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Bioética AULA 4

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Unidade
4
OBJETIVO DESTA UNIDADE:
Analisar questões fi losófi cas que fazem interfaces 
com as questões bioeticistas.
BIOÉTICA: problemas e reflexões
A questão do especismo nas ciências
A questão do especismo é, em suma, a questão 
da disposição dos outros animais por parte dos 
humanos. Ela pode ser enfrentada sob diversos 
aspectos (lazer, vestuário, alimentação e 
experimentação científi ca são alguns desses). 
De fato, todas podem se encaixar na análise 
radical da questão sobre a autorização 
humana para tal. As práticas científi cas 
envolvendo experimentações com animais, 
portanto, também estão submetidas a 
essa lógica. Assim como toda uma gama de 
práticas ditas “culturais” que promovem o 
uso irrestrito ou até a espetacularização do 
sofrimento animal para mero divertimento 
humano.
Curso de Bioética88
Experimentação animal é defi nida como toda e qualquer prática 
que utiliza animais para fi ns didáticos ou de pesquisa. Decorre 
de uma metodologia que considera como meio para se obter 
conhecimento científi co. Abrange a vivissecção, que é um 
procedimento cirúrgico, invasivo ou não, realizado em animal vivo. 
Ela ocorre com frequência no ensino didático e nas pesquisas de 
base realizadas nas faculdades de medicina, biologia, veterinária, 
zootecnia, educação física, odontologia, farmácia etc, (o mesmo 
ocorrendo) em indústrias de alimentos, de cosméticos e de 
outros produtos industrializados. Gonçalves (2006), mostra que 
também há registros de experiências com animais praticadas 
nos centros de pesquisa, nos laboratórios, nas salas de aula, nas 
fazendas industriais ou mesmo na clandestinidade. Para a ciência, 
uma passível forma de salvaguardar suas pesquisas. Para os 
defensores de animais, uma injustiça e imoralidade inaceitável. 
Mas em características e elementaridades mais específi cas, como 
se desenrola esse debate na atualidade?
COMPLEMENTANDO
Enfrentei a questão do especismo em três textos, que já foram ao 
público em momentos distintos.
Primeiro, publiquei o texto Pink e cérebro em auschwitz-birkenau: 
Tópicos fi losófi cos sobre o vegetarianismo e o especismo à luz da 
bioética, no periódico Revista do Hospital Universitário/UFMA, (v.1, 
n.1/2), em 2003.
Em seguida, orientei a monografi a de conclusão de graduação 
em Filosofi a de Arnaldo S, Menezes Filho, intitulada Ética e 
experimentação animal: exposição dos argumentos fi losófi cos 
para o uso de animais em experimentos científi cos, em 2010.
Mais recentemente, publiquei o artigo Ética, Método e 
Experimentação Animal: a questão do especismo nas ciências 
experimentais, em parceria com Arnaldo de Souza Menezes Filho, 
publicado no periódico Cadernos de Pesquisa (v.18, n.3), em 2011.
O texto que segue nessa unidade é um extrato desses textos.
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 89
No Brasil, o debate se manifesta em função de fatores culturais, 
históricos e sociais do momento, através de organizações brasileiras de 
proteção animal discutindo e buscando a regulamentação das formas de 
uso dos animais, especialmente na experimentação científi ca. Contudo, 
a questão do especismo passa pela nossa forma de lidarmos com as 
questões éticas, mas é, sobretudo, um debate com a nossa própria 
tradição religiosa e fi losófi ca.
Argumentos a favor da experimentação com animais
São vários os argumentos que tentam justifi car o direito de os humanos 
dispor dos animais não humanos para fi ns científi cos. Apontaremos alguns:
• A pesquisa com animais não humanos benefi cia a ambos
A posição que prevalece no meio científi co para a questão destacada 
refere-se ao critério “necessidade” de se utilizar os animais em fi ns 
experimentais. Os argumentos destacados nesse critério convergem 
para o seguinte enunciado: Existem vários benefícios obtidos a partir 
da utilização de animais e, esses benefícios, não se restringem à saúde 
humana, estendem-se à saúde dos próprios animais.
Trajano e Silveira (2008, p.31) destacam que nem sempre esse 
argumento é sufi cientemente lembrado no debate fi losófi co acerca 
dos direitos dos animais:
A experimentação animal resulta em benefícios em 
termos de diminuição do sofrimento a longo prazo, 
benefi ciando um incontável número de indivíduos, 
não apenas humanos como também outros animais, 
já que a medicina veterinária precisa e se benefi cia da 
experimentação (obviamente) animal.
