Buscar

Monografia Unipe Celia Maria Negociação e Síndrome de Estocolmo no Direito Penal 2015 (1)

Prévia do material em texto

0 
 
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE JOÃO PESSOA - UNIPÊ 
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E EDUCAÇÃO CONTINUADA 
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM CRIMINOLOGIA E PSICOLOGIA 
INVESTIGATIVA CRIMINAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
CÉLIA MARIA SILVA SANTOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A NEGOCIAÇÃO EM GERENCIAMENTO DE CRISE COM A INTERFERÊNCIA DA 
SÍNDROME DE ESTOCOLMO E OS REFLEXOS NO DIREITO PENAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
JOÃO PESSOA 
2015 
1 
 
CÉLIA MARIA SILVA SANTOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A NEGOCIAÇÃO EM GERENCIAMENTO DE CRISE COM A INTERFERÊNCIA DA 
SÍNDROME DE ESTOCOLMO E OS REFLEXOS NO DIREITO PENAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada à Pró-Reitoria de Pós-
Graduação e Educação Continuada do Centro 
Universitário de João Pessoa – UNIPÊ, como 
exigência parcial para a conclusão do Curso de 
Especialização em Criminologia e Psicologia 
Investigativa Criminal. 
 
 
Orientador: Ten Cel PMPB Dr. Onivan Elias de 
Oliveira 
 
 
Área: Direito Penal 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
João Pessoa 
2015 
2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
S237n Santos, Célia Maria Silva. 
A negociação em gerenciamento de crise com a 
interferência da Síndrome de Estocolmo e os reflexos no direito 
penal / Célia Maria Silva Santos.- João Pessoa, 2015. 
51f. 
 
Monografia (Curso de Especialização em Criminologia e 
Psicologia Investigativa Criminal) – 
Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ 
 
 
1. Negociação. 2. Gerenciamento de crise. 3. Síndrome de 
Estocolmo. 4. Direito Penal. I. Título. 
 
 
UNIPÊ / BC CDU – 343.549 
 
3 
 
TERMO DE RESPONSABILIDADE 
 
 
 
Eu, CÉLIA MARIA SILVA SANTOS, discente devidamente matriculada no 
Curso de Especialização em Criminologia e Psicologia Investigativa Criminal, 
matrícula nº 1411010079, declaro para todos os fins de direito e para salvaguardar 
na pessoa do meu Professor Orientador, Ten Cel PMPB Dr. Onivan Elias de Oliveira, 
bem como do Centro Universitário de João Pessoa/UNIPÊ, que a monografia 
intitulada “A negociação em gerenciamento de crise com a interferência da 
Síndrome de Estocolmo e os reflexos no direito penal” é autêntica e foi por mim 
produzida, submetida à avaliação técnica, correções gramatical e ortográfica, não 
constituindo cópia ou plágio de qualquer outra pesquisa acadêmica anteriormente 
realizada. 
 
 
João Pessoa, 22 de outubro de 2015. 
 
 
 
 
 
__________________________________________________________ 
 CÉLIA MARIA SILVA SANTOS 
 RG 3.061.477-5 SSP/SE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 
A Deus, pela força e proteção de cada dia. 
A meus pais, Vilomar e Lucivone, e a minhas irmãs, Juliana e Olga, por 
sempre acreditarem em meu potencial, pelo amor e pelo apoio imprescindíveis à 
concretização desta jornada. 
A meu orientador, Ten Cel PMPB Dr. Onivan Elias de Oliveira, pelos 
ensinamentos ao longo do curso de especialização, pela paciência e pela atenção 
dispensadas nessa última etapa. 
A Douglas, pela compreensão, pela perseverança, pelo estímulo e pelo amor 
indispensáveis aos longos períodos de aula e de elaboração da presente 
monografia. 
Aos colegas de sala, pela amizade construída ao longo desses quinze 
meses de estudo. 
Aos demais mestres do curso de especialização, pelo aprendizado 
concedido. 
Muito Obrigada. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
RESUMO 
 
 
 
 
A temática abordada no presente trabalho monográfico se resume à importância da 
atividade do policial negociador na contenção e resolução de uma crise, inclusive 
quando da presença da Síndrome de Estocolmo na casuística surgida, a qual pode 
trazer consequencias positivas e/ou negativas. O interesse em trabalhar a questão 
adveio da crescente demanda no uso da negociação em um evento crítico, mais do 
que a conhecida força tática das polícias militares, com o fito de contornar, ao 
máximo, a situação por meios pacíficos, a fim de se garantir e preservar os direitos 
de todos os envolvidos, sejam os do causador da crise, os dos reféns ou das 
vítimas, ou os dos policiais. Nesse contexto de busca da preservação da vida, 
principalmente dos reféns subordinados ao julgo dos seus captores, é que surge a 
problemática da Síndrome de Estocolmo, vista, pela ótica do negociador, como 
importante garantia da preservação da integridade física das vítimas reféns, 
contudo, pela ótica do aplicador do direito, como, por vezes, um empecilho no 
efetivo cumprimento da lei, pelo envolvimento que os reféns tiveram com os 
causadores do risco, ao ponto de tentar protegê-los de qualquer imputação 
delituosa. Diante disso, objetivou-se demonstrar a interligação existente entre o 
direito e a psicologia, presente na resolução de uma crise, e necessária no impasse 
da aplicação do direito penal, quando da interferência da Síndrome de Estocolmo. 
Para tanto, procedeu-se à farta pesquisa doutrinária e jurisprudencial acerca da 
identificação de uma crise, da dinâmica desenvolvida pelas polícias militar e civil 
brasileiras, com o fito de gerenciar o evento crítico, ressaltando a atividade do 
negociador, e do enfrentamento da temática da Síndrome de Estocolmo, que se 
torna aliada na preservação da vida de reféns, mas que pode também obstaculizar o 
trabalho do policial negociador – ocultando a realidade que rodeia as vítimas no 
epicentro da crise – e do aplicador do direito – impedindo que se alcance a 
imputação de crime ao causador do evento crítico. 
 
 
 
 
Palavras-chave: Negociação. Gerenciamento de crise. Síndrome de Estocolmo. 
Direito Penal. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
6 
 
ABSTRACT 
 
 
 
 
This research is focused on the importance of the police as a negotiator to solve and 
control a crisis, even when the Stockholm Syndrome is involved in a situation, which 
can bring positives or negatives consequences.The interest of this work came from 
the growing demand using negotiation in critical cases, more used than the military 
strategies, this method has the purpose to preserve the rights of all the people 
involved in the situation, such as the person the criminal, victims or the police, always 
using peaceful solutions in the situation. Searching for life preservation, especially of 
the victims that are subordinate to the criminal, it is important to talk about the 
problem of the Stockholm Syndrome, seeing from the perspective of the negotiatior 
as a guarantee of the physical integrity of the victims, however for those that are 
responsible to apply the law, the Stockholm Syndrome causes an obstacle to the law, 
because of the relation between the victims and their kidnappers, always trying to 
protect them from the law. The purpose of this research is to demonstrate the 
interaction between the law and psychology used in the solution of a crisis and 
required to apply the law when the Stockholm Syndrome interferes in the situation. 
The research of this project was based on case law, jurisprudence and in the 
interaction developed by brazilian military and civil polices trying to solve the critical 
situation,as a negotiatior. It is also important to point out the Stockholm Syndrome 
that can help to preserve the life of the victims but can also create an obstacle to the 
negotiator and for the law because it can hide the reality of the victims in the crisis 
situation. 
 
 
 
 
Keywords: Negotiation. Crisis Management. Stockholm Syndrome. Criminal Law. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
 
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................8 
2 A SEGURANÇA PÚBLICA E OS GRUPAMENTOS OPERACIONAIS TÁTICOS 
POLICIAIS................................................................................................................10 
2.1 AS POLÍCIAS MILITAR E CIVIL E SEUS FUNDAMENTOS .............................12 
2.2 A FORMAÇÃO DOS GRUPAMENTOS OPERACIONAIS TÁTICOS DA POLÍCIA 
MILITAR....................................................................................................................13 
3 O GERENCIAMENTO DE CRISE E A NEGOCIAÇÃO DE REFÉNS....................18 
3.1 A INSTALAÇÃO DE UMA CRISE E OS SEUS PERSONAGENS.......................18 
3.2 A ESTRUTURAÇÃO DO GERENCIAMENTO DE UMA CRISE..........................26 
3.3 A NEGOCIAÇÃO COM REFÉNS.........................................................................29 
4 A SÍNDROME DE ESTOCOLMO...........................................................................34 
4.1 HISTÓRICO.........................................................................................................36 
4.1.1 Assalto ao Kreditbank – Estocolmo, Suécia................................................36 
4.1.2 Sequestro de Patty Hearst – Califórnia, Estados Unidos............................37 
4.1.3 Sequestro de Natascha Kampusch – Viena, Áustria...................................37 
4.1.4 Sequestro de Patrícia Abravanel – São Paulo, Brasil..................................38 
4.2 CARACTERÍSTICAS E SINTOMAS PERCEPTÍVEIS DA SÍNDROME DE 
ESTOCOLMO............................................................................................................39 
4.3 REPERCUSSÃO DA SÍNDROME NA SEARA JURÍDICO-PENAL.....................42 
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................48 
REFERÊNCIAS..........................................................................................................50 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
O presente trabalho apresenta a conjuntura envolta da negociação de reféns 
em uma crise, desde a estruturação da organização policial para lidar com o evento 
crítico, até o enfrentamento da questão da Síndrome de Estocolmo, cujos reflexos se 
dão desde a crise instalada até depois do seu fim. 
O interesse nessa abordagem temática surgiu em virtude dessa delicada 
casuística que mais frequentemente vem sendo apresentada às corporações 
policiais, demandando destas um preparo específico para enfrentar os provocadores 
da crise, garantindo a sobrevivência destes e dos reféns. 
A relevância social se dessume do fato de que, mesmo diante de um 
potencial transgressor da lei, a garantia dos direitos fundamentais deste deve ser 
mantida, buscando-se a solução de uma crise da forma mais pacífica possível, 
através da negociação, pois assim preservará também, e na mesma proporção, os 
direitos constitucionais dos policiais e das vítimas. Já quanto à relevância 
acadêmica, a pesquisa se mostra como uma linha interpretativa da necessidade de, 
cada vez mais, o Direito se interligar com outros ramos do saber, como a Psicologia. 
O cerne dessa pretensa pesquisa gira em torno da importância em primar 
pela atividade do policial negociador, que em seu mister tem a incumbência de 
ponderar, de forma equilibrada, o direito e a psicologia, principalmente quando se 
deparar com o desenvolvimento da Síndrome de Estocolmo entre as vítimas, a qual 
pode se tornar um obstáculo à aplicação da lei penal aos provocadores do evento 
crítico. 
Para tanto, tem-se por norte que o gerenciamento de crise é uma atividade 
complexa, que envolve diversos setores da corporação policial, exigindo-se de cada 
grupamento designado a atuar no evento crítico um estudo aprimorado da casuística 
apresentada, visando à correta aplicação do direito durante a crise, ante o reflexo 
que essa atuação pode promover após o seu término e, em especial, no presente 
estudo, quando da incidência da Síndrome de Estocolmo. 
Nesse contexto, o presente trabalho monográfico objetiva, de modo geral, 
analisar o aparato policial que é erguido e designado para conter um evento crítico, 
com realce na atuação do policial negociador; e de forma mais específica, objetiva 
abordar o aspecto da interação entre o direito e a psicologia, demonstrada na 
presença de psicólogos durante o gerenciamento de uma crise, até no exame da 
9 
 
