentos; àquilo que os mantém inertes e indubitáveis no tempo, Proudhon obtém sucesso. De fato, a argumentação que fundamenta a propriedade na prescrição carece de maiores justificativas. A prescrição jurídica não cria ou dá início a um processo apropriativo. Apenas reconhece-o como possível em um contexto onde já existe a propriedade. Da feita em que sua lógica reprime a apropriação da terra, seja pela ocupação ou pelo trabalho, a prescrição temporal em nada pode agir para sacramentar a conformidade jurídica do esbulho. É, pois, cristalino: “(…) acumulem os anos e os séculos, não farão nunca com que a duração, que por si só não cria nada, não muda nada, não modifica nada, possa transformar o usufrutário em proprietário”.
Proudhon passa então às considerações sobre a apropriação mediante o trabalho desprendido à terra. Agora sua hipótese é clara: não prevê possibilidade de apropriação das coisas naturais. Por outro lado, aquilo que provém do exercício do trabalho em uma coisa natural (como a terra, por exemplo) pertencerá ao obreiro. Os meios de produção jamais serão apropriáveis; diferentemente dos produtos fornecidos pelo labor neste meio. “Que o trabalhador faça seus frutos, concordo, mas não compreendo que a propriedade dos produtos implique a da matéria” (p. 94). Isso porque a lógica empregada por Proudhon anteriormente surte efeitos a posteriori; o autor renega qualquer possibilidade de apropriação das coisas fornecidas pelo Criador, disponibilizadas à formação comunal humana. Somente aquilo efetivamente fruto da criação do homem poderá sofrer o esbulho legítimo.
Dessa forma, o trabalho não transformará a posse em propriedade per se; se assim o fosse, não mais seria proprietário aquele que deixasse de ser trabalhador (p. 94). A operação que tornará o proprietário como tal é resultado da consagração da ocupação primitiva somada ao instituto da prescrição civil, previamente afastados pelo autor francês.
Dos seus posicionamentos mais polêmicos, Proudhon defende “um direito natural de propriedade” (p. 98) sobre aquilo que fora produzido pelo trabalhador, ainda que este tenha sido pago na forma de salário por seu empregador. Decorrência evidente da sua máxima “Quem trabalha tornar-se-á proprietário” (p. 97), visto que defendia a apropriação do valor por quem o tivesse produzido. Momento em que Proudhon desvela algumas das profundas contradições inerentes ao sistema capitalista.
Não basta a recompensa em dinheiro frente a renúncia efetivada pelo obreiro em benefício de seu pagador; comprometem-se a sua liberdade de trabalho – os meios de produção sacrificados em benefício de outrem – e a longevidade do seu sustento, condenado a uma série de pagamentos consonantes às necessidades do contratante. Constrói-se um ciclo de exploração àquela mão de obra. Os lucros serão retro-investidos em novos meios de produção, limitando as possibilidades do proletariado, sem saída outra que não a nova submissão aos trabalhos requisitados por seuempregador. Este detém segurança; àquele restará a incerteza de novos dias.
 O valor financeiro dos salários e apequena frente as possibilidades proporcionadas pelo trabalho comum, de várias pessoas. E aqui destaca-se o gênio de Proudhon, ao dizer que “(…) ao remunerar as forças individuais não foi paga a força coletiva” (p. 103). Certamente, inexistiriam quaisquer grandes construções quando do trabalho de só um homem, mesmo que dispondo de todos os meios e instrumentos de produção, pelos anos necessários à consecução da tarefa. O valor desprendido pelo trabalho coletivo não obedece à lógica da soma de forças produtivas, o que automaticamente reflete na insuficiência dos salários como solução viável à satisfação dos proletários.
Se por um lado Proudhon destaca-se por certa preocupação a nível coletivo em relação à sociedade, por outro seu individualismo se sobressai. O autor é desfavorável a socialização dos meios de produção e do capital através de sua estatização. Defendia o modelo de associações/cooperativas de trabalhadores, que proveriam o seu sustento através do trabalho particionado equalitariamente nas em suas células, de sorte que fossem pagos pelos produtos de seus próprios trabalhos (“todo o trabalhador recebe da sociedade inteira o seu consumo, e com o seu consumo os meios de produzir”, p. 128). Assim, as trocas e vendas mútuas de diferentes produtos entre as células fariam pulsar a vida na sociedade.
Advém daí seu ceticismo quanto a instrumentos de taxação (“O fisco, cujo espírito é o de desnaturar as coisas melhores (…)”) (p. 78), hodiernamente essenciais à distribuição de renda entre os membros do corpo social. Peca o pensador francês quanto àqueles que não podem exercer o trabalho, provendo o próprio sustento. Inválidos por alguma enfermidade ou condição física, por exemplo, mesmo que inseridos em um contexto ideal de ausência das grandes apropriações de meios, não teriam vez em prover sustento e dignidade. Portanto, ao relegar a existência de uma instituição central de seguridade social – como serve o Estado -, Proudhon desampara outros setores da sociedade – clivagens menos abastadas dependentes de auxílio externo para sua existência.
Assim, a leitura de Proudhon reflete a tentativa de conciliação entre as propriedades “justas”, que assegurarão a subsistência do coletivo social, em detrimento dos instrumentos de exploração consagrados pelas apropriações despóticas e alienadoras, próprias do modelo capitalista construído pelo autor. Na linguagem, seu pecado é a ausência de placidez argumentativa. Excede os limites do debate filosófico, demonstrando reprovação extracientífica a verdadeiros adversários ideológicos. Entretanto, resiste enquanto crítica necessária às contradições instauradas pelo modelo de produção predatório do século XIX, de modo que seus ideais igualitários subsistem em importância histórica. É atual em vários momentos, justamente por demonstrar as circularidades deste sistema. Posicionamentos que são indispensáveis na construção teórica de qualquer noção humanitária de propriedade – onde justifica-se a importância de seu estudo.

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