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LENORA TESE CPDOC AI2 JUSTICA FEDERAL STF

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Prévia do material em texto

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS 
CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE 
HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL – CPDOC 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, POLÍTICA E BENS CULTURAIS 
DOUTORADO EM HISTÓRIA, POLÍTICA E BENS CULTURAIS 
 
 
 
 
 
 
Lenora de Beaurepaire da Silva Schwaitzer 
 
 
 
 
 
 
 
 
DESMISTIFICANDO O AI2 
A recriação da Justiça Federal a partir da visão dos bacharéis em Direito 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Orientador: Prof. Dr. Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2017 
 
 
 
 
 
 
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique Simonsen/FGV 
 
 
 
Schwaitzer, Lenora de Beaurepaire da Silva 
																													Desmistificando o AI2 : a recriação da Justiça Federal a partir da 
 visão dos bacharéis em direito /		Lenora de Beaurepaire da Silva 
 Schwaitzer. – 2017. 
 259 f. 
 
 Tese (doutorado) – Escola de Ciências Sociais da Fundação Getulio Vargas, 
Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens Culturais. 
 Orientador: Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos. 
 Inclui bibliografia. 
 
 1.Justiça Federal. 2. Direito constitucional - Brasil. 3. Intervenção 
estatal. 4. Corporativismo. 5. Brasil. Supremo Tribunal Federal. 
I. Mattos, Marco Aurélio Vannucchi Leme de. II. Escola de Ciências 
Sociais da Fundação Getulio Vargas. Programa de Pós-Graduação em 
História, Política e Bens Culturais. III.Título. 
 
 CDD – 341.256 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À constelação masculina ao meu redor: 
meu pai, inspiração nessa jornada histórica, 
meus dois irmãos, de sangue e de coração, 
meu companheiro de vida e de profissão 
e meu bebê, que me faz muita falta. 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
Esta tese é resultado da ações de muitas pessoas a quem devo meus sinceros e 
profundos agradecimentos a: 
Luciana Heymann, que sempre se mostrou solidária; 
Marco Aurélio Vannucchi, que me forneceu valiosas referências para apoiar minha 
tese, que foi sempre extremamente cuidadoso com seus comentários ao meu 
trabalho e que confiou na minha capacidade de concluí-lo, quando eu mesma não 
mais a tinha; 
Eloiza Rocha Pereira, querida amiga, que me brindou com a melhor fonte que 
poderia obter para orientar minha pesquisa; 
Maria Alice Gonzalez Rodriguez, Claudia Maria Pigozzo, Eliane Maria Tristão, 
Elisabeth Guercio, José Eduardo da Silva Queiroz e Maria Aparecida de Assis 
Marks, que muito me auxiliaram na obtenção de documentos arquivísticos e 
bibliográficos; 
Maria da Conceição Cardoso Panait e Débora Cordeiro da Costa, amigas que 
sempre me estimularam a dar continuidade a minha pesquisa, mesmo quando estive 
doente; 
Nívia Ferraz e Ricardo Horta, que auxiliaram na impressão de meu trabalho; 
Jadir Cabral Rodrigues, que diariamente me apoiou em minhas jornadas 
acadêmicas; 
Ana Paula Schwaitzer, que me auxiliou com o meu abstract; 
Sergio Schwaitzer, que leu todo o meu trabalho; 
Vera de Beaurepaire Rohanv, que compreendeu os desafios que eu enfrentei e que 
me apoiou em todos os momentos; 
Sem o suporte de todos, este trabalho não existiria. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Após 30 anos, 
extinta que foi pela Carta de 1937, ressurge 
renovada a Justiça Federal de primeira instância, 
defendida por uns, combatida por outros e 
sob a indiferença de muitos [...] 
 
Jorge Lafayette Pinto Guimarães 
Juiz Federal do Estado da Guanabara 
1967 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Tese que reflete acerca da reforma do Poder Judiciário e, particularmente, sobre a 
reinstalação da Justiça Federal de 1a instância através do Ato Institucional no 2, de 
27 de outubro de 1965. Refaz a trajetória da instituição desde sua criação em 1890, 
perpassando pela extinção em 1937 e utiliza, como elementos centrais de análise, 
as propostas de reforma apresentadas ao Ministério da Justiça para elaboração de 
anteprojeto de emenda constitucional por determinação do Presidente da República. 
Identifica os interesses das associações de advogados, da Fundação Getúlio Vargas 
e do próprio Judiciário, associa a recriação do órgão com a denominada “crise do 
STF”, intensificada a partir da Constituição Federal de 1934 e conclui que a Justiça 
Federal ressurge para dar conta do aumento das ações que envolvem interesses de 
um Estado que cada vez mais intervém no domínio econômico e que ocorre em 
paralelo com a reforma administrativa empreendida para aumentar a arrecadação e 
melhorar a fiscalização das atividades estatais. 
 
PALAVRAS CHAVE: Justiça Federal. Ato Institucional no 2. intervencionismo 
estatal. Corporativismo. “crise do STF” 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
This thesis reflects on the reform of the Judiciary and, particularly, on the 
reinstallation of the first instance of the Federal Court through the Institutional of 
the Act No. 2 of October 27, 1965. It re-traces the institution's trajectory since its 
inception in 1890 through its extinction in 1937 and uses, as central elements of 
analysis, the proposals of reform presented to the Ministry of Justice for 
elaboration of constitutional amendment draft by determination of the President of 
Brasil. It identifies the interests of lawyers' associations, Fundação Getúlio 
Vargas and the Judiciary itself, associates the re-creation of the body with the so-
called "STF crisis", intensified since the Federal Constitution of 1934 and concludes 
that the Federal Justice resumes to account for the increase in the suits involving the 
interests of a state that is increasingly involved in the economic field, and which takes 
place in parallel with the administrative reform undertaken to increase revenue and 
improve oversight of state activities. 
KEY WORDS: Federal Justice. Institutional Act no. 2. state intervention. 
corporativism. "STF crisis" 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1	 INTRODUÇÃO ................................................................................................ 10	
2	 CONTEXTO HISTÓRICO-POLÍTICO E ECONÔMICO EMBASANDO A 
EXISTÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL .......................................................... 21	
1.1	 CRIAÇÃO ATRAVÉS DA CONSTITUIÇÃO PROVISÓRIA DE 1890 ............. 23	
1.1.1	 Judiciário como um dos quatro poderes do Império ................................ 24	
1.1.2	 Da escravidão ao trabalho livre ................................................................... 28	
1.1.3	 Ideais progressistas: república, democracia e federação ........................ 29	
1.1.4	 Justiça Federal e o Governo Provisório ..................................................... 31	
1.1.5	 Justiça Federal na Constituição Federal de 1891 ...................................... 36	
1.2	 JUSTIÇA FEDERAL NA PRIMEIRA REPÚBLICA .......................................... 40	
1.2.1	 Entraves para a atuação da Justiça Federal .............................................. 41	
1.2.2	 Crise econômica e política com reflexo na Justiça Federal ..................... 42	
1.2.3	 Reforma Constitucional de 1926 ................................................................. 46	
1.3	 JUSTIÇA FEDERAL NO GOVERNO PROVISÓRIO DE 1930 ....................... 47	
1.3.1	 Reforma legislativa e projeto constituinte .................................................. 51	
1.4	 JUSTIÇA FEDERAL NA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE DE 1934 ............... 53	
1.4.1	 Reforma do Judiciário ..................................................................................54	
1.5	 JUSTIÇA FEDERAL NO ESTADO NOVO ...................................................... 57	
1.6	 DA CONSTITUIÇÃO DE 1946 AO ATO INSTITUCIONAL No 2 DE 1965 ..... 60	
2	 O ADVOGADO, SUAS ASSOCIAÇÕES DE CLASSE E A REFORMA DO 
JUDICIÁRIO ................................................................................................... 69	
2.1	 O CURSO JURÍDICO E O BACHARELISMO NO BRASIL ............................ 70	
2.2	 O ADVOGADO E SUAS ASSOCIAÇÕES DE CLASSE ................................. 71	
2.2.1	 Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB ................................................ 72	
2.2.2	 Ordem dos Advogados do Brasil – OAB .................................................... 80	
2.2.3	 Associação dos Advogados de São Paulo - AASP ................................... 87	
2.3	 O ADVOGADO, SUAS ASSOCIAÇÕES E O PODER JUDICIÁRIO .............. 89	
2.3.1	 Manifestação individual de advogados ...................................................... 91	
2.3.2	 A “crise” do Judiciário em eventos de classe ........................................... 97	
1.1.6	 Pareceres e anteprojetos das associações de classe dos advogados . 104	
2.4	 REFORMA DO JUDICIÁRIO E O INTERESSE DOS ADVOGADOS ........... 110	
3	 MESA REDONDA NA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS ........................... 115	
3.1	 FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS ................................................................. 117	
3.2	 INSTITUTO DE DIREITO PÚBLICO E CIÊNCIA POLÍTICA - IDPCP .......... 123	
3.2.1	 MESA REDONDA SOBRE REFORMA DO JUDICIÁRIO ........................... 130	
3.3	 PARTICIPANTES DA MESA REDONDA ..................................................... 131	
3.3.1	 Membros do IDPCP ..................................................................................... 132	
3.3.2	 Participantes convidados pelo IDPCP ...................................................... 137	
3.4	 DO ENCAMINHAMENTO DO EVENTO ....................................................... 143	
3.4.1	 Estrutura organizacional do Judiciário ..................................................... 145	
3.4.2	 Recriação da Justiça Federal ..................................................................... 152	
3.4.3	 Criação de uma Justiça Administrativa e Fiscal ...................................... 154	
3.4.4	 Provimento do cargo de juízes dos tribunais superiores ....................... 156	
3.4.5	 Resultado obtido na mesa redonda .......................................................... 158	
3.5	 REFORMA DO JUDICIÁRIO E O INTERESSE DA FGV ............................. 159	
4	 REORGANIZAÇÃO DA JUSTIÇA NA VISÃO DO JUDICIÁRIO ................. 165	
 
