Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Nº 21, 20 de julho de 2015 Sistemas Eleitorais A democracia tem uma relação direta com as eleições. Por meio dessa, os cidadãos escolhem qual a representação política comandará o país e executará as políticas de governo apresentadas nas campanhas eleitorais. Sem eleições legítimas, as democracias ficam vulneráveis a regimes autoritários, a representantes autocráticos ou, mesmo, a fraude às eleições com a finalidade de conferir aparência democrática ao governo. A fim de preservar a legitimidade das eleições, o Estado deve instituir, na sua Constituição, quais as formas e os requisitos exigidos para se assumir cargos públicos eletivos. Neste breve ensaio, o nosso enfoque encampará apenas os sistemas eleitorais vigentes em nosso país. As eleições são disciplinadas por princípios do direito eleitoral, por leis e por instruções normativas. Na instituição e regulamentação desse compêndio normativo, serão escolhidos os sistemas eleitorais que se utilizaram para a eleição dos candidatos aos diversos cargos políticos no Estado. Logo, sistema eleitoral é a maneira que o Estado definiu e organiza a contagem de votos dos eleitores com a finalidade de converte-los em mandatos para o Poder Executivo e para o Poder Legislativo, ligando a vontade popular dos cidadãos aos poderes políticos do Estado. Segundo esclarece (GOMES, p. 121, 2014) sistemas eleitorais: “Tem por função a organização das eleições e a conversão de votos em mandatos políticos. Em outros termos, visa proporcionar a captação eficiente, segura e imparcial da vontade popular democraticamente manifestada, de sorte Nº 21, 20 de julho de 2015 que os mandatos eletivos sejam conferidos e exercidos com legitimidade. [...]” 1 O sistema eleitoral escolhido representa a melhor maneira de compor a vontade dos eleitores para cada tipo de cargo político. Com base nisso, a Constituição Federal instituiu que as nossas eleições serão regidas pelos sistemas eleitorais majoritário e proporcional. Sistema majoritário Pelo sistema majoritário, considera-se eleito o candidato que obtiver a maioria dos votos válidos, excluindo-se os brancos e os nulos. A Constituição Federal o previu para os cargos do Poder Executivo e para o Poder Legislativo (Senado Federal): Presidente e Vice – Presidente da República, (CF/1988, art. 77, § 2°); Governador e Vice-Governador de Estado, (CF/1988, art. 28 e 32, § 2°); Prefeito e Vice-Prefeito, (CF/1988, art. 29, II) e Senador e dois suplentes, (art. 46 da CF/1988). Consoante Gomes (2014, p. 122), o sistema majoritário se fundamenta no princípio da representação da maioria em cada circunscrição eleitoral, sem excluir as minorias. No Brasil, o sistema majoritário está dividido em de maioria simples ou relativa (de turno único) e sistema majoritário de maioria absoluta (de 02 turnos). O primeiro, de maioria relativa, é aplicado para a eleição de prefeito e vice-prefeito em municípios de até 200 mil eleitores e para a eleição de senador e seus 02 suplentes (respectivamente art. 29, II 1 GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 10 ed. São Paulo. Editora Atlas, 2014, p.121. Nº 21, 20 de julho de 2015 e 46 da CF/1988), pelo qual será considerado eleito o candidato que obtiver a maioria dos votos válidos. A título de exemplo, considere que determinado município tenha uma população local de 240 mil habitantes, dos quais 198 mil sejam eleitores. Nas eleições municipais para prefeito e vice-prefeito, houve a disputa entre os candidatos A, B e C que representaram os seus partidos. Nesse caso, após a votação, excluindo os votos brancos e nulos, apuraram-se 172 mil votos válidos, distribuídos da seguinte maneira: Candidato A: 50 mil votos; Candidato B: 69 mil votos e Candidato C: 53mil votos. No exemplo citado, em razão de o município contar com menos de 200 mil eleitores, foi considerado eleito o Candidato B, pois obteve a maioria simples dos votos. Observa-se que, ao adotar a maioria relativa, o representante político eleito pode, não necessariamente, representar de fato a opção da maioria das pessoas naquele município. A quantidade de votos recebidos pelo candidato B representa, em termos percentuais (desprezada fração), 40% dos votos válidos, 34% dos eleitores e 28% dos habitantes dos municípios. Para o sistema majoritário de maioria absoluta, o candidato será considerado eleito se obtiver a maioria absoluta dos votos válidos, excluindo os brancos e nulos, tal que, se nenhum dos candidatos alcançar essa votação, ocorrerá nova eleição em segundo