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PONTA GROSSA - PARANÁ 2014 CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO PÚBLICA DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA A ação investigativa na perspectiva dos Direitos Humanos Latif Antonia Cassab CRÉDITOS UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA Núcleo de Tecnologia e Educação Aberta e a Distância - NUTEAD Av. Gal. Carlos Cavalcanti, 4748 - CEP 84030-900 - Ponta Grossa - PR Tel.: (42) 3220 3163 www.nutead.org 2014 Governo do Estado do Paraná Carlos Alberto Richa Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia João Carlos Gomes Secretaria de Estado da Família e Desenvolvimento Fernanda Bernardi Vieira Richa Secretaria de Estado da Administração e da Previdência Dinorah Botto Portugal Nogara Reitores Prof. Dr. Carlos Luciano Sant’Ana Vargas – UEPG Prof. Drª Nádina Aparecida Moreno – UEL Prof. Dr. Júlio Santiago Prates Filho – UEM Prof. Dr. Aldo Nelson Bona – UNICENTRO Coordenação Pedagógica Prof. Drª Solange de Moraes Barros – UEPG Prof. Ms. Liza Holzmann – UEPG Prof. Drª. Lenir Mainardes da Silva – UEPG Prof. Dr ª. Rosiléa Clara Werner – UEPG Prof. Ms. Adnilson José da Silva – UNICENTRO Prof. Drª. Vera Suguihiro – UEL Prof. Drª. Celene Tonella – UEM Núcleo de Tecnologia e Educação Aberta e a Distância Prof. Ms. Eliane de Fátima Rauski Prof. Ms. Cleide Aparecida Faria Rodrigues Nosso cotidiano está repleto de avanços tecnológicos, diferentes expressões culturais e mudanças sociais. Apesar de tantas novidades, nossa sociedade ainda convive com problemas básicos na área da saúde, da educação, assistência social, direitos humanos e tantas outras áreas. Por certo, de diferentes maneiras, os problemas vividos e noticiados tem estreita relação com a área da gestão pública. Diferentes explicações são dadas para o enfrentamento da questão social. Pensar e buscar alternativas às demandas sociais é uma tarefa dos gestores e funcionários públicos do Estado do Paraná. Assim foi criado o Curso de Especialização em Gestão Pública com ênfase em: Sistema Único da Assistência Social, Sistema Único da Saúde, Direitos Humanos e Cidadania, Gestão Escolar e Planejamento e Avaliação de Políticas Públicas oferecendo quinhentas e sessenta vagas aos servidores públicos das diversas secretarias envolvidas, e ainda duzentas e sete vagas a residentes técnicos com ênfase no Sistema Único da Assistência Social. O curso tem por objetivo habilitar profissionais já inseridos na área pública e egressos de diferentes áreas para atuarem em órgãos e empresas públicas, na prestação de serviços profissionais ou que pretendem trabalhar em projetos, convênios e serviços, no âmbito da administração pública. Um projeto construído a muitas mãos, coordenado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG, em parceria com a Universidade Estadual de Maringá – UEM, Universidade Estadual de Londrina - UEL, Universidade Estadual do Centro Oeste - UNICENTRO, Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – SETI, Secretaria de Estado da Família e Desenvolvimento Social – SEDS e Secretaria da Administração e da Previdência – Escola de Governo. Nosso desafio é colaborar na qualificação de gestores públicos para o Estado do Paraná, melhorando o planejamento, a execução e a avaliação das políticas públicas. Bom Estudo! Prof.ª Drª Lenir Mainardes da Silva (coord.da residência) Prof.ª MS. Liza Holzmann (coord.de tutoria) Prof. Drª. Solange de Moraes Barros (coord.pedagógica) PREFÁCIO Cassab, Latif Antonia C343 A ação investigativa na perspectiva dos direitos humanos / Latif Antonia Cassab. Ponta Grossa: UEPG/NUTEAD, 2014. 85p. Curso de Especialização em Gestão Pública. Direitos Humanos e Cidadania. 1. Direitos humanos. 2. Sistema Único da Assistência Social. Pesquisa ação. I. T. CDD : 323.4 Ficha Catalográfica Elaborada pelo Setor Tratamento da Informação BICEN/UEPG SUMÁRIO ■ PALAVRAS DOS PROFESSORES 7 ■ OBJETIVOS E EMENTA 9 A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO E CIÊNCIA 11 ■ SEÇÃO 1: A aventura do conhecimento: um roteiro de viagens 13 ■ SEÇÃO 2: O fazer ciência pela sociedade humana 22 ■ SEÇÃO 3: Século XIX e as novas tendências para a construção do conhecimento 30 ■ SEÇÃO 4: Século XX e as tendências para a produção do conhecimento científico 33 DESAFIOS DO CONHECIMENTO EM DIREITOS HUMANOS: DISCIPLINA, MULTIDISCIPLINARIDADE E INTERDISCIPLINARIDADE DO CONHECIMENTO 43 ■ SEÇÃO 1 - Disciplinaridade 47 ■ SEÇÃO 2 - Multidisciplinaridade 50 ■ SEÇÃO 3 - interdisciplinaridade 52 A PESQUISA-AÇÃO ENQUANTO UMA PROPOSTA INVESTIGATIVA EM DIREITOS HUMANOS 63 ■ SEÇÃO 1 - Pesquisa-ação: conhecer e agir 65 ■ SEÇÃO 2 - O fazer pesquisa-ação 69 ■ REFERÊNCIAS 83 PALAVRAS DA PROFESSORA A responsabilidade pelo conteúdo e imagens desta obra é do (s) respectivo (s) autor (es). O leitor se compromete a utilizar o conteúdo desta obra para aprendizado pessoal, sendo que a reprodução e distribuição ficarão limitadas ao âmbito interno dos cursos. A citação desta obra em trabalhos acadêmicos e/ou profissionais poderá ser feita com indicação da fonte. A cópia desta obra sem autorização expressa ou com intuito de lucro constitui crime contra a propriedade intelectual, com sanções previstas no Código Penal, artigo 184, Parágrafos 1º ao 3º, sem prejuízo das sanções cíveis cabíveis à espécie. Contextualizar sobre a ação investigativa na perspectiva dos direitos humanos traduz-se em um grande desafio. Desafio pautado na responsabilidade para com o conhecimento teórico – ou seja, o processo de ensino e aprendizagem de forma competente – sobre pesquisa no âmbito humano social, bem como a responsabilidade com as atividades empreendidas, nas quais incidem, sempre, uma postura ética. Mas não somente responsabilidades, mas prazer em se desvelar uma dada situação e/ou evento, que se encontrava escamotado e que através da pesquisa científica foi possível conhecer, ou como nos dizeres de Rubem Alves (1999, p. 132), O conhecimento prazeroso é aquele que nos abre as janelas do mundo. Como se a gente estivesse viajando, e fosse vendo árvores, riachos, campos, vacas, cavalos, pássaros, casas, caminhos, nuvens… Conhecimento prazeroso é aquele que coloca diante de nós os cenários do mundo, que vão dos ovos num ninho de beija-flor até galáxias a milhões de anos luz de distância. Diante dos cenários que o conhecimentos nos abre, os olhos e a alma ficam até abobalhados. Nesse caminho nos cabe apropriarmos de estudos que contribuam para delinear o objeto investigativo, elaborar o problema e objetivos de pesquisa. Mas não somente isso! Faz-se necessário planejar o desenvolvimento de todo esse processo de pesquisa, em outras palavras – a metodologia! A atividade de pesquisa se reveste de grande importância, principalmente por se constituir em instrumento de conhecimentos, os quais, por sua vez, subsidiarão propostas de intervenção. É preciso enfatizar que a pesquisa científica não se reduz a solucionar qualquer questão social, mas, através dos conhecimentos produzidos, oferecer subsídios para o agir de forma acertada. A realização desse empreendimento é resultado de minha jornada de estudos, no âmbito da academia, na condição de estudante e docente. Assim, o documento que ora apresento, tem como referência a ementa: “Direitos humanos em construção. A atitude investigativa como instrumento de formação em Direitos humanos. A produção de conhecimento na perspectiva dos Direitos Humanos. As expressões sociais, políticas e éticas dos direitos humanosno âmbito das políticas públicas.” Os objetivos do estudo encontram-se constituído por quatro unidades, com respectivas seções, sugestões de leituras, filmes e documentários, bem como algumas atividades a serem realizadas, além das referências bibliográficas. A primeira Unidade – A produção do conhecimento & ciência – relata sobre os tipos de conhecimentos, um pouco do contexto em que surge o conhecimento científico – o renascimento, o iluminismo – o período da modernidade. A segunda Unidade – Desafios do conhecimento em direitos humanos: disciplina, multidisciplinaridade e interdisciplinaridade do conhecimento – discorre sobre tais categorias teóricas e da contribuição delas em um processo investigativo. A terceira Unidade – A pesquisa-ação enquanto uma proposta investigativa em direitos humanos – discute a pesquisa-ação como estratégia para conhecer e intervir, enfatizando a questão da participação e do diálogo neste processo. Finalizando, desejo a todos, profícua e prazerosa leitura, na perspectiva que os conhecimentos apresentados contribuam para qualificar, sempre mais, o fazer pesquisa na perspectiva da materialização dos direitos humanos! Dr.