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Resumo 
Aula-tema 2: A coerência textual e seus mecanismos 
 
Como você consegue entender um texto? Que conhecimentos precisa ter para 
atribuir sentido ao que lê? Você precisa saber o significado de cada palavra do 
texto para poder entendê-lo? Teria o texto um único sentido à espera de ser 
decodificado? O que faz você considerar um texto coerente ou incoerente? 
Para refletirmos sobre essas questões, vejamos a propaganda abaixo: 
 
 
Fonte: <http://broando.blogspot.com.br/2011/04/propangandas-criativas-2.html>. 
(Acesso em: 27 jul. 2012) 
 
O que faz você rir desta propaganda que não chegou ao público? Em nossa 
cultura, a sogra não é bem vista ou querida, principalmente pelo genro. 
Geralmente ela tem fama de fofoqueira, de uma pessoa que gosta de fazer 
intrigas e de se envolver no relacionamento do casal. Também sabemos que a 
palavra afiada pode ter dois sentidos, e por isso reconhecemos a ambiguidade 
proposital da propaganda, para reforçar a ideia do excelente corte da faca, 
proporcionado por uma perfeita afiação, melhor até que a língua da sogra. Foi 
possível julgarmos a propaganda como coerente, pois cruzamos nosso 
conhecimento linguístico com o conhecimento de mundo. 
Para julgar o texto acima, você, como leitor, tem uma papel fundamental, pois a 
coerência não está no texto, não é uma mera qualidade ou propriedade do 
texto, mas é resultado de uma construção feita pelos interlocutores, numa 
situação de interação dada, pela atuação conjunta de uma série de fatores de 
ordem cognitiva, situacional, sociocultural e interacional. Ela diz respeito ao 
 
modo como os elementos subjacentes à superfície textual vêm a constituir, na 
mente dos interlocutores, uma configuração veiculadora de sentidos. 
Quando dizemos que um texto é incoerente, precisamos esclarecer que 
motivos nos levaram a afirmar isto. Ele pode ser incoerente em uma 
determinada situação, porque quem o produziu não soube adequá-lo aos 
conhecimentos prévios do receptor, não valorizou suficientemente as 
características do contexto em questão, não obedeceu ao código linguístico, 
enfim, não levou em conta o fato de que a coerência está diretamente ligada à 
possibilidade de se estabelecer um sentido para o texto. O mesmo pode ocorrer 
do ponto de vista do leitor, se este descuidar-se dos aspectos citados neste 
parágrafo. 
Não é necessário que um texto tenha marcas linguísticas que estabelecem 
relações de identidade, retomada ou conexão entre seus termos para ser 
considerado coerente. Vejamos o exemplo abaixo: 
mulher, 
rua, 
multidão, 
trânsito, 
ruído, 
pressa, 
bolsa, 
perda, 
grito, 
polícia. 
 
Apesar de ser formado apenas por substantivos, podemos reconhecer no breve 
poema uma seqüência narrativa, cuja protagonista, uma mulher, no meio da 
multidão, provavelmente com muita pressa, ao atravessar uma rua bastante 
movimentada (trânsito) e com bastante barulho (ruído), perde sua bolsa. Ao 
percebê-lo, ela grita de desespero, e para socorrê-la, chega um policial. 
Poderia ocorrer alguma variação de leitura, pois em vez de perder a bolsa, por 
exemplo, a mulher poderia ter sido roubada no meio da multidão. Nosso 
conhecimento de mundo permite que associemos as palavras entre si e, por 
meio de inferências, imaginamos a situação, os participantes dela, a seqüência 
dos acontecimentos, bem como seu provável desfecho. 
 
 
Essa análise ilustra o que Charolles (1983) chamou de “princípio de 
interpretabilidade”, que diz respeito ao fato de os interlocutores, em uma 
determinada situação de interação, construírem um sentido para o texto, com 
base em elementos contextuais, principalmente os de ordem sociocognitiva e 
interacional. 
 
Tipos de coerência 
Como você já estudou, na leitura de um texto, e em sua consequente avaliação 
da coerência, o leitor recorre a diferentes estratégias, que variam em função do 
tipo de texto. Esse fato levou alguns autores (Koch e Travaglia, 1993; Savioli e 
Fiorin, 1999 e Van Dijk e Kintsch,1983) a criarem uma classificação dos tipos 
de coerência, como pode ser visto a seguir: 
 
a) Coerência temática: diz respeito à relevância e/ou pertinência dos fatos, 
ideias e eventos em relação ao tema ou tópico em desenvolvimento em um 
determinado texto. O produtor do texto, ao desviar-se do assunto por qualquer 
motivo, deve indicar isso ao leitor, por meio de inserções explicativas, 
avaliativas, retrospectos etc. Exemplo: 
 
