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LUHMANN, Niklas A opinião pública

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ESTEVES, JOÃO PISSARRA (ORG.), COMUNICAÇÃO E SOCIEDADE, 2.ª ED., LISBOA, LIVROS HORIZONTE, 2009 
 
A OPINIÃO PÚBLICA 
NIKLAS LUHMANN 
 
 
Muitos conceitos clássicos da teoria política encontram-se hoje numa situação 
contraditória: não os podemos, simplesmente, abandonar, nem levá-los a sério no seu 
sentido primitivo. Eles parecem caracterizar importantes avanços da sociedade 
moderna e dos seus sistemas políticos, mas fazem-no de uma maneira que já não 
satisfaz, sendo, por assim dizer, demasiado directa, demasiado compacta e 
simplificada. As mais recentes correntes científicas da teoria dos sistemas, da teoria 
da decisão e da teoria da organização, que procuram ampliar a capacidade científica 
de tratamento de factos complexos, abandonam o património dos conceitos 
tradicionais. As disciplinas que pretendem conservá-lo correm, por isso mesmo, o risco 
de se deixarem atrasar ou de se limitarem à hermenêutica e à história das ideias. 
Nestas circunstâncias, a reconstrução dos conceitos políticos clássicos através de 
novos instrumentos de pensamento apresenta-se como uma tarefa interessante. 
Aqueles conceitos eram mesmo, não só criações científicas, mas, sobretudo, 
respostas a uma consciência aguda de problemas reais. Conceitos como política, 
democracia, domínio, legitimidade, poder, representação, estado de direito, 
controvérsia, opinião pública não visavam, sobretudo, explicar os acontecimentos e os 
desenvolvimentos efectivos; antes serviam para a fixação de soluções de problemas 
enquanto conquistas institucionais, e a sua problemática própria consistia, em boa 
parte, no facto de a precedente problemática do sistema permanecer obscura e muitas 
vezes desconhecida e de a “solução” poder consistir apenas numa combinação de 
exigências de comportamento e problemas consequentes, e não na eliminação do 
problema. A ser exacta esta suposição, deveria ser possível, mediante a clarificação e 
a fundamentação teórica dos problemas em causa, reconduzir estas respostas 
conceptuais às suas premissas, reconstruir o seu sentido, reconhecer a função das 
estruturas e dos processos em questão, e por esta via proceder à sua comparação 
com outras possibilidadesi. Semelhante tentativa deve ser aqui empreendida com base 
no conceito de opinião públicaii. 
O presente trabalho expõe-se conscientemente à objecção de que tudo o que será de 
seguida tratado sob o rótulo de opinião pública já nada tem a ver com o respectivo 
conceito clássico ou, então, falha, pelo menos, o núcleo essencial e a moralidade 
característica daquela. Para irmos ao encontro dessa objecção, enunciem-se as 
premissas que possam ser objecto de ataque: baseamos o nosso direito a prolongar a 
utilização do conceito na continuidade existente entre o problema e o seu âmbito de 
solução e encaramos o problema a que o conceito se refere na contingência do que é 
jurídica e politicamente possível, e o âmbito de solução do problema no processo de 
comunicação política. Da referência ao problema da contingência deriva a 
necessidade de uma reinterpretação da relação entre opinião pública e processo de 
comunicação: a opinião pública não pode mais ser considerada, simplesmente, como 
um resultado politicamente relevante, antes deve ser vista como estrutura temática da 
comunicação pública. Por outras palavras: não mais deve ser concebida, apenas, 
causalmente, como efeito produzido e continuamente operante, mas funcionalmente, 
como meio auxiliar de selecção. 
 
1. 
 “Opinião pública” é hoje um conceito cujo objecto se tornou discutível, ou até mesmo 
inexistente. Para a dissolução do objecto contribuiu, o que é significativo, 
precisamente a intenção de investigar empiricamente a opinião pública. A investigação 
empírica teve de introduzir substitutos dos dois elementos característicos do conceito. 
A opinião foi substituída por respostas, fornecidas a inquéritosiii, enquanto o elemento 
da publicidade foi substituído pelo interesse selectivo dos políticos por tais “opiniões”iv, 
ou pela influência que determinados grupos exercem sobre a formação da opinião. Se 
se combinar os substitutos dos dois elementos do conceito, torna-se evidente a 
problemática subjacente àquelas pesquisasv. Em todo o caso, os êxitos indiscutíveis 
de tais pesquisas não se podem atribuir às premissas teóricas que as fundamentam. 
Embora esta problemática científica seja conhecida há muito tempo, permanece 
contudo viva a recordação do conceito clássico, e da sua função política. O tema da 
opinião pública torna sensível a insuficiência de uma teoria política que se regule 
exclusivamente pelos aspectos institucionais. O poder político e o exercício de cargos 
políticos parecem ser insuficientes para uma compreensão plena dos acontecimentos 
políticos e para impedir que estes se desviem do seu curso normal. Com perplexa 
ironia, define V.O. Keyvi a opinião pública como “ o espírito santo do sistema político”. 
Importa, por conseguinte, descobrir um conceito mais apropriado, que não precise de 
ser acomodado nem na psicologia social nem na teologia, mas antes possa ser 
integrado numa teoria do sistema político. 
Se recuarmos até à concepção liberal da opinião pública, a sua pré-história torna 
antes de mais evidente que ela estava destinada a libertar a política da sua ligação 
com a verdade, típica do direito natural da velha Europa. O desenvolvimento da 
sociedade na Idade Média tardia e no início dos tempos modernos conduzira a uma 
diferenciação mais acentuada entre religião, política, economia e ciência, o que teve 
como consequência o surgimento, nestes domínios parcelares do sistema social, de 
novas autonomias e representações de objectivos mais abstractas. Os tradicionais 
fundamentos de verdade em que assentava a política perderam, por essa razão, a sua 
credibilidade e o seu carácter de ideias directrizes. Ainda dentro do direito natural 
interpretado como direito da razão, o pensamento jurídico do século XVIII converteu-
sevii à positividade (fixação do direito mediante decisões) dos fundamentos do direito, 
necessitando para tanto de um quadro de orientação moderno, que estivesse à altura 
da tão elevada contingência do que é juridicamente possível. Apesar de todas as 
tentativas no sentido de estabelecer fórmulas teleológicas invariáveis e princípios 
racionais enquanto limites da política, surgiu a necessidade de uma bitola directriz 
mais dúctil que a verdade, capaz de poder alterar os seus pontos de vista e os seus 
temas. Tal bitola já não podia ser concebida como verdade, mas apenas como opinião 
– como maneira provisoriamente retida de conceber o justo, a qual passara por 
determinados controlos da razão subjectiva e da discussão pública. A opinião pública 
é, por assim dizer, contingência política substantivada – um substantivo ao qual se 
confia a solução do problema da redução da discricionariedade do que é jurídica e 
politicamente possível. 
Se quisermos examinar mais pormenorizadamente, teremos, portanto, de perguntar 
pelos fundamentos desta confiança, pelas premissas estruturais do sistema em que 
ela assenta, para se poder então verificar se estas suposições são também, ainda, 
válidas para o sistema social da sociedade industrial avançada. Se as análises de 
Habermasviii se confirmam na realidade, podemos reconhecer que subjaz ao conceito 
clássico de opinião pública uma situação geral da diferenciação social que apresenta 
as seguintes características: os sistemas de formação da opinião são pequenos 
círculos onde se debatem ideias, nos quais os seres humanos se podem encontrar e 
aceitar como seres humanosix. Para a ordem interna daqueles círculos, é essencial 
que não ocorra separação entre conflito e cooperação, ou seja, procura-seganhar o 
consenso daqueles contra quem se argumenta. O que é possível no interior de 
pequenos sistemas. A orientação, facilitada pela diferenciação amigo/inimigo, é 
substituída pela institucionalização do tacto, isto é, pela aceitação da liberdade de 
autorepresentação do outro como fundamento do comportamento próprio, e isso com 
uma certeza capaz de assegurar a confiança recíproca. A esta ordem interna 
corresponde, enquanto condições sociais de tais sistemas, uma combinação 
característica de diferenciação e segmentação. Os círculos acham-se diferenciados, 
na medida em que os seus membros não se orientam em conformidade com os outros 
papéis que lhes são próprios: sexo, idade, posição social, profissão, recursos 
económicos, etc.; como exprime a fórmula “seres humanos como seres humanos” ou 
o conceito abstracto de “sujeito”. Por outro lado, os círculos estão segmentados na 
relação uns com os outros, uma vez que são constituídos de modo idêntico e 
uniforme, e não com base numa função particular que lhes seja atribuída. 
Este conjunto singular de circunstâncias permitia, mantendo-se ele próprio latente, que 
o “geral” se convertesse em tema de discussão e, por essa via, em problema; 
simultaneamente, tornava compreensível a possibilidade de generalizar a razão. A 
igualdade dos círculos de discussão e a neutralização das influências políticas, 
económicas e derivadas da posição social sobre a discussão permitiam admitir como 
geral a opinião que neles se formava; que as experiências neles desenvolvidas 
aparecessem como universalmente válidas; que as expectativas que se aprendia a 
acalentar como ressonância do comportamento próprio pudessem ser admitidas como 
expectativas de todos e, enquanto tais, pudessem substituir as velhas instituições; e 
que fosse possível chegar a um acordo baseado numa compreensão de si moralmente 
fundamentada, sem ter de atender às condições económicas, de classe ou derivadas 
da estrutura do sistema que influenciam um tal pensamento. Puderam, assim, ser 
activadas experiências que permitiram uma fácil transição da razão individual para a 
geral, e depois, também, da vontade supra-individual para a vontade geral. Os novos 
meios de difusão destas opiniões fizeram mais do que o necessário para convencer no 
que toca a essa possibilidade. Surpreendentemente, foi a diferenciação de uma 
sociedade ela própria já funcionalmente diferenciada que tornou possível aos que se 
envolviam nos debates compreenderem-se a si mesmos como “a sociedade” – uma 
chance, em boa verdade, provisória. 
