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CAPÍTULO 1 IMPORTÂNCIA DAS FORRAGEIRAS NO SISTEMA DE PRODUÇÃO Dilermando Miranda da Fonseca Manoel Eduardo Rozalino Santos Janaina Azevedo Martuscello 1 - INTRODUÇÃO Em um sistema de exploração pecuária com base na utilização de pastagens, a planta forrageira assume papel primordial, uma vez que tanto a rentabilidade quanto a sustentabilidade do sistema depende da escolha correta da forrageira. O Brasil, país de dimensão continental, contém uma série de biomas diferenciados, o que torna imprescindível a existência de grande número de espécies forrageiras, gramíneas ou leguminosas, para que todos esses ecossistemas sejam contemplados quando o objetivo for o estabelecimento de pastagens. O grande número de espécies forrageiras disponíveis aos pecuaristas realça a necessidade e esforços dos pesquisadores no sentido de distinguir suas principais características; e também aumenta a responsabilidade dos pecuaristas quanto à sua escolha, já que as opções são diversas. Estima-se que no Brasil exista cerca de 170 milhões de hectares de pastagens, sendo que 100 milhões são de pastagens cultivadas e 70 milhões de pastagens naturais (IBGE, 2005). A produção de carne e leite no país é baseada quase que exclusivamente em pastagens de gramíneas e leguminosas forrageiras. Devido à importância da pecuária nacional para a economia do país, o cultivo de plantas forrageiras assume papel relevante para a cadeia produtiva de carne e leite. Nos últimos anos, a produção de carne aumentou no Brasil e esse agronegócio movimenta aproximadamente 24 bilhões de dólares ao ano (FAO, 2005). Também no agronegócio leite, a partir da década de 1990, notou-se grande transformação da atividade no país, resultante de mudanças institucionais, onde os produtores incorporaram novas tecnologias ao sistema de produção (Martins, 2005). Assim, o aumento na produtividade de carne e leite no Brasil se deve, principalmente, à adoção de novas tecnologias pelos pecuaristas, incluindo a utilização de novas forrageiras mais responsivas em sistemas intensivos de produção, lançadas pelos centros de pesquisa (Martuscello et al., 2007). A produção animal em pastagens apresenta vantagens em relação aos outros sistemas de produção. Geralmente, o pasto é o alimento mais viável economicamente para a alimentação de ruminantes. Estima-se que o custo de produção da forragem oriunda da pastagem, na mesma unidade de medida, corresponde a um terço daquele originado a partir de outras fontes de alimento, como silagem, feno e alimentos concentrados. Neste contexto, o Brasil encontra-se em situação privilegiada, uma vez que estimativas são de que 96,5% do plantel de bovinos é manejado exclusivamente em pastagens, sendo que dos 3,5% restantes, a maioria é criada em pastagens por algum período do ciclo de produção (ANUALPEC, 2002). De acordo com dados oficiais do IBGE (2002), as pastagens brasileiras suportam um rebanho que ultrapassa 200 milhões de cabeças, das quais mais de 171 milhões só de bovinos, colocando o Brasil na condição de país com o segundo maior rebanho bovino do mundo. Entretanto, quando se analisa criteriosamente os índices zootécnicos do rebanho brasileiro sob pastejo, nota-se ineficiência nos sistemas de produção, já que o desfrute brasileiro é 23,4% menor do que o da vizinha Argentina, 47,5% menor do que o da Austrália, que também explora o sistema de produção em pastagens, e 64,1% menor do que o dos Estados Unidos (FAO, 2002). Evidentemente, esses dados refletem, dentre outros fatores, não só o manejo inadequado das pastagens e dos animais no Brasil, mas também, em alguns casos, a inadequação da planta forrageira ao sistema de produção. Culturalmente o produtor brasileiro tende a buscar a “forrageira milagrosa” como forma de aumento de produtividade, facilidade de manejo e sustentabilidade do sistema de exploração. Porém, na maioria dos casos, as subestimativas de exigências nutricionais e o desconhecimento do manejo da forrageira utilizada, somado à inadequação desta ao ecossistema, resulta em diminuição da produtividade e, posteriormente, degradação da pastagem. Ademais, a simples substituição da planta forrageira tem pouco efeito no sistema de produção como um todo, haja vista que esta é somente parte integrante do ecossistema. Ainda assim, é de extrema importância o conhecimento das características agronômicas, morfológicas e fisiológicas da forrageira a ser utilizada, pois este é a base que norteia a adequada escolha e o eficiente manejo das forrageiras. 2 - HISTÓRICO DAS FORRAGEIRAS NO BRASIL O Brasil, quando à época do descobrimento, possuía cerca de 89% de florestas e o restante de sua área era de formações campestres. Os campos de pastagens nativas mais representativos no Brasil eram os campos naturais do Sul do país, os campos inundáveis da Amazônia e do Pantanal e o Cerrado, com suas vegetações características. As demais áreas de pastagens no Brasil, já no início do século 20, foram surgindo por ação antrópica a partir do desmatamento de áreas florestais. Na época da escravatura, no Brasil colônia, algumas forrageiras de origem africana foram trazidas para o País em navios negreiros. De acordo com Mitidieri (1988), houve a introdução casual das primeiras gramíneas africanas na América através dos navios que traziam escravos de Guiné. O capim-colonião e outros serviam de cama para os escravos e, depois, eram jogados em áreas da costa brasileira. Devido principalmente as semelhanças edafoclimáticas entre algumas regiões do Brasil e algumas regiões da África, essas forrageiras se adaptaram bem e se disseminaram por várias localidades brasileiras. Ademais, essas forrageiras, mostraram-se bastante resistentes ao pisoteio e ao pastejo, como conseqüência, dentre outros fatores, da co-evolução durante milhares de anos com os grandes herbívoros africanos. Nesse grupo de gramíneas africanas estão incluídos o capim- colonião (Panicum maximum), o capim-braquiária (Brachiaria decumbens), o capim- jaraguá (Hyparrhenia rufa), o capim-gordura (Melinis minutiflora), entre outros, os quais serão abordados detalhadamente nos capítulos subseqüentes. Desde o início da colonização do território brasileiro e mesmo na atualidade em regiões em que ocorre expansão da agropecuária, os bovinos exerceram papel desbravador na ocupação de áreas. No início, o estabelecimento das pastagens ocorreu de forma lenta devido sua implantação por mudas e, a partir da década de 1960, o processo de estabelecimento das pastagens passou a ocupar maiores áreas, em menor tempo, devido à importação, produção e utilização de sementes de forrageiras. Entretanto, em razão do pouco conhecimento das exigências nutricionais e de manejo das forrageiras, o declínio de produtividade foi evidente, iniciando-se assim o denominado “ciclo dos capins” (Tabela 1), onde os produtores substituíam as forrageiras já estabelecidas na tentativa de restabelecer a produção, porém em solos cada vez mais improdutivos e degradados. Dessa forma, aumentava-se o número de degraus da “escada descendente feliz” ou “escada da ilusão” (Figura 1), quando se procurava, a cada reforma da pastagem, um “capim novo”, com baixa exigência em fertilidade de solo, resistente ao fogo, ao pastejo, produtivo no período seco do ano, etc. (Corsi, 1988). Tabela 1 - Evolução do uso e substituição de plantas forrageiras no Brasil (ciclo dos capins) Década Gênero, espécie e, ou cultivar de forrageira 1960 Cynodon e Digitaria 1970 Panicum maxium (Green Panic, Sempre Verde e Makueni) Setaria anceps (Nandi, Kazungula) Brachiaria decumbens 1980 (Áreas tropicais) Panicum maxium (Centenário) Andropogon gayanus 1980 (Áreas não tropicais) Festuca, Lolium, Phalaris, Trifolium, Medicago, Lotus 1980 (Introdução degermoplasma) Brachiaria Panicum 1980 (Lançamento de cultivar) Brachiaria brizantha cv. Marandu 1990 (Lançamento de cultivar) Panicum maximum cv. Vencedor, Tanzânia e Mombaça 2000 (Lançamento de cultivar) Brachiaria brizantha cvs. Xaraés e Piatã, Panicum maximum cv. Massai, Paspalum atratum cv. Pojuca Figura 1- Escada descendente feliz ou escada da ilusão (Adaptado de Corsi, 1988). Na atualidade, assim como no passado, verifica-se um grande interesse por parte dos pecuaristas no tocante à substituição de gramíneas forrageiras. Há especial interesse no estabelecimento de forrageiras lançadas recentemente e que ocupam maior espaço nos meios de divulgação. Vale salientar que a simples substituição da forrageira no sistema de produção não garante a lucratividade final, caso outras ações de manejo não sejam empregadas concomitantemente. Muitas “forrageiras atuais” são utilizadas sem o devido embasamento teórico (conhecimento de suas características) necessário para o seu adequado manejo. Dessa forma, parece que o “ciclo dos capins” ainda não acabou. 