 
 
4.1	 O JUDICIÁRIO FEDERAL NA REPÚBLICA ................................................. 167	
4.2	 DESEMBARGADORES E FEDERALIZAÇÃO DA JUSTIÇA ........................ 171	
4.2.1	 II Conferência Nacional de Desembargadores ......................................... 172	
4.3	 TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS E REFORMA DO JUDICIÁRIO ..... 179	
4.3.1	 O Tribunal Federal de Recursos ................................................................ 179	
4.3.2	 O desafio organizacional do TFR .............................................................. 180	
4.4	 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E SUA “CRISE” ..................................... 183	
4.4.1	 Competência do STF .................................................................................. 183	
4.4.2	 STF em debate – 1942 a 1965 .................................................................... 185	
4.5	 COMENTÁRIOS À REFORMA PROPOSTA EM 1965 ................................. 191	
4.5.1	 Perfil dos ministros que se manifestam sobre o projeto ........................ 192	
4.5.2	 O projeto de reforma do Governo Militar .................................................. 193	
4.5.3	 A reforma do STF a partir da ótica de seus membros ............................. 195	
4.6	 A PROPOSTA DE COLOMBO DE SOUSA .................................................. 197	
4.6.1	 Perfil biográfico de Colombo de Sousa .................................................... 198	
4.6.2	 Colombo de Sousa e seu projeto para o Judiciário ................................ 198	
4.7	 REFORMA DO JUDICIÁRIO E O INTERESSE DOS MAGISTRADOS ....... 201	
5	 CONSIDERAÇÕES ...................................................................................... 208	
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 221	
APÊNDICE A – Comparação Constituição Provisória e de 1891 ...................... 235	
APÊNDICE B – Processos do arquivo do TRF2 .................................................. 240	
APÊNDICE C – Constituição de 1891 e Reforma de 1926 .................................. 245	
APÊNDICE D – Decretos entre 15/11 a 03/12/1889 ............................................. 249	
APÊNDICE E – Constituição de 1946 e projeto de 1965 .................................... 252	
 
 
 
 
10 
1 INTRODUÇÃO 
 Esta tese objetiva compreender as razões e o contexto que possibilitaram a 
reinstalação da Justiça Federal de 1a instância1, em 1965, mais precisamente por 
meio do Ato Institucional no 2, de 27 de outubro de 1965 – AI2. Ela é fruto da 
curiosidade de uma analista judiciária do Tribunal Regional Federal da 2a Região – 
TRF2 que tomou posse na Justiça Federal da seção judiciária do estado do Rio de 
Janeiro, antes mesmo de se tornar bacharel em Direito, em 198. 
 Não há como precisar a época em que a trajetória da Instituição começou 
a me interessar, mas, em determinado momento, o fazer diário de processamento e 
análise de ações judiciais foi superado pela necessidade de identificar o caminho 
trilhado pelo Órgão ao qual eu ainda hoje pertenço. Na qualificação dessa tese, 
revelei meu fascínio pelo conteúdo do prédio secular no bairro de São Cristóvão, 
que já acolheu uma fábrica de sabonetes e que hoje abriga os quase dois milhões 
de processos do arquivo institucional, intermediário e permanente. Ao folhear 
alguns desses processos que ali se encontram, conscientizei-me que possuía um 
questionamento antigo, que remontava aos meus primeiros anos no Judiciário, 
acerca da origem da Instituição que havia decidido tantas questões – muitas delas 
extremamente controvertidas - ao longo de sua existência. 
 Ao ingressar no Programa de Pós-Graduação em História, Política e Bens 
Culturais do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea da 
Fundação Getúlio Vargas – CPDOC/FGV, propus-me a buscar as razões da 
extinção da Justiça Federal em 19372, malgrado reconhecesse a dificuldade do 
trabalho, já que deveria me basear em fontes primárias. 
 
1 Como a Justiça Federal sempre possuiu duas instâncias e que somente a primeira foi extinta em 
1937, permanecendo o STF com a competência para julgar os recursos ordinarios nas ações de 
interesse da União, o trabalho é sobre a sua reinstalação em 1965. Assim, quando houver menção à 
Justiça Federal, compreende-se que se trata de sua 1a instância. 
2 A Justiça Federal foi organizada pelo Decreto no 848, de 11 de outubro de 1890 e, por meio do 
decreto-lei no 6, de 16 de novembro de 1937, foi declarada a sua extinção. 
 
 
 
 
 
11 
 A pesquisa me fez compreender que um ato de demonstração de força 
política, como um decreto emanado por um Governo Provisório, a outorga de uma 
constituição ou a edição de um ato institucional, tem que ser examinado para além 
da letra da lei, pois decorre de um contexto autoritário que deve ser delimitado e 
compreendido. Assim como a extinção da Justiça Federal, que ocorreu em um 
momento de centralização do poder, como foi o Estado Novo, causava espanto – e, 
por que não admitir, um certo constrangimento – a recriação da Justiça Federal por 
meio de um ato institucional que determinou a eleição indireta, a intervenção federalnos Estados, a suspendeu garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade, 
inamovibilidade e estabilidade, bem como a de exercício em funções por tempo 
certo. Esse ato suspendeu, ainda, a apreciação judicial de atos praticados pelo 
Comando Supremo da Revolução e pelo Governo Federal e que extinguiu os 
partidos políticos3. 
 Ao efetuar a pesquisa no banco de teses e dissertações do IBICT vi que a 
busca com os termos “Justiça Federal” e “história” retornou apenas cinco 
documentos – um desses resultados é a minha dissertação –, e que, com a 
combinação dos termos “Justiça Federal” e “criação”, obtive somente doze 
documentos, sendo que nenhum deles estava relacionado ao tema da pesquisa. 
Com esse magro resultado, compreendi que a busca por elementos para conferir 
base ao meu trabalho deveria se dirigir para o contexto em que a recriação se 
operou, ou seja, para os primeiros anos do regime militar, se eu pretendesse 
encontrar os motivos para a reinstalação da Justiça Federal. 
 Em 2012, quando foi apresentado o projeto ao CPDOC, a hipótese 
apresentada foi a de que a recriação da Justiça Federal era fruto da força coercitiva 
do Poder Executivo que, durante o regime militar, “encarnaria o próprio Estado” 
(BOSCHI; LIMA, 2002, p. 197). No entanto, no final de 2014 tive acesso, por acaso, 
a uma fonte que mudou o curso da pesquisa, fonte esta que foi fornecida pela então 
diretora da área de gestão documental do Conselho da Justiça Federal, Eloiza 
Rocha Pereira. Esse documento provinha diretamente do Arquivo Nacional, em 
 
3 A recriação da Justiça Federal só ocorreu através do Ato Institucional no 2, de 27 de outubro de 
1965. 
 
 
 
12 
Brasília: um ofício datado de 1o de outubro de 1965 do então ministro da Justiça 
Milton Campos (1965), encaminhando projeto para emenda constitucional para 
reforma do Judiciário. Esse documento era resultado de consulta por ela efetuada 
para obter mais dados sobre o projeto de lei que deu origem à Lei no 5010, de 30 de 
maio de 1966, que cria o Conselho da Justiça Federal. 
 Sabendo sobre minha tese, Eloiza repartiu comigo, eufórica, sua 
descoberta, que servia mais para a minha pesquisa do que para a dela. Logo que 
procedi a leitura do documento, reconheci que o mesmo fornecia duas informações 
extremamente relevantes e que mudaram o enfoque do meu trabalho: que na 
abertura do ano legislativo de 1965 o presidente Castelo Branco4 requereu medidas 
para reforma do Judiciário com o restabelecimento da Justiça Federal, e que foi 
constituída uma comissão para a redação de uma proposta de emenda 
constitucional e que o documento foi elaborado com base em sete outros 
documentos que tinham sido encaminhados ao Ministério da Justiça. 
 Após perceber que existiam diversos registros documentais que auxiliariam 
a construir a tese, procurei nos inúmeros periódicos especializados em Direito todos 
os artigos que mencionassem a reforma do Judiciário. Mais uma vez, fui 
surpreendida com a variedade de posicionamentos e com as ramificações existentes 
em relação ao tema. Identifiquei que os desafios enfrentados à época eram 
múltiplos. Além do óbvio problema de excesso de ações e de recursos, tanto 
ordinários quanto extraordinários, submetidos ao STF, que eram a fonte para o que 
foi denominada como “a crise do Supremo Tribunal”, havia questionamentos que 
envolviam temas nas áreas dos direitos Administrativo e Tributário e dúvidas 
processuais relativas a ações que envolviam aqueles temas, já que ainda não havia 
código de processo tributário ou código de processo administrativo. O que existia à 
época eram práticas reiteradas de autoridades administrativas e entendimentos 
judiciais, que a maior parte das vezes não estavam pacificados, e que ocasionavam 
divergência na aplicação das normas específicas nos processos, seja na via 
administrativa, seja na via judicial. 
 
