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FILOSOFIA E FUNCIONALIDADE DO DIREITO
As muitas e significativas conquistas em favor dos direitos da pessoa humana impõem cada vez mais rigor em relação aos critérios de aplicação das normas jurídicas, não sendo mais aceitável que os interesses de um grupo social se sobressaia em detrimento dos de outro, nem que a justiça com as próprias mãos seja utilizada como mecanismo de sanção jurídica. Essa transformação, que se consolidou com a evolução da sociedade e com o aprofundamento teórico do mundo do Direito, acabou por dar destaque à tarefa de interpretação do aplicador das normas jurídicas, por sempre se cobrar que as soluções dos conflitos sejam as mais justas e adequadas.
Tal tarefa tem sua dificuldade intensificada em razão da natureza genérica e abstrata de suas normas, que acaba por deixar lacunas que precisam ser preenchidas para um posicionamento jurisdicional no caso concreto, o qual deve, ao mesmo tempo, ser adequado à realidade social e respeitar os direitos inalienáveis do homem.
Se no Direito arcaico as lacunas eram preenchidas pelas crenças e pelo respeito ao sobrenatural, justamente pela falta de outro tipo de resposta, o preenchimento das lacunas do Direito moderno se processa por meio da integração do direito, que se dá através da interpretação e da adequação de elementos oferecidos pela própria legislação, pelos costumes ou pelos princípios gerais do direito, com o objetivo de aplicar a lei a um caso concreto para o qual não houve previsão expressa do legislador.
Essa necessidade de se encontrar solução também para os casos não previstos legalmente é justificada pelo princípio da inafastabilidade jurisdicional, isto é, uma vez provocada, a jurisdição é obrigada a apresentar uma solução para a causa recebida, não sendo possível deixar de fazê-lo alegando a inexistência de previsão legal para o fato específico.
Ao contrário do que se possa imaginar, não só nas normas lacunosas e imperfeitas atua o intérprete, mas também naquelas que não deixam dúvidas quanto ao seu sentido e alcance, como ensina Maximiliano:
“Sem dúvida, quando a frase não é precisa, lúcida, escorreita, aumenta a necessidade de exegese, e aí brilha em todo o fulgor o talento do hermeneuta; porém a parte mais nobre e mais fecunda de sua arte de investigar é a que examina as leis não defeituosas (não obscuras, nem ambíguas), estuda as normas em conjunto, na variedade de suas relações e na riqueza de seus desenvolvimentos. É sobretudo com as regras positivas bem-feitas que o intérprete desempenha o seu grande papel de renovador consciente, adaptador das fórmulas vetustas às contingências da hora presente, com apreçar e utilizar todos os valores jurídico-sociais.
Nesse ínterim, interpretar consiste em ir além da compreensão gramatical de um texto ou de um discurso para se conhecer as intenções e os objetivos do autor e, só então, trazê-los para a apreciação do caso a ser decidido, como se depreende das palavras do douto doutrinador:
“É tarefa primordial do executor a pesquisa da relação entre o texto abstrato e o caso concreto, entre a norma jurídica e o fato social, isto é, aplicar o Direito. Para o conseguir se faz mister um trabalho preliminar: descobrir e fixar o sentido verdadeiro da regra positiva; e, logo depois, o respectivo alcance, a sua extensão”.
Na realização de tal tarefa, o intérprete faz escolhas comunicativas dentre as possibilidades postas pelo discurso, jogando com a semântica e com a sintaxe da língua. Para Ferraz Jr. essa interpretação está longe de ser a usada comumente no cotidiano das pessoas, pois nesse contexto o que se faz é decodificar uma mensagem, a partir de conhecimentos e impressões que se tem, extraindo-se um sentido que será usado para orientar as próprias reações e ações de quem realizou a decodificação.
Na verdade, está-se falando da interpretação jurídica, que é bem mais complexa que a interpretação comum, sendo aquela uma ferramenta para se alcançar o “sentido válido” de um texto normativo, traduzindo-o num “dever-se” para o modo de agir em sociedade, extraído a partir da identificação das razões que lhe atribuem autoridade e poder de imposição. Para que isso ocorra, segundo Paulo Nader (2009, 261), o magistrado, além de conhecer os fatos, precisa conhecer o Direito, para revelar o sentido e o alcance das normas aplicáveis. O doutrinador ainda ensina que interpretar o Direito é uma atividade que tem por escopo levar ao espírito o conhecimento pleno das expressões normativas, a fim de aplicá-las às relações sociais.