3. CONHECIMENTO DAS CARACTERÍSTICAS DAS PLANTAS FORRAGEIRAS O conhecimento das diversas características de cada forrageira é de suma importância para sua correta utilização, para garantir produtividade e perenidade das espécies, bem como lucratividade dos sistemas produtivos que as utilizam. Cada forrageira possui características particulares, resultado dos distintos meios nos quais evoluíram durante milhares de anos. Isso faz com que exista grande diversidade de CAPIM-COLONIÃO, CAPIM-NAPIER CAPIM-PANGOLA CAPIM-BRAQUIÁRIA CAPIM-KIKUIO-DA-AMAZÔNIA CAPIM-ANDROPÓGON CAPIM-MARANDU GRAMA BATATAIS (GRAMÃO) REBROTA DE BARBA DE BODE RABO DE BURRO, SAPÉ forrageiras no que diz respeito às características morfológicas e fisiológicas, às exigências edáficas e climáticas, que determinam aptidões variáveis tais como resistência à intensidade de pastejo, exigência em fertilidade e textura do solo, condições de clima e manejo, dentre outras. A consideração destas diversas características é essencial quando da idealização e condução de sistemas de produção baseados na utilização das pastagens. Embora exista muitas opções de recursos forrageiros disponíveis aos pecuaristas, para cada ecossistema e perfil de sistema produtivo, há um número restrito de forrageiras mais propícias. Ademais, em um mesmo ecossistema ou sistema de produção, existem microclimas em que as características do ambiente são diferenciadas ou áreas utilizadas com objetivos distintos. Essa realidade torna ainda mais importante o conhecimento das forrageiras para sua adequada escolha e utilização. Há forrageiras com diferentes formas de crescimento e essa característica é importante, por exemplo, quando da escolha da espécie para áreas de relevos distintos. Em áreas declivosas torna-se mais adequado a utilização de gramíneas estoloníferas e, ou decumbentes. Em contrapartida, áreas planas podem ser utilizadas com gramíneas cespitosas e de crescimento mais ereto. Esse simples conhecimento pode garantir a sustentabilidade da pastagem por prevenir possíveis problemas de erosão e, consequentemente, degradação. Pela caracterização morfológica de uma forrageira também se pode inferir sobre sua mais adequada forma de utilização. Assim, gramíneas com alta relação folha:colmo e de colmos finos são as mais indicadas para produção de feno por propiciarem mais rápida desidratação e melhor qualidade do produto; plantas de crescimento ereto com meristema apical mais facilmente eliminado pelo pastejo exigem freqüência de corte menor ou altura de corte mais elevada, ao contrário de plantas mais prostradas; e forrageiras de maior porte são menos indicadas para o pastejo de pequenos ruminantes e equídeos. As características agronômicas também devem ser consideradas. O maior potencial produtivo de uma forrageira a torna mais recomendada aos sistemas de produção mais intensivos, onde se utiliza maior quantidade de adubo com o objetivo de incrementar a produção animal por área. Normalmente, estas forrageiras são mais exigentes em fertilidade de solo, o que restringe e, ou limita sua utilização. Forrageiras com elevado potencial de produção de sementes garantem maior recuperação natural das plantas, o que pode contribuir para sustentabilidade do pasto em condições de manejo menos adequadas ou após ocorrências climáticas desfavoráveis. A variação fenológica das espécies e, ou cultivares de forrageiras tem influência na oferta e na distribuição, bem como no valor nutritivo da forragem e pode alterar o consumo e desempenho animal, o que faz com que ações de manejo sejam, teoricamente, diferenciadas em função do estádio de crescimento da planta. A adaptação da forrageira às condições de clima, bem como suas respostas ao clima, é fundamental para o sucesso na produção de forragem durante o ano. Essas informações, somadas ao conhecimento da condição climática da região onde se pretende implantar ou já existe a pastagem, permite a adequada escolha da espécie forrageira e melhor planejamento para utilização do recurso forrageiro. A maioria das gramíneas tropicais possui exigência de temperatura ótima para a fotossíntese em torno de 35°C (Magalhães, 1979). Isso é um dos fatores que explicam a sazonalidade da produção de forragem em condições tropicais. De outra forma, as forrageiras de inverno têm capacidade de crescer em ambientes mais frios, pois sua fotossíntese ótima ocorre numa temperatura em torno de 25°C (Magalhães, 1979). Destarte, o uso destas últimas pode constituir uma das estratégias para reduzir a estacionalidade da produção de forragem no sistema. A qualidade da forragem também é um dos determinantes do consumo e desempenho animal e, sendo assim, seu conhecimento permite adequar os diferentes tipos de pasto às distintas categorias e, ou espécies animais de forma coerente. Por exemplo, as leguminosas, em geral, possuem melhor valor nutritivo do que as gramíneas e, por isso, a sua utilização deve ser recomendada para ocasiões em que o maior desempenho animal é almejado, tais como em criatórios de animais de alto valor genético. Existem ainda plantas forrageiras que possuem fatores antinutricionais, tais como tanino, mimosina, ácido cianídrico, oxalato, dentre outros. Esse conhecimento pode limitar ou restringir sua utilização e, mais importante, evitar prejuízos ao pecuarista devido aos danos aos animais. Finalmente, é importante considerar que as demandas por tecnologias não são estáticas. Assim, na medida que novas tendências, diferentes formas de manejo ou distintos sistemas de produção vão sendo desenvolvidos e implementados, torna-se imprescindível novos conhecimentos sobre recursos vegetais mais aptos para serem utilizados nestas novas condições. Como exemplo, temos a crescente demanda de informações sobre implantação e condução de sistemas agrossilvipastoris, que integram conjuntamente a agricultura, a pecuária e a atividade florestal numa mesma área. Nesses sistemas, a introdução da forrageira deve ser baseada, dentre outros fatores, no conhecimento do seu nível de tolerância ao sombreamento para garantir boa produtividade. Outro exemplo são os sistemas que utilizam a integração agricultura e pecuária com o uso da técnica de plantio direto. Nesse caso, características da planta forrageira, tais como sistema radicular vigoroso capaz de melhorar as propriedades físicas do solo, facilidade de erradicação e, ou dessecação com o uso de herbicidas e elevada produção de biomassa que permita oferta de forragem e boa cobertura do solo, são requeridas para obtenção de êxito na exploração e, portanto, devem ser conhecidas. Várias outras características e finalidades de uso das forrageiras aindapoderiam ser descritas, as quais juntamente com as citadas, quando devidamente conhecidas, auxiliam sua escolha e adequada utilização. Todavia ressalta-se que, possivelmente, não existe uma única forrageira que reúna todas as características agronômicas e zootécnicas desejáveis para uma determinada condição. Essa realidade faz com que a caracterização das forrageiras seja necessária, como forma de nortear seus usuários e antecipar possíveis padrões de resposta produtiva quando do seu estabelecimento e utilização. 4 - FORRAGEIRA COMO COMPONENTE DO SISTEMA DE PRODUÇÃO EM PASTAGEM O conhecimento dos componentes do sistema de produção animal em pastagem é um dos pressupostos para o entendimento das relações de causa e efeito que determinam seu funcionamento. Segundo Sheath & Clark (1990), esses componentes são os recursos físicos, vegetais e animais, os quais são arranjados e organizados em uma seqüência hierárquica e interativa (Figura 2). Os recursos vegetais correspondem à espécie ou conjunto de espécies forrageiras que são exploradas no sistema produtivo. Para a utilização adequada desses recursos vegetais, deve-se conhecer suas características, bem como a base produtiva do sistema, denominada de recurso físico. Este compreende as condições edafoclimáticas, a infra-estrutura, a localização geográfica, quantidade e qualidade da mão-de-obra disponível, dentre outros, do sistema produtivo. Esses conhecimentos, se devidamente considerados, irão impor restrições às diversas possibilidades de escolha dos recursos vegetais, definindo um universo mais estreito de combinações em um sistema de produção (Da Silva & Corsi, 2003). Figura 2 - Representação da estrutura hierárquica entre os componentes do sistema de produção animal em pastagens (Adaptado de Sheath & Clark, 1990). A interação entre os recursos físicos e vegetais deve ser otimizada e harmonizada, respeitando-se as exigências e particularidades de ambos, para que o sistema seja produtivo e sustentável. Infelizmente, essa premissa básica e fundamental para o bom funcionamento do sistema de produção animal baseado no uso da pastagem não tem sido respeitada. É comum tentativas de estabelecimento de espécies forrageiras em condições impróprias, tais como o plantio de capim-elefante em áreas de solo com deficiência de drenagem; a semeadura de cultivares de Panicum, exigentes em fertilidade, em solos ácidos e