Esse argumento tem ampla aceitação perante o meio científi co, o 
meio político e, claro, perante a sociedade civil, pois está alicerçado no 
paradigma do benefício, que é compreendido como condição sufi ciente 
para tolerar os efeitos do sacrifício animal e, consequentemente, 
garantir a saúde de humanos e animais. Segundo Smith e Boyd (apud 
PAIXÃO, 2001, p.23) mesmo quando não há um avanço signifi cativo para 
Markus (2008, p.24), por 
exemplo, nos diz que a 
experimentação animal teve 
inegável importância para o 
desenvolvimento da biologia. 
Basta lembrar os princípios 
de anatomia lançados por 
William Harvey no século XVII 
e as conquistas fi siológicas 
proclamadas por Claude 
Bernard. Correspondem 
à “fatos inquestionáveis” 
para nossa compreensão 
sobre os aspectos orgânicos 
dos animais humanos e não 
humanos.
Curso de Bioética90
a ciência, ainda assim, o uso dos animais para fi ns terapêuticos e práticos 
é justifi cado, pois qualquer avanço é considerado um bem em si mesmo.
• a não utilização de animais não humanos põe em cheque o futuro 
da ciência
Diante desses “fatos”, que a ciência julga como “inquestionáveis”, 
outro argumento, também de ampla aceitação, emerge dos enunciados 
anteriores: Se os avanços biomédicos estão estritamente relacionados 
à experimentação animal, a não utilização desses privaria humanos e 
animais dos atuais e futuros benefícios das pesquisas. Assim, a pesquisa 
que envolve animais apoia-se na esperança de um futuro em que doenças 
terminais, caso não estejam eliminadas, possam estar sob controle.
Os argumentos que sustentam essa ideia reafi rmam a não existência de 
técnicas e alternativas de substituição dos animais nas pesquisas, visto 
que entre humanos e animais, prevalecem as similaridades biológicas. 
Lima (2008, p.26), por exemplo, relaciona as conquistas advindas dessas 
práticas ao aumento de 23,5 anos na expectativa de vida da população 
no século XX. Para o autor, os animais são utilizados como “mapas de 
territórios não explorados” ou simplesmente, modelos. Sem esses 
mapas, torna-se mais difícil chegar ao destino esperado. O entendimento 
acerca da origem de uma doença, nessa ótica, passa pelos “modelos 
experimentais” desenvolvidos nos animais de laboratório – em sua 
maioria, ratos e camundongos. Dessa compreensão, surgem hipóteses 
sobre os mecanismos de doenças que, uma vez confi rmadas, podem ser 
revertidas em benefício da sociedade na forma de novos medicamentos, 
tratamentos mais adequados de doenças, aperfeiçoamento de técnicas 
cirúrgicas, programas de vacinação etc.
Sendo assim, estaria correto o que disse a Sociedade de Pesquisa 
Científi ca Sigmaxi em documento intitulado Sigmaxi Statement on the 
Use of Animals in Research (apud PAIXÃO 2001, p.24): “[...] a pesquisa bem 
conduzida em animais forneceu e continua fornecendo informações, 
ideias e aplicações que não podem ser obtidas de outra forma”. O 
discurso que prevalece, nessa ótica, torna-se algo inquestionável e 
infl exível. Além disso, o debate ético e científi co ainda não estabeleceu 
o que seria essa “pesquisa bem conduzida”, permanecendo ainda 
muitas dúvidas e práticas inspiradas no emotivismo.
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 91
• a não utilização de animais nãohumanos pode interferir em 
condutas éticas
A AMA (American Medical Association) considera que a não utilização 
dos animais pelos humanos afetaria o caráter ético de nossas condutas. 
Pois, como diz o documento, “[...] a pesquisa animal detém a solução 
para a Aids, o câncer, doenças cardíacas, envelhecimento e defeitos 
congênitos” (AMA apud PAIXÃO, 2001, p.23). Não dá para abrir mão 
dos animais não humanos e fazer esses experimentos diretamente 
em humanos. Para nós humanos, trata-se de uma conduta eticamente 
inadequada fazer tais experimentos em humanos e não utilizar os 
animais em experimentações prévias.
Isso implica em posicionamentos extremos e, como exemplo, aquele 
defendido por Marcuse e Pear (apud PAIXÃO, 2001, p.25): “[...] A 
investigação animal é obrigatória do ponto de vista ético”. Algo que 
Levai (2010, p.4) critica ao colocar que tal conduta funciona “[...] 
como instrumento de reiteração da ordem cultural vigente”, onde 
prevalece a chamada “[...] postura dominante, na qual o capitalismo, o 
cientifi cismo e o tecnicismo constituem o tripé ideológico que sustenta 
as bases do sistema social vigente” (idem, p.3).