ª Latif Antonia Cassab OBJETIVOS E EMENTA ObjetivOs • Relatar um pouco do contexto em que surge o conhecimento científico. • Discorrer sobre desafios do conhecimento em direitos humanos: disciplina, multidisciplinaridade e interdisciplinaridade. • Discutir a pesquisa-ação enquanto uma proposta investigativa em direitos humanos. ementa Direitos humanos em construção. A atitude investigativa como instrumento de formação em Direitos Humanos. A produção de conhecimento na perspectiva dos Direitos Humanos. As expressões sociais, políticas e éticas dos direitos humanos no âmbito das políticas públicas. A produção do conhecimento & ciência Latif Antonia Cassab Un id ad e I • Contextualizar o que é conhecimento e a relação que o homem estabelece com o objeto a ser reconhecido. • Tratar sucintamente da história da ciência. • Discorrer sobre as principais tendências teórico-metodológicas para a produção do conhecimento científico. ROteiRO De estUDOs ObjetivOs De estUDOs • SEÇÃO 1: A aventura do conhecimento: um roteiro de viagens • SEÇÃO 2: O fazer ciência pela sociedade humana • SEÇÃO 3: Século XIX e as novas tendências para a construção do conhecimento • SEÇÃO 4: Século XX e as tendências para a produção do conhecimento científico “Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo. Ao largo dos anos povoa um espaço com imagens de províncias, reinos, de montanhas, de baías, de naves, de ilhas, de peixes, de habitações, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer descobre que esse paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto.” BORGES, J. L. O fazedor. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995 12 UNIDADE I 13 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s PARA INÍCIO DE CONVERSA O homem desde sua origem tem se questionado sobre o mundo em que se insere – as questões da natureza, a sociedade e as sociabilidades que empreende consigo próprio. Enquanto sujeito cognoscente, questiona o mundo à sua volta, fazendo descobertas revolucionárias. Nesse sentido, a ciência e a produção do conhecimento revelam um contexto humano, um patamar de civilidade, nem sempre disponível a todos. Nesta Unidade, estarei expondo a vocês, de forma breve, conteúdos sobre as formas de conhecimento, como o senso comum ou empírico, o religioso ou confessional, o filosófico ou reflexivo e o científico. São maneiras de conceber um determinado evento e/ou objeto. Ainda, estarei relatando sobre a viagem histórica realizada pela ciência, a forma como, a partir das inúmeras tendências epistemológicas, se concebeu o sujeito e a sua realidade e o próprio conhecimento científico. Epistemologia: e·pis·te·mo·lo·gi·a (epistem- + -o- + -logia) substantivo feminino. [Filosofia] Ramo da filosofia que se ocupa dos problemas que se relacionam com o conhecimento humano, refletindo sobre a sua natureza e validade. Filosofia do conhecimento, teoria do conhecimento. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013. Disponível em: http://www.priberam.pt/dlpo/epistemologia. Acesso em: 15 mar. 2014. SEÇÃO 1 A AVENTURA DO CONHECIMENTO: UM ROTEIRO DE VIAGENS Quando discorremos sobre conhecimentos, uma primeira ideia que temos é: o que entendemos por conhecer? O que estamos compreendendo por conhecimentos? Sucintamente podemos conceituar a palavra conhecer como um processo, uma relação entre uma pessoa e algo que se pretende conhecer. Segundo o Dicionário Aurélio, conhecer é, entre outros sentidos, ter a ideia, a noção mais ou menos precisa de alguma coisa, ter grande prática em certas coisas. Ou seja, conhecer evoca se apropriar de um saber que até então não tínhamos! Segundo Cyrino e Penha (1992, p. 13), “[...] conhecer é elaborar um modelo de realidade [...], projetar ordem onde havia caos”. Nesta perspectiva, evidenciam-se três aspectos importantes para que haja a produção de conhecimentos: • o sujeito, enquanto ser que busca e/ou conhece (cognoscente); • o próprio objeto, a quem se dirige e/ou investiga o sujeito para conhecer; • a questão mental que se coloca como opinião, ideia ou conceito, resultado da relação sujeito-objeto e que passa a existir na subjetividade daquele que conhece. Na relação que se estabelece entre sujeito cognoscente e objeto a ser conhecido, articulam-se sentimentos e pensamentos, os quais se expressam através da linguagem. “Essa linguagem pode ser oral ou escrita, [...]. Falar, escrever e gesticular seriam maneiras elementares de o sujeito humano produzir e veicular informações, conhecimentos e saberes.” (CORREIA, 2011, p. 1). 14 UNIDADE I 15 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Cognoscente: cog•nos•cen•te (latim cognoscens, -entis, particípio presente de cognosco, -ere, conhecer) adjetivo de dois gêneros. 1. Que conhece ou tem a capacidade de conhecer. = COGNOSCITIVO substantivo de dois gêneros. 2. Indivíduo que conhece “cognoscente”. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013. Disponível em: www.priberam.pt/dlpo/cognoscente Acesso em: 04 mar. 2014. Através de sua subjetividade o sujeito cognoscente apreende de maneira dinâmica o novo conhecimento, registrando-o em suportes materiais, fazendo uso desses para se relacionar, interagir com outras pessoas e compreender os objetos com os quais convive e mesmo aqueles que possa existir em seu plano abstrato. A isso chamamos conhecimento, esse produto da inteligência simbólica humana por meio da qual o múltiplo ganha uma unicidade, a diversidade recebe certa harmonia e o vazio é preenchido por um sentido, sendo o principal deles, é o sentido existencial, a razão de ser da vida, o motivo pelo qual o homem e a mulher são, pensam, sentem, julgam, valoram, decidem e agem no aqui-agora de seu ser-estar no mundo. (CORREIA, 2011, p. 1). No entanto, nesse universo, há distintos tipos de conhecimentos, mas, o que os distingue? Esquematicamente podemos nos referir a diversos tipos de conhecimentos, os quais se encontram imbricados às diferentes formas de concebermos a realidade, no sentido de compreendê-la e explicá-la. Assim, nesse primeiro momento, vamos conhecer o que se entende por conhecimentos (no plural!) e o que os distingue uns dos outros, para em seguida,mergulharmos em outros cenários teóricos. Em outros termos, como os diversos tipos de conhecimentos se engendraram na evolução da sociedade humana. Um primeiro tipo de conhecimento, muito comum entre nós, é o conhecimento denominado como senso comum ou empírico. O conhecimento do senso comum, como todo conhecimento, produz informações sobre uma determinada realidade, no entanto, tais informações normalmente se prendem aos seus objetivos mais imediatos. Ora, mas o que isso quer dizer? O senso comum é resultado da relação empreendida pelo sujeito com o mundo. Importante destacar que o conhecimento do senso comum é uma construção que se inicia desde o nascimento e finaliza com a morte do sujeito; assim, tem como referência a vivência espontânea da vida de cada um. O sujeito ao nascer em um dado grupo social herda sua cultura, que serve de guia para o empreendimento adequado em suas relações sociais. Desta forma, é um conhecimento corrente e espontâneo de conhecer e que se produz na relação direta entre sujeitos e estes com objetos, situações. Suas principais características são: • primeiro, tal conhecimento não se distingue de outros conhecimentos, em sua veracidade, nem pela sua natureza com o objeto conhecido, o que o diferencia de outros conhecimentos é a base de procedimentos metodológicos, feitos para conduzir a relação sujeito-objeto; • seu processo de aquisição é assistemático, ou seja, não há uma organização nas ideias e experiências vivenciadas pelo sujeito, nem mesmo na expectativa de validar tais conhecimentos; • apresenta-se acrítico, não há um debate sobre sua veracidade ou não, simplesmente o aceite desse, ou não; • é superficial, ou seja, apresenta a aparência, sendo comprovado apenas estando junto das coisas: expressa-se por frases como “porque o vi”, “porque o senti”, “porque o disseram”, “porque toda a gente o diz” (FERNANDES, 2013) 1; • é sensitivo, demonstra as vivências, condições de ânimo e emoções do sujeito no cotidiano; • expressa-se como subjetivo, revelando a organização do sujeito frente suas experiências e conhecimentos, mas, também, pela situação de “por ouvir assim dizer”. 1 De acordo com FERNANDES, Marcello; BARROS, Nazaré. O senso comum ou a atitude natural. 2013. Disponível em: http://ocanto.esenviseu.net/apoio/scomum.htm. Acesso em: 02 jan., 2014. 