Um rápido olhar à história do pensamento revela que aquela crença na razão e, 
também, a crença na capacidade da opinião pública para exercerem um controlo 
crítico e alterarem a estrutura do poder não podiam manter-se por muito tempo. É 
natural que a sociologia não interprete essa desintegração como um desenvolvimento 
dialéctico, auto-evidente e imanente do espírito, mas antes encontre a sua razão de 
ser na improbabilidade e na impossibilidade de estabilização das complexas estruturas 
sistémicas que suportavam aquelas crenças e a estas reconduziam as necessárias 
experiências. Faltam-nos, na verdade, análises suficientemente formais no campo da 
teoria social que possam fundamentar a hipótese segundo a qual a diferenciação 
progressiva de subsistemas segmentares sem função específica seria, em geral, 
instávelx. O desenvolvimento subsequente da sociedade moderna em direcção à era 
industrial encaminhou-se decisivamente, contudo, no sentido de uma sempre maior 
diferenciação funcional e de uma maior especificação de subsistemas, pelo que se 
torna impossível aos grupos que se subtraem a esta diferenciação afirmar serem eles 
a sociedade. A diferenciação funcional conduz à abstracção de perspectivas 
específicas do sistema, à sobreprodução de correspondentes representações de 
desejos e de exigências normativas e, por conseguinte, a uma pressão selectiva que 
se exerce sobre todos os participantes. A especificação em sub-sistemas e os modos 
de selecção são consolidados de forma organizada; são, portanto, executados por 
sistemas que se ajustam a processos de tomada de decisão e que, ao criarem as 
estruturas para tanto necessárias, já não podem representar qualquer interesse geral. 
A própria sociedade nem por isso regista uma simplificação do ponto de vista 
organizativo, nem passa a estar tecnicamente determinada; bem pelo contrário, ela 
torna-se num “campo turbulento”xi, no qual todos os sistemas são fortemente 
pressionados pela complexidade, tendo de se adaptar não só aos acontecimentos, 
mas sobretudo às adaptações dos outros sistemas. 
Estas transformações exigem um reexame mais radical do conceito de opinião pública 
do que tinha previsto a célebre conceptualização de Habermasxii. O conceito de 
opinião pública não é susceptível de ser facilmente repetido no interior da organização, 
pois as organizações assentam, precisamente, na fragmentação da consciência e 
nelas, por conseguinte, não se podem realizar nem aquelas premissas estruturais nem 
as correspondentes experiências, sobre as quais se fundara a hipótese da existência 
de uma opinião pública crítica. A “produção de publicidade” no interior da organização 
conduz, no melhor dos casos, à criação de situações penosas, não raro, até, a 
consideráveis perturbações funcionais que permitem aos seus causadores a 
emancipação pela tomada de consciência do próprio papel, mas não a sua 
emancipação como seres humanos através do meio, criador de solidariedades, que é 
o espaço público. Deste modo, as representações humanitárias da época do 
Iluminismo associadas ao conceito de espaço público são recebidas de uma forma 
demasiado directa, demasiado à letra. Importa encontrar traduções mais abstractas. 
 
2. 
Encontramos um termo de comparação suficientemente abstracto, quando nos 
interrogamos sobre a função daquilo que é abrangido pelo conceito de opinião pública. 
Em última análise, trata-se do problema da contingência política e jurídica de decisões 
vinculativas: a elevada discricionariedade do que é política e juridicamente possível 
deve ser reduzida, se não através da verdade, pelo menos através de opiniões 
fortalecidas pelo debate. Com o conceito de “opinião pública”, o que é, antes de tudo, 
oferecido, enquanto solução do problema, é um substantivo cujo substrato permanece 
obscuro. Mas com a substantivação, nem por isso os problemas se resolvem; fica 
pendente tudo o que se oculta em termos de factos e critérios por detrás do conceito 
de opinião. Igualmente insuficientes se revelam a conversão do problema em 
paradoxo, a sua dissolução romântica no infinito, ou a sua formulação dialéctica ou 
utópica, pois nenhuma destas soluções proporciona à teoria ou à prática contornos 
unívocos. Como problema referente às análises funcionais é possível, em 
compensação, especificar a contingência do que é jurídica e politicamente possível, e 
utilizar este critério como termo de comparação com outras propostas de solução do 
problema. 
A contingência, no sentido de “também-ser-possível-de-modo-diferente”, converte-se 
em problema quando é confrontada com a necessidade de estrutura da experiência 
vivida e do comportamento humano. O problema de ter de colocar as estruturas num 
horizonte de outras possibilidades adquire uma importância crucial para a formação da 
consciência na era moderna, em relação com as transformações evidentes das 
estruturas sociais. A nossa tese é a de que o conceito de opinião pública relaciona 
este problema com um sector particular da experiência e do comportamento humanos, 
nomeadamente com a comunicação interpessoal, sobretudo a de tipo político. Se se 
considerar que a comunicação se deveproduzir com um potencial mínimo de atenção 
consciente – e este é o ponto em que nos diferenciamos da autocompreensão e do 
conceito de razão do tempo do Iluminismoxiii –, torna-se evidente que tal comunicação 
tem de estabelecer pressupostos, tem de estar já na posse de temas possíveis. Aquilo 
que se designa por opinião pública parece residir no domínio desses temas da 
comunicação que, enquanto pressupostos, limitam a discricionariedade do que é 
politicamente possível. 
Por “temas” é nossa intenção designar certos complexos de sentido mais ou menos 
indeterminados e susceptíveis de desenvolvimento, sobre os quais se pode conversar 
e ter opiniões iguais, mas também diferentes: o tempo, o novo automóvel do vizinho, a 
reunificação da Alemanha, o ruído do motor da máquina de cortar relva, a subida dos 
preços, o ministro Straussxiv. Semelhantes temas constituem a base estrutural de 
qualquer comunicação, sendo esta conduzida como interacção entre vários parceiros. 
Eles tornam possível a referência comum a um significado idêntico e impedem que as 
pessoas falem sem se entenderem. Uma comunicação não pode ter início sem a 
existência de possíveis objectos comuns de comunicação, e estes acordos prévios 
consolidam-se no curso da comunicação, tornando-se limites mais ou menos estáveis 
do sistema, num mundo da vida aceite em comum e que de antemão se admite como 
desarticuladoxv. A comunicação pressupõe, por conseguinte, além da linguagem 
comum, dois outros planos de fixação do significado: a escolha de um tema e a 
articulação das opiniões relativas a esse tema. Somente no interior desta diferença se 
pode constituir a diferença entre opiniões concordantes e discordantes. De modo 
análogo, também a história do desenvolvimento de um sistema de comunicação pode 
comportar modificações de sentido nesses dois planos – mudanças de temática e 
mudanças no que respeita às opiniões estabelecidas. Ambas as variações 
dependerão, pela sua típica natureza própria, uma da outra, ou seja, a escolha dos 
temas não se fará independentemente das previsíveis ou evidentes possibilidades de 
consenso ou de dissensão. 
Esta dupla estrutura de temas e de opiniões é, na verdade, apenas necessária se a 
comunicação for conduzida de forma interactiva. Uma diferenciação dos temas sobre 
os quais se discute só tem sentido se se pressupor que o receptor da comunicação é 
alguém que pode responder, que não se pode furtar ao tema, mas que pode exprimir 
outras opiniões sobre o tema, introduzindo dessa forma, no domínio do que deva ser 
ordenado, a elevada complexidade de outras possibilidades. Uma comunicação 
unilateral a que se não possa responder (manipulação) poderia dispensar aquela 
estrutura e sugerir de imediato a opinião a reterxvi. O facto da opinião pública se 
constituir através daquela dupla estrutura significa que, nos canais de comunicação 
em causa, não se comunica de forma manipulativa, mas interactiva – por exemplo, 
debatendo ou participando de forma cooperativa na tomada de decisões. 
Depois destas reflexões, torna-se já possível identificar alguns perigos característicos 
que ameaçam a função da opinião pública. Estes apresentam-se como formas de 
amálgama de tema e opinião, que excluem a possibilidade de resposta à 
comunicação, tornando-se esta, por conseguinte, manipuladora. O que pode ocorrer 
no caso de unilateralidade, tecnicamente provocada, da comunicação através dos 
mass media, no caso de exposições psicotecnicamente trabalhadas, mas, sobretudo, 
no caso de recurso à moralização da comunicação (e, naturalmente, com o mais alto 
grau de certeza, no caso em que todas estas circunstâncias se encontram presentes). 