4 Como a maior parte da biografia apresentada nesta tese é extraída do Dicionário Histórico-
Biográfico Brasileiro, do CPDOC, optou-se por grafar os nomes pessoais da mesma forma como a 
existente nos verbetes 
 
 
 
13 
 Esse conjunto de documentos me permitiam perceber que, diversamente 
do que acreditava quando iniciei a pesquisa para a minha tese, a recriação da 
Justiça Federal pelo AI2 não era fruto exclusivo da força coercitiva do Executivo, 
mas resultava de uma longa discussão em torno da reforma do Judiciário que se 
intensificou nos primeiros anos da década de 1960. Enquanto me apropriava do 
conteúdo dos documentos coletados, ia se dissipando para mim o caráter misterioso 
que envolvia a recriação da Justiça Federal e que, em minha percepção, impediu 
que no ano de 2015 todo o Judiciário Federal deixasse passar a oportunidade de 
celebrar de forma grandiosa o seu jubileu de ouro. 
 Na realidade, o que observei é que no ano de 2016 o Conselho da Justiça 
Federal – CJF comemorou de forma singela os cinquenta anos da Lei no 5010, que 
organiza a Justiça Federal de primeira instância, e que neste ano de 2017 surgiram 
algumas iniciativas comemorativas da reinstalação da Justiça Federal, com a criação 
de logos e cerimônias dispersas evocando a data, fazendo com que os atos de 
organizar e instalar fossem mais relevantes do que o de recriar. 
 E é isso o que se tem em mente ao efetuar esta tese: trazer a luz as 
discussões que antecederam a recriação da Justiça Federal e dissipar a equivocada 
crença de que a recriação da Justiça Federal é fruto exclusivo de um ato 
institucional, e esclarecer que o ato foi precedido de um longo debate ocorrido em 
diversos nichos em que transitam bacharéis de Direito. 
 A pesquisa partiu da percepção de Elias (1994) de que a formação do 
Estado Nacional ocorre de forma gradual e dinâmica, em conformidade com o 
contexto em que é constituído, durante um período de longa duração e cujos 
resultados não têm como ser previstos ou antecipados na totalidade por seus 
membros, mas que a retrospectiva histórica desses fatos possibilita a delimitação de 
marcos para, a partir dos mesmos, extrair elementos fundamentais para 
compreender como aquele Estado foi sendo formado. Como o Poder Judiciário 
integra o Estado, nada mais natural do que também delimitar marcos para 
compreender como foi concebida a organização do Poder Judiciário enquanto se 
formava o Estado Nacional. 
 
 
 
14 
 Por esse motivo, a existência e a atuação da Justiça Federal durante a 
República se tornou a linha mestre para esta pesquisa. Ter muito claro o contexto e 
as razões para a sua criação e o que motivou sua extinção eram essenciais para 
esclarecer porque a Justiça Federal foi recriada durante o governo Castelo Branco. 
O que se objetiva, primordialmente, é a desmistificação da natureza coercitiva da 
recriação da Justiça Federal através do AI2 e revelar que sua recriação pelo Ato 
Institucional não resulta de um interesse unilateral do governo militar, mas que 
reflete a anseio de um determinado grupo social e político, que possuía ideias 
específicas acerca da estrutura organizacional da Justiça. 
 No caso deste trabalho, o objetivo deve ser alcançado através do 
mapeamento das visões dos bacharéis em Direito acerca da forma de organização 
do Poder Judiciário em locais específicos e dentro de um determinado momento da 
história republicana. Em assim o fazendo, busco identificar tanto a “ordem” quanto a 
“mudança” social e “[...] trazer a lume as dimensões históricas de uma estrutura 
social” (BENDIX, 1996, p. 48). Conforme bem enfatizado pelo autor, é preciso, antes 
de se indagar o percurso das mudanças sociais, organizar os fenômenos de 
mudanças e saber como ocorreram, a partir do relacionamento de conceitos e de 
teorias a favor das descobertas que venham a serrealizadas. 
 Nesta tese, como se percebeu que, com exceção de Castelo Branco, todas 
as visões e os discursos acerca da reforma da Justiça emanaram de bacharéis em 
Direito5, a ênfase foi no estudo de uma classe que “[...] a inteligência sociológica 
brasileira conferiu pouca importância” (ABREU, 1988, p. 20), mas que Abreu (1988) 
em seu “[...] levantamento bibliográfico preliminar revelou a importância dos 
bacharéis na construção do Estado Nacional” (ABREU, 1988, p. 24). 
 Mattos (2011, p. 135), por seu turno, sustenta que “[...] as informações 
bibliográficas demonstram o engajamento dos dirigentes da OAB e de alguns de 
seus conselheiros federais mais ilustres na campanha de desestabilização do 
governo Goulart e na ditadura instaurada em 1964”. Diz que “[...] seria preciso 
aprofundar a compreensão da participação dos bacharéis na instauração da ditadura 
 
5 Neste trabalho muitas vezes haverá menção apenas ao bacharel e, neste caso, será sempre aquele 
graduado em Direito 
 
 
 
15 
militar” e é esta participação que será estudada, a partir de múltiplos cenários 
constituídos em um período predeterminado, qual seja, no período compreendido 
entre o Estado Novo e a edição do AI2. 
 Convém grifar que, embora o intuito fosse restringir o trabalho ao período 
compreendido entre a proposta de reforma da Justiça do Conselho Federal da 
Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, em 22 de outubro de 1963 e os debates 
ocorridos, em agosto de 1965, no Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB para a 
elaboração de parecer acerca da aludida reforma, essa pretensão não se revelou 
viável. Isto porque a pesquisa denunciou a necessidade de se retornar ao período 
do Estado Novo para mapear a origem do motivo da reinstalação da Justiça Federal 
que, em minha perspectiva e, ironicamente, coincide com o de sua extinção, 
conforme será esclarecido e demonstrado ao longo deste trabalho. 
 O trabalho está centrado na visão dos bacharéis e nas propostas 
emanadas por três6 segmentos distintos: os advogados e suas associações de 
classe, a Fundação Getúlio Vargas - FGV e os magistrados dos tribunais. A 
justificativa para efetuar tal divisão é porque cinco dos sete7 documentos utilizados 
pela comissão designada pelo ministro da Justiça haviam sido produzidos por 
entidade coletiva: dois foram formulados por associação de classe – Conselho 
Federal da OAB e AASP –, um era de autoria de autarquia de ensino e pesquisa – 
 
6 Esses segmentos não são os únicos que podem ser estudados. No decorrer da pesquisa 
identificou-se ao menos mais dois campos possíveis de análise, mas que não foram extensamente 
mapeados porque abriam uma nova linha de interesse na já muito ramificada pesquisa. Ademais, a 
escolha efetuada foi a de centrar nos documentos que embasaram o projeto de emenda 
constitucional oferecido pelo Ministério da Justiça que, em momento algum mencionam documentos 
provenientes desses campos. 
 Um dos campos é o Poder Legislativo, que discute a reforma do Judiciário durante a Assembleia 
Nacional Constituinte de 1946, onde se apresentam três projetos de emendas constitucionais para a 
reforma da Justiça, que aprova a emenda constitucional no 16, de 26 de novembro de 1965 e a Lei no 
5010, de 30 de maio de 1966 e que aprova a Constituição de 1967. Outro local que pode ser 
estudado com foco na reforma da Justiça e reinstalação da Justiça Federal é o próprio Poder 
Executivo, que cria diversas comissões para estudar a reforma administrativa e a reforma da 
Constituição, que inclui a reforma da Justiça. Algumas dessas iniciativas, embora não sejam 
examinadas mais profundamente nesta tese, são mencionadas no trabalho, porque são relevantes 
para a construção da linha argumentativa aqui desenvolvida. 
7 As demais propostas são de autoria dos desembargadores Colombo de Sousa e Frederico 
Marques, propostas essas que serão descritas no capítulo do Judiciário, ficando ali incluídas devido 
ao perfil dos proponentes. 
 
 
 
16 
FGV – e dois eram dos tribunais superiores – STF e TFR8. E o exame desses 
documentos revelaram que os produzidos pelas associações dos advogados 
poderiam ser apreciados em conjunto, assim como os provenientes dos tribunais 
superiores eram complementares e também poderiam ser agrupados em uma 
mesma seção, apesar de cada um dos cinco possuir um foco de interesse 
divergente dos demais9. Estava claro, no entanto, que os interesses das 
associações de classe estavam mais próximos do interesse da entidade de ensino 
do que dos tribunais. 
 De igual forma, a legitimidade das manifestações mencionadas no trabalho 
possuem bases distintas. Enquanto que as associações de classe se valem do 
corporativismo para propor seus projetos de reforma da Justiça e a FGV se sustenta 
como um think tank10, os advogados lastreiam seus discursos11 no profissionalismo 
e e os magistrados, em sua toga, ou seja, na experiência de quem está imerso nos 
fazeres diários da Justiça, no ethos profissional12, que embora guarde estreita 
semelhança com o profissionalismo do advogado, está também associado à 
meritocracia que distingue os magistrados dos advogados. Conforme enfatizado 
com propriedade por Bonelli (2002), 
Cada uma dessas carreira tem seu perfil social, sua história profissional e 
suas formas distintas de se relacionar com o Estado, embora se vinculem 
umas às outras pela proximidade e pela competição, diferenciando-se de 
outras profissões. Os elos que ligam o mundo do Direito não são 
consequências apenas de se ter a mesma formação de bacharel. Eles são 
reforçados pelos laços construídos e pelas tensões partilhadas na busca 
cotidiana de soluções para os dilemas da ordem jurídica e da segurança 
pública (BONELLI, 2002, p. 16) 
 Porém, de uma forma geral, o conceito de profissionalismo aqui utilizado, 
seja em relação aos advogados ou aos magistrados, está associado a um processo 
 
