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A Geografia como Disciplina Escolar Breve Trajetória

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A Geografia como Disciplina Escolar: Breve Trajetória 
Prof.ª Drª. Maria José da Silva Fernandes (FC/UNESP/Bauru) 
Professores e Professoras de Geografia das Escolas Municipais de Bauru 
 
 
 
A Geografia, assim como outras ciências foi marcada por um processo 
permanente de interpretação do espaço, seu objeto maior, e de busca de soluções para 
problemas observados na sociedade, tendo sido marcado este processo pelas condições e 
necessidades dos diferentes momentos históricos. Desta forma, a Geografia teve 
historicamente um movimento que lhe permitiu evoluir na interpretação dos fenômenos 
espaciais. 
Ao longo dos anos, a ciência geográfica evoluiu e a interpretação baseada no 
reducionismo histórico/espacial, no determinismo e na linearidade dos fenômenos foi, aos 
poucos, sendo substituída pela compreensão dialética das relações, permitindo avanços 
significativos, já que a paisagem, elemento observável do espaço, passou a ser analisada a 
partir da relação entre a sociedade e a natureza mediada pelo trabalho humano. 
As concepções acerca da Geografia como ciência influenciaram “o que” e “de que 
forma” esta foi ensinada nas escolas. Em momentos marcados por uma concepção 
positivista, esta ciência traduzia-se numa disciplina que se pautava pela descrição acrítica e 
determinista da paisagem. 
Nas escolas brasileiras, a Geografia teve início no século XIX, inicialmente no 
Colégio Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro, depois foi sendo incorporado ao currículo 
oficial das demais escolas do país. Segundo Cavalcanti (1998, p. 18), a introdução da 
disciplina no referido momento histórico teve como objetivo a formação de cidadãos a 
partir da difusão da ideologia do nacionalismo patriótico. Neste sentido, a autora afirma 
que a Geografia foi caracterizada como uma disciplina voltada para a “transmissão de 
dados e informações gerais sobre os territórios do mundo em geral e dos países em 
particular”. Desta forma, identificamos a ideologia científica traduzir-se num ensino 
acrítico, descritivo e superficial nas escolas, fato que marcou a história da Geografia como 
disciplina. 
Os delineamentos epistemológicos da Geografia caracterizaram, por muitos anos, 
esta ciência de caráter conservador. Segundo Silva (1996), apesar da iminência dos temas 
políticos abarcados pela ciência geográfica, esta se caracterizou: 154 
Primeiro por ser uma ciência que se articulava de forma neutra; segundo, 
elucidadora de uma realidade com base exclusivamente nas descrições, 
resultando numa análise sempre sem vida, enfadonha. Terceiro 
consolidadora de uma visão fragmentada. Situações que creditamos 
também ao distanciamento que ocorreu entre as questões epistêmicas e as 
questões pedagógicas (SILVA, 1999, p. 107). 
Uma ciência e uma disciplina com tais características que desconsideravam as 
contradições presentes na sociedade, pouco contribuía para a análise crítica da 
organização espacial, favorecendo a alienação, a descrição, a memorização e a 
fragmentação analítica. Silva (p. 130) afirma que essa concepção científica também 
ganhou forças na década de 1970, quando, durante o regime militar, foi legitimada a falar 
de temários políticos de forma despolitizada: 
Por esse motivo, os livros de Geografia, por tratarem de temas políticos sem 
a sua essência circulavam com desenvoltura em exaltações de realizações 
do Estado Ditatorial. Falava-se, por exemplo, das transformações das 
paisagens da Amazônia, das novas migrações e assentamentos ao longo das 
grandiosas obras de redenção da região norte, mas não se falava das 
transformações geográficas em curso no campo brasileiro com o avanço do 