Até agora, pelas mais variadas razões, a moralização manipuladora tem despertado 
pouco interessexvii. A situação é, na verdade, complexa. A condição da sua 
possibilidade é uma sociedade altamente complexa, cuja integração através de uma 
moral colectiva já não é possível, ou, em todo o caso, já não é evidente. Nestas 
condições, a atribuição à comunicação de uma valência moral funciona como meio 
para a tornar irrespondível. O destinatário de semelhante comunicação vê-se 
confrontado por um papel, que lhe é implicitamente distribuído e que vincula o seu 
valor pessoal a determinadas opiniões. E, o que é mais desagradável ainda: ele 
surpreende nessa exigência um empenho moral do seu interlocutor, que a delicadeza, 
o tacto ou a necessidade de tranquilidade o inibem de desacreditar. Deve, então, 
acolher aquele que se lhe dirige como alguém que dele espera o que ele não pode ser 
– e sai depois de cena, com o melhor dos modos, mediante a suspensão ou a 
banalização da comunicação. 
Como acontece com qualquer manipulação, também esta exclui, à partida, qualquer 
diferenciação entre tema e opinião: a institucionalização do tema é de tal maneira 
fundida com as implicações morais das opiniões que a afirmação de uma moral ocorre 
juntamente com a pressão para que seja aceite. Difundida pelos mass media, por 
espectáculos e cartazes publicitários, nasce assim aquela moral pública sem 
ressonância que a todos deixa indiferentes. Se, pelo contrário, ocorrer no processo de 
comunicação uma diferenciação entre temas a opiniões e, por esta via, também uma 
diferenciação entre o motivo da comunicação e a afirmação de valores pessoais, a 
opinião pública pode constituir-se como estrutura de um processo de comunicação 
limitadamente aberto. Em tais processos de comunicação, chegar-se-á, com a ajuda 
de temas que impliquem um envolvimento, ao confronto de opiniões; enquanto com 
base em morais engajadas não se chegará à controvérsia sobre o direito à divergência 
de opiniões. Podemos exprimir o resultado desta análise sob a forma de uma regra 
geral: relações sociais sempre mais complexas só podem ser tratadas mediante 
processos de comunicação sempre mais complexos. A diferenciação entre temas e 
opiniões favorece o aumento deste potencial de complexidade. Sem ela, a 
comunicação já não pode ser, hoje, conduzida de forma interactiva, nem pode ser 
dominada a complexidade daquilo que para muitos sujeitos é razoavelmente possível. 
No contexto político também não é possível comunicar de outra maneira. Daí que os 
temas das possíveis comunicações adquiram uma importância prioritária. Eles actuam 
como regras para a actualização contínua de expectativas na interacção concreta e 
guiam, desse modo, a formação das opiniões. O mecanismo de redução da 
comunicação política, que o conceito de opinião pública abrangia, não consiste, 
portanto, nas próprias opiniões, mas nos temas da comunicação política. Deste modo, 
ao que me parece, pode encontrar solução o velho problema da unidade dos efeitos 
apesar do carácter contraditório da opinião públicaxviii. A função da opinião pública não 
deve ser inferida da forma das opiniões – da sua generalidade e possibilidade de 
discussão crítica, da sua racionalidade, capacidade consensual e representatividade 
pública –, mas da forma dos temas das comunicações políticas, da sua aptidão 
enquanto estrutura do processo de comunicação. E esta função não consiste na 
justeza das opiniões, mas na capacidade dos temas para absorver a incerteza e para 
criar estruturas. Por conseguinte, o problema não consiste na generalização do 
conteúdo das opiniões individuais sob a forma de fórmulas gerais, aceitáveis por todos 
os seres racionais, mas na adaptação da estrutura dos temas do processo de 
comunicação política à necessidade de tomada de decisões por parte da sociedade e 
do seu sistema político. 
Uma tal deslocação da atenção das opiniões para os temas que regulam as opiniões é 
pertinente não apenas por permitir uma melhor fundamentação no âmbito de uma 
teoria dos sistemasde comunicação, mas também pelas interessantes questões que 
levanta. Ela permite associar as pesquisas de opinião pública a uma teoria do sistema 
político (e até a uma teoria do sistema social), que identifica na complexidade deste 
sistema a variável independente primáriaxix. A complexidade do sistema político, ou 
seja, o número e variedade das possibilidades de experiência e de acção nele 
realizáveis, está efectivamente relacionada com a sua “capacidade temática”, isto é, 
com a estruturação temática dos seus processos de comunicação. A complexidade 
condiciona a capacidade temática, e vice-versa. Esta relação torna-se evidente não só 
na exigência de abstracção dos conteúdos de temas e opiniões, o que permite a estes 
cobrir um número maior e mais variado de factos e circunstâncias. Ela apresenta 
muitos outros aspectos que não podiam ser compreendidos com o conceito clássico 
de opinião pública, mas que podem ser reunidos sob o conceito funcional de opinião 
pública aqui defendido. Também a dimensão da diferenciação objectiva e táctica entre 
temas e opiniões (3), a mobilidade temporal dos temas (4) e as formas da sua 
institucionalização social (5) mudam com a complexidade do sistema político e com o 
peso da selecção dos seus processos de decisão. 
 
3. 
A teoria geral da organização ensina-nos que, em todos os sistemas sociais 
complexos que se ocupam de processos de decisão está presente uma diferenciação 
entre “attention rules” e “decision rules”, uma vez que a capacidade de operar 
confrontos conscientes não é suficiente para esgotar as possibilidades lógicas de 
racionalizaçãoxx. Porque a atenção é escassa, desenvolvem-se necessariamente 
regras sobre a captação da atenção, que se diferenciam das regras segundo as quais 
as decisões são tomadas e julgadas correctasxxi. Somente dentro dos limites daquilo 
que é geralmente considerado com atenção __ de algum modo, portanto, após a 
selecção preliminar efectuada pelas regras da atenção __, se pode chegar a decisões 
racionalizáveis. O objecto que desperta atenção não é necessariamente idêntico ao 
objecto sobre o qual, depois, efectivamente se decidexxii. Os processos de distribuição 
da atenção no sistema diferenciam-se, assim, significativamente, dos processos de 
tomada de decisão e, caso esta mesma diferenciação cumpra efectivamente a sua 
função, estes processos têm de ser julgados segundo critérios diferentes. 
Este ponto de vista, proveniente de uma área de pesquisa completamente diferente, 
pode ser aplicado à nossa distinção entre temas e opiniões, e ilustra uma das suas 
funções. As regras da atenção guiam a construção de temas políticos; as regras da 
decisão guiam a formação da opinião, nomeadamente, nas instâncias competentes 
em matéria de decisão. 
Os temas não servem directamente para determinar o conteúdo das opiniões, mas, 
em primeiro lugar, e sobretudo, para captar a atenção. Eles indicam aquilo que no 
processo político de comunicação se supõe possa ter ressonância e possa exigir 
capacidade de resposta, mas deixam em aberto quais opiniões sobre o tema serão 
sustentadas, quais as acertadas, quais as que serão capazes de se impor. O facto de 
dar atenção não significa ainda, portanto, ligação a determinadas opiniões e 
conteúdos de decisão, mas, quando muito, um estádio preparatório. E, inversamente, 
aspirações “em si mesmas” razoáveis e opiniões correctas não podem, por si, 
converter-se em temas dos processos de comunicação política, sem primeiro 
passarem pelo filtro das regras da atenção, construído de acordo com outros pontos 
de vista. A activação desta função de filtro precede o processo de comunicação. O que 
permite supor que o sistema político, tanto quanto assenta na opinião pública, não 
deve ser de modo algum integrado nas regras da decisão, mas nas da atenção. Em 
todo o caso, as regras da atenção oferecem, do ponto de vista social, um acesso mais 
amplo e a maior força integradora: elas podem, devem até, ser as mesmas, 
inclusivamente para participantes que agem de acordo com outras regras de decisão, 
enquanto a relação contrária não é possível. Nestas circunstâncias, poderia ser de 
grande importância, tanto do ponto de vista teórico como prático, conhecer as regras 
de atenção de um sistema político. Todavia, sem uma investigação empírica 
especialmente dirigida a esse objectivo, não será possível produzir, no momento 
presente, quaisquer afirmações seguras sobre essa questão. A observação ocasional 
da nossa cena política permite, no entanto, supor que, na distribuição da atenção e na 
formação dos temas, sejam observadas, entre outras, as seguintes regras: 
(1) Nítida prioridade de determinados valores, cuja ameaça ou violação origina, só por 
si, um tema político. Pense-se, por exemplo, na ameaça à paz, em interferências na 
independência da justiça, nos aspectos morais dos escândalos políticosxxiii.Os valores, 
por conseguinte, não só actuam como regras de decisão no interior de programas, 
mas também, ao mesmo tempo, noutro contexto, como regras de activação da 
atenção, sem que para o exercício desta função seja necessário ponderar a relação 
com outros valores. Um indicador operacionalizável de tais prioridades consistiria no 
facto de os temas correspondentes se poderem impor em face dos prazos fixados 
pelos políticosxxiv. 
(2) Crises ou sintomas de crisesxxv. As crises são ameaças inesperadas 
(tematicamente não preparadas) não só no que respeita a valores isolados, mas 
também, às exigências, intrínsecas ao sistema, impostas pela sua estabilidade. As 
crises, ao estimularem e concentrarem a atenção, e na medida em que colocam em 
perigo de forma difusa, indeterminada, o nível de desempenho de numerosos valores, 
colocam estes sob a pressão do tempoxxvi. É nisso que se baseia o seu efeito de 
integração, que deve ser diferenciado dos efeitos de inovação das crises, os quais se 
devem à mudança das regras de decisão sob pressão de situações de excepçãoxxvii. 