Síndrome de Estocolmo, cujos efeitos se prolongam para além do evento crítico e 
interferem de modo relevante na análise processual dos participantes do conflito. 
A linha metodológica a ser seguida, quanto à abordagem, é a dedutiva, 
partindo-se de formulações gerais procedentes de princípios reconhecidos na 
dogmática, para se chegar à lógica particular implícita nessa generalidade, de modo 
puramente formal. Quanto ao procedimento, segue-se o histórico-interpretativo, 
através da investigação, baseado na linha doutrinária e jurisprudencial de uma 
interpretação das leis e dos princípios jurídicos. E, por fim, a técnica de pesquisa 
utilizada é a bibliográfica, com abordagem qualitativa, através de consulta à doutrina, 
a artigos publicados, à legislação e à jurisprudência pátrias. 
É importante que seja trazido mais essa abordagem sobre a temática da 
negociação e da Síndrome de Estocolmo porque as polícias militar e civil brasileiras 
vem, cada vez mais, inserindo esse proceder mais pacífico – negociação – nas suas 
atividades, em consonância com o que já vem sendo desenvolvido, há tempos, por 
polícias outras, como a norte-americana, e, na medida em que mais se aprofundam 
no assunto, ou mais acervo bibliográfico é posto à disposição da corporação policial, 
melhor se desenvolve a sua atividade, bem como lhe é apresentada e ressaltada as 
consequências advindas de incidentes que podem ocorrer durante a crise – 
Síndrome de Estocolmo – com reflexos para além da casuística em que se 
desenvolveu. 
Nesse ínterim, o estudo sobre a negociação presente no gerenciamento de 
crise, com a interferência da Síndrome de Estocolmo e as implicações desta no 
ordenamento jurídico brasileiro se dá em três capítulos, sendo que no primeiro 
capítulo será evidenciada a atividade policial, com seus fundamentos e princípios 
norteadores, e as adaptações e evoluções necessárias diante da atual conjuntura da 
criminalidade. 
No segundo capítulo será abordada as nuances envoltas de uma crise, seu 
significado, seus participantes, sua classificação em grau de ameaça, com enfoque 
no gerenciamento do evento crítico e na importante, e cada vez mais constante, 
atuação do policial negociador na contenção da ameaça. 
E o terceiro e último capítulo tratará do significado da Síndrome de 
Estocolmo, apresentando os casos internacionais que mais relevância trouxeram ao 
estudo da Síndrome, evidenciando a interferência dessa doença na persecução 
criminal ao causador da crise. 
10 
 
2 A SEGURANÇA PÚBLICA E OS GRUPAMENTOS OPERACIONAIS TÁTICOS 
POLICIAIS 
 
Direito constitucional e fundamental assegurado aos cidadãos, tornando-se 
dever do Estado a sua efetiva prestação, a segurança pública vem sendo objeto de 
repetidas políticas públicas organizacionais, haja vistao contexto extremamente 
dinâmico em que se consagra. A Constituição da República Federativa do Brasil de 
1988 trata da segurança pública em seus artigos 5º, 6º e 144, a se ver: 
 
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, 
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a 
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à 
propriedade, nos termos seguintes; 
[...] 
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, 
a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a 
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na 
forma desta Constituição; 
[...] 
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade 
de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da 
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos. 
 
A crescente violência na sociedade brasileira, que tem suas raízes nos mais 
diversos motivos, dentre os quais a gritante desigualdade social que ainda impera na 
nação, vem “inovando” em cada nova constatação, seja em suas vítimas, seja nos 
gestos de atrocidades e meios aplicados. 
Soares (2003 apud DUARTE, 2014, p.16) assevera que: 
 
Hoje, o medo da sociedade não é ilusório nem fruto de manipulação 
midiática. O quadro nacional de insegurança é extraordinariamente grave, 
por diferentes razões, entre as quais devem ser sublinhadas as seguintes: 
(a) a magnitude das taxas de criminalidade e a intensidade da violência 
envolvida; (b) a exclusão de setores significativos da sociedade brasileira, 
que permanecem sem acesso aos benefícios mais elementares 
proporcionados pelo Estado Democrático de Direito, como liberdade de 
expressão e organização, e o direito trivial de ir e vir. (c) a degradação 
institucional a que se tem vinculado o crescimento da criminalidade: o crime 
se organiza, isto é, penetra cada vez mais nas instituições públicas, 
corrompendo-as, e as práticas policiais continuam marcadas pelos estigmas 
de classe, cor e sexo. 
 
E acrescenta: 
 
Indispensável é compreender que segurança pública é matéria de Estado, 
11 
 
não apenas de governo. Para ser responsabilidade superior precisa 
constituir-se como responsabilidade de todo o governo, não só das polícias 
e das secretarias de Segurança e de Justiça. A participação da sociedade 
civil é outro componente fundamental. (SOARES, 2003 apud DUARTE, 
2014, p.16) 
 
Consoante se destaca, a insegurança que assola a sociedade, e que não é 
atual, além de lhe privar de um de seus direitos fundamentais, tem obstaculizado a 
concretização de diversos outros, igualmente fundamentais, como a moradia, a 
alimentação e o próprio direito de ir e vir. 
Esta situação não é difícil de se encontrar. No seio das comunidades mais 
carentes de cada estado brasileiro, facilmente se constata a presença da “lei do 
silêncio” ou do “toque de recolhida” impostos, geralmente, por traficantes de drogas 
que dominam determinadas comunidades, ou das grandes “gangues” que 
conseguem estender suas atuações de dentro dos presídios até as comunidades, 
ficando em prejuízo e à mercê do medo o cidadão de bem. 
 
A segurança da sociedade surge como o principal requisito à garantia de 
direitos e ao cumprimento de deveres, estabelecidos nos ordenamentos 
jurídicos. A segurança pública é considerada uma demanda social que 
necessita de estruturas estatais e demais organizações da sociedade para 
ser efetivada. Às instituições ou órgãos estatais, incumbidos de adotar 
ações voltadas para garantir a segurança da sociedade, denomina-se 
sistema de segurança pública, tendo como eixo político estratégico a 
política de segurança pública, ou seja, o conjunto de ações delineadas em 
planos e programas e implementados como forma de garantir a segurança 
individual e coletiva. (CARVALHO, 2011, p. 60) 
 
Diante desse quadro, muito embora assegure a Constituição da República 
brasileira de 1988 ser dever do Estado a garantia da segurança pública, necessário 
se faz o desligamento com o modelo tradicional de policiamento para, em 
contrapartida, entrar em cena a implementação de mais ações conjuntas da polícia, 
do poder judiciário e da própria sociedade, a mais interessada. 
Bengochea (2004 apud CARVALHO, et. al., 2011, p.62) afirma que: 
 
A segurança pública é um processo sistêmico e otimizado que envolve um 
conjunto de ações públicas e comunitárias, visando assegurar a proteção do 
indivíduo e da coletividade e a ampliação da justiça da punição, 
recuperação e tratamento dos que violam a lei, garantindo direitos e 
cidadania a todos. Um processo sistêmico porque envolve, num mesmo 
cenário, um conjunto de conhecimentos e ferramentas de competência dos 
poderes constituídos e ao alcance da comunidade organizada, interagindo e 
compartilhando visão, compromissos e objetivos comuns; e otimizado 
porque depende de decisões rápidas e de resultados imediatos. 
12 
 
 
Foi nesse contexto de rupturas, mudanças de paradigmas, sistematização de 
ações pontuais fundamentadas na valorização do ser humano em todos os 
aspectos, considerando os elevados e inovadores índices de criminalidade que a 
própria corporação da Polícia Militar também realizou ajustes internos, dentre os 
quais, o surgimento dos grupos operacionais táticos. 
 