Apesar de não negligenciar os critérios éticos das pesquisas e evocar 
a necessidade de priorizar o bem-estar animal, Lima (2008, p.26), 
reconhece que “[...] no universo da ciência experimental, o uso 
de animais gerando um conhecimento é um dos elos da corrente 
formadora do saber científi co”.
Desse modo, as práticas vivisseccionistas são geralmente 
compreendidas e disseminadas como “algo natural”, “necessário” ou 
como “fato consumado”. Além disso, tais práticas estão assentadas 
em dados que apregoam o avanço da ciência e as práticas alternativas 
passam a ser compreendidas e divulgadas na comunidade científi ca – e 
para os demais públicos, apenas como técnicas complementares.
Argumentos contrários à experimentação com animais
A posição de que a experimentação animal, enquanto método científi co, 
não é uma prática adequada aos fi ns humanos advém da ideia de que ela 
Curso de Bioética92
se baseia em preceitos antropocêntricos e seu uso poderá trazer, em 
vez de benefícios, malefícios à ambas espécies. Isso por que, segundo 
os anti-vivisseccionistas, o uso de um método errôneo nas pesquisas 
causará aos humanos danos fi siológicos, neurológicos, psicológicos, 
dentre outros. Para os animais, restaria o sacrifício de milhões de vidas 
em benefício de poucos.
Segundo Paixão (2001, p.26), as críticas em nível científi co, direcionadas 
à tal prática, encontram-se divididas em duas categorias:
A primeira evidencia que os animais são consideravelmente diferentes 
dos seres humanos. E, sendo assim, torna-se impossível extrapolar 
qualquer resultado entre as espécies. Trata-se, portanto, de uma 
“crítica absoluta” à experimentação animal.
A segunda crítica, por sua vez, proclama que podem ser falhas 
determinadas características dos experimentos e dos procedimentos 
que o acompanham. Por exemplo, citamos a confi abilidade e a 
validade dessas práticas, de onde emerge a necessidade, segundo 
Levai (2010, p.2) “[...] de uma mudança na mentalidade dos mestres 
e dos pesquisadores, uma pequena revolução interior que lhe permita 
conciliar a ética à atividade didático-científi ca”. Desse modo, segundo 
o autor, deve-se romper o silêncio predominante no campo das 
ciências biomédicas, em busca de retirar determinados tabus e, claro, 
questionar a noção de justiça apenas ao restrito universo dos humanos.
• Crítica absoluta: animais humanos e não humanos são radicalmente 
diferentes
Essa postura diz que a utilização de animais não humanos é um 
procedimento inadequado, com resultados inúteis, que ocasionam 
graves equívocos e, pior, desestimulam a elaboração de outros 
métodos mais efi cazes.
Nessa acepção, os animais não podem ser compreendidos como 
“modelos” para os humanos, como citou Lima (2008, p.26), devido 
o seguinte argumento, exposto por Paixão (2001, p.27): existe uma 
Por estarem distantes da 
almejada “similaridade 
biológica” defendida 
pelos cientistas, os anti-
vivisseccionistas advogam 
que os animais são “modelos 
ruins” ou “modelos 
inexistentes”.
Com base nessa assertiva, 
segundo Croce (apud 
PAIXÃO, 2001, p.27) temos 
o seguinte argumento: 
Nenhuma experimentação 
conduzida em uma espécie 
pode ser extrapolada para 
outra espécie. Caso seja feita 
a extrapolação, as pesquisas 
podem produzir diversos 
resultados enganosos.
Isso ocorre, especialmente, 
devido as difi culdades de 
auferir consideravelmente os 
resultados da pesquisa com 
animais, pois essa se mostra 
limitada às condições e à 
natureza do próprio animal.
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 93
grande variação entre as espécies e, sendo assim, os animais respondem 
de forma diferente às drogas e às doenças.
Um dos aspectos apontados nesse sentido é que a pesquisa realizada 
em animais é perigosa quando se trata de avaliar a segurança de drogas. 
Muitas das reações adversas que ocorrem nos pacientes não podem 
ser demonstradas nos experimentos. Parte disso deve-se ao fato de 
que os animais não são capazes de relatar vários sintomas, tais como 
náuseas, dores de cabeça, depressão, distúrbios psicológicos, dentre 
outros, que indicam o potencial de ameaça da droga. E mesmo quando 
esses efeitos colaterais são excluídos, o potencial de predição ainda é 
baixo, isto é, os testes em animais não podem predizer o que realmente 
acontecerá quando a droga for administrada ao ser humano.
• Mito dos benefícios advindos da experimentação animal
Outra abordagem que merece destaque e que é amplamente utilizada 
pelos opositores da experimentação animal, corresponde àquela 
citada por Singer (2002, p.79-81), quando enfatiza o exagero no papel 
atribuído aos estudos que utilizam animais.