Em todos os sistemas sociais, as crises poderiam incluir-se entre as regras de 
distribuição da atenção; as respectivas diferenças têm a ver com o tipo de 
acontecimentos (por exemplo, demissão de um ministro, carestias, subidas 
excepcionais de preços, motins e actos de violência) que tornam uma crise perceptível 
e imputável, e com o tempo que ainda resta para uma tomada de decisãoxxviii. 
(3) Posição social do emissor de uma comunicação. As comunicações de chefes 
políticos, personalidades conhecidas e celebridades sociais recebem mais atenção e 
despertam um eco maior do que as de pessoas sem uma posição social eminente. A 
posição social influencia, por assim dizer, a comunicação. Este efeito é, além disso, 
independente do facto do detentor da posição social ser ou não capaz de afirmar a sua 
vontade em situações concretas. 
(4) Sintomas de sucesso político. Uma vez que no mundo complexo da política as 
condições reais do sucesso são muitas vezes imprevisíveis e não estão disponíveis 
informações em número suficiente, o seu lugar é ocupado por sintomas dotados de um 
melhor valor de orientação, por exemplo, um número crescente de votos, ou a menção 
de um nome ou de um facto na imprensa, ou o acesso imediato aos detentores dos 
mais altos cargos públicos. As circunstâncias que podem estar associadas a estes 
sintomas de sucesso recebem mais atenção, sobretudo por parte dos que se acham 
envolvidos na política activa, do que outros dados que, porventura, também possam 
ser importantes para a formação da opinião. 
(5) A novidade dos acontecimentos. Circunstâncias que permaneçam inalteráveis 
escapam à consciência, enquanto as mudanças dão nas vistas e chamam sobre si a 
atenção. O “novo” surge envolto numa presunção de importância.Em todo o caso, nas 
sociedades complexas, a percepção das inovações também se converte num 
problemaxxix, ao ponto de se constituírem subsistemas específicos que visam 
propriamente esse objectivo, em especial a imprensa diária, e que correm assim o 
risco de se especializarem demasiado nas novidades, em detrimento das questões 
importantes. 
(6) Dores ou seus equivalentes provocados pela civilização. Ameaça de danos físicos 
ou orgânicos, “stress”, ameaça à intimidade das relações pessoais, prejuízos 
financeiros, restrições orçamentais, perdas de posição social, especialmente as que se 
puderem medir e comparar – todos estes factos apresentam um elevado grau de 
alarme, se já não se puderem enquadrar em evidências institucionais, nem puderem 
ser compensadas pela ideia de um sacrifício que tenha sentido. 
Todas estas regras da atenção, e porventura ainda outras, derivam da estrutura do 
sistema político, ajustam-se a ela; não são, portanto, estabelecidas arbitrariamente, 
nem podem ser mudadas de qualquer maneira. Desta forma, a estrutura do sistema 
político regula a opinião pública, sem que a determine de uma maneira estável. A 
própria pluralidade das regras da atenção é determinante para a permanente abertura 
da opinião pública; ela impede que apenas valores estabelecidos, apenas crises, 
apenas comunicações dos detentores de posições sociais elevadas, apenas a própria 
lógica interna de sucesso do sistema político, apenas novidades ou apenas dores ou 
os seus sucedâneos determinem a temática do processo político de comunicação. A 
unilateralidade dos pontos de vista, indispensável para captar a atenção, pode ser, 
assim, reequilibrada no interior do sistema. 
 
4. 
Que a opinião pública, sob a forma de uma diferenciação de temas e de opiniões, se 
torna relevante em termos de direcção de um sistema político, demonstra-o a elevada 
complexidade deste último. Esta complexidade é uma consequência da diferenciação 
social do sistema político, da sua constituição como subsistema da sociedade, 
separado de outros âmbitos de funçõesxxx. Com semelhante diferenciação e aumento 
da complexidade subsistémica, surge, ao mesmo tempo, uma necessidade de 
variação estrutural no subsistema, pois o número de possíveis condições do sistema, 
necessário aliás para a adaptação à sociedade (a “requisite variety”xxxi do sistema 
político), só pode ser alcançado mediante mudanças estruturais muito frequentes e 
muito rápidas. No caso do processo de comunicação política, isso traduz-se na 
mobilidade da estrutura dos seus temas: os temas da comunicação política não só 
devem manter-se abertos às diversas opiniões e decisões, mas devem também poder 
ser alterados de acordo com as necessidades. 
Esta mudança parece observar uma certa ordem. Embora, também neste caso, não 
exista investigação empírica suficientexxxii, pode observar-se que os temas políticos 
não podem ser produzidos e desenvolvidos de qualquer maneira, no quadro estrutural 
do sistema político; pelo contrário, possuem como que uma biografia que, tal como a 
própria vida, pode percorrer diversos caminhos e ser prematuramente interrompida, 
mas pode também ser ordenada segundo fases típicas. Em cada uma das fases da 
carreira de um tema, mantêm-se por vezes em aberto determinadas possibilidades, 
surgem determinados problemas para resolver, haverá que satisfazer determinados 
pressupostos de participação; daí resultam oportunidades de acção estruturada para 
aqueles que põem o tema em movimento, que o promovem, travam, bloqueiam, ou 
que gostariam de encaminhá-lo por determinadas viasxxxiii. 
Os temas políticos passam, em geral, primeiro, por uma fase latente, durante a qual 
eles aparecem já como possíveis, especialmente aos iniciados e aos interessados, e 
em que são já postas em marcha actividades que precedem o seu nascimento; 
durante esta fase, porém, não se pode supor que os políticos, ou mesmo os não 
políticos, conheçam o tema e estejam dispostos a ocupar-se dele. O objecto em 
questão já surge, com maior ou menor nitidez, diante dos olhos de alguns, mas falta 
ainda, muitas vezes, a palavra que o designe – reservas naturais, esquerda 
extraparlamentar, revalorização da moeda, reforma das universidades, planos de 
educação, lei do estado de emergência, co-gestão das empresas, vacinação contra a 
poliomielite, prevenção dos acidentes rodoviários, escolas secundárias, etc. –, sob a 
qual o tema iniciará a sua carreira e poderá começar a ser debatido. Não há ainda 
qualquer urgência de decisão. Nada tem de acontecer. Frequentemente, os temas 
vegetam por muito tempo nesta forma preliminar, até reunirem a força necessária para 
uma carreira política e ter chegado o momento exacto de isso acontecer. Para muitos 
temas, esse momento nunca chegará. 
Alguns temas, no entanto, conseguem abrir caminho. Quando são pessoas corajosas 
que se saem bem na criação de um tema político, que apostam nele, que o divulgam, 
dedicando-lhe tempo, recursos e contactos. Muitas vezes, são outsiders que só se 
interessam por um determinado tema e que não têm nada a perder em termos 
políticos. Com frequência, trata-se de principiantes que, cavalgando o tema, iniciam 
uma carreira. Esses, com sorte e habilidade, conseguem que o tema não mais ocupe 
apenas aqueles que por ele se interessam, mas passe para as mãos dos que fazem 
política com temas variados. Neste estádio inicial, os temas ainda podem ser 
censurados, bloqueados ou desviados para caminhos secundários onde circulam os 
assuntos alheios à política; os poderosos têm ainda a possibilidade de dizer sim ou 
não ao tema. Se, todavia, o tema ganhar entretanto popularidade e se converter em 
moda, assume então a função de uma estrutura do processo de comunicação. Torna-
se parte integrante da opinião pública, no sentido que lhe dá o nosso conceito; 
aparece num artigo da imprensa diária, o que pressupõe que todos conhecem os 
antecedentes do tema. O facto de ele aparecer como uma coisa evidente impede que 
seja rejeitado. O tema, em si mesmo, já não está disponível para recusa, mas apenas 
as opiniões e decisões sobre ele. São outros agora os seus promotores. Referir e 
aprovar o tema já não representa qualquer risco, pois ele já andou na boca de 
ministros, presidentes, chanceleres e generais. Ele atinge, então, o ponto culminante 
da sua carreira. Os seus opositores têm de recuar, recorrendo a manobras dilatórias, 
para ganhar tempo, e a um reconhecimento limitado, com reservas; ao passo que os 
seus promotores devem, agora, tentar incluí-lo nos orçamentos ou nos programas de 
decisão da administração. 
O tempo para o fazerem é escasso, pois os primeiros sinais de cansaçoxxxiv, as 
primeiras dúvidas e experiências negativas não tardam a aparecer. Podem manifestar-
se opiniões próprias, de forma destacada, também no espaço público, incluindo na 
exposição os problemas que a questão levanta. Se nada acontece em relação ao 
tema, isso é sintoma de dificuldades, que acabarão sempre por surgir. Pouco depois, o 
tema deixa de suscitar interesse. Os peritos voltam-lhe as costas. O tema fossiliza-se 
num significado puramente cerimonial, torna-se num símbolo de boa vontade, diante 
do qual todos se curvam em determinadas ocasiões solenes. Faz a sua aparição nos 
discursos oficiais, em relatórios sobre produção das empresas, em ofícios de 
agradecimento. Ou, então, reveste a forma de um velho sonho irrealizado, que precisa 
de escândalos para, de tempos a tempos, voltar a despertar a atenção – por exemplo, 
o combate à especulação urbana. Quem ainda se pronuncia com entusiasmo sobre o 
tema mostra apenas que não está actualizado. Enquanto impulso para mudanças, o 
tema está morto; será mais difícil animá-lo doque a temas ainda não nascidos, uma 
vez que a sua história bloqueia qualquer renovação. Caso o tema não tenha resolvido 
o seu problema, deve renascer como tema novo. 