pobres em nutrientes; ou a utilização de forrageiras com limitado potencial de resposta produtiva, como a Brachiaria ruziziensis, em sistemas de produção de alto nível tecnológico. A inadequação dos recursos vegetais aos recursos físicos resulta em baixa produtividade e lucratividade do sistema e, o que é mais preocupante, na degradação dos ecossistemas pastagens. Segundo Barcellos et al. (2001), cerca de 80% das pastagens cultivadas nos Cerrados apresenta-se em estádio de degradação, sendo este apontado como um dos principais problemas sociais, econômicos e ambientais Recursos físicos Recursos vegetais Recursos animais vividos pela pecuária nacional. Contudo vale salientar que ações de manejo podem e, muitas vezes, devem ser implementadas com o objetivo de corrigir possíveis limitações nos recursos físicos e, assim, tornar apropriada a utilização dos recursos vegetais específicos e de interesse. Filosoficamente, somente após o estabelecimento da interação estável entre os recursos físicos e vegetais é que o terceiro componente do sistema de produção animal em pastagens deve ser considerado, ou seja, o recurso animal. Este pode ser caracterizado pela(s) espécie(s), categoria(s) e mérito genético dos animais que serão criados. Nesse contexto, ainda é corriqueira a observação do emprego de recursos animais inadequados aos recursos vegetais disponíveis. Situações como a manutenção de animais com produtividades distintas e, portanto, com exigências nutricionais diferentes num mesmo pasto são comuns. Neste caso, a simples divisão do rebanho em lotes mais homogêneos e sua alocação em pastos específicos, considerando o valor nutritivo da forragem e a demanda de nutrientes do animal, consiste em ação de manejo mais eficiente. Mas, para isso, torna-se necessário conhecer a qualidade da forragem possível de ser produzida pela planta forrageira. Assim, diferentes recursos animais exigem distintos recursos vegetais. Em condições de pastagem, onde existe uma oferta abundante de forragem de baixa qualidade, animais de menor porte ficam em desvantagem para atingir seus requerimentos em função de sua alta demanda energética (Demment & Van Soest, 1985). Os animais de grande porte têm a vantagem de poder utilizar a estratégia de aumentar o tempo de retenção do alimento, explorando mais eficientemente a forragem de baixa qualidade. Os bovinos teriam, portanto, uma considerável vantagem em relação a ovinos, e principalmente em relação a caprinos, nesta situação. Diante do exposto, fica evidente a existência de interdependência entre os recursos físicos, vegetais e animais no sistema de produção em pastagem. Nesse contexto, os recursos vegetais devem ser escolhidos em função da natureza e da possibilidade de alteração nos recursos físicos. Ademais, o recurso vegetal é um dos determinantes do desempenho do recurso animal em pastagens e, dessa forma, deve ser escolhido tendo como um dos critérios o tipo de animal que será criado. 5 - ETAPAS DE PRODUÇÃO ANIMAL EM PASTAGEM A produção animal em pastagens pode ser entendida, do ponto de vista do funcionamento, como resultado de três etapas interdependentes: crescimento, utilização e conversão (Hodgson, 1990) (Figura 3). A fixação de energia proveniente do sol e sua transformação em tecido vegetal são processos responsáveis pela produção de forragem e correspondem à etapa de crescimento. Essa forragem, quando colhida pelo animal por meio do pastejo, caracteriza a etapa de utilização. A conversão, última etapa do processo produtivo, é a transformação da forragem consumida em tecidos e produtos de origem animal. Figura 3 - Representação das etapas da produção animal em pastagens (Adaptado de Hodgson, 1990). A escolha da espécie ou cultivar de forrageira a ser utilizada influencia diretamente a etapa de crescimento, porque cada planta possui um potencial de Forragem produzida Recursos: Solo, Clima, Plantas CRESCIMENTO Forragem consumida UTILIZAÇÃO Produto Animal CONVERSÃO PRODUÇÃO ANIMAL produção determinado geneticamente e que, em função das condições do meio, pode ser expresso em escalas variáveis. Em razão disso, ambientes que permitam a expressão do mérito genético da planta forrageira devem ser utilizados com plantas com alto potencial de resposta, como as cultivares de Pennisetum purpureum e algumas de Panicum maximum. Contrariamente, os capins Brachiaria ruziziensis, Paspalum notatum e Melinis minutiflora, que são exemplos de espécies com menor capacidade de produção, devem ser alocadas em áreas cujas características sejam mais limitantes à produção de forragem. A morfologia da forrageira também condiciona as ações de manejo do pastejo empregadas durante a etapa de utilização. Parece haver um consenso de que plantas eretas, de porte alto e com ritmo de crescimento acelerado, como os capins Tanzânia, Mombaça e Elefante, são mais indicadas para a utilização sob pastejo em lotação intermitente, enquanto que as forrageiras de porte mais baixo, para uso em lotação contínua (Rodrigues & Reis, 1999). Acresce-se ainda que cada forrageira possui um valor nutritivo inerente, reflexo de suas características químicas e anatômicas que, embora possam ser modificadas pelo manejo, também influenciam a conversãoda forragem em produto animal, afetando, assim, a última etapa da produção animal em pastagem (conversão). Assim, a escolha da planta forrageira tem conseqüências significativas em todas as etapas do processo de produção animal em pastagem (crescimento, utilização e conversão). Ademais, a etapa de utilização também afeta o crescimento da planta forrageira, porque diferentes intensidades e freqüências de pastejo resultam em respostas diferenciadas da planta num determinado ambiente. Nesse contexto, o conhecimento do padrão de crescimento das diferentes forrageiras em condições de pastejo é importante para a escolha da espécie, tendo em vista as estratégias de manejo que são e, ou serão adotadas na propriedade. 6 - OBJETIVO COM O SISTEMA DE PRODUÇÃO EM PASTAGEM Embora exista um grande número de forrageiras de que se pode dispor, a simples consideração do(s) objetivo(s) e do perfil que se pretende com um sistema de produção animal já restringe, sobremaneira, as espécies mais convenientes e adequadas àquela condição. Dessa forma, o uso de determinado recurso forrageiro deve ser norteado pela consideração conjunta e criteriosa das características da planta e do sistema de produção. Existe uma grande diversidade de sistemas de produção animal no Brasil, o que demanda, teoricamente, forrageiras específicas para cada condição. Por exemplo, nos sistemas de produção em que o produto final é a forragem, como naqueles cujo produto é o feno ou a silagem, a planta forrageira não está sobre influência direta do animal. Assim, os efeitos do pisoteio, do pastejo e das dejeções dos animais não ocorrem e, portanto, adaptações a estes efeitos são menos relevantes quando da escolha da planta forrageia. Por outro lado, em praticamente todos os sistemas produtivos, a planta tem que ser adaptada a cortes frequentes (corte ou pastejo), ter boa capacidade produtiva e potencial de produzir uma forragem de boa qualidade. Os sistemas de produção onde animais permanecem confinados utilizam a planta forrageira para produção de volumoso, que é fornecido no cocho, seja na forma de feno, silagem ou forragem fresca e picada. Novamente, nessas condições a planta forrageira não é afetada pelo pastejo animal, mas deve ser escolhida com base no seu potencial de produção e qualidade. Os animais criados nestes sistemas são, via de regra, mais produtivos e, logo, demandam a ingestão de forragem “concentrada” em nutrientes. Isso faz necessário o uso de espécies forrageiras que, quando corretamente manejadas, produzam uma forragem de boa qualidade. Os sistemas de produção animal em pastagens são mais flexíveis quanto ao(s) objetivo(s) e às interações entre os componentes solo, planta, animal e meio. Nestes sistemas deve-se, como premissa básica, utilizar plantas adaptadas às condições de pastejo. Para esse fim, várias características da planta são desejáveis, tais como: localização do meristema apical mais próximo ao nível do solo, alta capacidade de renovação de tecido foliar, plasticidade fenotípica, etc. De acordo com alguns autores (Da Silva & Pedreira, 1997; Lupinacci, 2003), os sistemas de produção animal baseados no uso de pastagens podem ser agrupados, simplificadamente, em dois grupos básicos: (1) aqueles que objetivam elevado desempenho animal, praticados às expensas de taxas de lotação modestas, e (2) aqueles que visam a manutenção de elevadas taxas de lotação (elevada produção por área), com valores somente satisfatórios de desempenho animal. Para cada um desses sistemas produtivos, há forrageiras mais apropriadas e coerentes com os objetivos específicos. Para obtenção de elevado desempenho animal é indispensável, dentre outros, que a forragem tenha um bom valor nutritivo. Nesse sentido, dentre todas as opções de plantas forrageiras disponíveis para utilização em sistemas pastoris que explorem o mérito genético do animal, apenas algumas possuem características desejáveis. De outra forma, para que altas taxas de lotação sejam praticadas, é fundamental uma alta produção de forragem por unidade de área. Para isso, devem-se escolher plantas forrageiras com potencial de expressar sua característica genética de alta produção, desde de que as restrições do meio sejam corrigidas. É importante mencionar ainda que existem plantas forrageiras que, se bem manejadas, podem produzir forragem de boa qualidade e em quantidade satisfatória, como algumas forrageiras do gênero Panicum. Estas forrageiras podem, então, ser utilizadas tantos em sistemas que explorem o mérito genético do animal, quanto naqueles em que a expressão do mérito genético da planta forrageira é almejada. 