8 No processo administrativo (BR RJANRIO 0.0.28) localizado que possui uma cópia do parecer e 
projeto da comissão designada pelo ministro da Justiça também possui cópia de alguns Tribunais de 
Justiça estaduais que não foram analisados, mas que são aqui mencionados para auxiliar pesquisas 
futuras em relação ao tema 
9 O interesse de cada segmento é objeto de destaque ao final de cada seção 
10 O conceito de think tank será fornecido mais adiante 
11 A questão de discurso e da análise de sua intencionalidade não tem como ser aqui enfrentadas. 
Sinale-se, apenas, que o conceito aqui adotado guarda sintonia com o apresentado por Fairclough 
(2007, p. 64) de que “o discurso é uma prática não apenas de representar o mundo, mas de fazê-lo 
significar, constituindo e construindo o mundo com base em significados”. 
12 Cf Bonelli (2002) 
 
 
 
17 
histórico de longa duração para o reconhecimento de uma expertise para o 
exercício de uma ocupação e através do qual se estabelece relações no mundo do 
trabalho. De acordo com Bonelli (2002), o profissionalismo valoriza o conhecimento 
abstrato, a obtenção de diploma de nível superior, o controle do mercado pelos 
pares, a autonomia para realizar diagnósticos e a prestação de serviços 
especializados. 
 O conceito de corporativismo utilizado neste trabalho é o de um sistema 
integrado por um número limitado de entidades para representação exclusiva de 
interesses de uma determinada categoria social, que é legitimado pelo Estado para 
regulamentar a profissão e apresentar reivindicações das entidades constituintes do 
sistema. Tal conceito foi desenvolvido a partir das oito características identificadas 
por Mattos (2016, p. 508). 
 Já o conceito de think tank13 aqui adotado é o de organização que, 
independente de sua forma jurídica ou de fonte de financiamentorealiza 
“[...]pesquisas sobre políticas públicas, com a finalidade de aconselhar os policy 
makers, influenciar a tomada de decisão política e divulgar para a sociedade os 
resultados obtidos em seus estudos e pesquisas” (SOARES, 2009, p.11). 
 Acredita-se que trazer à tona as diversas correntes defendidas em relação 
à reforma do Poder Judiciário permite que se desvende não apenas os fatores 
preponderantes para o destino da Justiça Federal, como também pode abrir a 
oportunidade de sistematizar o estudo sobre a construção do Estado Nacional 
brasileiro a partir de uma perspectiva específica: a dos bacharéis em Direito. 
 Embora as fontes que discutem a reforma da Justiça estejam limitadas ao 
período entre o Estado Novo e o governo Castelo Branco, é imperioso esclarecer 
que a necessidade de entender a finalidade da Justiça Federal obrigou a retornar, 
ainda que rapidamente, à primeira Constituição brasileira para diferenciar o 
Judiciário no Regime Imperial daquele que se instala na República. Embora sem se 
 
13 Observe-se, por relevante, que McGann (2012) inclui a FGV entre os think tanks brasileiros. Além 
disso, Dreifuss (2006, p. 84) já incluía a FGV entre os think tanks brasileiros. 
 
 
 
18 
aprofundar em nenhum ponto específico, refaz-se os passos imprimidos durante o 
mestrado para se refletir novamente acerca da extinção da Justiça Federal. 
 As fontes adotadas para construir o contexto histórico que se relaciona 
mais diretamente com a trajetória da Justiça Federal foram basicamente Carvalho 
(1990, 1998, 1999, 2003, 2011), Camargo (1992), Fausto (2010), Ferreira e Gomes 
(2014), Ferreira e Sarmento (2002), Gomes (1980), Leal (1975), Levy (1980), Maluf 
(1986), Pandolfi (1999, 2007), Reis (2014) e Reis, Ridenti e Motta (2014). Outra 
fonte utilizada no trabalho para descrição da trajetória da Justiça Federal durante a 
Primeira República são os processos já tratados do arquivo do TRF214, que 
robustecem a ideia do papel desempenhado pela Justiça Federal durante a Primeira 
República. 
 Além disso, o trabalho se baseia em diversos documentos obtidos no 
arquivo nacional, tanto em sua sede no Rio de Janeiro quanto em Brasília, em atas 
do Conselho Federal da OAB, do IAB, da AASP, do TFR e do STF, além de diversas 
notícias de jornal e de um grande número de artigos publicados em periódicos 
especializados em Administração e Direito. 
 Como a grande maioria desses documentos nunca foram utilizados, ao 
menos segundo a percepção que se chegou a partir da pesquisa realizada, no 
decorrer do trabalho, o leitor irá observar a preocupação na descrição detalhada de 
seu conteúdo. Entretanto, ao final de cada seção, elabora-se um resumo, não 
apenas do conteúdo das fontes apresentadas, mas também as conclusões a que se 
chega quanto ao interesse de cada segmento analisado. 
 Um ponto relevante é que, embora sejam apresentados dados biográficos 
de diversas personalidades, somente se considerou relevante efetuar uma 
abordagem prosopográfica quanto aos integrantes da mesa redonda do IDPCP. A 
prosopografia ou biografia coletiva auxiliar no trabalho ao efetuar o “desvelamento 
dos interesses mais profundos que se considera residirem sob a retórica da política” 
(STONE, 2011, p.115), desnuda o funcionamento da máquina política e auxiliaa na 
 
14 Por força de resolução do TRF2, os processos de guarda permanente julgados pela Justiça Federal 
do Rio de Janeiro integram o fundo daquele tribunal 
 
 
 
19 
identificação daqueles que a controlam. No caso daqueles integrantes, percebeu-se 
diversos pontos em comum entre eles que, com o uso de um estudo 
prosopográfico, puderam ser destacados. 
 Outra questão que merece destaque é que há opção do uso do tempo 
verbal no presente, com exceção de algumas passagem desta introdução, ou 
quando se descreve os dados biográficos dos produtores dos documentos e ainda 
nas considerações finais. Esse recurso, embora possa causar estranheza inicial, é 
uma escolha consciente que tem o intuito de conferir maior proximidade do leitor às 
fontes e ao momento histórico que está sendo relatado e após perceber o uso de 
diversos tempos verbais na redação da tese. 
 O trabalho está dividido em seis seções15, sendo que esta é a primeira 
delas. Ela tem o objetivo de introduzir o tema ao leitor, tecer esclarecimentos acerca 
da finalidade, da metodologia, das fontes e acerca de sua estruturação. 
 A segunda seção efetua uma breve retrospectiva histórica desde a 
declaração da Independência do Brasil, e possui a finalidade de esclarecer o motivo 
da criação da Justiça Federal após a proclamação da República e vai até o dia 1o de 
outubro de 1965, data do ofício do ministro da Justiça que encaminha anteprojeto de 
emenda constitucional para a reforma do Judiciário, no qual está inserida a redação 
do art. 105 e que foi utilizada no AI2. 
 A terceira seção emerge no campo dos advogados, esclarecendo quanto à 
criação dos cursos jurídicos no país e a instituição do Instituto dos Advogados 
Brasileiros – IAB e da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB e de seu Conselho 
Federal. Como o ofício de Milton Campos menciona projeto da Associação dos 
Advogados de São Paulo – AASP, tal instituição também é apresentada. Nesta 
seção são descritas as manifestações individuais dos advogados e aquelas 
proferidas em eventos de classe e no seio de suas associações, que resultam em 
projetos de reforma do Judiciário. 
 
15 A ABNT NBR 14724, que dispõe sobre apresentação de trabalhos acadêmicos, estabelece que os 
mesmos são divididos em seções primárias, secundárias e terciárias e não por capítulos. 
 
 
 
20 
 A quarta seção contextualiza a realização de mesa redonda promovida no 
IDPCP para discutir a reforma do Judiciário em 1965, dando ênfase às ideias e ao 
perfil dos integrantes do evento, à finalidade tanto do IDPCP quanto da própria 
Fundação Getúlio Vargas – FGV, a fim de demonstrar que, em conformidade com o 
pensamento de Dreifuss (2006), a FGV atuava como think tank. 
 A quinta seção foca em dois períodos distintos, sendo que o primeiro 
ocorre em 1962, quando é realizada a II Conferência Nacional de Desembargadores, 
evento onde se discute a proposta de federalização do Poder Judiciário constante no 
projeto de emenda constitucional formulado pelo deputado Nereu Gomes, em 1961. 
O segundo, envolve os meses que antecedem a edição do AI2, quando o STF, o 
TFR e o desembargador Colombo de Sousa apresentam seus projetos de reforma 
da Justiça. 
 A sexta e última seção alinha todas as demais e tece considerações sobre 
o tema, com o intuito de demonstrar que a trajetória da Justiça Federal está marcada 
por atos emanados pelo Poder Executivo e em períodos em que há a exacerbação 
da figura do Chefe do Estado. Efetua também um paralelo entre a ativa participação 
dos bacharéis com a interferência efetuada por empresários, tecnoempresários e 
pelo capital transnacional identificada por Dreifuss (2006) para afirmar que a 
reestruturação ocorrida no Poder Judiciário em 1965 resulta de um projeto 
modernizante iniciado durante o Estado Novo, período histórico em que se observa 
iniciativas reiteradas de centralização do poder no Executivo, a crescente 
intervenção no domínio econômico, a criação de entidades autárquicas e o maior 
encargo tributário instituído para alimentar políticas econômicas e sociais. 
 Espera-se com esta tese demonstrar que, da mesma forma como ocorreu 
na administração pública, a reforma do Poder Judiciário promovida pelo AI2, ao 
menos no que se refere à Justiça Federal de 1a e 2a instância integra um modelo a 
ser desenvolvido no regime militar, que visava atender o interesse dos empresários,dos tecnoempresários e do capital transnacional seguindo a mesma linha daquele 
desenvolvido por integrantes do IPES para a reforma da administração pública 
perpetrada naquele regime. 
 