Talvez a característica mais relevante deste processo seja a diminuição da distância 
entre tema e opinião ou entre tema e decisão. A biografia de um tema é, ao mesmo 
tempo, uma história de condensação e concretização do sentido. Nela se consuma a 
assunção do significado do tema pela sua própria história: não se pode, hoje, 
propagandear a “reforma da administração” sem conhecer, compreender e presumir 
como conhecimento generalizado tudo o que, até agora, foi empreendido, e fracassou, 
sob essa designação; há que se distanciar desta história, há que reclamar, portanto, a 
“autêntica”, a “estrutural” reforma administrativa “a médio prazo”, “que não deve mais 
ser apenas…”. A história do tema, que se mantém fiel ao sentido deste, concretiza o 
tema e anula a distância entre regras da atenção e regras da decisão, a que nos 
referimos na secção anterior. É próprio dos temas políticos da opinião pública, sem 
que os mesmos sejam opiniões ou decisões, uma tendência para a formação de 
opiniões e para a tomada de decisões. O sistema político não pode tratar demasiados 
temas em simultâneo; tem de pôr de lado alguns, para dar lugar a novos – e isto a um 
ritmo tal que não deixa tempo suficiente para um tratamento adequado dos temas. Ao 
mesmo tempo, é necessário que a história da comunicação política, enquanto parte 
integrante dos temas, se converta em estrutura e possa então ser, de vez em quando, 
posta de lado mediante a supressão de velhos temas e a invenção de novos. Impede-
se, desta maneira, que os temas da prática política quotidiana permaneçam inactivos 
na irrealidade abstracta dos valores integrados: eles chegam, assim, pelo menos em 
parte, à decisão. Por outro lado, este tipo de mobilidade dos temas, pelo menos por 
agora, não garante suficientemente reformas estruturais duradouras. 
A teoria liberal reconheceu, na verdade, o instável flutuar da opinião pública, mas não 
podia aprovar a sua instabilidade, nem conseguiu explicar e integrar a sua função; 
teve, por essa razão, de se entregar à esperança no progresso. Continuou, assim, 
sempre à procura de um sentido invariante, como fundamento da prática de decisão 
política – se não verdades no sentido das ciências modernas, pelo menos opiniões 
racionalmente fundadas, universalmente válidas. Partindo desta premissa, a opinião 
pública, segundo a mais antiga teoria liberal, pôde anunciar, em nome de constantes 
racionais comuns a todos os homens, uma pretensão de domínio que foi, na prática, a 
da burguesia em ascensão. Dado o carácter ideológico dessa pretensão, a teoria em 
causa teve de limitar-se a uma função de crítica e de controlo, que confere ou nega 
relevância ao tema em apreço. Não se podia ainda pensar que o domínio se funda na 
variabilidade, e o poder na possibilidade de exercer influência. A opinião pública veio, 
assim, ocupar o seu lugar ao lado da dominação política, entendida esta como o 
verdadeiro centro do sistema político. Este último foi concebido, tal como 
anteriormente, como um sistema de cargos públicos, e não como um processo de 
comunicação estruturado. 
Estes pressupostos têm agora de ser reexaminados profundamente. A condução 
normal do sistema político de uma sociedade altamente complexa só pode ser 
exercida por mecanismos que apresentem uma variedade análoga, que sejam 
capazes de organizar um intercâmbio de matérias de comunicação e de estabelecer a 
sua ligação a exigências estruturais mais gerais (por exemplo, as de diferenciação do 
sistema). Na medida em que a estrutura dos temas do processo de comunicação 
política, que designamos por opinião pública, realiza efectivamente esse trabalho, ela 
assume a função de mecanismo orientador do sistema político que, não determina, é 
verdade, nem o exercício do domínio nem a formação das opiniões, estabelece, no 
entanto, as fronteiras daquilo que é, em dado momento, possível. No processo de 
comunicação política, qualquer papel, se não quiser renunciar à compreensão e à 
ressonância dos temas, tem de se ajustar à estrutura dos temas da opinião pública, ou 
seja, às regras da sua variação, mantendo-se assim dependente de uma 
compatibilidade com a opinião pública. 
Uma tal inserção de temas alternantes, e em si mesmos mutáveis, na estrutura da 
comunicação não pode deixar de ter repercussões sobre os elementos estruturais, 
relativamente constantes, do sistema político. Estes últimos têm de se tornar, em 
conformidade, suficientemente abstractos para poderem veicular temas mutáveis. 
Estas mudanças podem ser efectivamente observadas: por um lado, na organização 
processual dos procedimentos de decisão, e, por outro, na institucionalização de 
avaliações abstractas. Os procedimentos da escolha política, da legislação 
parlamentar, da jurisdição e da administração estão organizados de tal maneira que a 
sua forma e aceitabilidade dos resultados se conservam relativamente independentes 
dos temas tratadosxxxv, quaisquer que estes sejam; os procedimentos podem, assim, 
assegurar, uma vez por outra, a sustentação e a modificação dos temas da opinião 
pública em cada momento. Valores correntes, como, por exemplo, o dinheiro, a saúde, 
a justiça, a arte, a educação, a conservação da natureza, a paz, a repressão da 
criminalidade, a melhoria das comunicações, o divertimento, etc., são de tal maneira 
abstractos que, na discussão de numerosos temas, se pode confiadamente fazer 
referência a eles, sem ter de recear que alguém conteste esses valores em si 
mesmos. Para o seu reconhecimento, não é preciso aduzir razões ou motivos 
pessoais. Somente a relação hierárquica entre os valores e a necessidade de uma 
renúncia parcial aos mesmos estão abertas à discussão, de tempos a tempos, e 
mudam com os temas da opinião públicaxxxvi. Esta última deve ser capaz de organizar, 
no quadro da afirmação constante de pontos de vista avaliativos, a mudança das 
preferências actuais. 
 
5. 
Uma atribuição de funções de tão grande alcance reclama, inclusivamente, uma 
reinterpretação do conceito de publicidade, conceito que foi quase por completo 
ignorado nas nossas reflexões precedentesxxxvii. Esse conceito deve ser definido 
partindo de um quadro de referência mais abstracto. Ele não pode ser mais 
considerado, unicamente, como qualidade (jurídica) de coisas, por referência a 
determinados lugares comuns, ou como uma espécie de atmosfera. Traduzido em 
termos sociológicos, publicidade quer dizer o mesmo que neutralização das exigências 
de papéis procedentes de subsistemas mais limitados da sociedade, e, por essa 
razão, um afrouxamento, se não mesmo a anulação, dos vínculos pessoais que o 
indivíduo contraiu, pelo seu comportamento, no interior de sistemas mais limitados. 
O conceito político de publicidade da Antiguidade tem muito claramente em mira a 
cidade, entendida esta como praças, coisas, temas e ocasiões comuns a todos, e 
exclui, dessa forma, tudo o que tenha a ver com casas particulares e famílias. Se 
considerarmos a história da evolução e do pensamento que operou a transição das 
sociedades arcaicas para as altamente civilizadas, torna-se evidente que o conceito de 
publicidade não se dirigia contra a personalidade humana singular, com a sua 
necessidade de uma esfera privada de intimidade – pelo contrário, o indivíduo só 
adquire a sua individualidade como ser humano no âmbito público de carácter político 
– mas, sim, contra as vinculações a papéis próprias das associações de família 
arcaicas. Estas, ao serem atingidas e restringidas, deixam de ser directamente 
relevantes para a constituiçãojurídica da sociedade. 
A retomada da ideia de publicidade na época do Iluminismo revestiu um significado 
idêntico. O conceito refere-se a uma sociedade mais ampla e mais fortemente 
diferenciada, exigindo, por isso, em termos mais abstractos, a anulação do particular 
no geral. Também, neste caso, se trata de um conceito de valor, cuja tónica não pode 
ser compreendida directamente a partir do significado atribuído a factos “públicos”, 
“abertos”, “claros”, “verdadeiros”, “legítimos”, “racionais”xxxviii, mas a partir do estádio de 
desenvolvimento da sociedade e dos seus problemas específicos, que o conceito 
simboliza. Este estádio revela a problemática consequente de uma sociedade 
fortemente diferenciada, nomeadamente, o facto de a integração da sociedade só ser 
possível mediante a neutralização das tradições particulares do sistema, das 
projecções das normas, das necessidades e dos interesses defensivos dos 
subsistemas da sociedade. Com isto, o conceito de publicidade volta-se, pela primeira 
vez, contra interesses políticos específicos, em especial os interesses de conservação 
do segredo. 
Desde então, o quadro geral da sociedade transformou-se mais uma vez. A 
diferenciação funcional da sociedade desenvolveu-se a tal ponto que se tornou 
altamente improvável uma integração da sociedade no seu todo mediante opiniões 
públicas sem qualquer ligação particular a um subsistema. Isto obriga a uma nova 
interpretação do conceito de publicidade com base na sua função, e a transferi-lo, 
assim, para os subsistemas; neste caso, para o sistema político da sociedade. 
Publicidade significaria, então, que o sistema político produz situações que 
possibilitam que a função de neutralização de situações públicas se concretize. 