7- PLANTA FORRAGEIRA E O ANIMAL As plantas e os animais co-evoluíram ao longo de milhares de anos, desenvolvendo estratégias de resistência (planta) e de forrageamento (animais) que lhes permitiram sucesso adaptativo (Carvalho et al., 2006). Esse princípio deve ser considerado na idealização de sistemas de produção pastoris, porque os herbívoros domésticos que criamos e as plantas forrageiras que cultivamos são produtos desse processo evolutivo. O tamanho corporal do animal é uma característica de adaptação evolutiva, resultado da especialização do animal a determinados tipos de alimentos. Animais maiores, por exemplo, são mais aptos em tolerar alimentos de pior qualidade, porque a relação requerimento:capacidade digestiva diminui com o aumento do tamanho do animal (Carvalho et al., 2006). Contrariamente, herbívoros pequenos possuem alto gasto de energia por unidade de peso corporal e, portanto, demandam uma dieta mais digestiva e “concentrada” em nutrientes (Lechner-Doll et al., 1995). Dessa forma, existe uma estreita relação entre as características do pasto e as características dos animais que teriam capacidade de utilizá-lo. Pastos de forrageiras com pior valor nutritivo seriam mais bem aproveitados por espécies animais de maior peso corporal, como bovinos e equinos. No entanto, pastos de forrageiras de elevada qualidade são mais adequados aos animais menores, como caprinos, ovinos ou, até mesmo, animais jovens de espécies maiores (por exemplo, bezerros). Além dos aspectos qualitativos, as características morfológicas das forrageiras também devem ser analisadas para sua correta adequação ao tipo de animal que será criado no sistema produtivo. Como exemplo, gramíneas de porte médio ou baixo são preferidas pelos ovinos. Estes realizam pastejo mais baixo e, por isso, espécies com estolões de maior resistência ao pastejo ou espécies cespitosas de menor porte com meristema apical próximo ao nível do solo, tais como os capins Coastcross, Tifton, Estrela, Pensacola e Quicuio, são mais recomendadas para a criação de ovinos (Evangelista et al., 2003). Os ovinos não aproveitam bem a forragem produzida quando a pastagem é formada por espécies cespitosas de porte elevado, como os capins Colonião, Elefante e Jaraguá. Isso ocorre, simplesmente, devido à incompatibilidade entre as dimensões contrastantes do animal (pequeno) e do pasto (alto). Outro aspecto interessante na escolha da forrageira para ovinos diz respeito à relação entre a forma de crescimento da planta e o manejo sanitário de helmintos. Silva Sobrinho (2001) verificou que em pastos de espécies cespitosas, normalmente eretas e que não recobrem bem a superfície do solo, há a vantagem da maior penetração dos raios solares até a superfície do solo, tornando o ambiente menos favorável às larvas e ovos de helmintos. Por outro lado, espécies estoloníferas, com crescimento prostrado, propiciam a manutenção de um microclima mais favorável ao desenvolvimento de larvas de helmintos, dificultando o manejo sanitário. Com relação aos caprinos, sua maior mobilidade dos lábios superiores permite um pastejo tão próximo ao solo quanto os ovinos (Lu, 1988). Assim,as espécies forrageiras recomendadas para ovinos, normalmente, também se adequam bem aos caprinos. Além disso, os caprinos podem pastejar em posição bipedal, o que confere a esta espécie uma maior possibilidade de aproveitamento dos estratos arbóreo e de gramíneas mais altas (Ribeiro, 2003). Os equídeos realizam a preensão da planta utilizando o lábio superior, colocando o alimento entre os dentes incisivos, os quais, por sua vez, executam o corte, auxiliado pela movimentação da cabeça (Haddad & Plalatzeck, 1986). Assim, estes animais têm maior aptidão ao corte mais baixo e intenso, comparativamente aos ovinos, e espécies forrageiras de crescimento estolonífero, em geral, são mais adequadas para os equídeos. Ademais, os equídeos corriqueiramente empreendem corridas no pasto e, para respeitar este comportamento animal, é recomendado evitar o uso de forrageiras com crescimento cespitoso, que constituiriam obstáculo à movimentação destes animais. Com base nos exemplos citados anteriormente, torna-se necessário conciliar características da planta forrageira às características dos animais que irão utilizá-la. Normalmente, o tamanho e a anatomia dos órgãos de apreensão de alimento são características importantes nos animais. Nas plantas forrageiras, atenção deve ser devotada, principalmente, ao seu valor nutritivo, à sua forma de crescimento e ao seu porte. 8 - PLANTA FORRAGEIRA E MANEJO DO PASTEJO Uma das causas de insucesso na utilização dos recursos forrageiros consiste na ausência de informação e conhecimento sobre o manejo do pastejo mais adequado para cada forrageira. Analogamente a qualquer produto que é lançado no mercado, que tem seu manual de instrução e utilização, toda nova forrageira recém liberada para comercialização deveria vir acompanhada de diretrizes eficientes para nortear o seu manejo, seja sob lotação contínua ou lotação intermitente, os dois principais métodos de pastejo empregados no Brasil. Na falta de informações mais detalhadas e específicas sobre o manejo do pastejo para cada forrageira com potencial de utilização nos sistemas de produção, podemos lançar mão de outras características para, com base nelas, inferir sobre as formas mais adequadas de manejo. Dentre essas características, a sua morfologia, caracterizada pela forma de crescimento ou altura da planta, por exemplo, pode ser analisada para esse fim. O pastejo ou corte das forrageiras, como forma de manejo conservativo, varia com a morfologia, altura, forma de propagação e rebrotação das espécies (Blaser, 1994). A recuperação das plantas após a desfolhação pode ser influenciada pelas suas características morfológicas, como o número de pontos de crescimento pelos quais a rebrotação pode ocorrer. A preservação dos pontos de crescimento permite uma rápida formação de folhas, de forma que taxas de crescimento elevadas são atingidas num menor período após pastejo. Cada espécie e, ou cultivar de forrageira possui características morfológicas próprias, que podem ser modificadas pelo clima e manejo, até certo limite, resultado da sua plasticidade fenotípica. Esta plasticidade fenotípica pode ser definida como a mudança gradual e reversível nas características morfogênicas e estruturais da planta forrageira em razão de alterações no ambiente (Da Silva & Nascimento Júnior, 2006). Por exemplo, é sabido que gramíneas sob condições de pastejo intenso, normalmente, possuem menor altura, maior taxa de aparecimento de folhas, sendo estas de menor comprimento, e elevada capacidade de originar novos perfilhos. Contrariamente, numa situação de pastejo mais leniente, constata-se uma redução do número de perfilhos no pasto, além da ocorrência de plantas maiores, com o aparecimento de longas folhas de forma menos freqüente. Além disso, essas características morfológicas muitas vezes são um dos determinantes do tipo de manejo a ser adotado. Como exemplo, ressalta-se gramíneas de crescimento cespitoso, de porte alto, que elevam precocemente o meristema apical e, por isso, são mais indicadas para método de pastejo em lotação intermitente (Rodrigues & Reis, 1997). Ao contrário, gramíneas estoloníferas são recomendadas para o método de pastejo em lotação contínua, pelo fato de formarem um baixo e denso relvado, permitindo maior tolerância ao pastejo e pisoteio mais freqüente. Entretanto, salienta-se que gramíneas estoloníferas também podem ser utilizadas sob pastejo em lotação intermitente. Normalmente, forrageiras de porte mais alto são mais exigentes em manejo do pastejo, ou seja, são menos flexíveis quanto à forma de utilização e mais propensas aos erros durante sua utilização sob pastejo. Em geral, forrageiras com essas características são de maior potencial produtivo e perdem mais rapidamente o seu valor nutritivo com o tempo de crescimento (Figura 4). Como exemplo, tem-se o capim-elefante, espécie mais propensa aos erros de