2.1 AS POLÍCIAS MILITAR E CIVIL E SEUS FUNDAMENTOS 
 
A Constituição da República brasileira de 1988 elenca como órgãos 
responsáveis pela segurança pública a polícia federal, a polícia rodoviária federal, a 
polícia ferroviária federal, as polícias civis, as polícias militares e os corpos de 
bombeiros militares, discorrendo, igualmente, sobre as funções de cada um. 
Concentrando-se mais os estudos nas polícias militares e civis, 
classicamente, à Polícia Militar cabiam os papéis repressivo, preventivo e ostensivo, 
enquanto que à Polícia Civil cabia, tão-somente, o papel investigativo, como auxílio 
à justiça. 
Contudo, Greco (2014) leciona que essa diferenciação vem sendo aos poucos 
mitigada, quando da constatação da flexibilidade das funções destes profissionais, 
como a atuação investigativa dos policiais militares, em um primeiro momento, ao se 
depararem com uma ocorrência policial, ou mesmo no auxílio à justiça, quando da 
realização de escoltas a presos em audiências judiciais - papéis estes entendidos 
como cabíveis apenas à polícia civil; bem como a atuação dos policiais civis junto às 
blitz realizadas por todo Brasil, em uma atitude preventiva de crimes, tais como o 
tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo - papel este, em tese, exclusivo da 
polícia militar. 
Nesse contexto, Lazzarini (1996 apud GRECO, 2014, p. 6) ensina: 
 
A competência ampla da polícia militar na preservação da ordem pública 
engloba, inclusive, a competência específica dos demais órgãos policiais, 
no caso de falência operacional deles, a exemplo de suas greves e outras 
causas, que os tornem inoperantes ou ainda incapazes de dar conta de 
suas atribuições, pois, a polícia militar é verdadeira força pública da 
sociedade. 
 
Todavia, seja na atividade repressiva, seja na preventiva, na ostensiva ou na 
13 
 
investigativa, os membros de uma corporação policial devem se nortear pela 
incondicional observância do princípio fundamental da dignidade humana e pelo fiel 
cumprimento da lei. 
De outra forma não se poderia esperar, haja vista seu dever constitucional de 
zelar pela segurança pública, muito embora a mídia, rotineiramente, tenha mostrado 
à população a escandalosa corrupção que também alcança as unidades policiais, 
como quando ocorre, por exemplo, a facilitação da entrada de materiais proibidos 
nas penitenciárias, a "troca de favores"com grupos criminosos e traficantes de 
drogas, ou mesmo a não prestação do serviço por propina. 
Fato é que, o respeito à dignidade da pessoa humana e, por extensão, aos 
direitos humanos, retira da corporação policial a imagem de combatentes violentos, 
de puro uso da força bruta, fazendo prevalecer o profissionalismo destes policiais, 
além de torná-los vistos como parte integrante da comunidade, desempenhando 
uma função social válida, e dando exemplo a demais membros da sociedade no que 
diz respeito ao cumprimento da lei. 
É nessa ótica que Lasso (2001 apud GRECO, 2014, p.15-16) assevera que: 
 
Pelo contrário, o respeito dos direitos humanos por parte das autoridades 
responsáveis pela aplicação da lei reforça de fato a eficácia da atuação 
dessas autoridades. Neste sentido, o respeito da polícia pelos direitos 
humanos, além de ser um imperativo ético e legal, constitui também uma 
exigência prática em termos de aplicação da lei. [...] os agentes policiais e 
serviços responsáveis pela aplicação da lei que respeitam os direitos 
humanos colhem, pois, benefícios que servem os próprios objetivos da 
aplicação da lei, ao mesmo tempo que constroem uma estrutura de 
aplicação da lei que não se baseia no medo ou na força bruta, mas antes na 
honra, no profissionalismo e na dignidade". 
 
Afora estes princípios, a conduta policial também deve sempre ser pautada na 
eticidade, servindo a comunidade e protegendo as pessoas com base na legalidade, 
razoabilidade, proporcionalidade e necessidade. 
 
2.2 A FORMAÇÃO DOS GRUPAMENTOS OPERACIONAIS TÁTICOS DA POLÍCIA 
MILITAR 
 
Em meados da década de 80, o Brasil começou a evoluir reconhecidamente 
para um Estado Democrático de Direito, após um longo período de recessão, com 
mudanças salutares e precisas à população que tanto sofreu com as agruras do 
14 
 
período militar, sendo um marco nesta década a promulgação da Constituição da 
República Federativa do Brasil de 1988. 
Contudo, aproveitando-se do terreno fértil de mudanças e evoluções, a 
criminalidade também se fez presente, com um “aperfeiçoamento” em suas ações, 
seja pelo poderoso armamento que começou a ser contrabandeado para as mãos 
dos criminosos, seja no modus operandi de suas intentadas, principalmente no que 
tange às sucessivas tomadas de reféns. 
Tornou-se notório tanto dentro das corporações policiais, quanto fora, na 
sociedade, que a polícia, ainda que com toda a sua prática e efetivo policial 
despendido, não estava obtendo êxito na contenção do crime, sendo surpreendidos 
com novos e mais potentes armamentos utilizados pelos bandidos, deixando à vista 
o despreparo físico e, por vezes, emocional daqueles combatentes, ante a 
inusitadas situações de violência que lhes apareciam. 
Pautados nessa nova ótica apresentada, bem como no anseio da população 
por maior segurança ante a violência urbana crescente, a qual disseminava mais a 
insegurança e intranquilidade, a própria polícia enxergou a necessidade de criação 
de um grupamento especial, no interior da corporação, o qual deveria ter um 
treinamento específico, incluindo materiais de combate mais tecnológicos, servindo 
de apoio residual às guarnições policiais, diante de novos enfrentamentos com 
criminosos. 
A diferença deste grupo especial já se iniciava pelo ingresso do candidato, o 
qual se dava pela voluntariedade. A vontade desvinculada de qualquer 
obrigatoriedade de adentrar em uma equipe onde a perseverança, equilíbrio 
emocional e comprometimento com os colegas de trabalho se tornariam o norte das 
atividades, incutia no candidato o sentimento de pertencimento que o fazia 
atravessar os pesados treinamentos, sempre com vista ao melhor preparo para o 
enfrentamento das circunstâncias em que seriam exigidas a presença desses 
grupos especiais, e ao êxito da equipe. 
Lucca (2014, p. 26-27) ressalta que esta consciência de estar em um grupo 
que lidará apenas com as situações mais inusitadas e que exigem muito mais do ser 
humano, encontra-se presente inclusive na Oração do Guerreiro do GATE, que diz: 
 
Ó Senhor meu Deus, dai-nos somente aquilo que vos resta, dai-nos a fome, 
dai-nos o frio, dai-nos o medo, mas dai-nos acima de tudo, ó Senhor; a fé, a 
coragem e a vontade de vencer. Uns têm, mas não podem, outros podem, 
15 
 
mas não tem. Nós que temos e podemos, agradecemos ao Senhor. 
 
E explica o significado da referida oração: 
 
Nessa oração estão contidos muitos atributos pertinentes e particulares de 
um homem de operações especiais. É no mínimo curioso pedir a Deus só 
algo que resta, uma vez que as coisas boas já foram pedidas pelos outros. 
Ao pedir a fome, a sede, o frio e o medo expressa-se de forma subliminar e 
alegórica estar preparado para qualquer adversidade. [...] Por outro lado, ao 
pedir a Deus a fé, a força, a coragem, a vontade de vencer, o guerreiro 
reconhece que há fatores não controláveis por ele, e que o risco é inevitável 
sendo, portanto, prudente manter o pé no chão e invocar o apoio de uma 
força superior ou pelo menos aceitar que ela exista. [...] o guerreiro 
reconhece a importância de seu pertencimento a um grupo que possui 
menos vagas em relação à quantidade de pessoas que desejam ingressar. 
Entre eles, apenas os melhores terão essa chance e, entre os melhores, só 
os que forem constantes em sua virtuosidade é que permanecerão. Não se 
trata de apenas querer, são necessários também alguns requisitos que nem 
todos possuem ou que nem todos podem desenvolver. (LUCCA, 2014, p. 
27) 
 
Como toda e qualquer conduta policial, os militares pertencentes aos Grupos 
de Operações Especiais também pautam o seu servir em princípios, fundamentos e 
mandamentos éticos. Betini (2014 apud GRECO, 2014, p. 340-341) elenca seis 
princípios das Operações Especiais: o da segurança, da simplicidade, da surpresa, 
da rapidez, da repetição e o do propósito, os quais sintetizam os objetivos buscados 
em cada operação policial. Quanto aos fundamentos e mandamentos éticos 
estabelece: 
 
Os fundamentos éticos, comuns aos Grupos de Operações Especiais, são: 
responsabilidade coletiva; fidelidade aos princípios doutrinários; 
voluntariado; dever de silêncio (o operador deve ser discreto em sua vida 
profissional e particular) e comprometimento. Esses fundamentos precisam 
ser absorvidos integralmente para a manutenção dos pressupostos éticos e 
morais do indivíduo e do grupo como um todo. 
Além dos fundamentos éticos, os mandamentos das Operações Especiais 
ajudam a manter o moral elevado. São eles: 1º - Agressividade controlada; 
2º - Controle emocional; 3º - Disciplina consciente; 4º - Espírito de corpo; 5º 
- Flexibilidade; 6º - Honestidade; 7º - Iniciativa; 8º - Lealdade; 9º - Liderança; 
10º - Perseverança e 11º - Versatilidade. (grifo do autor) 
 