Situações, portanto, em que as comunicações não são estruturadas por subsistemas 
não políticos da sociedade (por exemplo, famílias, grupos de pesquisa, bancos, clubes 
específicos de certos estratos sociais), nem tão-pouco pelas características de 
subsistemas mais restritos do sistema político (por exemplo, grupos de interesses 
particulares, partidos políticos, serviços públicos), mas, precisamente, pelos temas da 
opinião pública. 
Desta forma, o problema a ser resolvido pela “produção de publicidade” transfere-se 
para um terreno muito mais difícil. Já não pode ser resolvido, simplesmente, através 
de um determinado tipo de situações. Na verdade, aquela neutralização de exigências 
restritivas não pode ser alcançada, somente, pelo recurso a irrupções violentas, pelo 
recurso à mobilização e organização de massas, pela simples presença de muitos 
indivíduos, ou pela participação de delegados. As mudanças de situação deste tipo, 
contanto que não sejam institucionalmente preparadas, levam apenas a que a 
verdadeira comunicação se retire das situações publicamente acessíveis. O problema 
reside, antes, na estrutura dos temas do processo de comunicação política. A 
publicidade é um problema de institucionalização de temas da comunicação política, 
num sentido que deve ser elaborado de maneira bem mais precisa. Por isso mesmo, 
não se revela decisiva para a função da opinião pública a (inalcançável) “publicidade” 
de todas as comunicações políticas, mas sim a estruturação da totalidade da 
comunicação política, mesmo a não pública, mediante temas institucionalizados. 
Os temas podem ser considerados institucionalizados, se e na medida em que se 
possa supor a disponibilidade para deles se ocupar em processos de comunicação. A 
publicidade seria, portanto, a admissibilidade da aceitação de temas. A questão crítica 
é, então, a de saber por parte de quem e graças a que informação preliminar sobre o 
parceiro de comunicação. Pertence ao saber normal sobre a conduta da vida a 
capacidade de avaliar os interlocutores com base em temas possíveis, e os temas 
com base nos possíveis interlocutores. O tempo, o sexo, o futebol, as férias, os 
impostos, a exposição de quadros de um pintor na moda, os problemas da educação 
dos filhos, os acidentes rodoviários, os modelos de automóveis, o preço dos géneros e 
o poder de compra, etc., são temas mais ou menos públicos, na medida em que se 
pode escolhê-los sem saber muita coisa sobre o interlocutor, sobre a sua biografia, 
sobre as suas relações e a sua filiação política. Eles estruturam a comunicação 
quotidiana, sobretudo no que respeita a situações sociais em que já se dispõe de um 
interlocutor e importa encontrar um tema que se lhe adapte. Mediante a diferenciação 
de sistemas de comunicação com funções específicas, multiplicam-se, ao mesmo 
tempo, os casos em que já se dispõe de um tema e se procura para ele um 
interlocutor – por exemplo, pessoas que, tal como nós, investigam sobre a 
socialização, ou que gostariam, também, tal como nós, de pôr em discussão, encurtar 
ou, pura e simplesmente, abolir o estágio dos juristas. Descobrir interlocutores 
particularmente interessados é, naturalmente, mais difícil do que encontrar temas para 
interlocutores já existentes. O carácter público de um tema torna mais fácil, nestes 
casos, encontrar interlocutores. Não nos devemos dirigir apenas, por exemplo, a 
funcionários dos ministérios competentes, mas também a associações profissionais, 
partidos, personalidades políticas eminentes, ou mesmo ao público, através da 
imprensa. Pode, então, presumir-se que todos estes não rejeitarão uma comunicação 
sobre o tema em questão, por a considerarem inoportuna, e que, pelo contrário, a 
aceitarão. Os pontos de referência para a avaliação dessas disponibilidades sofrem 
uma redução considerável, e a necessária informação prévia torna-se, desse modo, 
simplificada – por exemplo, através de directivas organizativas, ou de imagens de 
papéis específicos do sistema. Não é preciso saber se o parceiro de comunicação é 
casado ou não, se tem ou não antepassados, se foi ou não oficial, se possui ou não 
acções. O conhecimento desses “outros papéis” do interlocutor conserva apenas um 
valor táctico. 
Enquanto os papéis não políticos na comunicação sobre temas políticos podem ser 
consideravelmente neutralizados pela opinião pública no interior do sistema político 
(pois pode admitir-se a sua irrelevância), o mesmo não se passa com a comunicação 
política fora do sistema político. Depende do tipo de institucionalização dos temas da 
opinião pública quem possa falar sobre eles, e como o fará, fora do sistema político. 
Este caso pode ser ilustrado através da diferença entre quadro (funcionário) e líder de 
opiniãoxxxix. Ambos são papéis que contribuem para o reforço e para a difusão de uma 
comunicação cujos temas são fixados fora do sistema político propriamente dito, ou 
seja, na vida quotidiana. A diferença reside no princípio constitutivo dos papéis – se o 
são por pertencerem ao sistema político e dele dependerem, ou se a sua consolidação 
assenta em estruturas não políticas (baseadas em estratos sociais, na instrução, na 
economia, na idade, na profissão, etc.). No último caso, a que Parsons fez referênciaxl, 
o sistema político permanece dependente do tipo e da distribuição da notoriedade 
social que se forma fora do sistema político. 
É evidente que esta diferença mantém uma relação com os temas do processo político 
de comunicação – portanto, com a opinião pública. A expectativa dos líderes de 
opinião de que um tema por eles “agarrado” possa ter ressonância e não deparar com 
uma rejeição vergonhosa apresenta um fundamento diferente, conforme os casos. Os 
líderes de opinião têm de ser capazes de pressupor um grau mais elevado de 
institucionalização dos temas políticos e acham-se limitados pelo seu papel na 
selecção dos temas possíveis, enquanto os quadros, sendo mais independentes da 
opinião pública, estão,no entanto, absolutamente dependentes de instruções políticas. 
Em caso algum é de esperar muita selectividade própria destes papéis formadores da 
opinião. 
Em suma, não se deverá sobrevalorizar a eficácia real da função da publicidade, 
enquanto grau de institucionalização dos temas, na mobilização de contactos 
comunicativos. O tempo e a atenção dos interlocutores relevantes, sobretudo dos 
muito influentes, são de tal maneira escassos que um possível tema, só pelo facto de 
ser público, nem por isso garante o êxito da comunicação. No nosso sistema político, 
este limiar é ultrapassado, na maioria dos casos, de uma maneira ainda muito primitiva 
– isto é, mediante o conhecimento recíproco anterior dos interlocutores, ou graças à 
notoriedade (importância) individual de quem inicia a comunicação. O início do 
contacto é, assim, facilitado pela circunstância de aquele que toma a iniciativa da 
comunicação sobre um certo tema saber que o seu interlocutor sabe quem o está a 
contactar e quais as consequências que pode ter a sua recusa em comunicarxli. Não 
será errado admitir que, na actualidade, a maioria das comunicações politicamente 
relevantes, desde que exijam uma interacção, pressupõem uma segurança mais ou 
menos forte no que respeita aos temas públicos e às relações pessoais; e que, na 
medida em que o próprio tema perde o seu carácter de publicidade, aumentarão as 
exigências de relações pessoais anteriormente estabelecidas. Na verdade, questões e 
pedidos de carácter muito melindroso só podem ser discutidos com amigos políticos 
da maior confiança. 
Finalmente, podemos utilizar a nossa definição de publicidade como admissibilidade 
da aceitação de temas para analisar os riscos específicos que a suposição de tal 
aceitação comporta. Dessa análise resultam elementos interessantes: parece ser difícil 
atacar essa suposição enquanto tal, pois isso significaria negar a comunicação sobre 
um tema e não apenas o consenso das opiniões. A rejeição da comunicação 
submeteria a dura prova a pertença comum ao sistema e, por esse motivo, dificilmente 
alguém se arrisca a assumi-la abertamentexlii. O carácter público da opinião serve 
como legitimação para forçar os próprios governantes à comunicação, se não mesmo 
para os manipular moralmente. O principal perigo que ameaça tal suposição provém 
de uma direcção inteiramente diferente, adequada ao sistema, ou seja, do próprio 
processo de decisão. Ele conduz a uma revisão dos temas da qual resulta, por fim, 
que nada há mais para dizer, ficando o tema arruinado como objecto de discussão. 
Pode-se, então, negar a disponibilidade para a comunicação, com o fundamento de 
que já se teria falado, ou, eventualmente, de que a questão já fora resolvida. Num 
sistema político dotado de um aparelho eficiente de tomada de decisões não devem, 
por conseguinte, ser indefinidamente formuladas hipóteses deste tipo. A publicidade 
permanece em movimento – aquele movimento que descrevemos como iteração de 
temas políticos. 
 
6. 
Passando em revista os aspectos materiais, temporais e sociais da opinião pública até 
agora debatidos, esta aparece-nos como um produto altamente complexo, devido à 
sua ordem de grandezas (número dos temas, durabilidade do fenómeno, número de 
participantes), mas sobretudo pelo facto de observarmos uma elevada variabilidade, 
embora não arbitrária, isto é, não uma dispersão puramente ao acaso. Existem, 
manifestamente, limitações estruturais quanto à compatibilidade e à variabilidade, ou, 
dito de uma maneira mais formal, quanto às condições restritivas de possibilidade da 
opinião pública. E estas condições não residem, simplesmente, nos conteúdos das 
opiniões que se possa ou não ter e que podem ser certas ou erradas, mas resultam 
antes do facto de a opinião pública estruturar um sistema social, o que pode acontecer 
de diferentes maneiras, mas não ao acaso. 