 
 
 
21 
 
2 CONTEXTO HISTÓRICO-POLÍTICO E ECONÔMICO EMBASANDO 
A EXISTÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL 
 Delineia-se aqui, em paralelo com o contexto histórico brasileiro, a trajetória 
da Justiça Federal, desde o período que antecedeu sua criação, através do Decreto 
no 510, de 22 de junho de 1890, passando pela sua extinção implícita promovida 
pela Constituição Federal de 10 de novembro de 1937, até a sua reinclusão entre os 
órgãos do Poder Judiciário por meio do art. 6o do Ato Institucional no 2, de 27 de 
outubro de 1965. 
 O objetivo é realçar que todos os atos relacionados à sua existência são 
frutos de períodos históricos em que há a centralização do poder no Executivo. 
Deseja-se demonstrar é que apenas sua criação possui alguma justificativa formal, 
mas espera-se pontuar, a partir da descrição da conjuntura política, histórica e 
econômica do país, que tanto sua extinção quanto sua recriação – curiosamente 
ocorridas pela omissão ou inclusão dos Juízes Federais como um dos órgãos do 
Poder Judiciário - guardam estreita relação com a proposta de Estado Nacional que 
se almeja instituir naqueles períodos em que há a exacerbação dos poderes do 
Executivo. 
 O período histórico longo, de mais de um século, obriga uma aproximação 
tangencial sobre questões extremamente relevantes para a consolidação do Brasil 
como nação16, mas a opção em percorrer tal caminho decorre da certeza de que tais 
considerações favorecem uma adequada abordagem do tema de pesquisa, que é a 
recriação da Justiça Federal através do AI2. 
 Dessa forma, inicia-se por delimitar os fatores que propiciam a 
proclamação da República e que dão termo ao período imperial. Com isso, espera-
se tornar evidente que a criação da Justiça Federal está estreitamente relacionada 
 
16 Escravatura, federalismo, coronelismo, “política dos governadores”, “revolução constitucionalista”, 
integralismo, populismo, “movimento queremista”, são alguns dos pontos mencionados no trabalho, 
mas que não serão aprofundados, por se reconhecer a impossibilidade de se adentrar em cada um 
deles 
 
 
 
22 
com a absorção de atribuições que antes eram exclusivas do Imperador, quais 
sejam, a de mediador de conflito entre normas dispersas e muitas vezes conflitantes 
e também a de órgão de decisão quanto à prevalência dos interesses coletivos 
sobre os interesses particulares. 
 A seguir, o enfoque está na atuação da Justiça Federal durante o período 
histórico denominado “Primeira República”, época em que ocorre um forte domínio 
das oligarquias na política nacional, e que assiste, sob a perspectiva da Justiça 
Federal, um início de busca por direitos de cidadania por meio do habeas corpus, 
instrumento amplamente utilizado para assegurar a liberdade individual. Demonstra-
se, ainda, que decisões judiciais na Justiça Federal de 1a e 2a instância irão refletir 
na reforma da constituição em 1926, que restringe o alcance do habeas corpus, que 
delimita a atuação do Supremo Tribunal Federal e que prevê a criação de tribunais 
regionais federais para julgar os recursos nas ações de interesse da União, que até 
então era competência do STF. 
 Depois, esclarece-se que, durante o Governo Provisório de 1930 até a 
instalação do Estado Novo há claramente o conflito entre duas posições distintas em 
relação ao Judiciário: de um lado, percebe-se as inquietações no tocante à falta de 
aparelhamento da Justiça Federal para atuar fora da capital dos Estados. Do outro 
lado, há a clara busca para solucionar o problema da influência oligárquica nas 
decisões do Judiciário e conferir autonomia ao magistrado. Como representante 
máximo do ideário procedimental está o ministro Artur Ribeiro, que reconhece a 
inviabilidade de se construir toda uma estrutura para o Judiciário federal e que 
defende a sua estadualização. Como defensor do fortalecimento do Judiciário, 
investindo-o como um todo com o manto federal está Oliveira Viana, que vê como 
solução para o problema nacional, e via de consequência para o Judiciário, a 
centralização das decisões políticas, a fim de fazer prevalecer o primado do 
interesse público sobre o privado. 
 Segue-se com o pensamento nacionalista autoritário de Oliveira Viana, que 
é fortalecido pela visão constitucional antiliberal17 de Francisco Campos que, 
 
17 Cf Santos (2006) 
 
 
 
23 
fundidos, possibilitam a compreensão das modificações empreendidas no Poder 
Judiciário através da Constituição de 1937, que extingue tanto a Justiça Federal 
quanto a Justiça Eleitoral e que retira do Supremo Tribunal Federal a soberania do 
reconhecimento de constitucionalidade de normas legais. 
 Por fim, a proposta é delinear o cenário político e econômico existente após 
a queda do Estado Novo, demonstrando que a ruptura do equilíbrio entre os 
detentores do capital transnacional e as classes trabalhadoras subordinadas abalam 
a base estabelecida pelo populismo da década de 1950 e ensejam a ruptura do 
regime democrático e a edição, em 27 de outubro de 1965, do ato institucional que 
recria a Justiça Federal. 
1.1 CRIAÇÃO ATRAVÉS DA CONSTITUIÇÃO PROVISÓRIA DE 1890 
 O ponto de partida dessa parte do trabalho é a afirmação de Koerner 
(1998, p. 144) de que “[...] o advento da República resultou menos da força política 
organizada dos republicanos do que das tensões e conflitos criados sob a ordem 
política imperial” e objetiva demonstrar que é a posição central do Imperador o 
elemento catalisador tanto da proclamação da República quanto da criação da 
Justiça Federal. De acordo com Koerner (1998), esse eixo nodal do Imperador 
passa a ser elemento de repulsa para agentes políticos, que veem na federação e 
na república referências para a unificação de interesse de “[...] fazendeiros 
decepcionados com a Abolição, republicanos, militares e mesmo padres envolvidos 
na ‘questão religiosa’” (KOERNER, 1998, p. 146). E é a eliminação dessa figura 
nuclear da sociedade brasileira que deflagra a criação da Justiça Federal de 1a e 2a 
instância. 
 Para comprovar tais argumentos, é preciso identificar, de início, a 
competência do Judiciário e a do poder Moderador durante o Império. A seguir, 
menciona-se a questão conflituosa do trabalho escravo e o impacto econômico 
provocado com a passagem gradual da escravatura para o trabalho livre. Por fim, e 
aproveitando assertiva de Comparato (2003, p. 12) de que ‘[...] a autêntica ideia 
republicana nunca medrou entre nós”, enfatiza-se a falta de clareza quanto a muitas 
das ideias progressistas que circulam nas décadas que antecedem a proclamação 
 
 
 
24 
da República e que servem como ponto de contato para a unificação de interesses 
distintos que resultaram na queda do regime. 
 A partir desses elementos, pretende-se desenhar a competência da Justiça 
Federal de 1a e 2a instância como sucessora do poder Moderador, de forma a atuar 
como árbitra dos conflitos políticos e sociais, como solucionadora dos conflitos entre 
indivíduos e a administração pública e defensora dos preceitos constitucionais. 
 O que se afirma, em síntese, é que, com o término do Império, é preciso 
redirecionar as atividades que até então são do poder Moderador, e que acabam 
passando para a órbita do Poder Judiciário federal. 
 Com isso, o Judiciário, que durante o Império representa não mais do que 
uma “[...] mola da máquina administrativa”, no dizer do Visconde de Uruguai (1862, 
p. 261), passa a estar sujeito diretamente, não mais apenas às pressões políticas, 
mas também às intempéries e às oscilações econômicasno País. 
1.1.1 Judiciário como um dos quatro poderes do Império 
 De início, enfatiza-se que a Constituinte de 1823 determina a manutenção 
da aplicação das Ordenações do Reino, das Leis, dos Regimentos, dos Alvarás, dos 
Decretos e das Resoluções promulgadas pelos Reis de Portugal enquanto a 
estrutura legislativa nacional não estiver organizada18. 
 Outro ponto relevante é que a Constituição brasileira de 1824 não observa 
o princípio de tripartição de poderes ou o sistema de freios e contrapesos previstos 
por Montesquieu (1982), que foram concebidos com o objetivo de assegurar a 
harmonia entre os poderes. Na Constituição de 1824, o Judiciário brasileiro figura 
como um dos quatro poderes do Império e incumbe ao Poder Moderador - e 
portanto ao Imperador, como chave de toda a organização política -, a manutenção 
da independência, do equilíbrio e da harmonia entre os demais poderes19. Com 
isso, deve-se pontuar que o Judiciário brasileiro, ou Poder Judicial, durante o império 
age como representante do poder imperial na aplicação de leis promulgadas pelos 
 
18 Informação obtida em Vianna (1894) 
19 Observe-se a regra inserta nos arts. 10 e 98 da Constituição de 1824. 
 
 
 