turno, com os dois candidatos mais votados no primeiro turno. A Constituição Federal previu que fosse observada a maioria absoluta, prevista em seu artigo 77, § 3°, para os cargos de presidente da República, governador e vice-governador de Estado e prefeito e vice-prefeito de município com mais de 200 mil eleitores. Nº 21, 20 de julho de 2015 Sistema proporcional O sistema proporcional fundamenta-se em dar voz no parlamento a todos os segmentos da sociedade que tenham representações políticas mínimas nas eleições. Segundo os ensinamentos de José Jairo Gomes: GOMES (2014, p. 122-123): [...] Visa distribuir entre as múltiplas entidades políticas as vagas existentes nas Casas Legislativas, tornando equânime a disputa pelo poder e, principalmente, ensejando a representação de grupos minoritários. Por isso, o voto tem caráter dúplice ou binário, de modo que votar no candidato significa igualmente votar no partido (= voto de legenda); também é possível votar tão só na agremiação. Assim, tal sistema não considera somente o número de votos atribuídos ao candidato, como no majoritário, mas sobretudo os endereçados à agremiação. Pretende, antes, assegurar a presença no Parlamento do maior número de grupos e correntes que integram o eleitorado. [...]2 Para que isso ocorra, o sistema proporcional tem como parâmetro uma quantidade mínima de votos, que é representada pela divisão do número de votos válidos e pelo número de vagas no parlamento. Essa quantidade mínima é chamada de quociente eleitoral e cada partido que conseguir atingi-lo terá pelo menos um representante no parlamento. Assim, os partidos estarão proporcionalmente representados. A Constituição Federal estabeleceu o sistema proporcional para eleger os membros do Poder Legislativo (exceto o Senado 2 GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 10 ed. São Paulo. Editora Atlas, 2014, p.122- 123. Nº 21, 20 de julho de 2015 Federal): a Câmara dos Deputados, as Assembleias Legislativas, a Câmara Legislativa e as Câmaras de Vereadores, consoante os artigos 45, 27, § 1°, 32, §3° e 29, IV todos da Constituição de 1988. Para identificar proporcionalidade partidária e distribuir as cadeiras parlamentares, necessita-se que sejam realizadas determinadas sequências de cálculos que estão previstos no Código Eleitoral. Dessa forma, o sistema proporcional depende que se apure o quociente eleitoral, em seguida o quociente partidário para distribuição. Nessa linha, o quociente eleitoral corresponde à quantidade de votos válidos necessários, somando-se os em candidatos e em legendas, que um partido ou uma coligação partidária deverá atingir nas eleições para ter representação no Parlamento. Para a sua apuração, o Código Eleitoral prevê tal fórmula em seu artigo 106: Art. 106 – Determina-se o quocienteeleitoral dividindo-se o número de votos válidos apurados pelo de lugares a preencher em cada circunscrição eleitoral, desprezada a fração se igual ou inferior a meio, equivalente a um, se superior. De posse do quociente eleitoral, apura-se o quociente partidário que expressa em números de cadeiras no parlamento, a proporção alcançada nas urnas pelo partido ou coligação de legendas e em seguida passa-se a indicar os eleitos conforme os comandos dos art. 107, 108 e 109 do Código Eleitoral: Art. 107 - Determina-se para cada Partido ou coligação o quociente partidário, dividindo-se pelo quociente eleitoral o número de votos válidos dados sob a mesma legenda ou coligação de legendas desprezada a fração. Nº 21, 20 de julho de 2015 Art. 108 - Estarão eleitos tantos candidatos registrados por um Partido ou coligação quantos o respectivo quociente partidário indicar, na ordem da votação nominal que cada um tenha recebido. Art. 109 - Os lugares não preenchidos com a aplicação dos quocientes partidários serão distribuídos mediante observância das seguintes regras: I - dividir-se-á o número de votos válidos atribuídos a cada Partido ou coligação de Partidos pelo número de lugares por ele obtido, mais um, cabendo ao Partido ou coligação que apresentar a maior média um dos lugares a preencher; II - repetir-se-á a operação para a distribuição de cada um dos lugares. § 1º - O preenchimento dos Iugares com que cada Partido ou coligação for contemplado far-se-á segundo a ordem de votação recebida pelos seus candidatos. § 2º - Só poderão concorrer à distribuição dos lugares os Partidos e coligações que tiverem obtido quociente eleitoral. Para melhor compreensão das fórmulas expressas pelo Código Eleitoral para o sistema proporcional, passemos a exemplificar os cálculos, utilizando como referência didáticas as tabelas exemplificativas apresentadas pelo professor Ari Ferreira Queiroz3: Cálculo de votos válidos Cálculo do quociente eleitoral VV = VC + VL, onde: QE = VV / VP, onde: VV = votos válidos; QE = quociente eleitoral; 3 QUEIROZ, Ari Ferreira. Direito Eleitoral. 