A confirmar-se esta suposição, tais limitações estruturais devem poder ser 
transformadas em considerações estratégicas; e delas devem poder derivar as 
condições gerais de um comportamento eficaz, assim como as diferentes 
possibilidades de participação no sistema. A sua representação pode ser articulada 
em termos aproximativos, se distinguirmos entre a possibilidade de contornar a opinião 
pública e a utilização táctica desta mesma possibilidade. 
A opinião pública pode ser contornada no processo político unicamente quando é 
possível evitar uma comunicação intensa com desconhecidos. Uma eliminação 
completa da opinião pública em assuntos de alguma importância poderia ser, hoje, 
muito difícil, a menos que se pudesse legitimar o segredo pelos organismos oficiais. 
Mais importantes são as estratégias de contorno parcial: o tema é efectivamente posto 
à disposição da opinião pública, mas só mais tarde, ou dando dele apenas destaque a 
determinados aspectos. Acontece, assim, muitas vezes, que determinadas intenções 
só são levadas ao conhecimento da opinião pública num segundo momento, quando a 
sua execução já foi assegurada mediante um contacto directo com as instâncias de 
decisão – quando, por exemplo, o ministro das finanças já autorizou o adiantamento 
de quaisquer fundos, a coberto do orçamentoxliii. Deste modo, os promotores de uma 
determinada questão podem evitar o risco de uma recusa pública, pois é como se já 
tivessem o sucesso garantido quando se apresentam ao público, mas precisamente 
por isso subtraem à discussão pública as linhas fundamentais do seu projecto. Uma 
outra estratégia de contorno parcial da opinião pública é mais típica da imprensa do 
que da esfera burocrática. Ela assenta na diferença entre temas e premissas; ou, mais 
rigorosamente, no facto de serem possíveis transferências no âmbito dessa diferença. 
As frases usadas para apresentar um tema podem ser formuladas de maneira a que 
as questões preliminares pareçam já ter sido respondidas, ou de maneira a subtraí-las 
à discussão, admitindo-as como evidentes: fala-se dos monopólios como se fossem 
prejudiciais; um novo tema é apresentado, conforme as circunstâncias, como melhoria 
das estruturas ou como uma mera táctica eleitoral. Esta estratégia serve-se da 
manipulaçãoxliv, pois, relativamente às suas premissas, a comunicação em causa é 
unilateral (sem possibilidade de resposta). Estes mecanismos de contorno da opinião 
pública, dado o grau inevitavelmente elevado de desatenção do público, possuem 
consideráveis possibilidades de êxito. O alcance político da opinião pública pode ser 
medido, entre outras maneiras, pelo grau de importância a partir do qual os temas já 
não podem ser submetidos à atenção do público por um tempo tão breve. 
Importa distinguir destes procedimentos, para uma melhor compreensão da opinião 
pública, as tentativas que visam trabalhar com ela, isto é, sem a contornar. O 
procedimento táctico que visa estimular os temas da opinião pública é, desde logo, 
dificultado pelo grau de atenção fortemente limitado do público. O que implica, tanto a 
necessidade de recorrer a outros meios, mais drásticos, para obter um aumento da 
atenção e para encorajar determinadas opiniões sobre o tema em questão, como o 
surgimento de problemas emergentes na transição de uma fase para outra. Uma 
solução relativamente inábil seria, por exemplo, a de despertar a atenção do público 
começando com o lançamento de prospectos e aparecer, logo a seguir, com dossiers 
e documentos de trabalho; nesta maneira de agir, dever-se-ia, pelo menos, proceder à 
substituição das pessoas que actuam nos dois momentos, o que pressupõe 
organização. Possibilidades de combinações mais abstractas, mas mais exigentes na 
sua execução, são oferecidas pela produção de pseudocrises, pseudonovidades ou 
pseudosintomasda vontade do eleitorado, que depois podem ser utilizadas como base 
de uma argumentação fundada em factos reais; mas isto, por sua vez, só é possível 
no caso de um número muito limitado de temas. Uma terceira possibilidade, a de 
provocar a comunicação de um político altamente colocado, não está ao alcance de 
todos e é, além disso, dificultada pelo facto de o político em questão, normalmente, 
saber e controlar muito bem o que sai da sua boca. 
A estas dificuldades, que resultam da diferença material entre regras da atenção e 
regras da decisão, acrescentam-se outras, relacionadas com a mobilidade dos temas. 
Um contributo decisivo para a mobilidade de um tema pressupõe, minimamente, que 
se conheça a sua história e situação e que se esteja ao corrente (ou se seja 
informado) dos seus últimos desenvolvimentos. Um indivíduo isolado só pode 
conseguir isso em relação a poucos temas, ou apenas com a ajuda de um aparelho 
que lhe forneça a “documentação” em cada momento necessáriaxlv. Com a 
mobilização dos temas, as exigências de uma comunicação dotada de sentido 
aumentam a um ponto tal que só podem ser satisfeitas num contexto limitado ou 
graças a uma preparação especial. 
Finalmente, também na dimensão social, que mediante a institucionalização do tema 
deveria ser assegurada como possível objecto de comunicação, emergem exigências 
particulares em termos de saber diferenciado e de habilidade táctica. A 
institucionalização do tema não garante ainda qualquer cooperação efectiva, e muito 
menos animada de sentimentos idênticos, no que respeita ao tema. No caso de temas 
conhecidos, pode, na verdade, supor-se o seu conhecimento, ou então a 
impossibilidade de confessar o seu não conhecimento, como base para a 
comunicação: solicita-se uma assinatura contra as leis que regulam o estado de 
emergência, sem que haja necessidade de explicar o que seja um estado de 
emergência e porque motivos dele se pode abusar. Desta maneira, porém, não se vai 
longe, não se consegue, sobretudo, consolidar determinadas opiniões e decisões. 
Para isso, importa poder ter uma visão de conjunto dos canais sociais através dos 
quais se difundem e consolidam as opiniões, bem como avaliar as disposições para 
investir num tema com determinadas opiniões. O que pressupõe um conhecimento 
muito concreto da cena política. 
Todos estes elementos tomados em conjunto conduzem a um resultado à primeira 
vista paradoxal: nas condições descritas, haverá que contar, no domínio da política, 
com uma multiplicação de possibilidades de comportamento e, simultaneamente, com 
uma restrição das possibilidades de participação activa. A problemática e a respectiva 
colocação de temas públicos no sistema de comunicação da política autorizam, em 
cada momento, uma pluralidade de lances tácticos, mantendo em aberto muitas 
possibilidades de desenvolvimento e convidando, assim, à actividade; ao fazê-lo, 
porém, submetem a acção comum a exigências que somente poucos estão em 
condições de satisfazer. No essencial, a produção, o aproveitamento e a retomada de 
temas da opinião pública tornam-se uma prerrogativa de políticos profissionais, 
especialmente preparados para o efeito. O que fora planeado como management by 
participation converte-se em participation by management, isto é, em participação 
daqueles que sabem valorizar politicamente as informações, as conjunturas, as 
ligações, o número de votos e, last but not least, a si próprios. 
Pode, então, perguntar-se que grupos sociais, nestas circunstâncias, terão 
oportunidades de participação que sejam mais do que passivas. Os militares, por 
exemplo, estão demasiado habituados a um ambiente social tranquilo, pobre em 
variáveis, para poderem actuar com êxito no sistema de comunicação política da 
opinião pública. Aos professores falta, em geral, a capacidade para se deixarem 
influenciar politicamente. Os estudantes são considerados como pessoas imaturas e, 
por essa razão, não são tomados a sério como emissores de comunicações. O 
significado político de tais grupos parece, por conseguinte, ser sintomático de uma 
política subdesenvolvida, na medida em que a comunicação política não atingiu ainda 
aquele grau de complexidade que seria necessário para uma adaptação constante ao 
nível de desenvolvimento da sociedade dos nossos dias. 
Confirma-se, assim, a nossa hipótese acerca da existência de uma relação entre 
diferenciação e complexidade dos subsistemas sociais. O aumento de complexidade 
depende da formação do sistema, e, portanto, da diferenciação socialxlvi. Por outro 
lado, vemos agora mais claramente que a própria complexidade crescente de um 
subsistema contribui para a sua ulterior diferenciação e estabiliza as suas fronteiras. 
Um comportamento dotado de sentido da opinião pública no sistema de comunicação 
exige a redução da elevada complexidade; e exige, sobretudo, a superação das 
barreiras do poder-viver-e-poder-agir-de outro modo dos outros, e torna-se de tal 
maneira sobrecarregado de exigências e dificuldades que torna necessário um 
recrutamento no interior do próprio sistema; e isto significa também uma socialização 
mais ou menos imperceptível no sistema. As posições e os papéis estranhos ao 
sistema oferecem, na melhor das hipóteses, possibilidades de acesso, mas nenhuma 
base suficiente para uma participação activa e duradoura na vida política. O que 
poderia levar a concluir que a opinião pública se teria, entretanto, reduzido a meio de 
comunicação interno ao sistema político, à linguagem usada pelos políticos nas suas 
relações, a instrumento dos truques com que se iludem reciprocamente, perdendo, 
assim, qualquer função social global; que a opinião pública, juntamente com o sistema 
político, se teria diferenciado, por assim dizer, do mundo da vida quotidiano, não 
especificado, da sociedade no seu conjunto. Tal seria, no entanto, um juízo apressado. 