25 
Reis de Portugal para a solução dos conflitos entre os indivíduos. Para a solução 
dos conflitos com o governo, conforme realçado por Koerner (1998), 
[...] não haveria decisão propriamente judiciaria, porque neste caso seriam 
confrontados o interesse coletivo e o direito, ou interesse, particular. Se o 
interesse coletivo afetasse um mero interesse individual, o único recurso ao 
indivíduo seria suscitar uma jurisdição graciosa, na qual a reconsideração 
do ato pelo agente do governo seria discricionária. Se o interesse coletivo 
afetasse um direito privado, a decisão seria de tipo contencioso, processado 
com as devidas garantias, mas decidida por um órgão administrativo 
(KOERNER, 1998, p. 41-42) 
 A Constituição de 1824 prevê a existência de um Conselho de Estado, 
órgão criado como de consulta obrigatória “[...] em todos os negocios graves, e 
medidas geraes da publica Administração; principalmente sobre a declaração da 
Guerra, ajustes de paz, negociações com as Nações Estrangeiras, assim como em 
todas as occasiões” (BRASIL, 1824) e que assume, segundo Coser (2008), a função 
de uniformizar a interpretação das leis administrativa e de decidir os conflitos de 
atribuições entre os Poderes 
 A Carta Magna de 1824 limita, ainda, a incumbência do Supremo Tribunal 
de Justiça para a concessão ou denegação de revistas nas ações, para a decisão 
dos conflitos de jurisdição e de competência das Relações provinciais, assim como 
para o julgamento de seus ministros, os ministros das Relações provinciais, os 
empregados do Corpo Diplomático e os presidentes das Províncias e outorga ao 
poder Moderador a reponsabilidade pela manutenção da Independência, do 
equilíbrio, e da harmonia entre os demais Poderes. 
 Em 1830, surge o primeiro normativo relevante do Império, o Código 
Criminal. Em 1832, entra em vigor o Código de Processo Criminal, que traz grande 
inovação para a forma de atuação do Judiciário, eis que substitui os procedimentos 
inquisitoriais previstos pela legislação portuguesa por uma fórmula mais próxima ao 
modelo do common law20. De acordo com o Código de Processo Criminal, o juiz de 
 
20 Common law é um sistema judicial que surgiu na Inglaterra e que foi disseminado nos países por 
ela colonizados. Traduz-se num sistema contencioso no qual partes opostas se apresentam perante 
um juiz com conhecimentos jurídicos que está encarregado de moderar conflito e um júri que não 
possui treinamento legal, mas que emite decisão acerca dos fatos apresentados pelas partes. Seu 
preceito básico é a valorização dos precedentes para a prolação da decisão judicial em detrimento 
das esparsas decisões do legislativo 
 
 
 
26 
paz, eleito por voto direto dos cidadãos da localidade, é o principal agente do 
Judiciário. O Código prevê também que, além do juiz de paz, os cidadãos também 
elegem o promotor, o juiz municipal e o júri popular21. Com essas medidas, o 
Judiciário deixa de ser um representante do Imperador e passa a ser um órgão que 
está vinculado à sua localidade de funcionamento. 
 A Lei no 16, de 12 de agosto de 1834, conhecida como Ato Adicional de 
1834, opera reformas relevantes na Constituição de 1824, traçando contornos mais 
descentralizados à forma de governo do Império e suprime o Conselho de Estado, 
mas a Lei no 105, de 12 de maio de 184022, que marca o período conhecido como 
“Regresso Conservador”23, antecipa o que viria a ser a reforma do Código de 
Processo Criminal, promovida pela lei no 261, de 3 de dezembro de 1841. De uma 
forma geral, ocorre a retirada da competência das Assembleias Provinciais para a 
organização do Judiciário, transfere-se os poderes que haviam sido atribuídos ao 
juiz de paz pelo Código de Processo Criminal para os chefes de polícia – que são 
funcionários do Estado nomeados pelo imperador e escolhidos dentre a magistratura 
profissional –, para os delegados e para os juízes municipais, e altera-se a 
composição do Tribunal do Júri, que passa a ficar sob a direção do Juiz de Direito, 
ao qual ficava facultado apelar à Relação quando a decisão do Júri fosse contrária 
às evidências dos autos. No mais, estabelece-se que os assuntos da Justiça e da 
política passam a ser de incumbência do Executivo central, com subordinação direta 
à Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça. 
 A Lei no 234, de 23 de novembro de 1841 recria o Conselho de Estado e o 
Regulamento no 124, de 5 de fevereiro de 1842 estabelece suas diretrizes, deixando 
claro, em seu art. 24, que a autoridade judiciária não é competente para conhecer de 
algum pedido que tenha como base um objeto administrativo, que deverá ser 
solucionado pela autoridade administrativa e pelo Conselho de Estado. 
 
21 Cf Coser (2008) 
22 Conhecida como Lei de Interpretação do Ato Adicional de 1834 
23 Regresso Conservador é o nome denominado ao programa criado pelo partido conservador para 
reforçar a autoridade monárquica, restabelecer a centralização político-administrativa e reduzir as 
ameaças à unidade territorial. Ver Coser (2008) e Carvalho (1998) 
 
 
 
27 
 Em 1850 ocorre nova alteração relevante no arcabouço legislativo Imperial 
com a edição do primeiro Código Comercial brasileiro, cujo objetivo primordial é o de 
regulamentar as atividades dos bancos, das instituições de crédito, das companhias 
de seguro, além de criar normas para sociedades anônimas, regulamentar títulos ao 
portador, a emissão de debêntures e a concessão de patentes (PAULA, 2012), mas 
que também prevê critérios para procedimentos judiciais vinculados às atividades 
comerciais. 
 A reforma judiciária promovida pela Lei no 2033, de 20 de setembro de 
1871, promove o reordenamento das relações entre o Poder Judicial, o governo 
central e os poderes locais e a reorganização administrativa de suas atividades. Ela 
cria e altera os tipos de comarcas, modifica o número de juízes e estabelece a 
competência de juízes de paz, de juízes municipais, de juízes de direito e de 
ministros da Relação, a partir do valor da causa24. Em relação ao magistrado 
profissional, mantém a remoção prevista no art. 153 da Constituição de 1824, que, 
segundo Koerner (1998, p. 130), o “[...] instrumento que permitia ao governo central, 
e aos poderes locais, regular a eficácia da legislação no âmbito local”. 
 Quanto aos crimes, a reforma de 1871 separa a Justiça da Polícia, 
impedindo que essa efetue julgamento de autores de crimes e estabelece a 
incompatibilidade no exercício dos cargos judiciais com os cargospoliciais, 
ressalvada a hipótese do juiz de paz. Mantém-se, no entanto, o poder das 
autoridades policiais de detenção sem mandado e é criado o inquérito policial, no 
qual ficam mantidos os poderes de iniciativa da instrução criminal. Uma outra 
inovação trazida pela reforma de 1871 é a previsão de limites para os valores da 
fiança e a criação do habeas corpus preventivo. 
 Tais diretrizes legislativas aqui pontuadas evidenciam a organização 
gradativa do sistema legal brasileiro e também possibilitam entrever a existência de 
conflito entre o poder central e o poder local durante todo o período imperial em 
 
24 Koerner (1998) enfatiza que, apesar de a reforma promovida em 1871 promover alteração nas 
competências dos diversos órgãos do Judiciário, o exercício direto do controle social irá permanecer 
com as autoridades locais, através da ação da polícia e dos juízes de pais, e que os magistrados 
profissionais só interviam nos recursos, correições e habeas corpus. 
 
 
 
28 
relação ao efetivo controle social, conflito que não se dissipa com a proclamação da 
República. 
1.1.2 Da escravidão ao trabalho livre 
 Para que se possa compreender a influência da economia para a 
proclamação da República, é preciso identificar a importância da produção cafeeira 
para o país, produção essa que é a responsável pelo deslocamento do pólo 
econômico nacional do Nordeste para o Sudeste. Segundo Fausto (2010), entre a 
Independência e a República, a exportação do café passa de 18% para 61% do 
valor das exportações nacionais e é considerada a grande responsável pelo 
aparelhamento de portos, pela criação de mecanismos de crédito voltados para a 
exportação, em particular para esse segmento econômico, e também pela 
manutenção do tráfico de escravos, apesar das pressões da Inglaterra para o 
término de sua prática. 
 Sem ter a pretensão de adentrar profundamente no tema da escravidão, é 
importante ressaltar que as medidas implementadas após 1850 para repressão do 
ingresso de escravos no país e também para a punição daqueles que fossem 
coniventes com o tráfico negreiro tornam clara a necessidade de se buscar 
alternativas para a força de trabalho escrava. É nesse período que se observa, não 
apenas o deslocamento interno da mão de obra escrava das zonas açucareiras do 
Nordeste para o Sudeste, como também o direcionamento do capital antes 
empregado na aquisição de escravos para o surgimento de diversas práticas 
comerciais, dentre elas a criação de bancos, de indústrias e para a expansão das 
vias de transporte. 
 No final da década de 1860, são iniciadas medidas legislativas para 
emancipação gradual dos escravos, que resulta na promulgação da Lei no 2040, em 
28 de setembro de 187125. Essa lei, além de emancipar os filhos de mulheres 
escravas que nascessem após aquela data, prevê a existência de fundo destinado à 
emancipação e também determina a matrícula de todos os escravos existentes no 
Império. Koerner (1998) destaca que a lei cria formas de intervenção da justiça nas 
 
25 Essa norma ficou conhecida como “Lei do Ventre Livre” 
 
 
 
29 
relações entre o senhor e os escravos e autoriza o Judiciário não apenas a conceder 
alforria ao escravo, mas também a declarar libertos aqueles que não forem 
matriculados no prazo legal. Diz que através de um rito sumaríssimo fica permitido 
ao escravo apresentar pedido de manumissão, mediante o pagamento do seu preço, 
cujo valor, em caso de divergência, deve ser arbitrado pelo juiz de órfão e, em caso 
de decisão desfavorável à liberdade, cabe apelação ex officio26. 
 E é nas últimas décadas que antecedem a proclamação da República que, 
segundo Fausto (2010), a economia cafeeira passa a ser constituída de duas 
classes regionais bem delimitadas e que possuem destinos diversos: os fazendeiros 
do Vale do Paraíba, que sustentam a Monarquia e que dela vão se separando à 
medida que se imprimem medidas para a abolição da escravatura, e a burguesia do 
café do Oeste Paulista. Enquanto a primeira declina – seja pelo esgotamento de 
suas terras ou pela perda de suas fortunas que estava lastreada nos escravos –, a 
última se expande, por meio da incorporação contínua de novas áreas, pela 
introdução de ferramentas tecnológicas e pelo emprego de imigrantes, que saíam da 
Europa com subsídios do Governo Paulista. 
 Do que foi acima relatado, evidencia-se que a política que promove a 
transposição progressiva de uma mão de obra escrava para o trabalho livre afetando 
a atividade econômica, a forma de produção brasileira, a relação entre os grandes 
proprietários de terra com o Imperador e contribui para a desintegração do regime 
imperial, como também evidencia uma maior participação do Judiciário na relação 
entre escravo e seu proprietário. 
1.1.3 Ideais progressistas: república, democracia e federação 
 Concomitantemente à crise decorrente da política de dissolução da 
escravatura brasileira, é possível identificar nos discursos propagandistas e 
panfletários diversas referências à federação e à república, que passam a servir de 
base tanto para teóricos quanto para agentes sociais. Percebe-se também que, nas 
últimas décadas do Império, as ideias defendidas por republicanos ancoram-se nos 
 
26 Apelação ex officio é o ato de submeter automaticamente a decisão do juiz ao reexame pela 
autoridade judicial superior. 
 