capitalismo monopolista em busca da terra. Ou quando esse tema era 
tratado, a análise ficava limitada ao aspecto fisionômico, descrição daquilo 
que os levantamentos empíricos estavam mostrando (SILVA, 1996, p. 130-
131). 
A Geografia consolidou-se, assim, como uma ciência a favor do Estado e da 
manutenção do status quo. Moreira (1988) afirmou que esta ciência, dependendo do uso 
que dela se faz, poderia servir tanto para tornar os homens cidadãos esclarecidos como 
para aliená-los. O mesmo autor provoca nossa reflexão ao apontar que: 
Tal propriedade, que encontramos em qualquer forma de saber, assume na 
geografia significado maior. Aquele saber que fala do que parece o óbvio, no 
fundo se mostra mais perigoso que aquele outro de maior requinte. Já se 
disse que a geografia é um “saber terra-a-terra”, porque aquilo com que lida 
é por demais evidente. Capta-se, bastando apenas a percepção. Nossa 
percepção, todavia, não é capaz de nos pôr em contato com a realidade. Só 
nos permite o contato com o que ela aparenta. A percepção dá-nos um 
conhecimento empírico, que em si mesmo não é ainda conhecimento. 
Justamente porque a geografia é um saber apreendido pela própria vivência 
direta do mundo circulante, um saber vivido, é que pode compreendê-lo de 
modo mais imediato. Não de pronto, se o que se vê são as aparência. Diz o 
povo que “as aparências enganam”. A geografia não pode manter-se neste 
nível do conhecimento. A realidade esconde-se por trás da aparência, 
sobretudo porque possui forte carga ideológica. Cabe torná-la revelada 
(MOREIRA, 1988). 
Ao ficar atrelada à descrição e explicação superficial e aparente da realidade, a 
Geografia pouco contribuiu para a compreensão do espaço geográfico como resultado da 
materialidade do trabalho (MOREIRA, 1988), portanto, um espaço resultante das 
contradições da sociedade. 
Nas escolas, essa Geografia de base empirista e descritiva ficou conhecida como 
“tradicional”, perdurando por muitos anos não só na estrutura curricular, mas também nas 
práticas pedagógicas apresentadas pelos professores. De acordo com Moreira (1988), Silva 
(1996) e Cavalcanti (1998) essa concepção de ciência traduzia-se pela tentativa de 
explicação quantitativa e objetiva da realidade, pela ideia predominante de neutralidade 
da ciência e pela abordagem da relação homem/natureza sem privilegiar as relações 
sociais, abstraindo o homem das explicações espaciais. Pautada pela estruturação 
mecânica dos fatos, fenômenos e acontecimentos divididos em aspectos físicos, humanos 
e econômicos, a Geografia tradicional adotava como procedimento didático a 
memorização. 
Apenas nas décadas finais do século XX, é que esta concepção de Geografia e 
suas repercussões no currículo escolar começaram a perder força no cenário educacional 
brasileiro. Silva (1996, p. 193) afirma que a publicação da obra “Estudos de Geografia”, de 
Melhem Adas, em 1974, trouxe grandes contribuições para o debate e para “a superação 
dessa lógica de organização do jogo conceitual e temários dessa ciência”, o que, segundo o 
autor, foi favorecido pelo “calor de uma série de (novas) discussões que começaram a 
permear a realidade nacional e especialmente a seara geográfica”. 
Neste sentido, os encontros organizados pela Associação de Geógrafos do Brasil 
(AGB) também contribuíram para o movimento de renovação do ensino de Geografia, o 
que se ampliou a partir da década de 80 com a redemocratização do país. Cavalcanti 
(1998), afirma que as reformulações da ciência geográfica enquanto “conjunto de 
reflexões mais gerais sobre os fundamentos epistemológicos, ideológicos e políticos” 
levaram a alterações significativas no campo de ensino da Geografia, agregando a esta 
discussão elementos importantes da análise marxista e de suas categorias. A partir das 
discussões iniciais sobre o caráter ideológico da Geografia, passaram a ser incorporados 