16 UNIDADE I 17 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s A expressão senso comum designa, também, um conjunto de saberes e opiniões que uma determinada comunidade humana acumulou no decorrer do seu desenvolvimento. Sendo produto das experiências vividas por um povo ou por um grupo social alargado, esse saber comum constitui um património que herdamos das gerações anteriores e que partilhamos com todos os indivíduos da comunidade a que pertencemos. Fonte: FERNANDES, Marcello; BARROS, Nazaré. O senso comum ou a atitude natural. Disponível em: http://ocanto. esenviseu.net/apoio/scomum.htm. Acesso em: 02 jan. 2014. Outro conhecimento é o religioso, confessional ou teológico. Esse tipo de conhecimento origina-se na crença em alguma divindade, implicando o uso da fé. As pessoas acreditam, e as têm como verdades, as revelações feitas por Deus através dos homens. Desta forma, o que é revelado se apresenta como respostas às questões que o homem não consegue responder com os conhecimentos vulgar, científico ou filosófico. (Galliano, 1979). O conhecimento confessional apresenta como características ser: • valorativo– pois se fundamenta em proposições sagradas, ou seja, possui uma ortodoxia e escritos que se comportam como instrumento de fé, como a Bíblia (Novo e Antigo Testamento), no Cristianismo, a Torá, no judaísmo, o Alcorão, para os Islâmicos; • inspiracional – decorrente de sua condição valorativa, se expressa tal característica, ou seja, sua validade ocorre através de uma revelação/inspiração além do natural, de origem divina; • infalível – por ser valorativo se subentende sua característica inspiracional, ou seja, é decorrência de uma revelação fora do natural, de origem divina; • exato – por tais motivos, o conhecimento confessional é tido como exato e não sujeito a erros; • sistemático – pois busca identificar alguns sentidos no mundo, como origem, significado, finalidade e destino, e a relação com o criador divino; • não verificável – não se submete à verificação, pois depende da fé de cada pessoa. (LAKATOS; MARCONI, 2000). Importante considerar que: » tais características coadunam-se para que haja uma postura e adesão das pessoas a um ato de fé. (LAKATOS; MARCONI, 2000); » na história das religiões não existe um genérico certo ou errado, ou seja, não temos como afirmar se essa ou aquela religião de um povo é correta ou não, pois o conhecimento teológico sempre apresenta as características supracitadas. Pimentalab - Tecnologia, Política e Conhecimento. Cássio Hissa: entrevista sobre os desafios atuais da produção de conhecimentos Disponível em: https://pimentalab.milharal.org/2013/02/25/ entrevista-cassio-hissa Outra forma de conhecimento é o filosófico. Mas, como podemos compreender esse tipo de conhecimento? Muitos estudiosos do assunto expõem que o conhecimento filosófico baseia-se na especulação da realidade pela busca da verdade, através de questionamentos como: Quem é o homem? De onde ele veio? Para onde ele vai? Qual é o valor da vida humana? O que é o tempo? O que é o sentido da vida? Por isso, diz-se que tal conhecimento expressa uma atitude diante da vida, da realidade. Mas podemos, ainda, conceber tal conhecimento como resultado de um raciocínio, de uma reflexão. Em busca de respostas às questões formuladas por ele próprio, o conhecimento filosófico se apresenta ativo, racional ao empreender um 18 UNIDADE I 19 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s esforço em ir até as raízes das coisas, através de um rigor lógico para conhecê-las, em busca da verdade. Resumidamente suas características se constituem em ser: • sistemático – tem como fundamento a reflexão, como tentativa para solução dos problemas; • elucidativo – não tem como premissa explicar o mundo, mas esclarecer e delimitar os pensamentos, conceitos e problemas; • crítico – tudo deve ser analisado metodicamente, não aceitando nada sem prévio exame; • especulativo – através de uma atitude teórica, abstrata, busca envolver os problemas numa visão total, neste sentido, admite hipóteses e possibilidades para a compreensão de um objeto, questionando-o através de vários aspectos. Outro tipo de conhecimento é o científico. Mas, qual a natureza do conhecimento científico? O conhecimento científico é datado do século XVII, com a instauração da modernidade no ocidente. Naquela época, não havia a separação entre ciência e filosofia, mas ambas áreas do saber apresentavam-se com única – não que nos tempos atuais não haja um vínculo entre ciência e filosofia, ao contrário, este vínculo sempre se manteve. Havia uma interpenetração entre ciência e filosofia, mantendo-as em um vínculo comum, qual seja? A de questionarem a realidade quanto à felicidade humana. De modo geral, o conhecimento científico apresenta as seguintes características: > não é imediatista – ou seja, não se satisfaz com informações superficiais sobre uma dada realidade, mesmo considerando que tal informação seja útil;> é critica (de origem grega, kritikós) – procurar estar sempre julgando e corrigindo seus próprios resultados; > busca compreender ou explicar a realidade – quais os fatores que determinam sua existência; > generalidade – conhecendo os fatores que engendram dada realidade, deve-se garantir sua generalidade, conferindo o sentido de validade em outras situações; > a intersubjetividade na difusão de seus resultados – a garantia de que o conhecimento produzido está sendo posto em discussão e outros pesquisadores poderão ter acesso ao mesmo e empreenderem suas considerações, suas críticas; > não é dogmática – ou seja, o pesquisador ao relatar seus resultados, expondo-os aos seus pares, não pretende que os mesmos sejam reconhecidos como invioláveis, mas relata como os produziu, os procedimentos traçados para chegar aos resultados, ou seja, a apresentação do método denominado como científico. Mas, o que entendemos por método científico? O método apresenta-se na ciência como uma teoria e não como um ordenamento de passos, alcançando seus objetivos quando atende as seguintes etapas: → descobrir o problema ou a lacuna em um conjunto de conhecimentos — é preciso que o problema esteja enunciado com clareza para se passar à etapa subsequente; → exposição precisa do problema — ou, ainda, a recolocação de um velho problema, à luz de novos conhecimentos (empíricos ou teóricos, substantivos ou metodológicos); → busca de conhecimentos ou instrumentos relevantes ao problema (por exemplo, dados empíricos, teorias, aparelhos de medição, técnicas de cálculo ou de medição) — ou seja, exame do conhecido para tentar resolver o problema; → tentativa de solução do problema com auxílio dos meios identificados — se a tentativa resultar inútil, passa-se para a etapa seguinte; em caso contrário, à subsequente; → invenção de novas ideias (hipóteses, teorias ou técnicas) — ou produção de novos dados empíricos que prometam resolver o problema. (MARCONI; LAKATOS, 2000; JUNIOR, p. 13, 14). 20 UNIDADE I 21 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Assim, na pesquisa, o investigador não somente traça os caminhos a percorrer em busca de um determinado objetivo, mas explicita também os motivos que o fizeram escolher esse e não outro caminho. Deste modo, a escolha do método é uma questão teórica (do grego theoria), uma vez que tais fundamentos embasam pressupostos e modo de pesquisar. Nesta perspectiva, fundamentos diferentes determinam procedimentos diferentes para se alcançar o conhecimento. Mas exatamente o que são pressupostos? Os pressupostos são suposições prévias (antes de a pesquisa acontecer) sobre o quê? Basicamente os pressupostos e/ou suposições se relacionam a diversas condições, como: • o sentido que se atribui ao ser homem, as possibilidades deste conhecer determinado fenômeno e/ou realidade, como se constituem essas possibilidades e como poderão se dar; • concepção de sociedade e natureza que se tem; • através da concepção que se tem de homem, de sociedade e natureza, como se originam as ideias ou o saber da ciência, como ocorre o processo de produção do conhecimento. A definição de método nas ciências encontra-se vinculada à condição de um aparato metodológico, que subjaz a uma matriz teórica. Tal condição pressupõe uma pluralidade de tendências teórico- metodológicas que buscam fundamentar a produção de conhecimentos científicos em distintas áreas do saber. Nesse sentido, apesar da ciência estabelecer critérios, aceitos de uma maneira geral por todos os cientistas, como definidores de sua maneira de trabalhar (como a criticidade, por exemplo), os pesquisadores, de uma forma geral, realizam seus trabalhos para a produção de conhecimento de distintas maneiras, mas sempre referenciando a concepção que se possui de conhecimento científico. Isto ocorre porque os pressupostos a respeito do que seja o homem, a natureza e/ou a sociedade e o próprio modo de produzir conhecimento não necessariamente precisam ser os mesmos para todos investigadores. Desta forma, sugere-se discorrer sobre visões de ciência ou em tendências metodológicas. Esquematicamente, podemos conceber as etapas da produção do conhecimento científico como: Fonte: Autora, 2014. Fonte: Autora, 2014. 22 UNIDADE I 23 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s SEÇÃO 2 O FAZER CIÊNCIA PELA SOCIEDADE HUMANA As diferenças na forma de produzir e compreender o conhecimento científico encontram-se presentes no século XVII no surgimento da modernidade. No século seguinte, ou seja, XVIII, a ciência se constituía como uma extensão da filosofia – a epistemologia – e, no decorrer dos tempos, tem sido debatida e formulada a partir de diferentes fundamentos. Na epistemologia de Immanuel Kant, constavam-se os termos sujeito e objeto como dois polos envolvidos na produção do conhecimento, ou seja: ► o homem, disposto a conhecer algo, e, ► um aspecto da realidade a ser conhecido. Nesse contexto, o papel do sujeito adquire importância para se compreender a produção científica, “[...] uma vez que se refere à forma como o cientista (o sujeito) deve se comportar para produzir conhecimento, e, assim, revela pressupostos subjacentes a toda pesquisa” (CARVALHO et al., 2000, p. 5). Três perspectivas sobre o papel do pesquisador na produção do conhecimento se evidenciam com mais ênfase na história da epistemologia, vamos conhecê-las! 1.ª o empirismo: nesta perspectiva, o objeto detém a primazia em relação ao sujeito, em outros termos, a produção do conhecimento deve estar vinculada à forma como a realidade se apresenta ao pesquisador, assim, o sujeito assume papel passivo diante dessa realidade, pois a principal fonte do conhecimento está dada no objeto; 2.