Como cediço, em virtude do caráter especial destes combatentes, de atuação 
em missões pontuais que exigem destes uma constante atualização das mais 
modernas táticas de ação, o treinamento dos policiais é preparado com o fito de 
jamais estes combatentes agirem com base em “achismos”, com precipitações ou 
improviso, mas sim, de forma audaz, engenhosa, furtiva, com objetivo definido, 
16 
 
sempre com a seriedade e rigor técnico necessários, inclusive com o apoio sempre 
presente do grupo de Inteligência. 
Essa especificidade no treinamento já se inicia pela própria estruturação da 
sede do grupamento, a exemplo do COT – Comando de Operações Táticas da 
Polícia Federal, cuja sede dispõe de 
 
[...] estande de tiro iluminado com extensão de cem metros, estande de tiro 
coberto, pista de Cooper com 900 metros e múltiplas estações de atividade 
física, muro especial para treinamento com explosivos, pista de cordas, 
pista de obstáculos, heliponto, caixade areia, casa de tiro, torre para 
treinamento de técnicas em ambiente vertical, sala de recarga, auditório, 
setor de operações táticas (SOT), setor de estratégias táticas (SET), setor 
de inteligência, sala do grupo de assalto, sala de atiradores de precisão, 
academia de musculação, tatame, alojamento e setor administrativo. Existe, 
ainda, uma série de edificações em construção, como a cidade cenográfica 
com 1200m² e o tanque tático para treinamento de mergulho e operações 
anfíbias. (BETINI, 2014 apud GRECO, 2014, p. 336) 
 
O curso para formação de combatentes do COT, por exemplo, contempla 
diversas matérias, a se ver: 
 
Primeiros socorros; resgate de feridos; armamento e tiro; uso progressivo da 
força; combate corpo a corpo; Estágio de Combatente de Montanha do 
Exército Brasileiro em São João Del Rey, Minas Gerais; orientação e 
navegação terrestre; técnicas de abertura; técnicas em ambiente vertical; 
Curso Expedito de Operações Ribeirinhas da Marinha do Brasil, em 
Manaus, Amazonas; direção ofensiva; controle de distúrbios civis; técnicas 
e tecnologias menos letais; gerenciamento de crises; negociação; noções 
de tiro de precisão; retomada de edificações; retomada de ônibus; retomada 
de trem e metrô; retomada de navio (Rio de Janeiro); retomada de 
aeronaves (São Paulo); Estágio de Adaptação à Caatinga na CIOSAC, 
Polícia Militar de Pernambuco; abordagem e condução de cidadãos 
infratores; operações aéreas; paraquedismo; combate e sobrevivência na 
selva; salvamento aquático; sobrevivência na água; Estágio de Aplicações 
Táticas no BOPE, Polícia Militar do Rio de Janeiro; radiocomunicações; 
antiterrorismo e contraterrorismo; patrulha rural; patrulha urbana; noções de 
chefia e liderança; planejamento operacional e explosivos. (BETINI, 2014 
apud GRECO, 2014, p. 339) 
 
Consoante se expõe, o policial integrante de um grupo de operações 
especiais deve, antes de qualquer coisa, ter muita disciplina e aptidão para enfrentar 
um longo aprendizado físico e mental, desenvolvendo um alto controle emocional 
para o êxito das operações críticas a que são chamados, não esquecendo de 
sempre enaltecer o trabalho em equipe. 
 
Em linhas gerais, a gestão de pessoas nas tropas especiais é baseada em 
quatro requisitos: potencial, desempenho, competência e comprometimento. 
17 
 
Potencial e desempenho estão ligados à capacidade de entrega e às 
possibilidades de encarar novos desafios e até, no limite, de permanecer no 
grupo. Assim, quem tem alto potencial e alto desempenho está em 
condição, não só de permanecer no grupo, mas de se tornar sério candidato 
a uma promoção ou a um desafio maior. [...] entende-se por competência a 
capacidade de saber fazer, e por comprometimento, a virtude de querer 
fazer. (LUCCA, 2014, p. 58-59) 
 
Treinados, organizados e devidamente fiéis aos preceitos que norteiam a sua 
corporação, o policial integrante de um grupo operacional tático está apto a enfrentar 
agruras maiores e circunstâncias as mais complicadas possíveis, dentre as quais, a 
instalação de uma crise com a conseguinte tomada de refém por criminosos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
18 
 
3 O GERENCIAMENTO DE CRISE E A NEGOCIAÇÃO DE REFÉNS 
 
Um evento crítico, ou simplesmente crise, no passado remoto, não se 
caracterizava como uma situação apta a merecer um estudo e preparo singular por 
parte da Polícia, vez que se configurava de maneira esporádica e pontual, sendo 
contida, na maioria das vezes de maneira não muito efetiva, pelos policiais que 
eram, praticamente, "jogados" para a ocorrência com o objetivo único de findá-la, 
sem a estipulação de critério algum para a ocasião. 
Ocorreu que, com a crescente democratização dos Estados, e isso a nível 
internacional, não se tratando apenas do Brasil, os próprios criminosos 
acompanharam a devida adequação que a Polícia se enquadraria no que tange à 
preservação dos direitos de todo cidadão, aí se incluindo também o criminoso, 
sendo a "ordem maior" a garantia do direito à vida e à dignidade da pessoa humana. 
Com isso, um efeito inverso também se fez presente, qual seja o aumento da 
criminalidade e, consequentemente dos eventos críticos, devido a uma maior 
confiança dos transgressores das leis de que sairiam vivos das situações que deram 
causa, ainda que tivessem uma relativa perda de outros direitos a que lhes 
assistissem, vez que o próprio Estado lhes garantiria isso, devendo ser estritamente 
obedecido pelos comandos policiais. 
 
3.1 A INSTALAÇÃO DE UMA CRISE E OS SEUS PERSONAGENS 
 
O termo “crise”, segundo o Federal Bureau of Investigation (FBI), diz respeito 
a um “evento ou situação crucial, que exige uma resposta especial da polícia, a fim 
de assegurar uma solução aceitável” (GRECO, 2014, p. 152), ou também em bom 
português, “manifestação violenta e repentina de ruptura de equilíbrio” (FERREIRA, 
1999, p. 581). 
Destas sucintas descrições se verifica que uma crise se configura como um 
estado momentâneo, de duração não precisa e casuística, de ruptura de uma zona 
de conforto ou de equilíbrio de um ou mais indivíduos, que acarreta a mobilização de 
setores institucionais do Estado com o fim de conter o evento e garantir, na medida 
do possível, a volta da estabilidade que antes persistia. 
É importante ressaltar que, apesar de a grande maioria dos exemplos de crise 
vivenciados por autoridades policiais, bem como os mais corriqueiros exemplos 
19 
 
didáticos de um evento crítico, envolver um cidadão que, através dos mais variados 
meios e artefatos materiais, mantém um número variável de indivíduos sob o seu 
poder de comando, sejam estes reféns ou vítimas, durante um determinado lapso 
temporal, não só se entende por crise esta situação. 
Casos de iminente suicídio de uma pessoa, ou mesmo movimentos 
reivindicatórios dos mais variados pleitos, também são reconhecidos como 
potenciais situações de crise. Isso se dá ao fato de que o objetivo primordial do 
gerenciamento de crise, além da busca pelo equilíbrio anteriormente constatado, é 
preservação da vida dos cidadãos, sejam eles as vítimas, os reféns, terceiros não 
afeitos ao evento crítico, policiais pertencentes ao grupo de gerenciamento de crise, 
ou mesmo os próprios provocadores do evento crítico, e a aplicação correta da lei. 
 
A atuação do policial negociador ou gerenciador de crises, desde muito 
deixou de se voltar exclusivamente para criminosos contumazes, meliantes. 
Casos de suicídios, pessoas portadoras de psicopatologias graves, 
movimentos reivindicatórios que, por qualquer motivo, descambam para a 
violência ou o confronto, enfim, estão em sua área de atuação – e nesses 
casos, não cabe rotular como “bandidos” os causadores ou provocadores 
do evento crítico. (SALIGNAC, 2011, p.16) 
 
Nesse contexto, a crise se caracteriza através da presença de alguns 
elementos em comum, quais sejam a imprevisibilidade, a compressão de tempo e a 
ameaça à vida ou à integridade física das pessoas. 
A imprevisibilidade diz respeito ao elemento surpresa tão presente nas crises, 
muito embora haja ocasiões em que as autoridades competentes tenham condições 
de prenunciar a instauração de uma crise, como é o caso de rebeliões em presídios, 
onde há tempos os detentos não veem garantidos seus direitos enquanto 
encarcerados, situação que inevitavelmente levará a uma insatisfação parcial ou 
geral dos apenados, que pode descambar para uma crise. 
A compressão de tempo está intrinsecamente relacionada a outra 
característica essencial da crise: a ameaça à vida ou à integridade física das 
pessoas. Trata-se da urgência na resolução do conflito, justamente por envolver o 
tenso limiarentre a vida ou a morte de um ou alguns dos envolvidos no evento 
crítico. Quanto mais tempo se prolongar o gerenciamento e a negociação de uma 
crise, mais riscos correm todos os envolvidos, e a isto recaem as responsabilidades 
penal, civil e administrativa pelos resultados obtidos. 
 