Para Singer (2002, p.79), “[...] os defensores da experimentação 
com animais gostam de nos informar que esse tipo de experiência 
fez aumentar imensamente nossa expectativa de vida [...] [todavia] 
essas alegações são completamente falsas”, pois aquilo que é 
veiculado enquanto discurso, geralmente em comerciais de fármacos, 
em propagandas médicas e na imprensa em geral, ilustram erros 
estatísticos ou mecanismos de controle das ideias de diversos setores 
da sociedade.
Por isso, Singer (2002, p.80) retoma o posicionamento do médico 
especialista em medicina comunitária, Dr. David St. George (apud 
SINGER, 2002, p.80): 
Esse debate foi resolvido, e agora trata-se de um fato 
amplamente aceito que as intervenções médicas 
somente exerceram um efeito marginal sobre a 
mortalidade da população, e sobretudo num estágio 
muito tardio, depois de os índices de mortes já terem 
diminuídos acentuadamente.
Você sabe por quais testes o 
medicamento que você toma 
passou? Quais animais foram 
utilizados para testar a água que 
você bebe, o shampoo que usa 
ou o seu protetor solar?
Curso de Bioética94
Ademais, Singer (2002) também utiliza a opinião de outros dois 
especialistas, que estudaram as dez principais doenças infecciosas 
dos Estados Unidos. A queda drástica nos índices de mortalidade 
expressos naquele território entre 1900 e 1948 ocorreu, com base 
nos estudos desses autores, sem qualquer intervenção nova de 
medicamentos ou procedimentos, de onde pode-se supor que as 
melhorias de condições sanitárias e de alimentação seriam os fatores 
preponderantes na redução dos índices de mortalidade.
Talvez nos índices de mortalidade, 3,5% da queda ocorrida possa ser 
explicada por meio da intervenção médica, no caso das principais 
doenças infecciosas. Na verdade, já que são precisamente essas 
doenças em cuja redução de índices de mortalidade a Medicinaalega 
ter sido bem mais sucedida, a taxa de 3,5 provavelmente representa, 
para o declínio da mortalidade por doenças infecciosas nos Estados 
Unidos, uma estimativa razoável do limite da contribuição total das 
medidas médicas (MCKINLAY; BEAGLEHOLE apud SINGER, 2002, 
p.80).
Desse modo, Singer (2002, p.81) nos diz que é equivocado qualquer 
argumento que eleja os benefícios que a experimentação animal 
trouxe, ou que poderiam trazer, à melhoria e expectativa de vida 
da população. Quando essa contribuição existe, ocorre de forma 
irrelevante ou insufi ciente e o debate sobre as conquistas médicas 
advindas da experimentação animal torna-se algo impossível de 
se chegar à um consenso. Nas palavras de Singer (2002, p.81) isso 
signifi ca que
[...] ainda que valiosas descobertas tenham sido feitas 
com o uso dos animais, não podemos afi rmar até que 
ponto a pesquisa médica teria sido bem sucedida se, 
desde o começo, tivesse sido obrigada a desenvolver 
métodos alternativos de investigação.
Sendo assim, as conclusões retiradas de testes toxicológicos e de 
práticas que envolvem animais, na ótica de Paixão (2001, p.31), 
podem não possuir uma base confi ável para a saúde humana, uma 
vez que os resultados são insustentáveis e, sobretudo, manipulados 
comercialmente.
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 95
• Ocultamento de dados para fi ns comerciais
Felipe (1999) diz que diversas pesquisas são mantidas por empresas 
que lucram com a venda de fármacos, por indústrias de aparelhos e o 
segmento da cosmética. Em função disso, muitos dados são maquiados 
ou negligenciados.
Nesse cenário, em que as futuras gerações de profi ssionais são 
formadas, atesta Felipe (1999, p.4):
[...] jovens estudantes recebem treinamento intensivo 
no domínio de técnicas aplicadas ao corpo de animais 
não humanos. Seu treinamento, no entanto, [...] não se 
digna a contemplar os interesses de nenhuma espécie 
sacrifi cada. São interesses humanos os que contam.
Há solução para a questão ética da experimentação animal?
Segundo Hossne (2008, p.38) a questão da ética em experimentação 
animal já possui “substrato concreto em recomendações” como 
aqueles advindos da Declaração Universal de Direitos Animais (UNESCO 
1978), da Declaração do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal 
(COBEA) e de alguns projetos em tramitação no Congresso Nacional. 
Dentre tais recomendações, se destaca aquela de amplo conhecimento 
e aceitação no meio científi co: a adoção dos “3Rs”.