ª o racionalismo: nesta perspectiva, a ênfase encontra-se no sujeito ou em sua atividade em relação ao objeto, essa relação – sujeito e objeto – está permeada pela razão, ou seja, na capacidade humana de pensar, avaliar e estabelecer interações entre determinados elementos como fonte principal do conhecimento. Mas, qual a semelhança entre tais perspectivas? Empirismo ambas expõe uma separação entre sujeito e objeto; Racionalismo ainda, as perspectivas são denominadas como representacionismo e fundacionismo, pois ambas pretendem representar ou fazer referência à realidade tal como se apresenta, independentemente do sujeito que a investiga. Independente do ponto de vista do pesquisador existe uma realidade a qual deve ser conhecida pelo investigador através de sua percepção ou a razão. Ou seja, na perspectiva empirista, seja no racionalismo, o pesquisador faz parte do processo de produção de conhecimento, mas supondo-se que o objeto ou a realidade que se quer estudar existe por si só, fora e separado desse pesquisador. 3.ª perspectiva: o interacionismo, como o próprio nome indica, o conhecimento é produzido na interação que se estabelece entre sujeito e objeto. Os produtos da ciência, nesta perspectiva vinculam-se com a realidade na qual o pesquisador participa em suas práticas sociais. O que é importante considerar nessa perspectiva: a. a ciência enquanto prática social produz conhecimentos que revelam o aspecto cultural, ideológico de um lastro histórico de determinado grupo social; b. nesse sentido, o conhecimento científico detém historicidade, e, dessa forma, o interacionismo não se coaduna com a ideia daneutralidade. Em outras palavras, a perspectiva interacionista não apresenta a neutralidade científica, pois não concebe em seu processo o investigador purificado de suas condições de vida. Mas, qual é a historia da ciência? O surgimento da ciência está vinculado ao surgimento da sociedade moderna. Neste cenário, a ciência centraliza suas discussões em várias propostas e/ou tendência de fundamentação do conhecimento científico a partir de dois aspectos. Quais sejam? 24 UNIDADE I 25 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Um, sobre o papel do sujeito na produção do conhecimento, outro, à forma como a natureza e/ou sociedade é pressuposta pelas diversas tendências. A modernidade e os fundamentos do conhecimento científico balizam o fim do período da Idade Média; é marcado por grandes transformações da economia mundial, propiciadas em grande parte pelas descobertas geográficas. Um dos movimentos marcantes, com raízes no âmbito da Idade Média, que surge e se ramifica, através de um significativo número de pensadores é o renascimento, promovendo uma progressiva transformação no pensar e agir na sociedade. Maciejowski_Tower_of_Babel Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Maciejowski_Tower_of_Babel.jpg O Renascimento propunha a valorização da capacidade humana de conhecer e transformar a realidade. Esse se distingue da Idade Média e do período vindouro, a Modernidade – o período renascentista e o humanismo constituem um só movimento e são datados entre os séculos, de 1400 a 1500. O Renascimento instituiu uma nova arte, nova mentalidade e formas de ver, pensar e representar o ser humano e o mundo. Sucintamente, podemos elencar as principais características do Renascimento como: a) antropocentrismo (o homem como centro do universo): valorização do homem como ser racional e como a mais bela e perfeita obra da natureza; b) otimismo: os renascentistas tinham uma atitude positiva diante do mundo – acreditavam no progresso e na capacidade humana e apreciavam a beleza do mundo tentando captá-la em suas obras de arte; c) racionalismo: contrapondo à cultura medieval, que era baseada na autoridade divina, os renascentistas valorizavam a razão humana como base do conhecimento. O saber como fruto da observação e da experiência das leis que governam o mundo; d) humanismo: os humanistas eram estudiosos, sábios e filósofos, que traduziam e estudavam os textos clássicos greco-romamos. Os conhecimentos dos humanistas eram abrangentes e universais, versando sobre diversas áreas do saber humano. Com base nesses estudos, fundamentou-se à valorização do espírito humano, das capacidades, das potencialidades e das diversidades dos seres humanos; e) hedonismo: valorização dos prazeres sensoriais, carnais e materiais, contrapondo-se a ideia medieval de sofrimento e resignação. 26 UNIDADE I 27 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Renascimento O humanismo renascentista expressou-se como um movimento cultural, embasado nas culturas clássica, grega e romana, com o sentido de retomar suas formas literárias e artísticas e difundir os valores humanos que as fundamentavam, propiciando o nascimento de outra civilização, bastante distinta da anterior. Em outros termos, o humanismo se apresentou “[...] como um fenômeno literário e retórico no final do processo, quando se expande o novo espírito de época, voltado para o humano, buscando a dignidade humana no reconhecimento e na afirmação da liberdade.” (MEIER, 2009, p. 1). O humanismo constituiu-se de um movimento de regeneração, ou seja, à volta aos antigos, o renascer das origens e aos princípios autênticos, através de uma reforma espiritual, tendo o homem como foco principal. O Iluminismo Herdeiro do humanismo renascentista, o Iluminismo foi um movimento cultural, político e filosófico, também denominado como ilustração ou período das Luzes. Iniciou-se entre 1680 e 1780, em toda a Europa, originando-se na Inglaterra, porém, desenvolvendo-se e atingindo seu apogeu na França. Segundo Rouanet (1993, p. 203), o Iluminismo se apresentou, ao mesmo tempo, como um movimento de demolição global, sob a égide mútua da razão e da ciência: “[...] o Iluminismo é crítico por ser racional e Fonte: Linha do Tempo. Disponível em: http://antigo.rainhadapaz.com.br/projetos/historia/ linha_tempo/moderna/renascimento/textos/esquema/esquema.htm Acesso em 2 Fev. 2014 racional por ser crítico”. Com a desorganização e o caos socioeconômico e político do contexto feudal, a própria razão impelia à critica. Segundo Severino (1994, p. 108), o Iluminismo, pode ser compreendido como uma, [...] concepção filosófica de acordo com a qual o conhecimento se dá em função das luzes da razão e que só o conhecimento racional critico e a cientificidade emancipa o homem da superstição e do dogma, provendo seu progresso em todos os campos. Por extensão, é todo movimento político, literário ou cultural que se apoia nessa visão. Muitos de seus pensadores compartilhavam os mesmos interesses da classe burguesa, por sua vez, esses os apoiavam. Assim, o Iluminismo tinha várias criticas com relação ao Antigo Regime, como: o mercantilismo (intervenção na economia); o absolutismo monárquico (proteção à nobreza); o poder da igreja (verdades revelada pela fé). Apresentou-se como um dos instrumentos para repensar a posição do homem como sujeito da história, imprimindo à sociedade seu caráter antropocêntrico, alterando radicalmente os referenciais ideológicos e culturais das relações sociais do período. Através desses aspectos, os iluministas preconizavam: a liberdade econômica, ou seja, sem a intervenção do estado na economia; o avanço da ciência e da razão; o antropocentrismo; o predomínio da burguesia e seus ideais. Através de forte luta empreendida pela razão humana, o Iluminismo fez frente às condições sociopolíticas postas pela monarquia e igreja, procurando desvendar a explicação dogmática das relações do homem com a natureza, através da ciência e explicando a vida humana em sociedade, oferecendo possibilidades do próprio homem construir seu destino. A tradição religiosa e a autoridade perdem gradativamente seu caráter sagrado, assim como com os poderes estabelecidos (Igreja e monarquia), os pressupostos da autonomia social e individual entram em cena depois de um período de sombras da Idade Média, urgindo por novas teorias que explicassem a realidade e propusessem novas visões de mundo. Essas teorias seriam fundamentadas nos valores 28 UNIDADE I 29 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s da razão e do conhecimento / ciência como possibilidade de liberdade, de emancipação humana. Sob a influência das marcas iluministas “fomos emancipados” da crença no ato da criação, da revelação e da condenação eterna, encontramos por nossa própria conta a capacidade de aperfeiçoamento, de coragem, de vontade, de busca (LUIZ, 2006, p. 3). A superação do teocentrismo medieval, com a ênfase no homem e o racionalismo naturalista grego, constituiu “[...] o início de um processo de secularização, de emancipação das tutelas da religião e da Igreja, em direção a uma razão, a um conhecimento científico e a uma ação política moderna, radicalmente diferente das anteriores.” (MEIER, 2009, p. 1). Em umainterpretação histórica, ao elevar os valores humanos e ações políticas, o Iluminismo propiciou outro padrão civilizatório, sendo esse designado por estudiosos como um processo de “emancipação”. [...] a