manejo, razão pela qual seu uso é restrito, geralmente, à formação de capineiras e sua utilização sob pastejo gerou muitos insucessos. Outro exemplo é o capim-tobiatã, uma cultivar de Panicum maximum de porte alto, com intensa diferenciação morfológica durante seu crescimento e, por conseguinte, muito exigente em manejo. As forrageiras de porte mais baixo permitem maior flexibilidade de manejo do pastejo, sendo mais tolerantes a erros na sua utilização e, portanto, de uso mais fácil e generalizado. Normalmente, estas forrageiras também possuem menor potencial produtivo e perdem mais lentamente o seu valor nutritivo durante o período de crescimento quando comparadas àquelas forrageiras de porte mais alto (Figura 4). Como exemplo, pode-se citar a B. decumbens, uma espécie presente em grandes áreas de pastagens no Brasil e manejada sob distintas formas, como em lotação contínua, intermitente, no diferimento de pastagem, etc, demonstrando a sua flexibilidade e facilidade de manejo do pastejo. Figura 4 - Representação esquemática das relações entre aspectos produtivos, qualitativos e de manejo do pastejo e a altura da planta forrageira. Atualmente, estudos de estratégias de manejo do pastejo para gramíneas utilizadas no Brasil, tem sido intensificado, razão do reconhecimento de que a etapa de utilização da forragem produzida é a que possui maior potencial para alterar a eficiência do sistema de exploração em pastagem e, portanto, constitui o ponto de partida para qualquer intervenção no sistema produtivo (Da Silva & Corsi, 2003). Nesses estudos, têm-se contemplado aspectos relacionados à morfologia, fisiologia e ecologia da planta forrageira para que, com base nestes, possa se fazer recomendações de manejo mais racionais e eficientes. Em lotação intermitente, por exemplo, têm-se recomendado a entrada e a saída dos animais dos piquetes com base na altura do pasto. A altura do pasto preconizada na condição de pré-pastejo é aquela em que o dossel intercepta 95% da luz incidente (Da Silva, 2004). Nessa condição, em pastagens bem estabelecidas e com adequada cobertura do solo, tem se mostrado, de forma consistente para todas as gramíneas forrageiras tropicais estudadas, ser possível colher mais forragem de melhor composição morfológica e valor nutritivo, com menos perdas durante o pastejo (Carnevalli, 2003; Barbosa, 2004; Pedreira, 2006; Voltolini, 2006; Souza Júnior, 2007). Com base nesses resultados, tem sido possível relacionar a altura do pasto de algumas gramíneas tropicais com o momento em que o mesmo intercepta 95 % da luz incidente (Tabela 2). Contudo, ainda há poucas informações e estudos sobre estes referenciais de manejo do pastejo para o grande número de gramíneas tropicais manejados em lotação intermitente. Nesse sentido, uma forma de obter referenciais de manejo do pastejo mais coerentes para gramíneas que não foram devidamente avaliadaspela ciência seria basear na comparação morfológica destas gramíneas com aquelas que já foram estudadas. Nesta comparação, aspectos relacionados à altura da planta e à arquitetura foliar (tamanho, número, forma e ângulo foliar) seriam relevantes. Tabela 2 – Altura do pasto na condição de pré-pastejo associada à interceptação luminosa de 95% pelo dossel de gramíneas forrageiras tropicais Gramínea Altura do pasto (cm) Fonte Capim-mombaça 90 Carnevalli (2003) Capim-tanzânia 70 Barbosa (2004) Capim-marandu 25 Zeferino (2006) Capim-xaraés 30 Pedreira (2006) Capim-cameroon 100 Voltolini (2006) Como cada forrageira possui características morfológicas específicas, as estratégias de manejo devem variar em função da espécie em questão. A comparação entre a morfologia do colmo entre gramíneas, por si só, permite inferências sobre o objetivo com o manejo do pastejo das espécies. Gramíneas de colmo mais desenvolvido e lignificado, como o capim-elefante e algumas cultivares de P. maximum, são mais adequadamente manejadas sob lotação intermitente, pelo fato deste método de pastejo permitir um maior rigor no controle da intensidade e freqüência do pastejo, quanto comparado ao método de pastejo em lotação contínua. O controle do desenvolvimento do colmo é importante, pois este componente morfológico tem influencia negativa no comportamento ingestivo e consumo animal e também possui pior valor nutritivo do que as folhas. Já em gramíneas de colmos mais tenros, como as cultivares de Cynodon, o objetivo com o manejo do pastejo pode ser outro em função do efeito menos acentuado do colmo destas forrageiras sobre o consumo e desempenho animal. O conhecimento das características morfológicas das forrageiras é de suma importância para o desenvolvimento de estratégias de manejo do pastejo mais eficientes. A morfologia da planta, unicamente, consiste em indicativo da forma como a mesma deve ser utilizada sob pastejo. Portanto, as associações entre algumas características morfológicas da planta forrageira, especialmente a sua altura, e os seus aspectos produtivos, qualitativos e de manejo são importantes para auxiliar na definição de referenciais de manejo do pastejo mais adequados, principalmente quando estes referenciais, até então, não foram gerados de forma objetiva pela pesquisa. Assim, para que a exploração da pecuária seja produtiva, rentável e sustentável, o tipo de forrageira deve ser adequado, dentre outros fatores, ao(s) objetivo(s) que se pretende com o sistema de produção, às características dos animais que a utilizarão e às estratégias de manejo do pastejo adotadas. Essa adequação apenas será possível pelo conhecimento detalhado das características das forrageiras com potencial de utilização em nossas condições. Com relação à busca e, ou procura da chamada “forrageira milagrosa”, duas considerações são possíveis. Primeiramente, pode-se assumir que a “forrageira milagrosa” não existe e nem existirá, porque parece ser incompatível, biologicamente, a reunião de todas as características desejáveis em uma única espécie e, ou cultivar de planta. Essa tem sido a opinião mais difundida e aceita pelos técnicos e pesquisadores que trabalham na área de forragicultura e pastagens. Por outro lado, uma proposição diferente pode ser assumida: existem diversas “forrageiras milagrosas”, cada qual apropriada aos distintos ambientes de produção. A forrageira mais adequada às condições e aos objetivos do sistema de produção consiste na “forrageira milagrosa”. Nessa perspectiva, provavelmente, as “forrageiras milagrosas” já existem e estão à disposição dos pecuaristas, porém a falta de conhecimento sobre as diversas características inerentes a cada forrageira impede a sua escolha e o seu uso. Por isto, neste capítulo, procurou-se enfatizar a importância do conhecimento das características das plantas forrageiras, as quais serão descritas detalhadamente para um grande número de espécies e, ou cultivares de forrageiras nos demais capítulos. Na verdade, a busca por estes conhecimentos deveria consistir numa das primeiras ações de manejo da pastagem a ser praticada pelo manejador a fim de garantir sua produtividade e sustentabilidade. 9 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, R.A . Características morfofisiológicas e acúmulo de forragem em capim-Tanzânia (Panicum maximum Jacq. Cv. Tanzânia) submetidos a freqüências e intensidades de pastejo. Viçosa: Universidade Federal de Viçosa, 2003. 122p. Tese (Doutorado em Zootecnia) – Universidade Federal de Viçosa, 2004. BARCELOS, A.O.; VILELA, L.; LUPINACCI, A.V. Produção animal a pasto: desafios e oportunidades. In: ENCONTRO NACIONAL DO BOI VERDE: A PECUÁRIA SUSTENTÁVEL, 3., 2001, Uberlândia, MG. Anais... 