 
 
30 
conceitos de república, democracia e federalismo. Esses conceitos possibilitam, 
ainda que de forma incipiente, a unificação política. 
 Malgrado também não constitua objeto do presente trabalho, pode-se 
afirmar que fica nítido através da leitura do Manifesto de 1870 que os republicanos à 
época não possuem clareza quanto àqueles conceitos (república, democracia e 
federalismo) e que sequer fazem distinção entre os dois primeiros. Mas do 
documento pode-se depreender que a carência de conhecimento mais profundo dos 
republicanos é compensado pelo entusiasmo quanto à ideia do federalismo, conceito 
que ocupou todo um capítulo daquele manifesto. Através de seu conteúdo, verifica-
se em síntese que os republicanos defendem um sistema misto, no qual coexistem a 
hereditariedade do chefe de Estado com o regime republicano, visto como forma de 
governo apropriada ao exercício da soberania popular brasileira. 
 Analisando as propostas republicanas, Carvalho (2011, p. 145) menciona 
que o ponto central do debate ocorrido no congresso republicano de Itu, em 1873, é 
“[...] a forma a ser assumida pela república, presidencialista ou parlamentarista, 
centralista ou federalista, democrática ou ditatorial” e que, somente no manifesto do 
Partido Republicano de Pernambuco, em 1888, percebe-se uma clara distinção 
entre república e democracia. 
 O conceito de federação também recebe bastante destaque nas décadas 
que antecedem à proclamação da República, já que o pensamento político que 
predomina à época já se mostrava contrário à centralização do Império, uma vez 
que esse impossibilita 
[...] o crescimento econômico das províncias que ainda eram controladas 
pela coroa, por meio de pessoas de confiança do imperador que exerciam 
os cargos de Presidentes de Províncias, que detinham poder sobre a 
guarda nacional, nomeavam autoridades policiais além de fazer 
perseguições aos opositores. (LIMA; PONTE, 2015, p. 278) 
 Desta forma, embora não exista uma proposta republicana consolidada, o 
Manifesto evidencia grande insatisfação quanto à forma de governo, quanto à 
centralização realizada pelo regime imperial e quanto à atuação do poder 
Moderador, muito embora acolha a ideia de hereditariedade do Chefe de Estado. 
 
 
 
31 
1.1.4 Justiça Federal e o Governo Provisório 
 Conformeesclarecido até agora, as alterações na estrutura econômica do 
país, a defesa de ideias progressistas e a disputa pela organização judiciária são 
questões relevantes para o estremecimento da ordem política imperial. Proclamada 
a República e decretada a federação como forma de governo a ser adotada, surgem 
imediatamente diversas questões a serem elucidadas, das quais três são 
fundamentais para o presente trabalho: divisão dos poderes entre União e Estados, 
absorção das funções delegadas ao Imperador no exercício do Poder Moderador e 
edição da nova Constituição. Quanto à forma de organização da República, Koerner 
(1998) esclarece que 
Os militares ligados a Deodoro e os burocratas pretendiam limitar o alcance 
do federalismo, defendendo a centralização dos poderes e a organização 
nacional da burocracia. Líderes políticos dos estados menores ou em 
decadência econômica, antigos liberais e conservadores, e também alguns 
republicanos, defendiam uma organização federal, na qual o governo 
central mantivesse alguns poderes. Por fim, os republicanos históricos, os 
liberais e os conservadores dos estados maiores propunham uma 
organização ultrafederalista, na qual seria deixado à União apenas a renda 
”estritamente necessária para viver”, reduzindo-se suas atribuições às 
relações internacionais, à defesa externa e arbitramento das questões entre 
os estados (KOERNER, 1998, p. 147-148) 
 No que pertine à elaboração da nova Constituição, o “Apostolado 
Positivista”27 se mostra a favor da outorga de uma Constituição ditatorial positivista, 
enquanto que o ministro da Justiça, Campos Sales, defende o projeto do Governo 
Provisório, de ordem presidencialista e federativa. Por sua vez, Rui Barbosa sugere 
o plebiscito e Quintino Bocaiúva é a favor da convocação de uma Assembleia 
Constituinte, formato esse que, no final, se sagra vencedor. 
 Após debates no seio do Governo Provisório28, decide-se pelo critério de 
eleição de membros para composição da Assembleia Constituinte, e constitui-se a 
denominada “Comissão dos Cinco"29, criada através do Decreto nº 29, em 03 de 
 
27 Ver Carvalho (1990) e Mello (2011) 
28 Cf Abranches (1907) 
29 A Comissão dos Cinco, ou Comissão de Petrópolis, era composta por Joaquim Saldanha Marinho – 
presidente –, Américo Brasiliense de Almeida Melo, Antônio Luís dos Santos Werneck, Francisco 
Rangel Pestana e José Antônio Pedreira de Magalhães Castro e foi designada para elaboração de 
um projeto constitucional que foi entregue ao Governo Provisório em 30 de maio de 1890 
(KOERNER, 1998) 
 
 
 
32 
dezembro de 1889, que é incumbida da redação do projeto a ser apresentado à 
Assembleia Constituinte. Para a redação do projeto de Constituição, são 
apresentadas três propostas distintas: a de Américo Brasiliense, a de Magalhães 
Castro e a elaborada por Santos Werneck em conjunto com Rangel Pestana. 
 Da leitura dos projetos30 na parte relativa ao Poder Judiciário, depreende-
se que Américo Brasiliense defende a existência de um único Poder Judiciário, a 
soberania da União para legislar sobre o direito substantivo31, a legitimidade 
concorrente entre União e Estados para legislar quanto ao direito processual32 e a 
temporalidade do exercício do cargo de membros do Tribunal da Relação, que são 
escolhidos pelo Presidente da República com base em lista tríplice elaborada pela 
Corte Suprema da Justiça33. 
 Magalhães Castro propõe a unidade do Judiciário, do direito substantivo e 
processual34 e da magistratura, prevê eleição para juízes de paz, concurso para o 
cargo de juiz de direito e a escolha dos membros da Relação pelo Supremo Tribunal 
de Justiça. 
 No projeto de Rangel Pestana e de Santos Werneck propõe-se a dualidade 
Judiciário, do direito substantivo e processual e da magistratura. Autoriza os Estados 
a regulamentar o processo de direito federal privado, estabelece validade das 
normas federais para os Estados que não possuam legislação específica e a 
resolução do conflito de leis através da doutrina e dos preceitos de direito 
internacional privado. 
 Além desses pontos, os projetos também propõem instâncias distintas para 
a resolução dos conflitos políticos e privados e para a garantia da prevalência do 
 
30 Ver Ribeiro (1917) 
31 Direito substantivo ou direito material é o conjunto de normas que os fatos jurídicos que se 
relacionam a bens e utilidades da vida. São exemplos de normas de Direito substantivo as normas ou 
leis penais, as civis, as empresariais, as tributários, etc. O direito substantivo se contrapõe ao direito 
processual ou formal, que estabelece os procedimentos adequados para se pleitear ou defender 
algum direito material 
32 Ver nota 31 
33 O Supremo Tribunal Federal – nome atribuído à última instância do Judiciário por Rui Barbosa – 
também foi denominado Corte Suprema de Justiça e Supremo Tribunal de Justiça 
34 O projeto prevê a possibilidade de adaptação das normas pelos Estados se não houver violação 
aos princípios gerais estabelecidos na Constituição 
 
 
 