ideia iluminista propõe estender a todos os indivíduos condições concretas de autonomia, em todas as esferas. Em outras palavras, ela é universalista em sua abrangência – ela visa todos os homens, sem limitações de sexo, raça, cultura, nação – individualizante em seu foco – os sujeitos e os objetos do processo de civilização são indivíduos e não entidades coletivas – e emancipatória em sua intenção – esses humanos individualizados devem aceder à plena autonomia, no tríplice registro do pensamento, da política e da economia. (ROUANET, 1993, p. 33). Nessa perspectiva, o homem sente-se capaz de, por si só, descobrir o modo de funcionamento da natureza, com a mesma capacidade com que estava descobrindo outros povos, outros continentes, outras terras estrangeiras. Submeter-se à natureza aparece como o primeiro passo do projeto moderno de produção de conhecimento. O segundo passo, relacionado intrinsicamente ao primeiro, refere-se ao domínio e controle da natureza em benefício do próprio homem. Há uma procura, pelo homem, em produzir corretamente os conhecimentos, marcando o surgimento da ciência moderna, a qual tinha como principal objetivo a previsão da ocorrência futura dos fenômenos, previsão esta subjacente à elaboração das leis científicas. Mas, tal busca pelo conhecimento não foi um processo tranquilo. Havia, entre os estudiosos da época, divergências quanto a um otimismo epistemológico, ou seja, para muitos não era possível obter um conhecimento puro, destituído das vicissitudes ou caprichos humanos. No entanto, a base dada pela capacidade humana de conhecer-se a si própria, com autonomia, tornou-se hegemônica na modernidade. Assim, na ciência moderna, o problema central foi posto no método. Em outras palavras, sem determinada ordenação não é possível conhecer. “O problema dos modernos vai ser o ponto de vista filosófico, ou mais especificamente epistemológico, fornecer as bases seguras do conhecimento, desprovendo-o de erros advindos da falta de método, da ordem e medida necessárias ao correto proceder da razão.” (CARVALHO et al., 2000, p. 9). Na busca obsessiva pela superação do erro e contrária à parcialidade humana, os afetos e suas vicissitudes, a imaginação que destrói a diferença entre o real e o onírico, a influência dos interesses particulares (pessoais, culturais, grupais, etc.) na construção do conhecimento e contra a linguagem que carrega consigo os preconceitos do real, e, portanto, não consegue descrever a realidade tal como ela é, nasce a ciência moderna. Os primeiros modernos ao buscarem os fundamentos seguros do conhecimento, supõem que há uma unidade ou permanecia na natureza. Assim, ao indicarem as bases seguras para o conhecimento, apresentam, também, uma concepção de verdade: aquela comprometida com a valorização dos fenômenos. O termo positivo expressa o real por oposição ao quimérico, o útil em oposição ao ocioso. Significa também o contrário de negativo e indica tendência de substituir o absoluto pelo relativo. Disponível em: http://professorbical.blogspot.com.br/2012/11/o-positivismo-de- comte.html Acesso em: 19 dez. 2014. Nesse processo da busca pela verdade, estava posto a necessidade de uma purificação do sujeito produtor de conhecimento. Mas, será que era possível obter um conhecimento tão destituído de humanidade, ainda que feito em nome do homem e de sua transformação? 30 UNIDADE I 31 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s SEÇÃO 3 SÉCULO XIX E AS NOVAS TENDÊNCIAS PARA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO No raiar do século XIX surgem, com o propósito de compreensão das crises do conhecimento, as ciências humanas. Duas foram as tendências metodológicas que marcaram e configuraram profundamente a produção do conhecimento: o positivismo e o materialismo histórico-dialético. O positivismo, fundado por Augusto Comte, relacionou ao surgimento da sociologia, sendo seus fundamentos: • assim como a natureza é compreendida como um fenômeno natural e harmônica, a vida social também deve ter a mesma compreensão, ou seja, harmônica e natural; • constituída por um todo integrado por partes, a sociedade tende a se desenvolver naturalmente – nesse contexto, a ordem capitalista representaria a culminância da evolução da humanidade; • desta forma, as leis que ordenam a vida social devem ser naturais e invariáveis, portanto, independentes da vontade e da ação humana. O positivismo de Comte propunha para as ciências sociais o método que embasava as ciências naturais. Suas principais características eram: 1. Observação neutra, objetiva, desligada dos fenômenos, o que implica uma separação entre o sujeito produtor de conhecimento e seu objeto de estudo. 2. Valorização exclusiva do fato, tomado como aquilo que pode ser conhecido somente através da observação e da experiência. 3. Segmentação da realidade, ou seja, a compreensão da totalidade se dá pela compreensão das partes que a compõem. (CARVALHO et al., 2000, p. 25). Tal proposta, no entanto, apresentou algumas críticas, como: ► a valorização do fato, a partir de um constructo teórico, o qual serve para a análise dos fenômenos sociais, é um dos fundamentos criticados, pela ideia de harmonia na natureza e na vida social; ► outro, sobre as ideias de ordem e progresso, elaborado pela burguesia, e a integração perfeita do todo pelas partes, “[...] revelando um compromisso com o modo capitalista de se entender como o mais avançado dos sistemas sociais elaborados pela humanidade”; ► a forma rígida com que se concebe a natureza e o sistema social, impedindo de se perceber a realidade enquanto um processo. Quanto ao materialismo histórico-dialético concebido por Karl Marx, outra tendência metodológica se constitui a partir de uma série de influências, quais sejam: a. A dialética hegeliana, ou seja, o real existe como movimento contraditório e processual; a construção do conhecimento científico, portanto, deve ser feita nessa perspectiva. Pensar dialeticamente a realidade é desvendar os movimentos contraditórios que a compõem. O que diferencia Marx de Hegel é a concepção do primeiro de que é o ser social do homem que determina sua consciência e não, como afirma o segundo, sua consciência ou ideia. b. Feuerbach foi um segundo marco. Segundo a análise da religião feita por este autor, o homem se aliena quando atribui a entidades, que são criações suas qualidades e poderes que pertencem ao próprio homem. Surge, assim, uma concepção materialista e naturalista de homem. c. De A. Smith e D. Ricardo, Marx se apropriou da noção de valor do trabalho. d. Dos socialistas utópicos (Owen, Fourier e Saint Simon), Marx considerou a possibilidade de construção de uma abordagem científica da sociedade capitalista e de suas condições de superação. Este, aliás, é o cerne do trabalho de Marx. Em outras palavras, Marx busca estudar as leis que regem o desenvolvimento do capitalismo e indicam sua superação. (CARVALHO et al., 2000, p. 26). 32 UNIDADE I 33 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Quanto aos fundamentos do materialismo histórico-dialético, Marx os concebia como: ■ a base da sociedade e do próprio homem, é o trabalho. Através do trabalho o homem se relaciona com a naturezae com os outros homens de forma a produzir sua existência material, incluindo a compreensão material das formas de organização jurídica, política, artística ou outro tipo qualquer de ideia; ■ historicamente o homem se constrói. Ao realizar sua história, em determinadas condições, o homem se torna determinado e determinante da/pela natureza e por outros homens, à medida que transforma a natureza para satisfazer suas necessidades básicas e, nesse processo, cria novas necessidades que se transformam também; ■ o conhecimento científico constitui-se em uma forma de compreender e transformar o homem e a sociedade, o que implica a ausência de neutralidade da ciência, pois o que se está conhecendo sempre é uma determinada formação histórica, a partir de dado ponto de vista: o da classe explorada. O conhecimento que se pretende neutro é tratado como ideológico, isto é, são ideias produzidas pela classe que detém o poder e que são apresentadas como entidades, como verdades eternas, como universais a-históricos. Na verdade, trata-se de uma universalização de interesses particulares, ou seja, uma classe apresenta os seus interesses como sendo os interesses de todos os membros da sociedade. (CARVALHO et al., 2000, p. 27). ■ o conhecimento a-histórico se constitui como aparência, pois não revela suas condições históricas de produção. Desta forma, considerar a história e a dialética, pressupõe o alcance da essência dos fenômenos, revelando-os como inter-relacionados com outros fenômenos com os quais e a partir dos quais constituem totalidades dinâmicas. SEÇÃO 4 SÉCULO XX E AS TENDÊNCIAS PARA A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO No cenário do século XX, em específico em suas primeiras décadas, as propostas de produção de conhecimento científico encontravam- se vinculadas ao ideal de objetividade posto pela ciência moderna. O sentido iluminista apoiado na razão predominava. Outras tendências para a produção do conhecimento se impunham, como o empirismo lógico e a