elementos importantes para a análise dos arranjos espaciais, passando estes a serem 
interpretados em sua totalidade e de forma dialética. A nova Geografia proposta, 
comprometida com o papel transformador do professore da sociedade, passou a ser 
denominada “Geografia Crítica”. Embora tenha levado muitos anos a chegar às escolas 
(ainda temos dúvidas se de fato a Geografia Tradicional desapareceu do cotidiano e da 
cultura escolar), essa nova perspectiva de ensino ganhou força nos espaços universitários 
e de discussão acadêmica. 
Segundo Cavalcanti (1998), a Geografia Crítica apresentou-se como uma nova 
possibilidade de organização do ensino da disciplina, já que: 
As propostas de reformulação do ensino de Geografia também têm em 
comum o fato de explicitarem as possibilidades da Geografia e da prática de 
ensino de cumprirem papeis politicamente voltados aos interesses das 
classes populares. Nesta perspectiva, os estudiosos alertam para a 
necessidade de se considerar o saber e a realidade do aluno como 
referência para o estudo do espaço geográfico. O ensino de Geografia, 
assim, não deve pautar pela descrição e enumeração de dados, priorizando 
apenas aqueles visíveis e observáveis na sua aparência (na maioria das vezes 
impostos à “memória” dos alunos, sem real interesse por parte deles). Ao 
contrário, o ensino deve propiciar ao aluno a compreensão do espaço 
geográfico na sua concretude, nas suas contradições (CAVACANTI, 1998, p. 
20). 
Neste sentido, a Geografia apresentou avanços, pois passou a priorizar as 
relações sociais, o trabalho, a produção e a transformação do espaço geográfico, 
analisando a apropriação da natureza em função dos interesses sociais, portanto, numa 
sociedade capitalista, sempre desigual e contraditória. Com uma perspectiva crítica e 
política, esta ciência favoreceu a compreensão da “realidade que esconde-se por trás da 
aparência, sobretudo porque possui forte carga ideológica. Cabe torná-la revelada” 
(MOREIRA, 1988). Desta forma, a Geografia além de explicar o mundo passou a ser 
compreendida como ciência que contribui para transformá-lo. 
Nas escolas, com muitas resistências iniciais, houve necessidade de rearranjos do 
ponto de vista dos conteúdos, dos métodos e dos objetivos de ensino. Uma nova 
concepção de ciência implicou numa forma diferente de ensinar. Para Cavalcanti (1998, p. 
25), 
Para cumprir os objetivos do ensino de Geografia, sintetizados na ideia de 
desenvolvimento do raciocínio geográfico, é preciso que se selecionem e se 
organizem os conteúdos que sejam significativos e socialmente relevantes. 
A leitura do mundo do ponto de vista de sua espacialidade demanda a 
apropriação, pelos alunos, de um conjunto de instrumentos conceituais de 
interpretação e de questionamento da realidade socioespacial. 
 
Considerando-se a importância desta mudança epistemológica em relação à 
Geografia, discussões e reflexões passaram a permear os cursos de formação inicial e 
continuada de professores, repercutindo em alterações na organização didática da disciplina. 
Mais de um século depois de sua introdução nas escolas como disciplina escolar, a Geografia 
caminhou, mesmo que a passos lentos, no sentido proposto por Marx ao afirmar que “a 
ciência seria desnecessária se toda essência coincidisse com a sua aparência” (Marx apud 
Moreira, 1988). 
 
Referências 
 
CAVALCANTI, L. S. Geografia, escola e construção de conhecimentos. Campinas: Papirus, 
1998. 
 
MOREIRA, R. O que é Geografia. 9. ed. São Paulo: Brasiliense, 1988. 
 
SILVA, J. L. B. Notas introdutórias de um itinerário interpretativo sobre a formação do 
pensamento geográfico brasileiro. 1996. 219 f. Dissertação (Mestrado em Geografia). 
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 
1996.

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