Para o combate ao mosquito da dengue, toda a comunidade deve empenhar-se em 
manter o prato do vaso de plantas sempre com areia, manter fechadas as caixas 
d’água. Por falar nisso, faz dois anos que não limpo a minha. Voltando ao assunto, 
devemos armazenar garrafas e outros recipientes que possam juntar água em lugares 
protegidos da chuva. 
b) coerência pragmática: relaciona-se aos atos de fala, isto é, às ações que o 
autor pretendeu realizar ao compor seu enunciado desta ou daquela forma. 
Para que ocorram, esses atos devem obedecer a certas condições, sob pena 
de não se realizarem. Exemplo: 
O casal de adolescentes queria se casar escondido dos pais. Combinaram com o 
melhor amigo de se encontrarem na capela da cidade, às duas da madrugada. 
Chegado o momento, o aspirante a padre os abençoou e os declarou “marido e 
mulher”. 
Nesta situação hipotética, tanto para efeitos legais, quanto para efeitos 
religiosos, o casamento não ocorreu, pois o amigo não estava investido nem da 
autoridade de um juiz nem da de um padre ou pastor para realizar o ato de 
casar duas pessoas. 
 
 
 
 
c) coerência estilística: adequação do tipo de linguagem escolhido 
(formal/informal) ao tipo e gênero textual, à situação e aos interlocutores. 
Exemplo: 
 
 
Fala aí, mano 
O pessoal aí da nossa rua tá tudo reclamando das buraquera. Se o senhor que 
é prefeito não tomá as providencia nóis não vai votar mais em você. 
Té mais! 
Seu Pedrinho da Conceição 
 
d) Coerência genérica ou superestrutural: adequação à estrutura e 
característica típicas de cada tipo gênero e tipo textual. É imprescindível, por 
exemplo, que em uma narrativa haja, no mínimo, um conflito. Nos gêneros 
expositivos, informativos e argumentativos, espera-se uma sequência lógica na 
exposição das ideias, o desenvolvimento de argumentos consistentes e bem 
fundamentados. Exemplo: 
 
Minha mãe não pode estudar porque tinha que trabalhar quando era pequena. Eu 
continuei no mesmo caminho que minha mãe e também parei de estudar para 
trabalhar de empregada doméstica e ajudar minha mãe em casa. Eu me lembro que 
eu ficava triste quando via as outras crianças indo para a escola. É muito importante 
cada criança poder estudar. O governo tem que cuidar disso. Os filhos que eu vou ter 
vão poder estudar. 
 
Suponha que o exemplo acima tenha sido escrito para cumprir a tarefa de 
escrever um texto dissertativo sobre a importância do acesso à educação, ele 
estaria atendendo aos requisitos básicos de uma dissertação? 
 
e) Coerência semântica: refere-se à relação entre significados dos elementos 
das frases em seqüência em um texto ou entre os elementos do texto como um 
todo; o respeito ou desrespeito às relações de sentido entre os termos também 
se relacionam a esse tipo de coerência. Entra também na avaliação deste tipo 
de coerência, a contradição. Exemplos: 
 
1) "Precisa-se começar uma reciclagem mental dos humanos, fazer uma verdadeira 
lavagem cerebral em relação ao desmatamento, poluição e depredação de si próprio." 
(Pérolas do Enem) 
2) "Depois de algum tempo, a água corrente foi instalada no cemitério, para satisfação 
dos habitantes." (Pérolas do Enem) 
3) “Esta nova terapia traz esperanças a todos aqueles que morrem de cancro a cada 
ano." (Pérolas do Enem) 
O problema do 1º enunciado é a combinação inadequada entre os sentidos das 
palavras que a compõem, uma vez queafirma o “desmatamento, poluição e 
depredação de si próprio”. Desmatar, poluir e depredar são ações sofridas por 
seres inanimados ou por seres vivos como os vegetais, mas não por um ser 
humano. Nos exemplos 2 e 3, é contraditório que alguma ação seja realizada 
para a satisfação de quem já morreu ou para lhes dar esperança. 
 
f) Coerência sintática: refere-se aos meios sintáticos (gramaticais) utilizados 
para expressar a coerência semântica, tais como os conectivos (conjunções), 
pronomes, advérbios etc. Também relaciona-se à ordem dos elementos na 
oração, à escolha de palavras e a correta relação entre elas (regência verbal e 
nominal). Exemplos: 
 
1) Choveu porque a rua está molhada. 
 
2) O Brasil tem condições de ser o hexacampeão da Copa do Mundo, embora tenha 
muita técnica e garra para jogar bem. 
Em 1 e 2, os conectivos usados entre as orações não estão expressando a 
verdadeira relação de sentido existente entre elas e isso afeta a coerência. No 
1º caso, a rua estar molhada não é a causa da chuva como expressaria o uso 
do porque, mas sua conseqüência. No 2º caso, o operador “embora”, que 
expressa disjunção ou oposição, está sendo usado erroneamente no lugar de 
um conector que introduzisse uma justificativa como “pois” ou “porque”.

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