• Replacement (substituição)
O primeiro “R” refere-se à “replacement” (substituição).
Deveria prevalecer na experimentação animal a substituição de 
vertebrados por seres não sencientes, como plantas e microrganismos.
• Reduction (redução)
O segundo “R” corresponde à “reducion” (redução) do número de 
animais utilizados em experimentos, pois a escolha de diferentes 
Curso de Bioética96
estratégias pode incidir na descoberta e no aperfeiçoamento dos 
campos biomédicos e estatísticos.
• Refi nement (refi namento)
O terceiro “R” refere-se a “refi nement” (refi namento) que indica que se 
deve buscar minimizar ao máximo o desconforto e sofrimento animal 
com uso de drogas anestésicas, caso seja necessário.
A adoção dos “3Rs”, à primeira vista, parece ser uma alternativa 
importante para nortear as condutas éticas dos humanos perante 
os animais. Mas, como um dos nossos objetivos está em promover 
o debate fi losófi co a partir dos argumentos que circunscrevem o 
fenômeno, vale destacar as críticas direcionadas a tal prática.
Em primeiro lugar, citamos o posicionamento de um defensor da 
experimentação animal. Na ótica de Goodwin (apud PAIXÃO, 2001, p.24) 
não é adequado o uso de recursos alternativos e a adoção dos “3Rs” 
signifi ca “[...] uma percepção de que nós concordamos que o uso de 
animais é moralmente errado, e que está se tentando afastar esse uso 
o mais rápido possível”. Adotar tal prática contradiz a premissa de que 
os modelos fornecidos pelos animais são modelos apropriados aos fi ns 
humanos. Além disso, esse argumento nos leva a crer que os animais 
estão fora do campo da moral dos seres humanos.
De outra forma, os “3Rs” também são criticados pelos opositores da 
experimentação animal, pois é originário da convicção que existem 
métodos seguros e mais efi cientes para a experimentação animal. 
Assim, para Paixão (2001, p.29):
[...] os ‘3Rs’ também são criticados, já que a ideia de se 
’reduzir’ ou ‘refi nar’ mantém a utilização de animais, 
e até mesmo a ideia de ‘substituir’ é criticada porque 
supõe-se que experimentos animais ‘válidos’ possam 
ser substituídos por outros experimentos, igualmente 
válidos, logo ‘validando’, pelo menos cientifi camente, 
o atual sistema’.
Esse tipo de abordagem, que traz à tona o uso dos animais para fi ns 
experimentais a partir de critérios científi cos, é mais recente do que o 
De acordo com Hossne (2008, 
p.38) um quarto “R” nem 
sempre é sufi cientemente 
lembrado. Trata-se da adoção 
do “R” de respeito como 
alicerce da pesquisa científi ca 
que envolva animais. Esse não 
deveria estar ausente, mesmo 
que as melhorias da condição 
dos animais de laboratório sejam 
apenas para a melhoria dos 
resultados das pesquisas.
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 97
questionamento sobre ações morais acerca do uso de animais. Desse 
modo, é evidente que a crítica ao método a partir de critérios científi cos 
objetiva indicar outros caminhos para impedir o sofrimento desses 
seres passíveis de sensibilidade.
Levai (2010, p.4-5) exemplifi ca alguns dos mais conhecidos recursos 
alternativos, que em seu entendimento, poderiam “[...] inspirar uma 
metodologia científi ca verdadeiramente ética”:
Sistemas biológicos ‘in vitro’ (cultura de células, 
de tecidos e de órgãos passíveis de utilização em 
genética, microbiologia, bioquímica, imunologia, 
farmacologia, radiação, toxicologia, produção de 
vacinas, pesquisas sobre vírus e sobre câncer); 
Cromatografi a e espectrometria de massa (técnica 
que permite a identifi cação de compostos químicos 
e sua possível atuação no organismo, de modo não-
invasivo); Farmacologia e mecânica quânticas (avaliam 
o metabolismo das drogas no corpo); Estudos 
epidemiológicos (permitem desenvolver a medicina 
preventiva com base em dados comparativos e na 
própria observação do processo das doenças); Estudos 
clínicos (análise estatística da incidência de moléstias 
em populações diversas); Necrópsias e biópsias 
(métodos que permitem mostrar a ação das doenças 
no organismo humano); Simulações computadorizadas 
(sistemas virtuais que podem ser usados no ensino 
das ciências biomédicas, substituindo o animal); 
Modelos matemáticos (traduzem analiticamente 
os processos que ocorrem nos organismos vivos); 
Culturas de bactérias e protozoários (alternativas para 
testes cancerígenos e preparo de antibióticos); Uso da 
placenta e do cordão umbilical (para treinamento de 
técnica cirúrgica e testes toxicológicos); Membrana 
corialantoide (teste CAME, que utiliza a membrana 
dos ovos de galinha para avaliar a toxicidade de 
determinada substância); etc.