20 
 
Além dessas características essenciais, uma crise pode apresentar outras 
características peculiares: 
a) Necessidade de muitos recursos para sua solução; 
b) É um evento caótico, de baixa probabilidade de ocorrência, mas graves 
consequências; 
c) Acompanhamento próximo e detalhado, tanto pelas autoridades como 
pela comunidade e pela mídia. (SALIGNAC, 2011, p.22) 
 
Verificando-se a presença das características elementares de uma crise, 
determinados critérios basilares devem ser apreciados e adotados durante a tomada 
de decisões para a contenção do evento crítico. A Academia Nacional do FBI, 
costumeiramente, elenca três critérios fundamentais: a necessidade, a validade do 
risco e a aceitabilidade. 
A necessidade diz respeito à tomada de decisões que sejam realmente 
indispensáveis ao bom andamento da negociação, ou mesmo da resolução do 
conflito. A validade do risco traz em si a ideia de ponderação entre os riscos 
advindos da decisão e os resultados obtidos. E a aceitabilidade traz consigo três 
elementares: a legal, a moral e a ética, assim sendo, as condutas praticadas pelos 
responsáveis no gerenciamento da crise devem ter um respaldo e aceitação legal, 
moral – no que tange a não ir de encontro à moralidade e aos bons costumes 
daquela sociedade – e ética – referente aos ditames das organizações policiais. 
Identificadas as características do evento crítico e os critérios de ação frente a 
este, didaticamente se passou a estabelecer uma classificação do risco de 
determinada crise e do correspondente nível de resposta, a fim de uma melhor 
dinâmica entre os envolvidos no gerenciamento da crise. 
O Tenente Coronel da Polícia Militar do Estado da Paraíba, Onivan Elias de 
Oliveira, doutrinariamente discorre acerca dos graus de risco de uma crise, como 
sendo o primeiro grau, ou alto risco, aquele em que a única vida em risco evidente é 
apenas a do causador; o segundo grau, ou altíssimo risco, aquele em que existe a 
presença de reféns; o terceiro grau, ou ameaça extraordinária, aquele em que existe 
a presença de explosivos independente da presença de reféns; e o quarto grau, ou 
ameaça exótica, aquela em que existe a presença de elementos químicos, 
biológicos, bacteriológicos, radiológicos, nucleares ou fenômeno da natureza. 
Correspondente a cada grau de risco, há o que o FBI adotou como níveis de 
resposta: 
 
21 
 
a) NÍVEL UM (correspondente à crise de ALTO RISCO): A crise pode ser 
debelada com recursos locais. 
b) NÍVEL DOIS (correspondente à crise de ALTÍSSIMO RISCO): A solução 
da crise exige recursos locais especializados (emprego do grupo tático). 
c) NÍVEL TRÊS (correspondente à AMEAÇA EXTRAORDINÁRIA): A crise 
exige recursos locais especializados e, também, no nosso caso, 
recursos da sede. 
d) NÍVEL QUATRO (correspondente à AMEAÇA EXÓTICA): A solução da 
crise requer o emprego dos recursos do nível três e outros, inclusive de 
organismos de outros países. (SALIGNAC, 2011, p. 30) 
 
Identificado o grau de risco de uma crise, bem como a resposta a ser dada, 
de acordo com os níveis estabelecidos, insta delimitar o papel de cada personagem 
envolto ao gerenciamento de crise. 
Greco (2014) elencou como sendo três os elementos fundamentais envoltos a 
um evento crítico: o perpetrador da crise, os reféns e os elementos operacionais. 
Dentro da categoria elementos operacionais estariam o negociador, o gerente da 
crise e o grupo tático. 
O perpetrador da crise nada mais é do que o indivíduo que, normalmente, 
vendo frustrada sua intentada delitiva, por qualquer razão, modifica seu objetivo 
primário e se volta para terceiros que passarão a ser seu alicerce na garantia de sua 
sobrevivência – ressaltando que há casos de crise instalada com apenas o 
perpetrador figurando no meio, como é o caso de suicídio. 
Os reféns seriam aqueles “que possuem valor real para o captor” 
(SALIGNAC, 2011, p. 16) e “não tem nenhum valor como pessoa para o 
sequestrador” (SOUZA, 2010, p. 66). Os indivíduos tomados como reféns não são, 
em regra, previamente delimitados e escolhidos, mas sim, fruto do inusitado, do 
elemento surpresa não esperado ou, ao menos, não devidamente evitado pelo 
causador da crise, quando de seu objetivo primário, a exemplo de um assalto a uma 
farmácia interrompido pela ação da polícia. 
Contudo, convém ressaltar que também há situações em que, isolada ou 
conjuntamente com os reféns, as vítimas também se fazem presentes e, em relação 
àqueles, guardam uma tênue diferença. 
 
“Vítimas” formam uma categoria que diz respeito àquelas pessoas 
capturadas e que não têm valor para os captores, sendo antes objeto de 
seu ódio: o captor busca eliminação física dessas pessoas ou danos à sua 
integridade. Uma vítima não tem outro valor para quem a captura, exceto o 
da realização dos desejos de seu captor. Diferenciar entre uma e outra 
categoria muda radicalmente os rumos táticos e técnicos de uma 
negociação. (SALIGNAC, 2011, p. 16) 
22 
 
 
É que, diferentemente dos reféns, as vítimas, quando não são a “moeda de 
troca” dos seus captores, são o próprio objetivo destes, o fim a que suas ações se 
destinam. Geralmente são exemplificadas por familiares do captor, companheira (o), 
desafeto, e são os “figurantes” do evento crítico que mais causam tensão entre as 
autoridades responsáveis pelo gerenciamento, principalmente pelo fato do 
menosprezo do perpetrador da crise em relação à vítima, quando não o ódio a esta, 
o que pode acarretar em consequências drásticas ao bom andamento das 
negociações. 
O negociador é o que se pode dizer de peça-chave da primeira fase do 
gerenciamento de crise. É quem intermedeia o causador da crise e o gerente desta, 
não se confundindo com a própria pessoa do gerenciador do evento crítico. 
Por vezes se faz auxiliar por um segundo negociador, ou negociador 
secundário, a quem incumbiria a produção de relatórios acerca do andamento das 
negociações, tomando por nota todos os sucessos e empecilhos constatados 
durante a tratativa com os perpetradores, e disso tudo dando ciência ao Grupo de 
Negociação. 
Fuselier (1988 apud SALIGNAC, 2011, p. 191-192) elenca as características 
fundamentais de um bom negociador: 
 
a) O negociador deve ser voluntário, preferencialmente um policial 
experiente e em excelente estado físico e mental; 
b) Deve ter facilidade para desempenhar tarefas cognitivas em estado de 
tensão; 
c) Deve possuir maturidade emocional, aceitar ser exposto a abusos, 
ridículo ou declarações insultuosas sem respostas temperamentais; 
d) Deve manter a serenidade quando os circundantes a tiverem perdido; 
e) Deve ser bom ouvinte; 
f) Deve ter excelente habilidade como entrevistador; 
g) Deve ser o tipo de pessoa que facilmente se torna digno de crédito; 
h) Deve ter habilidade para convencer os outros de que seu ponto de vista 
é aceitável e racional; 
i) Deve ter facilidade para se comunicar com pessoas de variados 
estratos sociais e econômicos; 
j) Deve ter bom raciocínio lógico, senso comum e ser experiente com o 
trabalho operacional (das ruas); 
k) Deve ter habilidade para manipular situações de incertezas e aceitar 
responsabilidades mesmo sem poder de mando; 
l) Deve concordar inteiramente com a doutrina básica da negociação; 
m) Deve aceitar o fato de que, se a negociação técnica por qualquer motivo 
não prosperar, e havendo risco de vida para envolvidos no evento 
crítico, deverá auxiliar na preparação daação tática. 
 
23 
 
Como já mencionado, ao negociador cabe a intermediação entre integrantes 
da crise, o que não se confunde com poder de mando, devendo sempre se ater às 
decisões e delimitações dadas pelo gerente de crise. 
Por demandar dessa autorização do gerente da crise, dos constantes envios 
e recebimentos de informações referentes aos indivíduos presentes no ponto crítico, 
a negociação se torna uma atividade dinâmica e, para tanto, necessita de um 
aparato especial, qual seja, o Grupo de Negociação. 
O grupo de negociação é composto pelo negociador principal, pelo 
negociados secundário – um auxiliar do negociador principal, podendo substituí-lo –, 
pelos consultores, sejam estes psicólogos ou psiquiatras, e pelo chefe de equipe. 
Aos consultores cabe a difícil tarefa de repetidas vezes avaliar o negociador, vez 
que o mesmo se encontra em uma situação de tensão, suscetível a humilhações, 
que podem propiciar uma fraqueza e derrubar toda a sistemática do gerenciamento 
e negociação em crise. Ao chefe de equipe caberia o mister de organizar o grupo, 
delimitando tarefas e mantendo contato com os demais grupos presentes no evento 
crítico. 
O gerente da crise, como bem assevera Greco (2014, p. 158): 
 
É o encarregado de comandar todas as operações necessárias ao desfecho 
de evento crítico. Sua função é de extrema importância, pois é ele quem 
detém o poder de decisão. Todas as ordens deverão partir do gerente da 
crise. Uma decisão equivocada poderá até mesmo fazer com que seja 
responsabilizado administrativa, civil e penalmente. 
 