12 ed. Editora JHmizuno. 2014, p. 111. Nº 21, 20 de julho de 2015 VC = votos dados em candidatos; VV = votos válidos; VL = votos da legenda. VP = Vagas a serem preenchidas. Cálculo do quociente partidário Cálculo das vagas restantes QP = VCL / QE, onde: VR = VCL / (QP + 1), onde: QP = quociente partidário; VR = vagas restante; VCL= votos em candidatos ou legenda; VCL= votos candidatos ou legenda; QE = quociente eleitoral. (QP + 1) = quociente partidário, mais uma das vagas restantes. Por exemplo, em uma eleição hipotética para Assembleia Legislativa, determinado estado dispõe de 24 vagas para a disputa do cargo de deputado Estadual. Participaram dessa eleição os partidos V, X, W e a Coligação YZ que representa os partidos Y e Z. O número de votos válidos (descontados os votos em branco, os nulos e as abstenções) foi de 7.842.000 votos. Ao apurar a votação, verificou-se o seguinte resultado, somado os votos em candidatos e em partidos ou coligação: Partido V: 1.750.000; Partido X: 1.600.000; Partido W: 2.000.000; Partido K: 280.000 e a Coligação Partidária YZ: 2.212.000. a) Cálculo do quociente eleitoral: QE = VV/VP QE = 7.842.000/24 = 326.750 Nº 21, 20 de julho de 2015 Logo o quociente eleitoral que o partido ou coligação necessita atingir para eleger um deputado é de 326.750 votos. Verifica-se de plano que o Partido K com 280.000 votos não atingiu o quociente eleitoral e não terá representantes eleitos. b) Cálculo do quociente partidário: QP = VCL/QE Partido ou coligação Cálculo Resultado Sobra Partido V 1.750.000 / 326.750 5 116.250 Partido X 1.600.000 / 326.750 4 293.000 Partido W 2.000.000 / 326.750 6 49.500 Coligação YZ 2.212.000 / 326.750 6 251.500 Partido K Não atingiu quociente eleitoral 0 0 Pelo nosso exemplo, percebe-se que houve a divisão entre os partidos políticos e coligação de 21 vagas considerando o quociente partidário de forma a buscar representar a proporcionalidade daquela circunscrição eleitoral. No entanto, observa-se que restam 03 vagas a serem distribuídas aos partidos ou coligações partidárias. Nessa situação aplica-se a regra disposta no artigo 109 do Código Eleitoral até preencher as vagas restantes. c) Cálculo das vagas restantes VR = VCL / (QP+1) Nesta etapa, as vagas restantes serão distribuídas considerando qual partido teria a maior média de votos, caso a vaga remanescente tivesse sido atribuída a todos eles. Assim: c.1 ) 22ª vaga para deputado estadual Nº 21, 20 de julho de 2015 Partido ou coligação Será adicionado uma vaga ao número de vagas conquistado por cada partido Para encontrar a maior média hipotética Partido V 1.750.000 / (5+1) 291.266 Partido X 1.600.000 / (4+1) 320.000 Partido W 2.000.000 / (6+1) 285.714 Coligação YZ 2.212.000 / (6+1) 316.000 Nesse primeiro cálculo das sobras de vagas restantes, o Partido X obteve a maior média com 320.000 votos ficando com 22ª cadeira na Assembleia Legislativa. c.2 ) 23ª vaga para deputado estadual Partido ou coligação Será adicionado uma vaga ao número de vagas conquistado por cada partido Para encontrar a maior média hipotética Partido V 1.750.000 / (5+1) 291.266 Partido X 1.600.000 / (5+1) 266.666 Partido W 2.000.000 / (6+1) 285.714 Coligação YZ 2.212.000 / (6+1) 316.000 Nesse segundo cálculo das sobras de vagas restantes, a Coligação YZ obteve a maior média com 316.000 votos ficando com 23ª cadeira na Assembleia Legislativa. c.3 ) 24ª vaga para deputado estadual Partido ou Será adicionado uma vaga ao número Para encontrar a maior Nº 21, 20 de julho de 2015 coligação de vagas conquistado por cada partido média hipotética Partido V 1.750.000 / (5+1) 291.266 Partido X 1.600.000 / (5+1) 266.666 Partido W 2.000.000 / (6+1) 285.714 Coligação YZ 2.212.000 / (7+1) 276.500 Nesse último cálculo das sobras de vagas restantes, o Partido V obteve a maior média com 291.266 votos ficando com 24ª e última cadeira para deputado estadual na Assembleia Legislativa. Assim, com essas breves considerações sobre os sistemas eleitorais, que organizam a contagem de votos nas eleições, objetivamos, de maneira didática, demonstrar o caminho percorrido pelo voto para eleger nossos representantes, tal que eles sejam fruto da vontade expressa nas urnas e reafirmem a democracia.
Compartilhar