É inegável também dizer que por trás do desenvolvimento desses 
“recursos alternativos” encontra-se uma importante crítica ao 
antropocentrismo, paradigma que ainda impera nas relações sociais 
e que enaltece o que Levai (2010, p.3) chama de “altar cientifi cista”, 
ao longo da história. Pois, como diz Lima (2009, p.1), “[...] Estamos 
todos habituados, infelizmente, ao jargão antropocêntrico que afi rma 
a superioridade humana sobre os outros membros da natureza”.
E aqui cabe o questionamento que Felipe (1999, p.3) diz ser comum 
a todo profi ssional e cidadão: “[...] Incluir ou não seres não racionais 
Cursode Bioética98
no âmbito das considerações morais?” Existe uma razão para que 
isso ocorra, segundo diz a autora. Trata-se de ampliar cada vez mais 
o campo da moralidade. Caso não sejamos capazes de incluir os 
animais no âmbito da moralidade, corre-se o risco de diminuir nossa 
sensibilidade perante práticas bárbaras e cruéis até com seres de nossa 
própria espécie.
A questão da morte digna
Morrer, hoje em dia, se tornou muito complicado. Não morremos 
mais como antigamente: acompanhados de nossos entes queridos em 
nosso leito ou defendendo nossas honras nos campos de batalha. Era 
simples demais. Morríamos pela espada, pela peste, por uma doença 
letal ou pelo consumir dos anos. Hoje, como relata Ariès (2003), morrer 
não é mais um evento social, vivenciado no âmbito domiciliar e cercada 
por rituais e emoções públicas. Morrer tornou-se um evento privado 
e proibido de ser trazido publicamente à fala, principalmente nas 
ciências da saúde, que, ironicamente, são as ciências que na sua prática 
profi ssional mais se deparam com essa questão.
Esses interditos acerca do morrer não nos afastam da questão, mas ao 
contrário, a exigem. E, seu enfrentamento passa pelo que se conhece 
genericamente como “morte digna” ou “morrer com dignidade”.
Enfrentei a questão da morte digna, sozinho ou em parceria com 
outros autores, em vários textos, sob os mais diferentes aspectos:
O primeiro deles foi a eutanásia, publicado em 2005, na Revista 
do Hospital Universitário. Depois, em 2006, a medicalização da 
morte, na Ciências Humanas em Revista. E, no mesmo ano, propus 
um método de investigação tanatológico, chamado Silogismo da 
Morte, publicado naquele mesmo periódico;
A morte como questão social, foi publicado em 2007, na Barbaroi;
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 99
Em 2008, defendi uma tese de doutorado sobre o assunto que 
depois foi premiada pela CAPES e virou livro, sob o título Direitos 
Sociais dos Moribundos, publicado pela EDUFMA;
A formação que os profi ssionais de saúde recebem para lidar com 
a morte, em 2010, na Cadernos de Pesquisa; e na Investigación y 
Educación em Enfermaría, em 2011;
Os rituais de luto no universo virtual, na cadernos de Pesquisa, em 
2011.
O que vai ser apresentado aqui é mais um convite para a discussão 
sobre o tema.
A medicalização do morrer
A questão da “morte digna” está localizada dentro do paradigma da 
medicalização da vida (CLOTET, 2003, p.27-48), uma vez que com essa 
medicalização, as concepções de morte e morrer mudaram. Dentre as 
formas de medicalização da vida associadas à morte e ao morrer estão 
a descoberta dos antibióticos e a criação das UTIs.
O sucesso intervencionista das UTIs é tão forte sobre o imaginário das 
pessoas que algumas chegam a pensar que a morte nos ambientes de 
UTIs é opcional (SOUZA; ZAKABI, 2005, p.93-94). Ou seja, que alguém 
possa ser hibernado para sempre ou até que se descubra uma cura. Isso 
criou no ambiente das ciências da saúde uma ilusão de amortalidade. 
É essa ilusão que ajuda as pessoas, em muitos casos, a enfrentar o 
sofrimento em torno do morrer. Pois, muitas vezes a família sabe que 
não irá salvar a vida do doente, mas quer viver essa ilusão. O profi ssional 
de saúde, também, ou vivencia ou ajuda a alimentar nos usuários essa 
mesma ilusão (LUNA, 2005, p.18-19; DA SILVA, 2005, p.364-365).