E assevera que: 
 
[...] também deverá se preocupar com a manutenção dos perímetros interno 
e externo, evitando a presença de curiosos no local; em fornecer dados 
para a imprensa, que não prejudiquem o andamento das negociações; em 
manter contato com a família dos reféns, vítimas e do próprio causador da 
crise; acionar as equipes de resgate (ambulância, bombeiros etc.); em 
traçar os planos para uma possível rendição do produtor da crise (ritual de 
rendição) ou, que seria a mais drástica das posições, elaborar o plano de 
ação do grupo tático, incluído, aqui, o tiro de comprometimento. (GRECO, 
2014, p. 158) 
 
Em suma, o gerente da crise é a pessoa responsável por planejar toda a 
operação, coordenando-a e a organizando, sabendo quais grupos atuarão no caso 
concreto, gerenciando, por fim, as decisões a serem tomadas por aqueles. 
O grupo tático se constitui de uma parcela de policiais que recebe um 
24 
 
treinamento mais severo e voltado a determinadas atividades pontuais, tornando os 
componentes deste grupo especialistas nestas, assim sendo, atiradores de precisão, 
explosivistas, grupos de assalto, entre outros. 
São conhecidos como Special Weapons and Tactics (S.W.A.T.) e seguem 
uma doutrina com fundamentos rígidos: 
 
a) Unidade paramilitar de pequeno porte (sete a dez homens em cada 
equipe); 
b) Fundamenta-se na hierarquia, na disciplina e na lealdade; 
c) O recrutamento é feito na base do voluntariado, sendo a escolha 
pautada na conduta, na coragem e na experiência do candidato em 
situações de crise; 
d) O grupo é submetido a treinamentos constantes e tão assemelhados 
quanto possível à realidade; 
e) Os seus integrantes trabalham em regime de dedicação exclusiva ao 
grupo; 
f) Todos assumem o compromisso de matar (commitment to kill, no dizer 
dos norte-americanos). (SALIGNAC, 2011, p. 67) 
 
É um grupo seleto, que prima pela voluntariedade em seu recrutamento, ante 
ao fiel e irrestrito seguimento aos seus princípios. São os responsáveis por ficar no 
aguardo da decisão do gerenciador da crise e da conseguinte ordem do comandante 
do grupo para entrarem em ação. Geralmente são acionados quando a crise tomou 
proporções mais drásticas, não reversíveis com a negociação. 
As ações, ou “assaltos”, do grupo tático são pontuais e rápidas, em virtude da 
situação alarmante que se tornou a atitude do perpetrador da crise com os reféns, 
ou vítimas. Qualquer excesso que venha a ser praticado por um dos policiais 
pertencentes a este grupo estará sujeito a punição. 
 
Sendo os GT dotados de tão delicados encargos e sujeitos aos riscos 
decorrentes dessa condição, impõe-se como inafastável princípio moral que 
eles sejam dotados de rígidos fundamentos éticos. [...] 
a) A responsabilidade coletiva; 
b) A fidelidade aos objetivos doutrinários; 
c) O voluntariado; 
d) O dever do silêncio. (SALIGNAC, 2011, p. 70) 
 
A responsabilidade coletiva sintetiza a unicidade do seleto grupo: o ato 
praticado por um dos integrantes a todos os demais alcança. Não é por menos que 
dentre o fardamento utilizado pelos agentes do grupo tático está a “balacava”, 
espécie de capuz que possui abertura para os olhos, em um sinal de uniformidade 
do grupo, o qual, quando entra em ação, não está individualizado na pessoa de um 
25 
 
determinado integrante. 
Como indissociável consequência da responsabilidade coletiva, há o dever do 
silêncio entre os integrantes, ou seja, “ainda que observe erros graves dos seus 
pares durante as operações, o integrante de um grupo tático especial não os deve 
divulgar nem revelar” (SALIGNAC, 2011, p. 71). 
A fidelidade aos objetivos doutrinários é reflexo da rigidez com que são 
treinados, em decorrência da atuação precisa que necessita ter quando autorizado a 
agir em um evento crítico. A efetiva atuação do grupo tático deve ser o máximo 
possível eivada de erros, em virtude, principalmente, do risco que um movimento 
estranho sequer pode trazer para a vida ou integridade física de reféns ou vítimas. 
Napoleão (2014 apud GRECO, 2014, p. 161) bem elucida essa fidelidade ao 
tratar do sniper, ou atirador de precisão: 
 
Não é suficiente que o indivíduo seja um exímio atirador para ser um Sniper. 
As habilidades necessárias à qualificação do Sniper, principalmente o 
“Sniper Policial”, envolvem, obrigatoriamente, altíssimas doses de paciência 
e disciplina, inteligência, vontade, confiança no grupo, não beber, fumar ou 
usar narcóticos, possuir equilíbrio mental e emocional, ser calmo e 
ponderado, não ser suscetível a ansiedade e remorsos, e tudo isso, aliado a 
um alto grau de discernimento, capacidade de julgamento, e, finalmente, 
sujeitar-se hierárquica e disciplinadamente ao seu Comandante de maneira 
inconteste. 
 
Em decorrência dos demais fundamentos, há o voluntariado, o qual prega a 
não obrigatoriedade de pertencimento de qualquer policial a um grupo tático, pois 
“essa deve ser uma opção de livre escolha dele. Por outro lado, se ingressou no 
grupo voluntariamente, mas tempos depois, buscou seu desligamento, da mesma 
forma não será obrigado a nele permanecer” (GRECO, 2014, p. 160). 
Mas, os “componentes” de um evento crítico não se resumem única e 
exclusivamente nestes – perpetrador da crise, reféns, negociador, gerente de crise e 
grupo tático –, há que se dar o devido valor aos que trabalham com a mídia. 
Muito embora passe a imagem de mais atrapalhar que ajudar, posto que por 
vezes deturpam informações sobre o evento crítico, as quais podem ser 
acompanhadas, inclusive, pelos próprios causadores da crise – a depender se no 
local onde se encontra enclausurado há televisor e energia ainda –, os funcionários 
que trabalham para a imprensa podem ser de grande valia, no que tange a dar uma 
resposta à sociedade do andamento das investidas policiais, bem como a suprir os 
cadastros que o gerenciador da crise possui sobre a personalidade e interesses do 
26 
 
provocador do evento crítico e dos reféns ali presentes. 
Assim como a imprensa, as autoridades judiciais, por vezes, fazem-se 
presentes no local da crise. Aliás, é aconselhável a presença destes para que seja 
dadoo respaldo necessário à atuação dos policiais, desde que não venham a 
interferir diretamente, quando não autorizados, no processo de gerenciamento do 
evento crítico, encabeçado pelo gerente da crise. 
De igual forma, governantes ou autoridades do Poder Executivo ou Legislativo 
podem se fazer presentes nessas circunstâncias. Por vezes, a permanência destes 
próximo ao local do evento é exigência dos causadores da crise, como forma de 
direcionar seus pleitos e anseios a determinado dirigente do município ou do Estado, 
ou ainda, autoridade legislativa. 
Ressalta-se que, muito embora se façam presentes em meio à crise instalada, 
esses governantes não costumam ser postos para falar diretamente com os 
perpetradores da crise, para uma maior segurança deles próprios e, principalmente, 
para não desvirtuar a linha de pensamento adotada pelo negociador e gerente de 
crise, já que essas autoridades não receberam treinamento específico para lidar com 
a referenciada circunstância. 
Por fim, há ainda a possibilidade da presença de familiares do causador do 
evento crítico, muito embora seja essa probabilidade mais remota, haja vista a carga 
emotiva excessiva com que estes parentes chegam ao local e, principalmente, pela 
reação que o perpetrador terá ao tomar ciência da presença de seus entes 
próximos, os quais, em alguns casos, são o ponto crucial para a existência de 
determinada crise, ou seja, por vezes são os únicos alvos que o causador da crise 
quer atingir, em uma clara expressão de revolta ao relacionamento familiar que 
possui. 
 
3.2 A ESTRUTURAÇÃO DO GERENCIAMENTO DE UMA CRISE 
 
É certo que um evento crítico, seja de pequenas proporções, seja de grandes 
dimensões, necessita de todo um aparelhamento para a sua contenção, isolamento 
e início das estratégias negociais e táticas para a sua resolução. 
Assim, quando da chegada de informação da instalação de uma crise, o que 
primeiro se procura delimitar são os perímetros interno e externo. 
O perímetro interno constitui-se de um cordão de isolamento ao redor do 
27 
 
epicentro do evento crítico, amplamente resguardados por policiais designados para 
este mister, com o fito de evitar a proximidade de curiosos que possam interferir 
negativamente em todo o planejamento do gerente de crise e dos grupos 
operacionais essenciais com ele coadunados. 
O perímetro externo é a área logo em seguida ao perímetro interno, o 
entremeio entre este e o público em geral, composta, em regra, pelo posto de 
comando, pelo centro de operações táticas, pelo centro de negociação e pelo centro 
de operações de emergência. 
O posto de comando é onde se instala o grupo de gerenciamento de crise, 
encabeçado pelo gerente da crise, de onde saem as diretrizes e instruções para o 
bom andamento da resolução do evento crítico. É importante que essa estrutura 
esteja o mais próximo possível, resguardados os devidos cuidados na segurança de 
todos que fazem parte do grupo de gerenciamento de crise, do epicentro do evento, 
a fim de dar um maior campo de visão, com riqueza de detalhes, para o gerente da 
crise, evitando, inclusive, que se faça o uso excessivo de informantes e dos meios 
de comunicação, que podem retardar mais o procedimento de neutralização da 
crise. 
O centro de operações táticas é onde permanece o grupo tático apenas à 
espera do efetivo comando para dar início ao assalto ao local da crise. É importante 
destacar que, ainda que a fase da negociação já esteja obtendo êxito para uma 
rendição, ou mesmo que o perpetrador da crise já tenha dado início à rendição, o 
grupo tático nunca deve baixar a guarda, uma vez que nunca se sabe se o 
perpetrador da crise desistirá da rendição e retornará ao seu local de 
enclausuramento com os reféns, ou ainda, voltar-se-á contra algum dos agentes do 
gerenciamento da crise. 
O centro de negociações é onde fica o grupo de negociação, constituído pelo 
negociador principal, negociador secundário e chefe do grupo, além de auxiliares. 
Tanto o centro de negociações, quanto o de operações táticas e o posto de 
comando devem estar os mais próximos possíveis, para uma melhor estruturação da 
atuação de cada agente responsável por seu respectivo setor, inclusive o grupo de 
negociação e o grupo de operações táticas, em virtude de uma das estratégias, por 
vezes, utilizadas, qual seja, a tática do medo: 
 