33 
interesse geral perante os interesses particulares da sociedade, atividades que sob 
a égide do regime anterior estavam atribuídas ao Poder Moderador. 
 Conforme destacado por Koerner (1998), essas questões são enfrentadas 
quando se discute o poder para interpretar a Constituição, que cabe ao Supremo 
Tribunal de Justiça, em todos os casos, no projeto de Magalhães Castro. Esse 
projeto confere ainda uma atividade consultiva ao Supremo Tribunal de Justiça que 
deve apoiar a presidência da República acerca da constitucionalidade dos projetos 
de lei encaminhados para sanção presidencial. 
 Américo Brasiliense entende que cabe à Corte Suprema de Justiça o poder 
de interpretar a Constituição, quando se tratar de execução da Constituição e das 
leis federais, e ao Legislativo, quando houver interpretação por via de autoridade. De 
igual forma, Santos Werneck e Rangel Pestana atribuem ao Supremo apenas a 
competência para interpretar a Constituição e ao Congresso, a obrigação por velar 
pela guarda da Constituição e das leis. 
 O projeto elaborado pela “Comissão dos Cinco” é entregue ao Governo 
Provisório em 30 de maio de 1890 e é transformado na Constituição provisória 
brasileira, outorgada através do Decreto no 510, de 22 de junho de 1890, ficando 
nela previsto que: 
a) o judiciário da União é constituído pelo Supremo Tribunal Federal e por 
juízes e tribunais Federais (art. 54); 
b) o STF é composto por 15 juízes nomeados pelo Presidente da 
República dentre os 30 juízes federais mais antigos e cidadãos de 
notável saber e reputação, elegíveis pelo Senado (art. 55); 
c) é garantida a vitaliciedade dos juízes federais, com irredutibilidade de 
vencimentos (art. 56 e seu § 1o) 
d) o julgamento dos ministros do STF é realizado pelo Senado e que o 
dos juízes federais, pelo STF ((art. 56, § 2o); 
e) o Procurador Geral da República é designado pelo Presidente da 
República dentre os membros do STF (art. 57); 
f) é competência do STF a verificação da aplicabilidade de tratados e leis 
federais ou quando se contestar a validade de leis ou atos dos 
governos dos Estados em face da Constituição ou de leis federais e a 
decisão do tribunal do Estado considerar válidos os atos ou leis 
impugnados (art. 58, § 1o, III); 
g) deve ser observada a jurisprudência dos Estados na aplicação das leis 
estaduais e da jurisprudência federal, na interpretação de leis da União 
(art. 58, § 2o); 
 
 
 
34 
h) é de competência exclusiva da Justiça Federal para decidir: 
- ação movida com base na Constituição Federal; 
- litígios entre Estado e cidadãos de outros Estados, entre cidadãos 
de Estados diversos ou entre Estados estrangeiros e cidadão 
brasileiros; 
- questões de direitomarítimo, de direito criminal ou civil internacional 
e crimes políticos (art. 59); 
- proibição de exercício de competência às justiças dos Estados para 
exercer competência do judiciário federal (art. 59, § 1o) e de intervir 
em questões submetidas ao Judiciário Federal, seja para anular, 
alterar ou suspender efeitos (art. 61) 
 
 Posteriormente, o Decreto no 848, de 11 de outubro de 1890, imprime 
critérios para a organização da Justiça Federal, com o acréscimo dos seguintes 
pontos: 
a) inamovibilidade de seus membros (art. 2o); 
b) ministros devem ser escolhidos entre os juízes federais (seccionais) ou 
entre cidadãos de notável saber que possuam a condição de 
elegibilidade para o Senado (art. 5o ); 
c) mandato de 3 (três) anos para Presidente e Vice-Presidente do STF, 
com possibilidade de reeleição (art. 11); 
d) criação de Vara Federal em cada capital dos Estados e no Distrito 
Federal, com Juiz nomeado pelo Presidente da República entre 
bacharéis com mínimo de 4 anos de prática como advogado ou 
membro da magistratura (arts. 13 e 14); 
e) existência de um Juiz substituto, nomeado pelo Presidente da 
República, em cada vara com exercício por 4 anos (art. 18); 
f) nomeação de juiz ad hoc pelo Presidente da República quando houver 
circunstância em que não possa funcionar o juiz substituto (art. 20); 
g) o membro do STF que for nomeado Procurador Geral da República 
será vitalício e deixará de tomar parte no julgamento e decisões (art. 
21); 
h) os Procuradores da República nomeados pelo Presidente da República 
para cada vara federal contarão com mandato de 4 anos (art. 23); 
i) aposentadoria dos membros do STF e dos juízes federais após 10 
(dez) anos de atividade, se houver invalidez, com vencimentos 
proporcionais ou após 20 (vinte) anos, com vencimentos integrais (art. 
39); 
j) os crimes federais estão sujeitos ao júri (art. 40); 
 
 Vê-se, portanto que a Constituição provisória outorgada pelo Governo 
Provisório cria um Judiciário Federal que é constituído pelo Supremo Tribunal 
Federal – STF e pelos Juízes Federais, que possuem competência para decidir 
 
 
 
35 
qualquer ação movida com base na Constituição Federal, para decidir questões que 
envolve o direito marítimo, o direito criminal ou civil internacional e os crimes 
políticos. A Constituição provisória também veda às justiças dos Estados o exercício 
da competência do judiciário federal e a intervenção sobre questões que sejam 
submetidas ao ramo federal. 
 Esse Judiciário é regulamentado através de novo decreto do Governo 
Provisório, que é editado antes mesmo da instalação da Assembleia Constituinte, 
sob a justificativa de que a imediata organização da Justiça Federal antecipa o 
término do período ditatorial e possibilita o exame das ações movidas com base na 
Constituição Federal. Para o ministro da Justiça Campos Sales, 
Não se trata de tribunaes ordinarios de justiça, com uma jurisdicção pura e 
simplesmente restricta á applicação das leis nas multiplas relações do 
direito privado. A magistratura que agora se installa no paiz, graças ao 
regimen republicano, não é um instrumento cego ou mero interprete na 
execução dos actos do poder legislativo. Antes de applicar a lei cabe-lhe o 
direito de exame, podendo dar-lhe ou recusar-lhe sancção, si ella lhe 
parecer conforme ou contraria á lei organica. (SALES, 1993, p. 13) 
 Para Sales (1993), o Judiciário deixa sua posição subordinada ao Poder 
Moderador e se transforma em entidade soberana, com poderes para defender a 
liberdade e a autonomia individual. Diz ele que o sistema federativo “[...] exige para o 
seu regular funccionamento uma demarcação clara e positiva, traçando os limites 
entre a jurisdicção federal e a dos Estados, de tal sorte que o domínio legítimo de 
cada uma destas soberanias seja rigorosamente mantido e reciprocamente 
respeitado” (SALES, 1993, p. 14). Sustenta que o decreto de organização da Justiça 
Federal traça “[...] com clareza e precisão os limites da competência entre a Justiça 
Federal e a dos Estados, de tal modo que cada uma, resguardada de todo o perigo 
de invasão, conservará na mais completa integridade a sua autonomia jurisdiccional” 
(SALES, 1993, p. 15). 
 Dessa forma, observa-se que à Justiça Federal de 1a e 2a instância, criada 
pela Constituição provisória de 22 de junho de 1890, são outorgados poderes para 
defender, com soberania, a liberdade e autonomia individual na apreciação das 
ações que estejam sob jurisdição federal, preservando a autonomia dos Estados 
para decidir quanto à organização de seu Judiciário. 
 
 
 
36 
 Roure (1979, p. 5) comenta que “[...] logo que foi publicada a notícia da 
organização judiciária constante do projeto [da Constituição que foi promulgada em 
1891], com a dualidade da magistratura, surgiram protestos e reclamações” 
advindos principalmente do corpo de magistrados. Koerner (1998, p. 165) diz que 
“[...] os ministros do Supremo Tribunal de Justiça, desembargadores da Relação do 
Distrito Federal e outros magistrados encaminharam representação ao Marechal 
Deodoro reivindicando os seus direitos adquiridos e combatendo com veemência o 
plano da nova organização” e Ribas (1983) relata que Campos Sales defende 
veementemente a dualidade de Justiça, chegando a ponto de condicionar sua 
continuidade no cargo de ministro da Justiça à criação do Judiciário federal. Ribas 
(1983) comenta que Campos Sales afirma não ser possível conceber uma federação 
sem soberania dos Estados e da União e sem a existência dos três poderes políticos 
em ambas as esferas e Koerner (1998) acredita que é para rebater a pretensão dos 
magistrados que Campos Sales redige a Exposição de Motivos do Decreto no 848, 
de 11 de outubro de 1890. 
 Da comparação entre a redação do Decreto no 510, de 22 de junho de 
1890, e do Decreto no 914-A, de 23 de outubro de 1890, identifica-se que a única 
grande diferença no que pertine à Seção III, que trata sobre o Poder Judiciário, é a 
previsão de que os ministros do STF não mais são escolhidos dentre os trinta juízes 
federais mais antigos e os cidadãos de notável saber e reputação elegíveis para o 
Senado, mas apenas dentre cidadãos de notável saber e reputação elegíveis para o 
Senado. Observa-se, ainda, que são efetuados pequenos acertos em relação à 
redação e inclusão do teor do § 1o do art. 58, que teria sido suprimido no Decreto no 
510, de 1890. E é em cima desse texto que a Constituinte de 1891 se debruça para 
redigir a primeira Carta Magna republicana. 
1.1.5 Justiça Federal na Constituição Federal de 1891 
 Segundo Koerner (1998), durante a Constituinte de 1891, a organização 
judiciaria é abordada pelo ângulo dos limites do federalismo e é objeto de grande 
debate. Roure (1979) afirma que no seio dos constituintes identifica-se três grupos 
majoritários: os dualistas, que defendem duas magistratura, uma estadual e outra 
federal, e a autonomia dos Estados para legislar; os unitaristas, que são a favor da 
 
 
 
37 
unidade da magistratura e da atribuição exclusiva da União para a criação de leis de 
Direito substantivo e de Direito processual; os que defendem um sistema misto, no 
qual é cabível aos Estados legislar sobre normas processuais e sobre a 
organização das magistraturas e à União incumbe legislar sobre o Direito 
substantivo. Vê-se, portanto, que as questões divergentes centrais em relação ao 
Judiciário, e que são objeto de disputa e de amplo debate entre os constituintes35, 
são a competência para legislar acerca do Direito material e formal, a 
unidade/dualidade da magistratura e a forma da organização judiciária no país. 
 Anfilófio de Carvalho e José Higino são grandes defensores da unidade. 
Segundo Higino, todas as relações da vida civil e na vida pública devem ser 
mediadas por um Judiciário nacional,

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