Sobre as formas de interpretação, numa perspectiva dworkiniana, Reis Junior (2011) apresenta a seguinte classificação: a conversacional, a científica e a criativa. A primeira foca a análise dos sons ou de signos gráficos emitidos por uma pessoa para que se descubra seu significado; a segunda dá ênfase na descrição do princípio da causalidade nos eventos naturais; e, a última, se propõe à análise de um objeto, não sendo adstrita à elucidação da vontade do autor do objeto interpretado, mas deve ela mesma pôr em prática uma intenção, qual seja, a do intérprete. Na sequência, o mesmo autor aponta que esta interpretação criativa tem proximidade com o que Gadamer conceitua como fusão de horizontes, na qual o significado de um texto seria o resultado da experiência dialógica ocorrida quando há a fusão entre o horizonte de significados do intérprete e o horizonte em que está situado o próprio texto. Assim, na compreensão do texto estariam intrínsecos os pensamentos.
Os métodos são regras que orientam para a resolução de problemas de ordem sintática, semântica e pragmática na análise da norma, a partir dos critérios básicos de coerência (hierarquia normativa), consenso (respaldo social) e justiça (caráter axiológico do direito), para o uso no momento da decisão dos conflitos. Os tipos hermenêuticos, por seu turno, relacionam-se com as opções de decodificação dos signos linguísticos, mais ou menos rigorosa do texto normativo, resultando numa interpretação especificadora (declara o sentido literal da norma), restritiva (reduz o sentido da norma) ou extensiva (amplia o sentido da norma).
Há duas correntes na hermenêutica. A chamada hermenêutica clássica é norteada pela precisão cientificista e avessa a questões mais subjetivas ou metafísicas, defendendo-se as decisões judiciais neutras e objetivas, como se fosse possível separa o Direito dos outros aspectos que envolvem a sociedade (política e moral, por exemplo). Com outro enfoque, sem abandonar os métodos clássicos, está a denominada hermenêutica contemporânea que traz métodos de interpretação que ressaltam o papel criativo do intérprete, como: os princípios da unidade, efeito integrador, máxima efetividade e força normativa.
A visão moderna da Hermenêutica permite que se coloque à disposição do intérprete o arcabouço técnico e a liberdade criativa para, de forma harmoniosa, viabilizar sua incursão nas investigações do mundo normativo, com o fim maior de fixar o sentido e o alcance das normas em prol do bem comum, daquilo que é justo. No dizer de Maximiliano (2010), O direito precisa transformar-se em realidade eficiente, no interesse coletivo e também no individual.
Assim, entende-se que, seja para preencher as lacunas da lei, seja para examinar as leis não ambíguas e não defeituosas, a interpretação é atividade indispensável na resolução jurídica dos conflitos. Também, que a hermenêutica dá ao intérprete o aparato teórico necessário para se extrair do texto normativo idealizado pelo legislador (verdade ideal), o seu dever-se, traduzindo-o para a verdade real, que é a da decisão justa no caso concreto, dando-lhe, de forma racional e técnica, um significado efetivo e unificado.
Pelo exposto fica clara a diferença e, ao mesmo tempo, a relação existente entre interpretação e hermenêutica. Pois, se elas se separam enquanto essência, sendo aquela a ação e está a ciência, elas se aproximam no papel imprescindível que tem na árdua tarefa de aplicação do Direito.
É inegável a importância de se conhecer as origens da aplicaçãodo direito para se entender toda a evolução que se sucedeu do domínio da escrita até os dias atuais. Todavia, o ponto mais significativo é perceber que o homem, por menos desenvolvido que fosse àquela época, de alguma forma buscava instituir uma ordem social, através de um controle de condutas coercitivo, com sanções definidas e direcionadas de acordo com o valor que as transgressões representassem para o grupo. Tudo isso com o intuito maior de resguardar a boa convivência entre os homens em prol da sobrevivência do coletivo.
Os povos arcaicos, apesar de não dominarem a escrita ou qualquer tipo de conhecimento científico, desenvolveram um direito próprio que se manifestava pela reprodução constante de procedimentos ritualísticos, não podendo ser considerado arbitrário, posto que suas regras e suas sanções eram fundamentadas na aceitação do grupo social e consolidadas por sua repetição através dos tempos. 
A sociedade moderna, por sua vez, pela evolução constatada rumo à valorização da pessoa humana e de seus direitos, progrediu também na consolidação do regramento das relações sociais, com um ordenamento jurídico cada vez mais abrangente.
Por seu turno, para que se dê conta das imensuráveis situações a que se está exposto em sociedade, principalmente quando há conflitos de interesse, o aplicador do Direito carece da análise e interpretação das normas postas para se posicionar diante da realidade que lhe é trazida em litígio. Nesse momento, a hermenêutica surge como o apoio sólido na busca pelo mais adequado e justo posicionamento, fim último de sua atuação.
Depreende-se que a junção da aplicação do Direito com interpretação e hermenêutica vai ao encontro daquilo que se espera da atuação contemporânea do aplicador do Direito, uma atividade criativa na interação entre texto e realidade na produção do Direito. Assim, seu papel torna-se, cada vez mais imprescindível na concretização da justiça.

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