fenomenologia. Surgem outras tendências metodológicas: o neopositivismo, o estruturalismo e a fenomenologia, na perspectiva de manterem e aprofundarem, ao mesmo tempo, os fundamentos teóricos editados no nascimento da ciência moderna. A ênfase se coloca na questão da neutralidade da ciência, ou seja, a possibilidade da independência do sujeito com relação ao objeto investigativo. “Se o conhecimento não é neutro (como já propunha Marx), então a questão da produção do conhecimento científico não é só cognitiva, mas também ética e política.” (CARVALHO et al., 2000, p. 28). O neopositivismo, também denominado como empirismo lógico, teve como representantes principais R. Carnap, O. Neurath, H. Hahn e M. Schlick. Para esse grupo de estudiosos, conhecidos também como Círculo de Viena, a produção do conhecimento deveria fundamentar uma transformação racional da ordem social, a realidade. Duas condições são essenciais para compreensão do neopositivismo,”[...] a) trata-se de uma concepção empirista e positivista, isto é, só existe conhecimento legítimo baseado numa experiência empírica; e b) pela aplicação do método da análise lógica ao material empírico, busca-se o ideal da ciência unificada.” (CARVALHO et al., 2000, p. 28). A outra tendência, que surge no início do século XX é a fenomenologia, tendo como precursor F. Brentano (segunda metade do século XIX), porém, nessa tendência, seus princípios são elaborados por E. Husserl na primeira metade do século XX. 34 UNIDADE I 35 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Os estudiosos dessa tendência são: Sartre, Heidegger, Merleau- Ponty, Schutz, Poiret e Koyré, os quais foram influenciados pelo pensamento de Husserl. A fenomenologia, ao contrário do positivismo em voga no início do século XX, sobretudo como modelo metodológico para as ciências humanas –, e mesmo do cartesianismo, se opõe à separação entre o sujeito produtor de conhecimento e o objeto. (CARVALHO et al., 2000, p. 29). Inverso ao positivismo, a fenomenologia é contrária à separação entre o sujeito produtor de conhecimento e o objeto de pesquisa. Afirma que o conhecimento é o produto da interação entre o que o sujeito observa e o sentido que ele fornece à coisa percebida. O método fenomenológico busca a essência da experiência humana, conduzindo o pesquisador a refletir sobre a realidade e sobre a sua própria existência nessa instância. Assim, a prática reflexiva na análise fenomenológica das próprias experiências em um processo investigativo poderá ser utilizada como uma estratégia para o desenvolvimento do pensamento crítico e para a compreensão da teoria do conhecimento e da relação teoria-prática. (PSICOLOGIA, 2013). Dessa forma, não tem como se obter uma observação independente dos significados que o pesquisador atribui ao objeto investigativo. Em outros termos, o objeto, a realidade investigada se constitui a partir dos sentidos conferidos a eles pela consciência. Por isso se fala em fenômenos nessa tendência e em intencionalidade, ou seja, o fenômeno é algo que aparece para a consciência, que é sempre a consciência de algo. [...] a fenomenologia não admite que existam fatos que por si só garantem a objetividade da ciência. [...]. Para a fenomenologia, portanto, não existe fenômeno que não se dê no plano da intencionalidade da consciência. (CARVALHO et al., 2000, p. 30). A terceira tendência relacionada, sobretudo às ciências humanas, surge no início da segunda metade do século X, o estruturalismo. Inicialmente suas bases foram formuladas no campo da linguística, pelo estudioso Ferdinand de Saussurre. A partir da metade do século XX, C. Lévi-Strauss elabora uma perspectiva estruturalista para a análise de fenômenos culturais, constituindo, assim, uma tendência aos estudos da antropologia. Mas, o que é a estrutura? A estrutura se constitui em um conjunto de elementos, intercambiáveis que mantêm relações necessárias, funcionais entre si, ou seja, cada parte que participa do sistema concorre para a manutenção dos que lhe estão relacionados, cada parte tem uma função no todo. De uma maneira geral, o método estruturalista pretende alcançar leis universais que expliquem o modo de funcionamento dos fenômenos humanos. [...]. E são essas estruturas que, de forma inconsciente, controlam o comportamento humano. Nesse sentido, é alcançado o ideal de cientificidade para as ciências humanas, uma vez que, ao desvendar as estruturas, está-se enunciando leis gerais sobre o modo de funcionamento das sociedades humanas. (CARVALHO et al., 2000, p. 31). A liberdade, a criatividade e a historicidade humana, no estruturalismo, somente poderão ser compreendidas no cenário das determinações estruturais de cada grupo social. Assim, enfatiza-se a sincronia (dimensão estrutural) do que a diacronia (dimensão histórica). Outras tendências, final do século XIX e XX, manifestaram-se contrárias ao modo de conhecer da ciência moderna, constituindo-se em outros fundamentos de produzir conhecimentos. Para Husserl, os fenômenos são percebidos pela consciência e se referem à realidade dos objetos, ao que eles são. Mas, alcançar a essência de tais fenômenos requer um método (o fenomenológico). Assim, uma questão que se coloca é: Como a nossa consciência pode ter acesso à realidade? A responsabilidade com a produção do conhecimento envolve, portanto, aliar-se, continuamente, ao esforço de se alfabetizar cientificamente, seja sobre os grandes e/ou pequenos temas científicos, desde o ensino do primeiro ao terceiro grau.36 UNIDADE I 37 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Alfabetizar compreende ensinar a ler, mas adicionada à definição de Ciências, conforme Chassot (2003) conclui-se que a alfabetização científica significa ensinar a ler e interpretar a linguagem instituída por homens e mulheres para explicar o mundo. Para Freire (1980, p.111), [...] a alfabetização é mais que o simples domínio psicológico e mecânico de técnicas de escrever e de ler. É o domínio destas técnicas em termos conscientes. [...] Implica numa autoformação de que possa resultar uma postura interferente do homem sobre seu contexto. Nestas perspectivas, a alfabetização científica envolve não apenas o conhecimento de leitura, mas de interpretação da realidade, a competência técnica no sentido da intervenção humana no contexto em que se insere. Segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a importância de uma educação científica consiste em um dos fatores mais importantes para a realização do bem-estar econômico de uma nação. Em outros termos, a OCDE expressa a importância da “[...] capacidade de usar o conhecimento científico para identificar questões e chegar a conclusões baseadas em provas, de modo a entender e ajudar a tomar decisões sobre o mundo natural e as mudanças nele operadas pela atividade humana.” (SILVA, 2012, p. 50). A contemporaneidade democrática requer, além do exercício civil, cidadãos que disponham de conhecimentos consistentes para decidirem sobre temáticas que estão além do senso comum. Nesse desafio, algumas condições devem ser enfáticas, como o papel das mídias, ou seja, os meios de comunicação em massa, com a relevante função de expandir os veículos do noticiário científico, bem como qualificar o desenvolvimento profissional de seus agentes para uma atuação competente. Nesta perspectiva, espera-se manter bem informados os atuais interessados por ciência ou aqueles que a praticam, mas, necessariamente, investir na expansão de seu público. Outra condição, fundamental, refere-se ao sistema educacional brasileiro. A escola será tanto mais eficiente quanto mais estiver aberta às condições do país e do mundo em que vivemos. O interesse pelos problemas atuais que afligem a humanidade não poderá deixar de existir dentro da escola, na medida em que esta pretende formar pessoas para atuarem de forma construtiva na solução desses problemas; a civilização é instigada a superar o desafio da busca pelo conhecimento, pela democracia e pela educação universal, num caráter interdependente. (BIZZO, 2002, p. 307-314). O âmbito educacional deve se revestir de excelência no ensino e produção de conhecimentos, possibilitando a oferta de espaços de aprendizado e discussões através de professores comprometidos com a cientificidade. Finalizamos esta Unidade expondo, de modo sucinto, duas questões. Quais sejam? Expor os diferentes modos da produção da ciência, a partir de diferentes concepções teóricas, a relação sujeito-objeto de pesquisa nas diversas tendências no decorrer da história. Outra buscou retratar como a realidade era concebida por essas diversas tendências. Percebemos que as questões encontram-se imbricadas, ou seja, ambas são marcada por uma relação dialética. O produtor do conhecimento, no início das concepções teóricas da ciência, apresenta- se como um sujeito racional e livre, capaz de, por si só, elaborar pressupostos para a ciência – a autonomia é uma das maiores invenções do mundo moderno. A epistemologia – sua constituição e desenvolvimento – faz parte do mundo moderno até os dias atuais. Assim, percebemos o quanto a ciência é partícipe e resultado das condições históricas. Também, o conhecimento científico e seus produtos propiciam alterações na realidade social, de tal forma que, vinculados às determinações socioeconômicas, constituem- se em novas formas de vida e de sociabilidades. 