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Dissertação (Mestrado em Ciência Animal e Pastagens) – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”/ Universidade de São Paulo, 2006. CAPÍTULO 2 Gênero Brachiaria Cacilda Borges do Valle Manuel Cláudio Motta Macedo Valéria Pacheco Batista Euclides Liana Jank Rosangela Maria Simeão Resende 1 - INTRODUÇÃO - HISTÓRICO O gênero Brachiaria foi primeiramente descrito por Trinius (1834) como uma subdivisão de Panicum e depois elevado a gênero por Grisebach (1853). A taxonomia do gênero é até hoje controversa devido a ampla e contínua variação em características diferenciadoras utilizadas para delimitar espécies do gênero e mesmo entre gêneros afins como Urochloa, Eriochloa e Panicum. Brachiaria inclui cerca de 100 espécies, de origem principalmente tropical e subtropical africana. Sete dessas espécies - B. arrecta, B. brizantha, B. decumbens, B. dictyoneura, B. humidicola, B. mutica e B. ruziziensis - são muito utilizadas como plantas forrageiras na América Tropical (Keller-Grein et al., 1996). Umas poucas espécies africanas como, B. plantaginea e provavelmente B. mutica, foram introduzidas durante o período colonial, como cama para os escravos em navios negreiros (Parsons, 1972; Sendulsky, 1978). A B. decumbens foi introduzida oficialmente no Brasil em 1952, no Instituto de Pesquisa Agropecuária do Norte (IPEAN), em Belém (Serrão e Simão Neto, 1971) com o nome de B. brizantha. A partir de 1965, ocorreram novas introduções dessa B. decumbens, que ficou conhecida como cv. IPEAN, juntamente com as primeiras introduções de B. brizantha e B. ruziziensis. Houve distribuição e multiplicação desta forrageira por estolões para outros estados brasileiros, uma vez que a produção de sementes na região Norte era reduzida (Pizarro et al., 1996). Um outro ecotipo de B. decumbens, originário de Uganda, mas levado para a Austrália em 1930 e lá registrado como cv. Basilisk (Mackay, 1982), foi introduzido pelo Instituto de Pesquisas Internacionais (IRI) em Matão, São Paulo no início da década de 1960. Entre 1968 e 1972 houve intensa importação de sementes da Austrália dessa cultivar, estimulada por programas governamentais de incentivo a formação de pastagens. Estabeleceu-se assim um extenso monocultivo nos cerrados brasileiros. A boa adaptação aos solos ácidos e pobres, fácil multiplicação por sementes, associada à grande vantagem competitiva com invasoras e bom desempenho animal comparada às pastagens nativas, explicam a rápida expansão desta braquiária nos trópicos. Com o monocultivo de milhões de hectares de B. decumbens, uma cultivar rústica e apomítica (o embrião é clonal, i.e., uma cópia exata da planta-mãe), começaram a aparecer problemas como a cigarrinha-das-pastagens, que dizimou essas pastagens na Amazônia; a fotossensibilização, especialmente em bezerros desmamados em pasto de capim-braquiária; e extensas áreas de pastagens degradadas, associadas ao manejo indevido (superpastejo, não realização de adubações de manutenção ou subsolagem). Neste contexto, a liberação da B. brizantha cv. Marandu em 1984 (Nunes et al., 1984), resistente às cigarrinhas, promoveu gradual substituição das áreas de B. decumbens, e por sua vez constituiu novo monocultivo a partir de meados da década de 1980 e que perdura até hoje. Segundo um estudo realizado pela Scot Consultoria relatado pelo Jornal dos Criadores (Anônimo, 2004), em 2003 havia 174 milhões de hectares de pastagens cultivadas no Brasil, dos quais cerca de 100 milhões em áreas de cerrados. As poucas cultivares comerciais disponíveis de braquiária respondem por 85% das sementes de forrageiras comercializadas anualmente no Brasil Central (Macedo, 2006) e por isso geram grande vulnerabilidade nos mais de 50 milhões de hectares cultivados com essas variedades. A capacidade de suporte das pastagens nos Cerrados foi praticamente triplicada com a introdução da braquiária: se as pastagens nativas eram utilizadas na base de 3 a 4 hectares por cabeça, e pastagens de capins Gordura ou Jaraguá nos cerrados com 0,3 a 0,6 cabeças por hectare, as braquiárias suportam em média 1 a 1,5 cabeça por hectare durante o ano. Fala-se mesmo que a braquiária foi um "divisor de águas" no Brasil central pecuário: pecuária antes e após sua utilização. O pequeno número de cultivares disponíveis e a baixa diversidade genética dessas cultivares em uso representam um grande risco a esse patrimônio. Daí a grande demanda e urgência em desenvolver e selecionar novos genótipos visando a diversificação das áreas de pastagens nos trópicos. Fontes de informações específicas e importantes sobre o gênero Brachiaria estão publicadas nos Anais do 11o Simpósio sobre Manejo da Pastagem (Peixoto et al., (eds.), 1994); no livro: "Brachiaria: Biology, Agronomy, and Improvement" (Miles et al., 1996); no capítulo sobre Brachiaria em “Recursos Genéticos & Melhoramento - Plantas (Pereira et al., 2001); no capítulo “Brachiariagrasses” em “Warm-Season (C4) Grasses” (Miles et al., 2004), e no capítulo“Breeding of apomictic grasses” (Valle e Miles, 2001), em “The flowering of apomixis: from mechanisms to genetic engineering” (CIMMYT; IRD; Commission European (Org.)). Informações sobre forrageiras tropicais com fotos e características agronômicas podem ser consultadas on line em www.tropicalforages.info. Informações mais antigas foram publicadas nos “Encontro para discussão sobre capins do gênero Brachiaria” (Encontro ..., 1986 e 1991). Para facilidade de abordagem, os itens origem e caracterização botânica serão apresentados a seguir para o conjunto de espécies do gênero seguidos de descrições e ilustrações específicas de cada cultivar. 2 - ORIGEM, DISTRIBUIÇÃO E ADAPTAÇÃO Espécies do gênero Brachiaria ocorrem nas regiões tropicais e subtropicais de ambos os hemisférios. Já o centro de origem das principais espécies de valor agronômico concentra-se na África Oriental (Figura 1). A adaptação dessas espécies é ampla, abrangendo várzeas inundáveis, margens de florestas pouco densas e até regiões semi-desérticas, mas a ocorrência mais comum é em vegetação de savana. Keller-Grein et al., (1996) compilaram a distribuição geográfica, climática e edáfica apresentadas no Quadro 1. Segundo Bogdan (1977), há espécies reconhecidamente adaptadas a solos de baixa fertilidade e mal drenados. Dentre as espécies de maior utilização como forrageiras, a B. brizantha é sem dúvida mais amplamente distribuída, ocorrendo em campos limpos ou com arbustos, e margem de matas. Segundo Boonman (1993), espécies de Brachiaria são componentes comuns e de grande valor na vegetação natural do Leste Africano. Porém, pastagens cultivadas são, essencialmente, inexistentes nos sistemas de produção animal da África. Fora do continente africano, no entanto, B. brizantha é a forrageira tropical de maior utilização para produção animal em termos de área cultivada (Miles e Valle, 1996), totalizando, só nos cerrados brasileiros, cerca de quarenta milhões de hectares (Jank et al., 2005). Figura 1 – Mapa da África mostrando região de origem das espécies de Brachiaria de maior importância agronômica (Linha vermelha). No mapa, cor laranja = desertos; verde escuro = floresta tropical; verdes claros = savanas de gramíneas e arbustos (Fonte: http://fathom.lib.uchicago.edu/1/777777122619/3604_africaveg.html ). Há espécimes em herbário e, ou, acessos nas coleções provenientes da Etiópia, Quênia, Uganda, Ruanda, Burundi, Tanzânia, Zâmbia, Zimbábue, Malawi, Swazilândia e Norte da África do Sul. Aparece ainda nos países do Golfo da Guiné, como Nigéria - onde foi amplamente coletada - e em Camarões (mapa 1 em Keller- Grein et al., 1996). Segundo este autor, citando S. A. Renvoize, especialista em Brachiaria do “Royal Botanical Garden” em Kew, na Inglaterra, há locais de origem desta espécie que nunca foram coletados na África Ocidental, e no sul da África Tropical, especialmente Zaire e Zâmbia. A excelente base de dados “Tropical Forages” (2005) (www.tropicalforages.info) cita B. brizantha como nativa de Botswana, Camarões, Costa do Marfim, Etiópia, Ghana, Guiné, Quênia, Malawi, Moçambique, Namibia, Nigéria, Serra Leoa, África do Sul, Tanzânia, Uganda, Zaire, Zâmbia, Zimbábue e todo o Sub-Saara Africano de 25ºS até 12ºN, e de 100 a 2.300 metros sobre o nível do mar. Depois de sua introdução em outros países tornou-se naturalizada em todo o trópico úmido e sub-úmido. Quadro 1 – Características geográficas, climáticas e edáficas de sítios de coleta de cinco espécies mais importantes de Brachiaria Espécie Latitude Altitude (m) Precipitação anual (mm) Meses sem chuva (nº) pH do solo B. brizantha 25º05´S-12°36N 80-2310 590-2770 0-7 4,0-8,0 B. decumbens 4°21´S-1°09´N 840-2290 870-1900 0-5 4,9-7,0 B. dictyoneura 25°23´S-5°58´N 200-2000 680-1320 2-8 5,5-7,0 B. humidicola 20°17´S-11°21´N 560-2375 600-2800 2-7 4,0-7,0 B. ruziziensis 4°05´S-2°54´S 590-1940 890-1710 3-4 5,0-6,8 Fonte: Adaptado de Keller-Grein et al., (1996). A segunda espécie em abrangência de distribuição é B. humidicola, encontrada na Etiópia, Quênia, Uganda, Ruanda, Burundi, Tanzânia, Zâmbia, Zimbábue, Malawi, e Swazilândia, mas pouco coletada na Nigéria, Sudão e África do Sul onde é comum (mapa 4 em Keller-Grein et al., 1996). Ocorre normalmente nos locais mais úmidos ou de drenagem deficiente, ou com inundação sazonal. Segundo “Tropical Forages” (2005), B. humidicola é nativa desde o Sul do Sudão e Etiópia até o Norte da África do Sul e Namíbia. Hoje cultivada nos países de clima tropical úmido da América Latina, ilhas do Pacífico e Sudeste Asiático, bem como nas regiões costeiras do Norte da Austrália. B. decumbens e B. ruziziensis apresentam distribuição muito mais restrita que as primeiras, tendo sido coletadas no Oeste do Quênia, Ruanda e Burundi. Faltam exemplares de Uganda, local de origem da cv. Basilisk, além da Tanzânia e Zaire nas coleções mundiais de braquiária. Estas espécies ocorrem em campos e margens de matas caducifólias. B. ruziziensis é mais exigente em fertilidade e ocorre em áreas de campos e áreas antropisadas. B. decumbens foi coletada em pradarias do planalto de “Great Lakes” em Uganda. Foi introduzida na Austrália em 1930 e selecionada pela alta produtividade em testes em “South Johnstone” entre 1956 e 1966. Segundo o banco de dados “Tropical Forages” (2005) (www.tropicalforages.info) é nativa da África Central e Oriental entre 500 e 2.300 m de altitude. Hoje é cultivada por toda a América Tropical, Sudeste Asiático e Pacífico. A cultivar Basilisk continua sendo a gramínea mais utilizada na América do Sul. A B. dictyoneura também está restrita a países do extremo Leste, como Tanzânia e Quênia, porém faltam exemplares do Sudão, Uganda, Tanzânia, Zâmbia e Moçambique nas coleções mundiais de braquiária. Esta espécie está pouco representada nas coleções de germoplasma e mereceria maior atenção dos programas de seleção e melhoramento pelo potencial forrageiro que exibe. Outras duas forrageiras de uso mais restrito e específico, B. mutica e B. arrecta são originárias do Oeste Africano e são forrageiras de grande aceitabilidade pelos animais e extremamente bem adaptadas a solos alagados e férteis, características essas de grande interesse aos programas de melhoramento de forrageiras. Por não haver diversidade genética disponível não possuem cultivares desenvolvidas e a baixa produção de sementes limita sua ampla utilização. Estas duas espécies não serão discutidas neste capítulo devido à menor importância frente às demais. 