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Havia um livro específico, “Registro da Caixa Econômica da Fábrica do Cedro”, o qual os lançamentos eram realizados neste, mas esta não durou muito tempo. Acontece que ainda havia outras formas de gratificação aos operários. Eram distribuídas sobras ou vendas de ações das fábricas. A premiação dos melhores tinha retorno imediato para a companhia, pois aumentava a dedicação, o zelo, a produção e a produtividade. A gratificação não foi, no entanto, um recurso tão generalizado, e sua distribuição muito seletiva. Foi aplicada para premiar os mestres e contramestres e poucos operários, os mais exemplares. Apesar do seu caráter limitado e restritivo, a premiação desempenhou um papel fundamental para a produção da disciplina, na medida em que garantiu e realimentou a dedicação e a lealdade da estrutura intermediária de poder. A construção da disciplina na vila operária O uso do poder político O poder político, que nas sociedades modernas é característico á Soberania do Estado, foi utilizado pelos empresários para determinar o comportamento dos operários e moradores das vilas. Foi basicamente de dois tipos: o poder legislativo e o de polícia. Os regulamentos das fábricas foram escritos para gerar compromissos sociais. O Regulamento da Cedro serviu de modelo para os da Cachoeira, São Sebastião e São Vicente. Nele dizia que estão sujeitos todos os empregados e moradores da Fábrica do Cedro (C.O.,fl.l.grifos nossos). Os destinatários eram claramente nomeados: todos os operários e habitantes da vila. Os empresários proclamavam sua soberania nos domínios internos e externos da fábrica. Para os trabalhadores e moradores não havia escolha possível: ou se submetiam a todas as normas regulamentares, ou passavam á categoria incômoda de contraventores, que, caso se enquadrassem nesta, seriam demitidos da fábrica e expulsos da Vila. A vigilância era extrema nas redondezas. O horário de recolher era 21horas. Depois disso uma fiscalização rigorosa era executada. Mais tarde, com a extensão da luz elétrica, o fornecimento de energia vinculou-se ao cumprimento daquele horário. O poder de polícia era instaurado na tarefa de disciplinamento da mão de obra das vilas operárias. Investiram no poder de taxar, aplicar multas e usar a força, prerrogativas que, nas sociedades modernas, são exclusivas do Estado. Com essas medidas, os empresários coibiam aqueles que eram contra. Além do poder de legislar e de aplicar penalidades fora das relações de trabalho, os industriais, no intuito de controlar o corpo operário, recorreram ao uso da violência nas vilas. Havia a direção e os mestres dentro das fábricas, mas além destes, eram contratadas pessoas para manter a vigilância, a ordem e a disciplina nas vilas operárias. A escolha poderia recair sobre os chefes de repartição, que passavam a ter duas funções. Esse exemplo de acumulação de funções é um dos métodos empregados para manter a ordem dentro da fábrica. Na Cedro, por exemplo, havia policiais particulares, pagos pela companhia, para manter a ordem e o sossego público. Seus membros eram chamados pelo povo de “porreteiros”, por “dar uma lição” naqueles que eram considerados rebeldes. As vilas eram constituídas de duas partes. A primeira, mais central, era formada pelo setor mais urbanizado, com casas de melhor qualidade, servidas de água e posteriormente de luz. A segunda, eram casas feitas de pau-a-pique, cobertas de palha, distantes do núcleo central. A partir do momento em que as vilas operárias se transformaram em cidades, sedes de municípios, os poderes políticos de legislar, multar, fiscalizar e de polícia voltaram á esfera pública: ás prefeituras, ás câmaras municipais ou ás delegacias e aos destacamentos policiais. A manipulação do poder econômico e ideológico O modelo fábrica e vila operária funda seu domínio na manipulação do poder econômico advindo da propriedade e do uso monopolista de bens essenciais, pelos empresários, com fins políticos, de controle dos operários. Os bens essenciais que as fábricas mineiras de tecidos do século XIX manipulavam eram muito variados. Passavam pelo abastecimento, pela moradia, pelas terras de plantio, pelo acesso a rios e lagoas para pesca, pela água, transporte, pela luz elétrica, pelos serviços, educação, lazer, etc. A outra forma posta em prática pelas fábricas para disciplinar os operários foi a utilização de outras instituições de poder. A fundação das fábricas durante o século XIX possibilitou o surgimento de uma nova categoria de operários industriais – os tecelões, o mais numeroso contingente operário em Minas. Quanto ao problema da educação, os empresários organizaram as escolas primárias noturnas para meninos e meninas, que funcionaram nas vilas, muitas vezes ás suas próprias custas. É evidente que o objetivo imediato era a formação dos menores que atuavam nas fábricas. Outra instituição de poder foi a Igreja, que foi de grande utilidade para o disciplinamento dos operários. O catolicismo sempre foi a religião dos brasileiros em geral. Assim, foram construídas capelas que celebravam missa e a presença á missa e aos cultos era um tanto quanto estimulada. Outro campo importante que os empresários investiram para o disciplinamento dos operários e moradores foi o de lazer e diversões. Além disso, tinha a questão da saúde. Antes os empresários não se responsabilizavam pelos acidentes ocorridos nas fábricas e as enfermidades eram resolvidas pela medicina caseira. Mas na década de 1890 foi instalada uma farmácia em cada fábrica para o atendimento dos operários. Outra agência de poder era a família. A instituição familiar era acionada para garantir a continuidade e a perseverança dos operários no trabalho, pelo estimulo ou pela coerção. Contudo, é possível observar que o poder ideológico foi manipulado, indiretamente, por meio do uso de agencias privadas previamente existentes na sociedade civil (como a família, a escola e a Igreja), e diretamente pelas associações especificas criadas por eles, como: bandas de música, associações esportivas, clubes, serviços auxiliares (saúde, hospitais, etc.). O convento Além das instituições vistas anteriormente, havia outras que atuavam na formação da disciplina de uma parte da força de trabalho. A maioria das fábricas mineiras, por preferir operários solteiros, organizou alojamentos para abrigar os trabalhadores que não morassem com os pais, um para homens e outro para mulheres. Esses alojamentos eram designados de formas diferentes. Na Marzagão, em Sabará, o de moças chamava-se “convento” (‘pensão para as operárias’). Acontece que eles queriam construir outro convento. Obs: esses conventos tinham em outras fábricas, como Cachoeira, Cedro, São Sebastião, São Vicente, Beriberi, Montes Claros, etc. Muitas vezes foi preferível a mão de obra feminina tanto por evitar a imobilização de capital na construção de casas para operários, quanto por essa solução possibilitar o pagamento de mais baixos salários as operárias, porque as despesas de manutenção das moçam eram as menores possíveis. Outra razão da preferência por recrutar operárias no convento é o fato delas serem mais constantes e estáveis. Com o tempo as exigências foram aumentando, preferiam mulheres sadias, com prática profissional, inteligentes, sem família, dentre outras características, e, logo, alguns conventos se fecharam. As moças começaram a resistir ao assalariamento e a busca a novas mulheres foi fracassando. A existência de regulamento próprio transformava o convento numa organização fechada. Nele, as moças não podiam agir livremente. Seu tempo e suas atividades eram reguladas coletivamente e deviam obediência á abadessa (pessoa com poderes para dirigir e vigiar o convento). O contato com o mundo exterior era regulado também. Durante os vários depoimentos dados no capítulo aparecem claramente indicados os dois