A questão conduz a problemas muito complexos, até hoje insuficientemente 
esclarecidos, no âmbito da teoria geral dos sistemas sociais. Deles nos iremos ocupar, 
para concluirmos este trabalho – não para apresentarmos de imediato respostas 
válidas, mas para mostrarmos como uma compreensão adequada da opinião pública 
se acha dependente do desenvolvimento ulterior de uma teoria dos sistemas sociais 
muito mais abstracta. 
 
7. 
De uma maneira geral, os sistemas sociais são representados de modo demasiado 
concreto, podemos mesmo dizer reificado. A sua identidade, no entanto, não assenta 
numa relação natural entre seres humanos ou entre acções, mas em regras que 
delimitam fronteiras e estabelecem correlações que orientam a elaboração da 
experiência humana dotada de sentido. A diferenciação subsequente dos subsistemas 
sociais deve, por conseguinte, ser concebida como dependendo dessas tais regras de 
delimitação e de correlação que funcionam no conjunto do sistema socialxlvii. Daí que a 
diferenciação nunca conduza a um desenraizamento em relação ao contexto da 
comunicação social; ela deverá ser vista, de preferência, como reguladora deste 
contexto de comunicação, como estrutura que, mediante diferenciação (e não pelo 
recurso a barreiras internas intransponíveis), permite alcançar e controlar uma 
complexidade mais elevada. 
A diferenciação dos subsistemas (ou a crescente diferenciação interna do sistema 
social) não deve significar, portanto, que as relações causais ou comunicativas destes 
subsistemas com o respectivo ambiente social devam ser suprimidas ou mantidas 
dentro de limites relativamente estreitosxlviii. A identidade e a autonomia dos 
subsistemas não dependem do facto de estes comunicarem exclusiva ou 
predominantemente no seu interior; baseiam-se, antes, no carácter reconhecível e naobservância de regras segundo as quais as comunicações produzem operações 
selectivas e se enquadram em determinados sistemas, consoante o tipo e a direcção 
da selecção realizadaxlix. Por essa razão, a quantidade de comunicação e de 
dependência ou independência recíprocas entre os sistemas deve ser considerada 
uma questão aberta, a ser resolvida de maneiras diferentes, consoante as 
circunstâncias. 
Partindo de uma tal formulação da teoria dos sistemas, que não pode ser aqui 
suficientemente fundamentada, é impensável remeter exclusivamente a opinião 
pública para o sistema político. Existe, todavia, uma relação particular entre ambos, 
que deve ser esclarecida mais pormenorizadamente. 
Os temas, incluindo os temas políticos, da opinião pública são constituídos de uma 
forma relativamente independente do contexto (e, nessa medida, “abstracta”). Pode 
falar-se sobre eles não apenas no contexto de relações internas do sistema político, 
mas também no seio da família, em reuniões de conselhos de administração, nas 
mesas de tertúlia, nas prelecções universitárias, etc. É sabido, além disso, que um 
tema político pode ser tratado num contexto apolítico – por exemplo, pode saber-se da 
impossibilidade de abordar aqui e agora um determinado tema e pode admitir-se que 
sobre isso impere um certo consenso. A escolha de ocasiões e de temas, a direcção 
da sua articulação, o tempo que se gasta na discussão de temas políticos num sentido 
diferente daquele que lhe daria o sistema político são governados por uma consciência 
dos limites do sistema, que acompanha a comunicação. Graças à abstracção dos 
temas da opinião pública, é possível estabelecer a sua identidade e transmissibilidade, 
e abordar o tema de forma diferente, de acordo com o contexto do sistema. 
A estrutura dos temas da opinião pública comporta, por conseguinte, funções tanto 
diferenciadoras como integradoras e, consoante a complexidade social, deve 
apresentar o necessário grau de abstracção e especificação de temas relativamente 
independentes do contexto. Ao concluirmos este trabalho, esta função de mediação 
deve ser apresentada sob duas perspectivas diferentes, uma de natureza mais 
processual, a outra mais estrutural. 
A existência de temas políticos correntes, presentes na discussão, torna possível falar 
sobre o mesmo assunto em contextos políticos e apolíticos, e transferir opiniões de um 
contexto para o outro. A identidade do tema, na sua indeterminação aberta, abre 
amplo espaço a fáceis deslocamentos de sentido, que muitas vezes passam 
despercebidos. Assim, no caso do tema dos estudos sobre a paz, os políticos parecem 
pensar num determinado tipo de pesquisa, e os cientistas num determinado tipo de 
financiamento da investigação. O próprio processo de transmissão não reveste 
necessariamente a forma de uma comunicação que ultrapasse as fronteiras do 
sistema: o arcebispo telefona ao secretário regional da Educação e da Cultura, o 
presidente do sindicato ao presidente do grupo parlamentar de um partido. Esta forma 
de intercâmbio pressupõe uma correspondência complementar de papéis nos vários 
sistemas (e, na prática, a sua estruturação hierárquica). Ao lado desta forma de 
intercâmbio, existe uma outra forma de activação dos diversos papéis que uma 
mesma pessoa pode desempenhar: à volta da mesa de tertúlia formam-se as opiniões 
na base das quais os frequentadores definem as suas opções eleitorais; o desenrolar 
de um colóquio científico fornece ao professor informações, motivos e razões para 
oferecer ostensivamente os seus serviços à comissão consultiva de um ministério; 
durante a sessão de um conselho de administração, um dos seus membros oferece-se 
para pôr as suas relações de amizade com determinados políticos ao serviço de uma 
determinada causal. Nestes casos, as comunicações políticas e não políticas sobre 
temas políticos são mediatizadas por combinações de papéis. Para este tipo de 
mediação – e não apenas para a comunicação directa entre sistemas – é essencial 
proceder a uma pré-estruturação mediante temas da opinião pública. Igualmente, fora 
do sistema político, deve ser possível avaliar, embora com exigências muito mais 
reduzidas, que temas se podem tornar políticos, e talvez, também, qual o seu destino 
político, em determinadas condições. 
Considerando esta função de mediação, pode presumir-se que a estrutura dos temas 
da opinião pública é também, em última análise, o fundamento da diferenciação e da 
autonomia funcional do sistema político. Por outras palavras, a opinião pública deve 
estar em condições de poder tolerar a distinção entre política e não política, bem como 
uma relativa abstracção e incompreensibilidade dos pormenores dos processos de 
decisão política. Ela deve ser capaz de produzir temas que, apesar da elevada 
complexidade das interacções concretas presentes no contexto do sistema, possam 
desempenhar as funções de regra no que respeita à articulação permanente de 
expectativas significativas e possam traduzir as necessidades sociais em problemas 
susceptíveis de uma decisão política. O problema reside na relação entre a 
selectividade dos temas emergentes e a riqueza de possibilidades resultante do 
aumento progressivo da complexidade social. 
A concepção predominante, que remonta, em última análise, à antiga tradição 
europeia da filosofia social e política, apresenta um conceito de estrutura diferente e 
uma outra visão do problema. Segundo ela, a identidade e a autonomia do sistema 
político (considerado como sociedade ou como subsistema social) são constituídas 
através do domínio. O problema é, deste modo, definido no plano dos papéis, os 
quais, de direito ou de facto, estão em condições de dar e fazer cumprir ordens. 
Graças à importância atribuída ao conceito de papel na sociologia mais recente, esta 
opção conceptual, longe de ser reduzida, vê-se ainda mais reforçadali. A opinião 
pública pode então, tudo bem ponderado, assumir a função que o liberalismo lhe 
atribuiu, uma função de crítica e de controlo do domínio; entendida desta maneira, ela 
continua a ser um contrapoder que se não pode traduzir em papéis, ocupando uma 
posição desde o princípio subordinada. Nesta óptica, a selecção apresenta-se como 
repressão, sem ter em conta, de qualquer modo, que esta terá de se produzirlii. 
A questão que se levanta é a de saber se, dessa forma, não será fragilizado o plano 
estrutural que preside ao desenvolvimento dos nossos sistemas políticos e, 
consequentemente, da nossa sociedade. Ninguém contestará que existem papéis 
relacionados com o exercício do poder sob a forma de competências de comando ou 
de oportunidades que a prática consolidou. Este poder, no entanto, não pode ser 
concebido de forma adequada como causa, como vontade ou como interesseliii. No 
que respeita ao grau da sua liberdade, ele acha-se dependente das estruturas do 
sistema de comunicação onde exerce a sua actividade. A opinião pública não pode 
dominar nem substituir o detentor do poder. Não lhe pode prescrever o modo como ele 
deve exercer o poder. A sua relação com o exercício do poder não é uma relação de 
causa a efeito, mas entre estrutura e processo. A sua função não consiste na 
imposição da vontade – da vontade popular, essa ficção ingénua do pensamento 
causal – mas na ordenação de operações selectivas. 
Se considerarmos as sociedades e as suas esferas políticas funcionais como 
sistemas, a percepção do problema modifica-se. Concentra-se, então, na relação dos 
sistemas com o seu ambiente extremamente complexo e procurará explicar através de 
que estruturas e processos se torna possível uma compreensão dotada de sentido e 
uma redução daquela complexidade. As estruturas traduzem a complexidade das

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