3 - CLASSIFICAÇÃO BOTÂNICA Brachiaria, pertence a um grupo de gêneros com limites ainda indefinidos incluindo Urochloa, Eriochloa e Panicum. As principais características que identificam o gênero, dentro da tribo Paniceae, são as espiguetas ovais a oblongas, arranjadas em racemos unilaterais, com a gluma inferior adjacente à ráquis, i.e., em posição adaxial (Royal Botanical Gardens, não publicado, citado por Renvoize et al. (1996) (Figura 2). Gramíneas do gênero Brachiaria realizam fotossíntese do tipo C4 pelo ciclo PEP-CK (Fosfoenolpiruvato carboxilase), característica esta particular a um pequeno grupo de gêneros, que incluem Urochola e Panicum (Clayton e Renvoize, 1986). Renvoize et al. (1996) realizaram uma revisão taxonômica envolvendo 97 espécies distribuídas por todo o táxon e identificaram nove grupos, considerando a associação de características morfológicas mais significativas. Estes autores descreveram cada um dos grupos e as espécies que os compõe, subdivididas por continente de origem. As espécies de maior importância agronômica para o Brasil estão em dois grupos, sendo o primeiro constituído por B. decumbens, B. brizantha e B. ruziziensis, espécies próximas e passíveis de cruzamento. AB. humidicola situou- se em outro grupo que inclui B. dictyoneura e B. jubata, com características morfológicas semelhantes. Estes autores discutiram ainda, os argumentos apresentados por Webster (1987) e Morrone e Zuloaga (1992) para reclassificar Brachiaria como Urochloa. Figura 2 - Inflorescências das principais espécies forrageiras de Brachiaria: A) B. brizantha com espiguetas unisseriadas; B) B. decumbens com espiguetas bisseriadas; C) B. humidicola com espiguetas alternas; D) B. ruziziensis com espiguetas bisseriadas e densamente pilosas; E) rácemos de B. humidicola cv. Tupi (esquerda) com pêlos longos e claros e comum (direita) glabra; F) B. dictyoneura típica, com espiguetas bisseriadas em rácemos curto e numerosos. A B C D E F Estes gêneros sempre foram diferenciados pela posição reversa (adaxial) da espigueta em Brachiaria, porém quando estas são pediceladas ou bisseriadas como em algumas espécies de Urochloa, não é tão fácil reconhecer este posicionamento. Assim, Webster (1987) considerou a espécie-tipo, B. eruciformis, e usou a desarticulação do flósculo superior acima das glumas, separando-o do restante da espigueta, como o argumento para colocar todas as outras espécies de Brachiaria que desarticulam abaixo da gluma inferior como Urochloa. Além disso considerou a presença de mucro (protuberância) na espigueta superior, que ocorre na espécie tipo de Urochloa e em algumas poucas espécies de menor relevância de Brachiaria, como argumento para reunir estes gêneros. Morrone e Zuloaga (1992) seguiram a orientação de Webster, e passaram todas as espécies sul-americanas de Brachiaria a Urochloa, mesmo quando as espécies de maior expressão não exibem o mucro. Recentemente, Torres-Gonzalez e Morton (2005) realizaram um estudo filogenético com base em polimorfismo de seqüências básicas de nucleotídeos na região espaçadora interna transcrita de RNA nuclear ribossomal mas não lograram separar Brachiaria de Urochloa. A análise cladística sugeriu que esses dois gêneros formam um complexo parafilético com Eriochloa e Melinis e concluíram que espécies de todos esses gêneros pertencem aos mesmos grupos monofiléticos. Morrone e Zuloaga (1992) consideraram a importância comercial de P. maximum e a necessidade de mais evidências, para não reclassificá-lo, mas não usaram o mesmo argumento para Brachiaria – de volume e área de pastagem bem mais expressiva e transferiram a maioria das espécies para Urochloa. Em resumo, todos esses relatos sugerem a necessidade de novos estudos sistemáticos a fim de elucidar a relação e os limites entre estes gêneros, já que a taxonomia atual não oferece uma solução satisfatória para o problema de identidade genérica e das espécies componentes. Veldkamp (1996), S. Renvoize (comunicação pessoal, 2006) e J. F. M. Valls (comunicação pessoal, 2006) sugerem que o uso corrente do nome genérico Brachiaria seja conservado, pois as evidências até aqui apresentadas para transferir algumas espécies de Brachiaria para outros gêneros não são conclusivas. No interesse da comunidade diretamente envolvida com forrageiras e pelas implicações sobre toda uma legislação de sementes a ser afetada por tais mudanças, há consenso em aguardar mais dados, quem sabe até com auxílio da biotecnologia e citogenética, antes de precipitadamente transferir espécies ou criar novos gêneros. 4 - CULTIVARES DE Brachiaria 4.1- B. brizantha cv. Marandu 4.1.1 - Origem O capim-marandu (IRI 822; BRA000591 (registro no SCPA- Sistema Cooperativo de Pesquisa Agropecuária); CIAT 6294; CPI 81408; ILCA 16550) também conhecido como braquiarão ou brizantão descende diretamente de acesso introduzido em 1967 na região de Ibirarema no estado de São Paulo, proveniente da Estação Experimental de Pastagens em Marandellas, hoje Marondera, da antiga Rodésia, hoje Zimbábue (Nunes et al., 1984). Em 1976 esse acesso passou a integrar a coleção de forrageiras do Instituto de Pesquisas IRI em Matão, SP que em 1978 o repassou ao Centro de Pesquisas Agropecuárias dos Cerrado – Embrapa Cerrados – em Planaltina, DF e ao Centro Nacional de Pesquisas de Gado de Corte – Embrapa Gado de Corte, em Campo Grande, MS. Nestes centros recebeu respectivamente os registros CPAC 3099 e G-127/78. Nesta mesma época foi enviada ainda ao Centro de Pesquisas do Tropico Úmido – Embrapa Amazônia Oriental (CPATU 20) e ao Centro Internacional de Agricultura Tropical sob o código BRA000591. Esse acesso foi novamente introduzido em coleções sob números distintos (CPAC 3132 e CNPGC 142/80) e no CIAT sob três registros: CIAT 6294 = IRI 822, CIAT 6297 = G 127/78 e 6378 = CPATU 78071 (J. F. M.Valls – documento preparado para o lançamento da cv. Marandu, 1983). A cultivar foi lançada no Brasil em 1984, pela Embrapa Gado de Corte e Embrapa Cerrados, e segundo Macedo (2006) responde por cerca de 80% das pastagens em alguns estados da região norte como Acre, Rondônia e Pará, e por cerca de 50% das pastagens cultivadas no Brasil. 4.1.2 - Caracterização morfológica Planta cespitosa, muito robusta, de 1,5 a 2,5 m de altura, com colmos iniciais prostrados, mas produzindo perfilhos que surgem cada vez mais eretos ao longo do crescimento da touceira (Figura 3). Rizomas muito curtos e encurvados, cobertos por catáfilos. Colmos floríferos eretos, freqüentemente com perfilhamento nos nós superiores. Nós salientes, de cor verde-amarelada, glabrescentes. Bainhas pilosas, densamente pilosas na base e com cílios nas margens, geralmente mais longas que os entrenós, escondendo os nós. Lígulas inicialmente membranosas e ciliadas da metade para cima. Lâminas linear-lanceoladas, com ápice agudo, arredondadas e carenadas na base, até 2 cm de largura e 50 cm de comprimento, esparsamente pubescentes na face ventral e glabras na face dorsal, com margens levemente engrossadas e pouco ásperas, numerosas nervuras finas bem definidas e nervura central muito evidente. Inflorescência com até 40 cm de comprimento, com 4 a 6 ramos, mas de apenas 1 ou 2 ramos nas inflorescências surgidas de perfilhos emergentes dos nós superiores dos colmos floríferos. Eixo da inflorescência pubescente, com pêlos mais longos abaixo dos pontos de inserção dos ramos. Ao longo do eixo os ramos são eqüidistantes, sésseis, secundifloros, retos e firmes, passando a encurvados por ocasião da maturação e queda das espiguetas, de 7 a 10 cm de comprimento, e até 20 cm em plantas muito vigorosas. Raque dos ramos estreita, em torno de 1 mm de largura, côncava, verde, passando a estramínea (amarelada) na maturidade, papiloso-ciliada nas margens. Espiguetas oblongas a elíptico-oblongas, obtusas ou sub agudas, túrgidas, com 5 a 5,5 mm de comprimento por 2 a 2,5 mm de largura, esparsamente pilosas no ápice. Primeira gluma envolvendo a base da espigueta e alcançando quase a metade do seu comprimento. 