É permanentemente utilizada durante o gerenciamento da crise. A 
28 
 
movimentação da Polícia produz uma sensação de aflição nos 
seqüestradores. Deve ser utilizada com eficiência para que dela possa ser 
tirado proveito na busca da solução negociada. 
Desde o primeiro contato, o negociador dirá que a Polícia não vai invadir, 
mas eles devem saber que ela está ali e pode invadir. O negociador, assim, 
estará fortalecido, pois, ele é a maior garantia de que não haverá solução 
extrema. 
A habilidade do negociador é justamente demonstrar que ele é mais 
importante que os reféns e, ao mesmo tempo, pressioná-los de todas as 
maneiras, sem aumentar a tensão do ambiente e exercendo um cerrado 
controle de suas emoções, mantendo-os e fazendo-os sentirem-se 
completamente isolados do mundo. Buscar mecanismos que proporcionem 
situações que repercutam cansaço físico e mental são exemplos 
comumente utilizados. (SOUZA, 2010, p.117) 
 
E o centro de operações de emergência é aquele destinado a atender 
situações emergenciais, possuindo em seu encalço o próprio apoio policial, unidades 
de bombeiros, equipes médicas e de inteligência e equipes de serviço público. 
Como já ressaltado, o aparelhamento elaborado para gerenciar um evento 
crítico dependerá da amplitude, maior ou menor, da crise, razão pela qual é 
indispensável a instalação de um posto de comando: 
 
a) Quando o número de pessoas envolvidas numa operação de campo 
exceder a capacidade de controle do gerente da crise. Por capacidade 
de controle entende-se o número máximo de pessoas que um indivíduo 
pode pessoalmente dirigir e controlar, de uma maneira eficiente e 
eficaz. Essa capacidade pode ser reduzida pelo efeito do estresse. 
b) Numa operação de campo que requeira coordenação entre várias 
unidades de uma mesma entidade policial, ou entre organizações 
policiais diferentes. 
c) Numa operação de campo que exija atividades múltiplas. (SALIGNAC, 
2011, p. 56) 
 
Além de todos estes agentes, há que se relembrar do importante papel da 
imprensa, quanto às informações levadas à sociedade do andamento das 
negociações e estratégias, bem como buscando informações mais afincas e céleres 
sobre todos os que se encontram sob o julgo do perpetrador da crise, e deste 
também. 
Todavia, a imprensa costuma ficar em local apartado do perímetro externo, 
apenas podendo nele ingressar com autorização do posto de comando, caso 
contrário, ser-lhe-á explicado e designado o momento e o agente responsável por 
dar as informações essenciais e pontuais a serem apresentadas à sociedade, tudo 
com o máximo de cuidado para não dar margem ao causador da crise tomar ciência 
dos passos conseguintes que serão dados pelo gerente da crise, pelo negociador ou 
29 
 
mesmo pelo grupo tático, vez que há sempre a possibilidade de o perpetrador ter 
perto de si aparelhos de comunicação e radiodifusão, a fim de se inteirar acerca da 
proporção que o evento crítico tomou. 
É necessário esclarecer que nem sempre, e na grande maioria das vezes não 
o é, a instalação do posto de comando e dos centros de negociação, de operações 
táticas e demais se fazem através de vans equipadas e especialmente fabricadas 
para ocasiões como as de um evento crítico. 
Por vezes, pela urgência, pela localidade em que se desenvolveu a crise, pela 
proporção que o evento já alcançou, o gerenteda crise e os grupos de negociação e 
de operações táticas, principalmente, instalam-se em residências, empresariais, ou 
mesmo em construções que estejam próximas do local da crise, guardadas as 
devidas proporções com o que se estabeleceria de dimensão do perímetro interno e 
externo. 
Nesse ínterim é que se prima também pela presença de servidores públicos 
que estejam aptos a realocar famílias, temporariamente, de suas residências que 
serão utilizadas para o gerenciamento de uma crise, bem como calcular possíveis 
indenizações por parte do Estado, em virtude de algum dano que os agentes 
policiais venham a causar nos bens daquelas. 
 
3.3 A NEGOCIAÇÃO COM REFÉNS 
 
Instalado um evento crítico e estando as organizações policiais cientes, urge 
a designação de um gerente de crise para as medidas iniciais, assim também 
identificada como “resposta imediata”. 
Como medida primordial, o controlador da crise deve conter a casuística 
apresentada, delimitando o perímetro interno, restringindo o provocador do evento 
crítico a um pequeno espaço terrestre, conseguindo com isso, também, controlar os 
agentes e pessoas autorizados a naquele espaço adentrar ou transitar. 
Nesse mesmo intervalo, já são delimitados os grupos operacionais 
essenciais, no interior do chamado perímetro externo, bem como mantido o primeiro 
contato com o causador da crise, através do negociador. 
Toda essa sistemática decorre de um plano específico traçado pelo 
gerenciador da crise. A ponderação sobre qual grupo operacional agirá em 
determinada ocasião é incumbência do gerenciador, o qual deve verificar que a 
30 
 
atuação do grupo tático, na grande maioria das vezes, é célere, porém, além de 
demandar um gasto ao poder público, é arriscado no que tange à integridade física 
do perpetrador da crise, dos reféns ou vítimas, e dos próprios agentes policiais; já a 
negociação, muito embora possa demandar um longo período de tempo, é a solução 
mais viável e pacífica, logo, a mais aceita. 
 
Negociar: opção cuja maior e principal vantagem é a de salvar vidas, 
projetar uma imagem de eficiência e modernidade e proteger os policiais 
dos riscos da atuação tática. As desvantagens são, por vezes, o excessivo 
consumo de tempo, a enorme quantidade de trabalho que exige e o 
treinamento necessário. (SALIGNAC, 2011, p.118) 
 
Todavia, a praticidade e a participação do negociador foi, e ainda é, 
trabalhada constantemente no meio policial, pois ainda permanece enraizado nas 
organizações policiais o exclusivo uso da força, tendo sido o negociador visto como 
um mero intermediário entre o provocador e o gerenciador da crise. 
 
Tudo isso se transforma em óbice para o profissional negociador. Encarado 
como elemento coadjuvante no processo do gerenciamento, tende a ser 
tratado como um mero transmissor de recados entre o GGC e o PEC, não 
se admitindo sequer que estabeleça estratégias e táticas de condução do 
processo de negociação, que fica a cargo do humor do encarregado do 
GGC. (SALIGNAC, 2011, p. 101) 
 
Mas, com a evolução das dinâmicas das polícias de todos os estados, o 
negociador ganhou mais notoriedade, tornando-se uma peça chave que demanda 
um curso didático e aperfeiçoador, um acompanhamento clínico por especialistas 
das áreas de psicologia e psiquiatria, e que, principalmente, necessita de um 
trabalho em equipe do grupo de gerenciamento de crise, do grupo tático e do setor 
de inteligência da corporação, recebendo os comandos necessários, tendo a sua 
guarda protegida e uma equipe de prontidão a “assaltar” quando viável, e sendo 
alimentado de todas as informações possíveis acerca dos presentes no epicentro da 
ameaça, respectivamente. 
Certificado de tudo que lhe rodeia e resguarda, o negociador deve manter o 
primeiro contato com o provocador da crise apresentando-se. Esta atitude primária 
visa a uma quebra de barreiras entre ambos os personagens, e, principalmente, um 
impactante desarme do causador da ameaça, o qual se encontra encurralado, 
temerário da ação tática policial de confronto. 
A partir dessa atitude, a negociação deve se pautar pela atenção ativa por 
31 
 
parte do policial negociador, que nada mais é do que pôr em prática o saber ouvir, o 
esperar a manifestação do causador, não sem o deixar ciente da existência de uma 
relação mútua e de contínua troca, tentando dessa forma identificar se aquele 
evento se trata de uma crise negociável, com base nas oito características 
apontadas pela polícia federal norte-americana: 
 
a) O PEC deve desejar manter-se vivo; 
b) Deve haver ameaça do uso de força pelas autoridades; 
c) O PEC deve ter feito exigências realísticas; 
d) O negociador deve ter sido percebido pelo PEC como uma fonte 
potencial de ameaça, mas que deseja ajudá-lo; 
e) Deve haver tempo disponível para a negociação; 
f) Um canal de comunicação confiável deve ter sido estabelecido entre o 
PEC e o negociador; 
g) Tanto a localização do incidente crítico como as comunicações entre 
PEC e negociador devem estar claramente delimitadas e restringidas; 
h) O negociador deve ser capaz de identificar e de atuar em conjunto com 
o PEC que é responsável pela tomada de decisões. (SALIGNAC, 2011, 
p. 121-122) 
 
Em caso de se verificar uma situação não solucionável através da 
negociação, o policial negociador cientificará o chefe do grupo de negociação, o 
qual, prontamente, informará ao gerente da crise e ao chefe do grupo tático, para 
que seja providenciada a “saída” que resta: o “assalto” tático. 
Mas, como já ressaltado, busca-se em eventos críticos a rendição do 
causador da ameaça e, para alcançar isto, o negociador se valerá de todos os meios 
possíveis, desde o uso da linguagem adequada, com as tratativas feitas, até a troca 
de negociador. 
O policial negociador sempre procurará não apresentar respostas negativas 
ao provocador da crise ante às exigências deste, principalmente nas primeiras horas 
de controle da ameaça, momento em que, geralmente, há muita tensão por parte do 
causador do evento, o que o leva a fazer pedidos aviltantes e incabíveis. 
De igual forma, não é recomendável que o negociador procure se comunicar 
com o perpetrador da ameaça utilizando-se das gírias deste, pois este pode 
entender como uma ofensa, pelo modo forçado que soa, o que já traz mais 
dificuldade para o enfretamento da situação, além da possibilidade de o policial 
empregar um determinado termo de forma equivocada, no entender do causador, 
por desconhecer das gírias utilizadas, como o relatado por Lucca (2014, p. 101-102) 
em uma de suas ocorrências na contenção de uma rebelião na antiga FEBEM de 
32 
 