38 UNIDADE I 39 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Sugestão de leitura GOHN. Maria da Gloria M. A pesquisa na produção do conhecimento: questões metodológicas. EccoS Revista Científica, v. 7, n. 2, p. 253-274, São Paulo, jul. – dez. 2005. MADURO, Otto. Mapas para a festa: reflexões latino americanas sobre a crise do conhecimento. Rio de. Janeiro: Vozes, 1994. A roda de leitura2 1 Disponível em: https://www.google.com.br/search?q=%22Roda+de+leitura%22+de+Agostin o+Ramelli&tbm=isch&tbo=u&source=univ&sa=X&ei=p2UrU-P7HMuNkAfO8IHIDg&ved=0CE 8QsAQ&biw=911&bih=429 Acesso em: 24 fev. 2 Inventada e projetada pelo engenheiro militar italiano, Agostino Ramelli, em 1588. “A roda da leitura consistia em uma roda giratória vertical, capaz de acomodar vários livros, a serem consultados por um leitor que podia voltar sua atenção de um para o outro sem sair do seu lugar.” BELLEI, Sérgio Luiz Prado. Hiper texto e literatura. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2012. P. 36-37. 1. Sinalize nas questões abaixo, a correta. 1.1 O processo científico pode ser guiado por distintos pressupostos, determinando procedimentos diferentes para alcançar o conhecimento. Mas, exatamente, sobre o que se referem tais pressupostos? I. O que é o homem, suas possibilidades de vir a conhecer a realidade e, se existem, quais são elas e como poderão se dar. II. As maneiras pelas quais a natureza e a sociedade são concebidas. III. O processo de produção de conhecimento, isto é, considerando determinada concepção de homem e de natureza e/ou sociedade, resta supor como se originam as ideias ou o saber da ciência, como deverá ser possível produzi-lo. ( ) I ( ) II ( ) III ( ) II, III ( ) III ( ) I, II, III. 1.2 Na história da epistemologia surgiram três perspectivas sobre o papel do pesquisador na produção do conhecimento. Quais são tais epistemologias? I. Empirismo e racionalismo: ambos pressupõem uma separação entre sujeito e objeto, isto é, partem do princípio de que existe uma realidade que independe do ponto de vista do pesquisador e que deve ser por este alcançada, seja tomando como sua via principal de acesso a percepção ou a razão. II. Empirismo e racionalismo, em ambos os casos, o pesquisador participa do processo de produção de conhecimento, mas supondo-se que o objeto ou a realidade que se quer estudar existe por si só, fora e separado desse pesquisador. III. Empirismo e racionalismo, ambos são também denominados como representacionismo e fundacionismo, uma vez que ambas pretendem representar ou fazer referência à realidade tal como ela, de fato, é, independentemente do sujeito que a estuda. IV. Outra perspectiva: o interacionismo, o qual indica que o conhecimento é produzido no quadro da interação entre sujeito e objeto. Nesta perspectiva, os produtos da ciência seriam os resultados das inter-relações que mantemos com a realidade, a partir de nossas práticas sociais. V. Na perspectiva interacionista, pressupõe-se um cientista “contaminado” pelas condições que determinam a sua própria existência como homem e pesquisador. ( ) III ( ) IV ( ) V ( ) II, III, V ( ) I, II, III, IV. 40 UNIDADE I 41 UNIDADE I A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Caça-palavras 1. Encontre no caça-palavras as seis características do conhecimento religioso. N A O V E R I F I C A V E L I O P E C L C F Z R Q U J X I U I E T P U M X R E X L B N O E U Y L V C FN L I L K O T K O X I N V I V O G T T Z A N I P I N L U D H V X Q B X V V T H Q F R R A V I H S E L H X P E D A D W T K T E B Q D L N A R Q L Y V I K A Z G L J D A E P S I I L V O R K M V U G Y D L B V N F O P O K R F G U K G H K E V C Q G L R C P L M Q I S K L T M N C A F I A R C Y N S Y Q Y K L V V L L Z R R W S P Z X P A F O S M Q P A I C P M C L Z H O C I T Á M E T S I S H U P F W B R D K A F I L R P Q E I R D L H Y F K C C O A R E S P E C U L A T I V O J C A R N V Z D T V J G P V H R I L T Z M H Z F S H H B C M G O C O C I T Á M E T S I S K Q N D J I I Q G O H I Y K B A F A T 2. Descubra no caça-palavras as quatro características do conhecimento filosófico. Desafios do conhecimento em Direitos Humanos: disciplina, multidisciplinaridade e interdisciplinaridade do conhecimento Latif Antonia Cassab Un id ad e II • Contextualizar a disciplinaridade enquanto categoria constituída sob diferentes perspectivas e formatos teórico-metodológicos. • Abordar a multidisciplinaridade constituída pela integração de conhecimentos. • Compreender a interdisciplinaridade como uma abordagem que busca a unidade do saber. ROteiRO De estUDOs ObjetivOs De estUDOs • SEÇÃO 1: Disciplinaridade • SEÇÃO 2: Multidisciplinaridade • SEÇÃO 3: Interdiciplinaridade 44 UNIDADE II 45 UNIDADE II A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s “Nada perturbará esse voo nas alturas, nem o monte selvagem, abismos e vertentes, abrem-se enfim o mar com enseadas ardentes, e meus olhos humanos fartam deslumbrados. [...] Ao homem, por nascença, é dado, nesta vida, deixar que a alma ascenda ao páramo a sonhar.” (GOETHE, 2003, p. 50). No atual estágio da sociedade, a produção de conhecimento em direitos humanos tem se instituído na pós-graduação, através de um esforço acadêmico, no sentido de fortalecer os laços, os vínculos e amarras para aprimorar, desenvolver, consolidar e dar fundamento ao debate sobre os direitos humanos no Brasil. Mas não somente. À medida que os direitos humanos comparecem à agenda política nacional, há uma demanda pelo engendramento de conhecimento com qualidade. Inúmeras organizações não governamentais e governamentais que atuam na promoção e defesa dos direitos humanos, no cenário nacional e internacional, requerem para seus quadros recursos humanos especializados. Em outras palavras, como importante ator em direitos humanos, as organizações não governamentais e governamentais passaram a exigir “[...] profissionais capazes de dominar informação qualificada, que inclui compreensão de instrumentos técnicos e metodológicos próprios do saber acadêmico e profissional produzido nas universidades e centros de pesquisa.” (ADORNO; BRITO, 2006, p. 1). A qualificação profissional em direitos humanos permite o refinamento de pareceres e a construção de cenários institucionais comprometidos com a participação nos processos de formulação e implementação de políticas públicas de proteção e promoção de direitos humanos. Assim, “[...] considera-se que o agir teórico, ético e crítico é de fundamental importância para o agir reflexivo transformador.” (BITTAR, 2008, p. VII). No entanto, se a produção do conhecimento em direitos humanos é questão fundamental para a instauração de outro patamar de civilidade – posto pela relação teoria e práxis – é preciso considerar o estágio em que se encontra a produção desse conhecimento. PARA INÍCIO DE CONVERSA No âmbito brasileiro, apesar da temática se vincular de forma progressiva e ampliada aos cursos de terceiro grau e na pós-graduação latu sensu, em diferentes formações profissionais, o mesmo não ocorre nos cursos de stricto senso – mestrados e doutorados. Mas, o que tal situação significa? Segundo Adorno e Brito (2006), significa a necessidade de superar alguns desafios. Quais sejam? O reconhecimento da indivisibilidade dos direitos humanos, pressupondo a superação de uma única ou restrita perspectiva para se investigar o campo de direitos humanos. Assim, um dos desafios postos à pesquisa nessa área se constitui no avanço teórico-metodológico, através do desenvolvimento conceitual da pesquisa teórica e da pesquisa empírica, expressa por objetivos delineados, com objetividade e precisão. “É sob esta perspectiva que se pode compreender questões de direitos humanos relacionadas à ecologia, ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável.” (ADORNO, BRITO, 2006, p. 2). O desafio se faz, então, em produzir pesquisas que possam, de alguma forma, tratar o assunto de modo concentrado, multidisciplinar e interdisciplinar. Mas, qual a distinção conceitual entre tais termos? Nos últimos quatro séculos, o desenvolvimento da ciência centrou- se no objetivo de compreender a natureza e os fenômenos vinculados ao mundo real. Nesse processo, o conhecimento foi subdividido em inúmeras disciplinas, as quais contribuíram para o avanço da ciência, em específico a ciência clássica, a qual faz uso de métodos, quase sempre ineficazes, para operar com problemas contemporâneos de maior complexidade. A ciência clássica, de modo geral, caracteriza-se por ser constituir em campos distintos, com teorias, objetos e métodos próprios de estudo. O modelo científico dominante até o final do século XIX se guiava pelo entendimento de que o conhecimento das partes constituintes de uma realidade conduz ao conhecimento do sistema como um todo, condição que resultou no saber especializado (as ciências) e aos especialistas (cientistas, técnicos) para soluções de ordem teórica ou prática. A partir do pós-guerra3,1surgiram outras ciências que se desenvolveram de forma diferenciada da ciência clássica, tendo como um de seus traços identificadores as práticas multidisciplinares, interdisciplinares necessárias para o desenvolvimento da pesquisa. 