Como esse imaginário perpassa todas as classes e profi ssões, dá-
nos a entender que atualmente existe uma conspiração contra 
o morrer. As pessoas são até capazes de aceitar a morte, mas 
difi cilmente aceitam o morrer. Elas são até capazes de fazer planos 
Amortalidade diz respeito às 
formas de suspensão da morte 
ou ao que ela representa. 
Por exemplo, a criogenia é 
entendida como uma forma de 
amortalidade porque suspende 
o processo de decomposição 
– que é associado à morte. 
Muitos tratamentos estéticos 
e plásticos são formas de 
amortalidade (de ocultamento 
dos sinais da morte em 
nossos corpos). Perceba que 
a amortalidade não tira a 
mortalidade, a esconde ou 
prolonga o máximo de vida 
possível (longevidade).
Curso de Bioética100
para a sua morte, ou sobre a sua forma, o dia ou o que virá depois, 
mas pouquíssimas fazem planos para morrer.
As religiões ocidentais, as ciências da saúde e a nossa cultura em 
geral compreendem a morte como fi nitude, como um fi m da vida, 
uma passagem ou uma punição. Com isso elas não preparam 
as pessoas para o morrer. Mesmo as pessoas religiosas, cujas 
crenças atribuem à morte um papel importante como um ritual de 
passagem, normalmente são temerárias quanto a esse momento.
Note bem, elas normalmente veem a morte como um momento, o 
que signifi ca que desprezam o morrer. E, as fronteiras do morrer 
se confundem com as fronteiras do viver, como nos lembra 
Montaigne (1972). Desse modo, o bem viver e o bem morrer são 
duas faces da mesma realidade.
O que mais temos observado na realidade é que domina entre os 
profi ssionais da saúde uma obstinação terapêutica e um afastamento 
acadêmico com a questão da morte e do morrer.
• Obstinação terapêutica
Obstinação terapêutica no que diz respeito a uma “inexorável 
tecnologização dos cuidados médicos” (LUNA, 2005, p.18), ou mais 
precisamente, uma futile medical therapy, conhecida também como 
distanásia.
Essa obstinação terapêutica, que se revela em casos como o da 
americana Terry Schiavo, deve-se, de acordo com Luna (2005), mais às 
concepções fi losófi cas (sic) e religiosas do que às decisões éticas, legais 
e econômicas. No entanto, a insistência pelo tratamento intensivo 
deveria ser limitada “[...] às condições que permitam uma sobrevida 
qualifi cada e digna” (LUNA, 2005, p.18), e não como uma prática de 
distanásia, gerando dispêndios públicos e comprometendo a qualidade 
de vida e morte dos usuários do sistema público de saúde.
Distanásia é o prolongamento 
do processo de morte por 
meios artifi ciais, geralmente 
aumentando o sofrimento de 
todos os envolvidos, na tentativa 
de evitar, a todo custo que a 
morte aconteça. Sua ideologia é 
pautada fortemente no desejo de 
amortalidade.
Distanásia é ainda conhecida, 
além dos sinônimos aqui 
apresentados, como 
encarniçamento terapêutico.
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 101
• Afastamento acadêmico
Afastamento acadêmico no que diz respeito à ausência de preparação 
acadêmica dos profi ssionais da área da saúde para lidar com a 
questão da morte e do morrer, justamente os que mais se deparam 
cotidianamente com essa questão (DA SILVA, 2005, p.364-365).
Os poucos conteúdos que abordam essa questão são insufi cientes
[...] eles apenas falam de questões éticas ou causa 
mortis da população, mas ao se compreender a 
morte como um fenômeno ao qual se está exposto 
diariamente (presenciando, ou tentando lutar contra) 
e com o qual deveria saber lidar, não há referências 
(DA SILVA, 2005, p.364).
Essa pouca ou nenhuma preparação acadêmica para lidar com a 
questão da morte e do morrer é evidenciada pela ausência da disciplina 
tanatologia ou outra que faça o papel dos cursos da área da saúde. 
Assim, resta ao profi ssional o sentimento de que a morte representa 
um inefável e um insondável mistério contra o qual as suas forças são 
insufi cientes. O que ocasiona na obstinação terapêutica, afastando 
outras possibilidades mais humanizadas.
A discussão chega à Filosofi a e já dividiu a Ética aplicada à saúde em 
utilitaristas e consequencialistas. O primeiro grupo, mais ligado às ideias 
de Bentham (1979), subjuga o tratamento ao conceito de dor e prazer; 
o segundo grupo, mais ligado às ideias de Singer (2002), associa a 
questão da vida e da morte não ao tratamento, mas à experimentação, 
o quelevou a denunciar a distanásia, e a defender a eutanásia e o 
suicídio assistido.