Franco da Rocha: 
 
Parecia que as coisas estavam indo bem quando um terceiro grupo, com 
uma outra liderança, passou a se manifestar, nitidamente querendo 
sobrepujar os demais sem, contudo, apresentar alguma ideia que não 
tivesse sido discutida anteriormente. Foi nesse instante que cometi um erro. 
Na intenção de colocar um mínimo de ordem no tumulto, usei uma 
expressão da qual iria me arrepender: “Aí, moçada, desse jeito não vai dar!” 
Há quem diga que três coisas não voltam atrás: a palavra falada, a flecha 
lançada e a oportunidade perdida. Se eu pudesse voltar atrás... 
A reação dos jovens foi péssima: começaram a me apedrejar. Não me 
restou alternativa se não descer rapidamente pela escada e me proteger 
das pedras mantendo o corpo encostado na parede externa da muralha. 
Não entendi o que havia acontecido, mas percebi um certo constrangimento 
do diretor do presídio, que me dez um sinal de que queria conversar comigo 
em particular. 
Terminada a chuva de pedras pude me aproximar dele para manter o 
seguinte e, para mim, surpreendente diálogo: 
– Comandante, o senhor falouuma palavra que não podia falar. 
– Que palavra? 
– O senhor disse “moçada” que para eles significa um grupo de moças e por 
isso se revoltaram. Melhor teria sido falar “rapaziada”. 
Assim, ainda que perplexo com o que julgava ser um detalhe banal, dirigi-
me novamente à escada, subi os degraus e, ao alcançar novamente a 
muralha disse-lhes: 
– Aí, rapaziada, podemos conversar novamente? 
Por incrível que possa parecer todos acolheram a nova abordagem e 
assumiram uma atitude que tinha um sentido duplo: aceitação de um pedido 
de desculpas e permissão para continuarmos as tratativas. 
 
É por casuísticas como essa que o negociador nunca deve deixar de se valer 
do auxílio do gerente da crise, do setor de inteligência, e de terceiros que convivam 
com o causador. 
Inclusive no momento da rendição, que simbologicamente corresponde ao 
sucesso da negociação, o policial negociador deve se valer do auxílio do grupo 
tático, para o caso de ação de extrema urgência, vez que o causador pode mudar de 
ideia a qualquer momento. E, nessa situação, o grupo tático deve se valer dos seus 
fundamentos teóricos de atuação: a rapidez, a surpresa e a agressividade da ação. 
 
Em uma rápida avaliação, recomenda-se que, na rendição, todos os 
envolvidos sejam algemados, tentando-se, desta forma, evitar que um 
criminoso escape misturando-se aos capturados, ou produza algum 
comportamento violento e inesperado. (SALIGNAC, 2011, p. 201) 
 
Mas, talvez, um dos objetivos principais, se é que é possível subdividi-los 
desta forma, buscados pelo negociador seja a obtenção do rapport, ou seja, uma 
aproximação maior, de cunho psicológico, com o causador da crise. 
33 
 
Através do rapport, o negociador pode extrair do próprio causador se as 
pessoas que se encontram sob seu julgo são reféns ou vítimas e a situação em que 
os mesmos se encontram, conseguindo, inclusive, em determinadas ocasiões, ter 
contato com um destes reféns ou vítimas para poder arrancar maiores e precisas 
informações. 
Todavia, essas informações sobre os reféns ou vítimas devem ser obtidas 
com o máximo de cautela, posto que, uma vez percebendo o provocador do evento 
crítico que o negociador e o aparato policial externo se encontram bastante 
preocupados com os reféns, e menos com o próprio causador, este pode se sentir 
acuado e passar a ameaçar mais seus subjugados, como uma medida a seu favor. 
Ainda assim, o negociador e o gerente de crise devem ficar atentos a uma 
casuística que pode acontecer e que pode, por um lado, trazer benefícios, como 
também trazer malefícios: a Síndrome de Estocolmo. 
A Síndrome de Estocolmo é vista, por parte do negociador, como uma peça 
chave na sua atuação, pois quanto mais afeto for desenvolvido entre o captor e os 
seus capturados, menos possibilidade há de prática de violência contra estes. 
 
O desenvolvimento da Síndrome produz uma importante garantia de 
proteção aos capturados. Embora relativa, esta proteção deve ser buscada 
de todas as formas possíveis pelo negociador. A criatividade do profissional 
será posta em prova, pois não há um método absolutamente sistematizado 
de procedimentos, os quais poderão variar entre as diversas situações 
críticas que se apresentam. (SALIGNAC, 2011, p. 167) 
 
Contudo, esse mesmo vínculo afetivo pode desvirtuar as informações 
colhidas através dos próprios capturados, vez que estes procurarão defender e 
proteger seu captor, dificultando mais a atuação dos policiais. 
Ademais, os efeitos da Síndrome persistem para além do fim do evento crítico 
e, a partir deste momento, a sua perpetuação pode não ser muito favorável ao 
ordenamento jurídico, logo, não muito bem quista, quando da aplicação necessária 
do direito, no que tange aos crimes praticados pelo causador da crise. 
 
 
 
 
 
34 
 
4 A SÍNDROME DE ESTOCOLMO 
 
Identificada como um dos vários danos psíquicos que acometem vítimas 
submetidas a estados de extrema violência ou de agressões de cunho físico e/ou 
psicológico, em que a sua sobrevivência é posta em risco, a Síndrome de Estocolmo 
retrata uma situação que evidencia a necessidade cada vez maior de 
interdisciplinaridade entre os vários ramos do conhecimento, para a manutenção do 
melhor convívio social dos cidadãos, bem como para propiciar a reestruturação de 
ordem psíquica dessas vítimas, e para a aplicação das normas do nosso 
ordenamento jurídico. 
Cunhada como síndrome pela primeira vez pelo criminólogo e psicólogo Nils 
Bejerot, quando de sua atuação como conselheiro psicólogo no caso policial que 
deu notoriedade a referida Síndrome, o comportamento envolto da Síndrome de 
Estocolmo se caracteriza por um transtorno involuntário de ordem psicológica, 
originário da própria vítima, quando esta se vê em risco provocado por um agressor, 
no qual ela, a vítima, acaba por se projetar neste, ou seja, “colocando-se no lugar do 
agressor”, e enxergando um melhor meio de sair daquela situação de risco, com o 
fito de não mais se prejudicar. 
Essa identificação da vítima com o causador do risco desencadeia uma 
relação de afeto com consequências relevantes em dois grandes ramos do saber: a 
Psicologia, mais especificamente na sua subdivisão da Psicologia Jurídica, e o 
Direito, mais especificamente na esfera do Direito Penal. 
A Psicologia, como toda ciência, configura-se como um conhecimento acerca 
de uma realidade, expresso através de uma linguagem específica. Seu diferencial 
consiste em ser uma ciência humana, assim sendo, estuda o ser humano, porém, 
não objetiva e isoladamente, mas sim, sob uma ótica eclética de múltiplas 
perspectivas, tais como a comportamental, a psicanalítica, a biológica, a subjetivista 
e a cognitiva. 
A Psicologia Jurídica é um dos ramos da Psicologia que interrelaciona o saber 
psicológico com as situações de aplicação do direito e, segundo Leal (2008, p. 182-
183) tem vasta aplicação, a se ver: 
 
Psicologia Jurídica e as Questões da Infância e Juventude (adoção, 
conselho tutelar, criança e adolescente em situação de risco, intervenção 
junto a crianças abrigadas, infração e medidas sócio-educativas); Psicologia 
35 
 
Jurídica e o Direito de Família (separação, paternidade, disputa de guarda, 
acompanhamento de visitas); Psicologia Jurídica e Direito Civil (interdições, 
indenizações, dano psíquico); Psicologia Jurídica do Trabalho (acidente de 
trabalho, indenizações, dano psíquico); Psicologia Jurídica e o Direito Penal 
(perícia, insanidade mental e crime, delinquência); Psicologia Judicial ou do 
Testemunho (estudo do testemunho, falsas memórias); Psicologia 
Penitenciária (penas alternativas, intervenção junto ao recluso, egressos, 
trabalho com agentes de segurança); Psicologia Policial e das Forças 
Armadas (seleção e formação da polícia civil e militar, atendimento 
psicológico); Mediação (mediador nas questões de Direito de Família e 
Penal); Psicologia Jurídica e Direitos Humanos (defesa e promoção dos 
Direitos Humanos); Proteção a Testemunhas (existem no Brasil programas 
de Apoio e Proteção a Testemunhas); Formação e Atendimento aos Juízes 
e Promotores (avaliação psicológica na seleção de juízes e promotores, 
consultoria e atendimento psicológico aos juízes e promotores); Vitimologia 
(violência doméstica, atendimento a vítimas de violência e seus familiares) e 
Autópsia Psicológica (avaliação de características psicológicas mediante 
informações de terceiros). 
 
O Direito, como ciência social, é o estudo de um conjunto de regramentos 
especificamente determinados para o convívio social dos indivíduos em sua melhor 
forma harmoniosa, e vê-se muito atuante nos chamados Estados Democráticos de 
Direito, os quais têm por pressuposto fundamentador o respeito à dignidade 
humana. 
O Direito

Outros materiais

Materiais relacionados

Perguntas relacionadas

Perguntas Recentes