13-nervada, glabra, em geral com as extremidades das nervuras anastomosadas. Segunda gluma um pouco mais curta que o lema estéril, esparsamente pilosa no terço apical, 7-nervada, arroxeada, junto ao ápice. Flósculo basal com flor masculina, com três anteras alaranjadas bem desenvolvidas. Flósculo apical com flor hermafrodita, elíptico-oblongo, verde pálido passando a estramíneo. Anteras alaranjadas e estigmas roxos. Cariopse elíptico-oblonga, comprimida dorsiventralmente, com embrião ocupando dois terços de seu comprimento. O florescimento é intenso e concentrado no final do verão (fevereiro-março). Características diferenciadoras: plantas robustas com tendência ao intenso perfilhamento nos nós superiores dos colmos floríferos; presença de pêlos na porção apical dos entrenós, bainhas pilosas e lâminas largas e longas com pubescência apenas na face ventral, glabras na face dorsal e com margens não cortantes; raque sem pigmentaçãoarroxeadas e espiguetas ciliadas no ápice. (Valls, J. F. M. e Sendulski, T. – documento para lançamento, 1983). Figura 3 - B. brizantha cv. Marandu em franco florescimento; detalhe das espiguetas e cariopses com glumas e deglumadas. 4.2 - B. brizantha cv. La Libertad 4.2.1 - Origem A cultivar La Libertad (CIAT 26646, MG-4) é derivada de um ecótipo de origem desconhecida da África Tropical e foi introduzido na Colômbia em 1955 procedente de Trinidad pelo então Instituto Colombiano Agropecuário (ICA) hoje CORPOICA (Cuesta Muñoz e Pérez Bonna, 1987). Já em 1966 este acesso foi selecionado por sua adaptação e boa produtividade em dois centros experimentais (ICA Palmira e ICA La Libertad). Nesta mesma época B. brizantha e B. decumbens se destacaram pela adaptação, precocidade, cobertura do solo, produção de forragem e resistência à seca em ensaios conduzidos na Estação Experimental Llano Grande e partir de 1970 foram intensificadas as avaliações em diferentes localidades dos Piedmontes Llanero e Amazônico, visando o lançamento da cv. La Libertad, que ocorreu em 1987 na Colômbia. Não houve grande expansão na época devido à falta de promoção e pela baixa produção de sementes. O capim-la libertad ganhou maior espaço quando começou a ser multiplicado no Brasil e liberada com o nome de “MG-4”, conquistando um sucesso moderado na última década. 4.2.2 - Caracterização morfológica Gramínea cespitosa de touceira vigorosa, com altura entre 0,8 e 1,5 m, com rizomas horizontais curtos, duros e curvos, cobertos por escamas glabras, de cor amarelada ou roxa (Figura 4). Os colmos são vigorosos, eretos ou semi-eretos, com escassa ramificação e de cor verde intenso. Os nós são proeminentes, glabros, de cor verde ou amarelo claro, e pouco radicantes. A bainha das folhas são glabras, mais curtas que os entrenós, de cor verde intenso e arroxeadas na base. A lígula apresenta um bordo ciliado de cor branca, e de aproximadamente 2 mm de altura. As folhas são linear-lanceoladas, arredondadas na base e em forma de quilha na extremidade superior, de 16 a 40 cm de comprimento e 10 a 20 mm de largura, cor verde intensa a clara, glabras com margens denteadas, mais áspera de um lado do que do outro. As nervuras são numerosas e finas, e a nervura central é de cor clara. Os entrenós são planos, de cor verde intenso e roxos no ápice. A inflorescência é uma panícula racemosa de 10 a 20 cm de comprimento, com 2 a 8 racemos unilaterais, retos, em forma de racemo. Os ramos laterais são de 3 a 10 cm de comprimento. A raque é estriada, de cor roxa e verde, com cílios laterais de 2 a 4 mm de comprimento. Espiguetas oblongas a elíptico-oblongas com aproximadamente 6 mm de comprimento e 2 a 2,5 mm de largura, de cor roxa no ápice e pilosidade branca no ápice (Cuesta Muñuz e Pérez Bonna, 1987). O florescimento ocorre no verão (fevereiro a março). Algumas características dessa cultivar a diferenciam da cv. Marandu, como ausência de pelos na porção apical dos entrenós, as bainhas glabras com margens denticuladas e a raque estriada de cor arroxeada e verde. Figura 4 - B. brizantha cv. La libertad. Detalhe mostra espiguetas e cariopses com glumas e deglumadas. 4.3 - B. brizantha cv. Xaraés 4.3.1 - Origem O capim-xaraés (CIAT 26110, BRA004308) deriva de acesso coletado na região de Cibitoke, no Burundi, África, entre 1984 e 1985. O acesso original foi importado pelo CIAT na Colômbia, entre 1985 e 1986 junto com uma grande coleção de ecótipos, na forma de plântulas por cultivo de meristemas, com vistas a evitar a entrada de patógenos africanos. No Brasil, o acesso foi recebido novamente como plântulas em tubos de ensaio, juntamente com uma grande coleção de genótipos, conforme acordo firmado entre Embrapa e CIAT. A quarentena foi realizada na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (CENARGEN) onde recebeu o código BRA 004308 e códigos de campo B178 (Embrapa Gado de Corte) e CPAC 3555 (Embrapa Cerrados). Introduzido pela Embrapa em 1986, chegou a Embrapa Gado de Corte em 1987, e foi avaliado pelos pesquisadores de forragicultura e pastagem em Campo Grande e da Embrapa Cerrados por mais de 10 anos. Foi registrado no Serviço Nacional de Proteção de Cultivares do Ministério de Agricultura Pecuária e Abastecimento (http://www.agricultura.gov.br/snpc) e lançado comercialmente em 2003 sob o nome de origem tupi-guarani cv. Xaraés em homenagem ao conjunto formado por ecossistemas pantaneiros do Mato Grosso do Sul e Mato Grosso e os povos que o habitavam (Valle et al., 2004a). No Brasil, há dois outros registros de cultivares semelhantes, feitos for firmas particulares, sob nomes de “MG-5 Vitória” e cv. Toledo, mas a Embrapa garante a identidade e origem e mantém sementes genéticas apenas da cv. Xaraés. 4.3.2 - Caracterização morfológica O capim-xaraés é uma planta cespitosa podendo enraizar nos nós basais; altura média de 1,5 m; colmos verdes de 6 mm de diâmetro, pouco ramificados; brácteas arroxeadas na brotação basal. Bainhas com pêlos claros, rijos, ralos, densos apenas nas bordas; lâmina com até 64 cm de comprimento e 3 cm de largura, com pilosidade curta na face superior, bordos hialinos ou arroxeados, ásperos (cortantes). Inflorescência racemosa, com 40 a 50 cm de comprimento e eixo de 14 cm de comprimento, com 7 ramos (racemos) quase horizontais, com pêlos junto às ramificações; ramo basal de 12 cm de comprimento. Espiguetas unisseriadas em número médio de 44, com pêlos longos, claros, translúcidos na parte apical, arroxeadas no ápice (Figura 5). O florescimento é tardio, ocorrendo em meados do outono (maio). Figura 5 - B. brizantha cv. Xaraés: inflorescências, área de pastagem e detalhe das espiguetas e cariopses com glumas e deglumadas. 4.4 - B. brizantha cv. Piatã 4.4.1- Origem O capim-piatã deriva de uma planta coletada na região de Welega na Etiópia em colaboração com o International Livestock Center for Africa”- ILCA (número de registro no ILCA-13372). O acesso foi recebido juntamente com uma grande coleção de genótipos, importada do CIAT (Cali, Colômbia) sob número CIAT 16125, conforme acordo firmado com a Embrapa. A quarentena foi realizada na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, onde recebeu o código BRA002844 (registro no SCPA) e códigos de campo GC930/87 - B112 (Embrapa Gado de Corte) e CPAC 3341 (Embrapa Cerrados). Este ecótipo vem sendo avaliado nestes dois centros desde 1988, em rede nacional de ensaios, e sob pastejo em dois locais distintos desde 2001. A liberação desta cultivar ocorreu em 2007. 4.4.2- Caracterização morfológica O capim-piatã é uma planta cespitosa; altura de 0,85 a 1,1 m; colmos verdes de 4 mm de diâmetro, ramificados. Bainhas com pêlos claros, pouco densos; articulação clara; lâmina com até 45 cm de comprimento e 1,8 cm de largura, áspera na face superior, sem pêlos, bordas hialinas muito ásperos (cortantes). Inflorescência com eixo de 19 cm de comprimento, com 12 ramos (racemos) quase horizontais, com pêlos longos claros; ramo basal de 12 cm de comprimento. Espiguetas em número médio de 48 no racemo basal, sem pêlos, arroxeadas no ápice (Figura 6). O florescimento é precoce e ocorre no início do verão (janeiro-fevereiro). Figura 6 - B. brizantha cv. Piatã em franco florescimento; detalhe das espiguetas e cariopses com glumas e deglumadas. 4.5 - B. decumbens cv. Basilisk 4.5.1 - Origem A cultivar Basilisk é provavelmente a gramínea mais conhecida e cultivada em toda a região tropical. É derivada de sementes trazidas de Uganda para a Austrália, onde recebeu o registro CPI 1694 em 1930 (Keller-Grein et al., 1996). Inicialmente foi propagada por mudas na Autrália até que se determinou
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