3 Conforme Judt (2008), o pós-guerra, na historiografia contemporânea, quase sempre se refere ao período entre 1945 e 1955, ou seja, após a Segunda Guerra Mundial. 46 UNIDADE II 47 UNIDADE II A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s Contudo, o conhecimento científico que se estabelece, com maior expressão a partir da segunda metade do século XX, não nega o valor da ciência clássica, tampouco concorre com ela. Mas, uma revolução iniciada na física veio questionar as ideias de ordem, separabilidade, redução e lógica clássica, transformando e alterando o paradigma científico vigente até então. Em seguida, vieram as ciências sistêmicas que reagruparam disciplinas em torno de um complexo de interações ou de um objeto que constitua um sistema, representando uma segunda revolução. (BICALHO, OLIVEIRA, 2011, p. 4). As inovações tecnológicas, nesse período, também contribuiriam para mudanças importantes no papel do conhecimento nas relações sociais, engendrando um novo paradigma, econômico e tecnológico, tornando-se a base da atual sociedade, e cujas principais consequências foram: [...] a despersonalização do conhecimento; a credibilidade do conhecimento, que, em alguma extensão, já não é possível ser provado pela observação do mundo; a fragmentação do saber, devido à grande quantidade disponível e ao desenvolvimento de diferentes padrões de ação e aceitação entre os campos e dentro de cada um; e a racionalização do conhecimento, exigida pela crescente complexidade do mundo atual e pela concepção ocidental empirista. (BICALHO, OLIVEIRA, 2011, p. 4). Nesse cenário, evidenciou-se a requisição, pela ciência, de novas abordagenspara a solução de situações complexas, principalmente nas interações estabelecidas entre o homem e os sistemas naturais, nas áreas de grande desenvolvimento tecnológico e no campo da competição econômica. Outras estruturas passaram a ser discutidas e desenvolvidas para compreensão de temas atuais, como a ecologia, os estudos da paz, a avaliação de tecnologia, as áreas do trabalho e do lazer, propiciando a aproximação entre as fronteiras do conhecimento na perspectiva de conduzir, com sucesso, os empreendimentos desenvolvidos pelas disciplinas. A multi-, a inter- e a transdisciplinaridade (apesar de existirem outras denominações e subdivisões desses termos)42ofereceram outros modos de pensar e fazer diferente da ciência clássica, colocando, para além do pensamento analítico reducionista, formas de investigação científica que possibilitem a compreensão de eventos e fenômenos em toda a sua complexidade. Os níveis de classificação das disciplinas constituem-se sob diferentes perspectivas e formatos, com empréstimos de teorias e de metodologias “[...] deslocamentos ou diluição de fronteiras entre os campos científicos envolvidos, sem uma distinção muito precisa dos limites entre esses níveis, dentro de uma “cadeia conceitual” sucessiva e crescente [...]”. (BICALHO, OLIVEIRA, 2011, p. 4). 4 “Os conceitos associados aos três termos aqui mencionados não são, contudo, únicos ou aceitos com tranquilidade pelos estudiosos. Eles foram assumindo significações diversas ao longo das últimas décadas, mantendo em comum a ideia de que representam movimentos que surgiram em resposta à fragmentação do conhecimento.” (BICALHO, OLIVEIRA, 2011, p. 5). SEÇÃO 1 DISCIPLINARIDADE Segundo Morin (2002), a expressão disciplina se deriva do conhecimento acadêmico-científico – esse oriundo no século XIX e, ao longo do século XX –, através do surgimento de vários ramos ou especializações no âmbito da ciência e, desenvolvendo-se, à medida do progresso científico da pesquisa. Também, pode se expressar como um coletivo de conhecimentos em determinada cadeira de uma instituição de ensino ou, simplesmente, uma matéria de ensino. Consonante a uma ampla perspectiva epistemológica Morin (2002, p. 37) apresenta a disciplina como, [...] uma categoria que organiza o conhecimento científico e que institui nesse conhecimento a divisão e a especialização do trabalho respondendo à diversidade de domínios que as ciências recobrem. Apesar de estar englobada 48 UNIDADE II 49 UNIDADE II A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s num conjunto científico mais vasto, uma disciplina tende naturalmente à autonomia pela delimitação de suas fronteiras, pela linguagem que instaura, pelas técnicas que é levada a elaborar ou a utilizar e, eventualmente, pelas teorias que lhe são próprias. Segundo Gusdorf (2006), a disciplina busca “[...] uma aproximação da realidade humana segundo a dimensão que lhe é própria, tendo o homem como centro comum”, revelando distintos padrões de organização e formalidade. Para Heckhausen (2006), a disciplina apresenta determinados critérios que permitem a compreensão de sua natureza, possibilitando aproximações ou as distinguindo uma das outras em seus aspectos, os quais nem sempre são muito bem definitivos, como: ► domínio material – constitui os objetos com os quais se ocupam, sendo que muitas disciplinas se sobrepõem a este domínio; ► domínio de estudo – apresenta aspecto específico de seu domínio material; ► nível de integração teórica – construção da realidade a partir de seus domínios em termos teóricos, ou seja, sua fundamentação teórica deve ser consistente e para abranger suficientemente para explicar e prever os eventos de seu domínio de estudo. Tal condição expressa a maturidade da disciplina, e se constituindo no critério mais importante para identificação de uma disciplina; ► métodos próprios – para apreender e transformar os eventos, denotando autonomia e aperfeiçoamento, os quais devem ser adaptados à natureza do domínio de estudo, com correspondência entre aplicação concreta dos métodos e as leis gerais no plano teórico; ► instrumentos de análise – baseiam-se em estratégia lógica, em raciocínios matemáticos e na construção de modelos de processos; aplicam-se a diversos domínios e são critérios neutros; ► aplicações – orientação para a aplicação e uso em atividade profissional; ► contingências históricas – situação pela qual a disciplina passa em seu processo de evolução histórica, com interferências internas em seu domínio de estudo quanto de forças exteriores. (HECKHAUSEN, 2006 apud BICALHO, OLIVEIRA, 2011). D’AMBROSIO, Ubiratan. Disciplinaridade. Conferência “Reflexos sobre os desafios da universidade no mundo globalizado e na sociedade do conhecimento”, set. 2009. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=4qDz_j6n7ZM Em outra perspectiva podemos acrescentar que as disciplinas se constituem por grupos de pessoas com determinadas metas intelectuais em comum, representando uma estrutura organizacional institucionalizada que negocia critérios, interesses e objetivos dos pesquisadores e dos setores de demanda, no âmbito da política científica. Sugestão de filme: Contato Direção de Robert Zemeckis e atuação central de Jodie Foster, Mattew McConaughey e James Woods. Disponível em: http://sementesdasestrelas.blogspot.com. br/2013/09/contato-filme-completo.html O filme em questão focaliza interações dialógicas entre porta-vozes de distintas formas de conhecimento (modo de pensar) acerca da possibilidade de vida inteligente fora da terra e mostra também as relações que se passam nos “bastidores” do processo de construção do conhecimento científico. [...] coloca em questão a hegemonia do paradigma da Ciência Moderna, trazendo à tona a convivência e simultaneidade de outros paradigmas construídos ao longo da história. Como diz Assmann (1996: 92-93): os paradigmas não existem apenas para explicar o mundo, mas para organizá-lo mediante o uso do poder [...] Além de humanamente necessários, historicamente relativos e naturalmente seletivos, os paradigmas tendem a territorializar-se. No filme, cada uma das formas do conhecimento é expressão do pensamento hegemônico (dominante) a cada momento na história do pensamento humano que, por sua vez, está articulado diretamente com suas condições de produção (econômica, política, social e cultural); e distingue-se das demais, fundamentalmente, pela natureza do conteúdo e forma discursiva. Vale dizer que argutas observações da sociedade contemporânea demonstram que todas as formas resistiram ao tempo e convivem contemporaneamente. SANTOS, Ana Cristina Souza dos; SANTOS, Akiko. Da disciplinaridade à transdisciplinaridade: obstáculos epistemológico. Disponível em: http://www. ufrrj.br/leptrans/arquivos/Da_disciplinaridade_transdisciplinaridade_ANPED.pdf Acesso em: 28 fev. 2014. 50 UNIDADE II 51 UNIDADE II A a çã o in ve st ig a tiv a n a p e rs p e ct iv a d o s D ire ito s H u m a n o s SEÇÃO 2 MULTIDISCIPLINARIDADE Inicialmente é importante enfatizar que muitos estudiosos do assunto, como Gusdorf (1990), Pombo (1994), Nicolescu et al. (2000), entre outros, compreendem o conceito da multidisciplinaridade equivalente à pluridisciplinaridade, tendo como principal característica a justaposição de ideias, nas relações em que ocorre esse tipo de abordagem. Segundo Nicolescu et al. (2000), a multidisciplinaridade corresponde à busca da integração de conhecimentos, através do estudo
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