Eutanásia é um termo que já passou por inúmeras modifi cações, 
desde o de boa morte a sinônimo de homicídio. A defi nição mais 
em voga é a de que eutanásia é a ação ou omissão por parte do 
médico com intenção de, por compaixão, provocar a morte do 
paciente em sofrimento e a pedido desse.
Alguns autores costumam falar em eutanásia voluntária (a pedido 
do paciente) e eutanásia involuntária (realizada por compaixão do 
Curso de Bioética102
profi ssional, mas sem ciência do paciente – geralmente o paciente 
não está em condições de decisão).
Falam também em eutanásia ativa (aquela produzida por uma ação 
concreta) e eutanásia passiva (aquela decorrente de uma omissão 
de cuidados ou de tratamentos, bem como da retirada de suporte, 
para deixar o paciente, intencionalmente, morrer).
No entanto, essas defi nições sofreram revisões e não é mais comum 
falar em eutanásia passiva nem involuntária, pois, a legalização e 
politização da prática, defi ne que é próprio da eutanásia ela ser uma 
solicitação voluntária (não pode ser representada), devidamente 
analisada e sob a oferta de opções de cuidados. A eutanásia passiva 
passaria a ser considerada negligência e a eutanásia involuntária, 
homicídio.
Note também que eutanásia passa a ser um protocolo clínico 
realizado por um profi ssional habilitado e designado para essa 
tarefa.
Suicídio assistido é a assistência clínica ao moribundo que deseja 
e ainda tem condições de tirar a própria vida, geralmente pela 
administração de fármacos que conduzam ao óbito sem causar 
dor e sofrimento. Nesses casos, o profi ssional auxilia o moribundo 
em diversos aspectos, mas não tenta demovê-lo de sua ação ou 
impedir que o fármaco ingerido faça o seu efeito letal.
Esses debates produziram inúmeras questões, das quais algumas já 
vieram à tona no Brasil. A mais recente foi a tentativa de criar normas 
para a internação dos usuários nas UTIs. Ventilada pelo então Ministro 
da Saúde Humberto Costa (em abril de 2005), a ideia terminou 
engavetada, após manifestações contrárias.
Essa proposta pretendia oferecer critérios para o acesso ao tratamento 
intensivo, o que deixaria de fora, por exemplo, uma pessoa com morte 
cerebral, caso outra precisasse do leito. Isto é, o Ministério da Saúde 
trabalhava com o objetivo de criar normas para dar acesso aos leitos de 
UTI só para usuários graves com chances reais de recuperação.
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 103
Nem os setores médicos, nem os setores políticos aceitaram essa 
iniciativa, ao menos na forma como fora ventilada. No entanto, a 
discussão não foi encerrada, como o próprio Ministro declarou à Folha 
de São Paulo: “Queremos fazer a discussão de forma correta, situá-la 
em nível técnico e impedir que haja má compreensão ou insegurança 
pela população” (SCOLESE 2005, p.1).
A reação contrária tem duas bases.
• Reação médica da AMIB
A reação médica argumenta que a proposta retira o poder de decisão 
do médico sobre quem precisa ou não ir à UTI, e que o real problema é 
a falta de leitos não a sua seleção.
Para a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), a proposta 
de discutir a Cultura da UTI é importante, uma vez que ela existe. Mas, 
o governo não pode discutir a seleção dos leitos sem antes sanar a 
carência de leitos atual, que também existe.
Justamente devido à falta de leitos, e da pressão familiar, o médico 
acaba escolhendo aquele usuário em situação mais grave, que não é 
necessariamente o que mais se benefi ciará da UTI. No entanto, devido 
a essa escolha, o usuário em estado menos grave, que poderia tirar 
melhor proveito do tratamento, acaba retardando a sua entrada, o 
que pode agravar o seu quadro e transformar o problema num círculo 
vicioso.
• Reação política do Congresso
Por sua vez, a reação política do Congresso argumenta que haveria 
discriminação na seleção dos leitos, o que poderia prejudicar os 
usuários menos favorecidos economicamente, afi nal, as UTIs públicas 
são usadas pela rede privada, e não o contrário.
Curso de Bioética104
Aqui nós temos uma questão crucial. A discussão da otimização dos 
leitos é uma discussão meramente técnico-científi ca ou é uma questão 
de infra-estrutura? Um dos problemas, enquanto não se resolve esse 
impasse, é que se continua a praticar a distanásia e a gerar uma cultura 
excludente do doente terminal. As próprias câmaras de Bioética dos 
Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) já discutem a elaboração de 
uma medida que salvaguarde o médico em condutas adotadas com o 
doente terminal, como a eutanásia, por exemplo. Esses profi ssionais 
admitem que é preciso a criação de um protocolo de orientação 
médica, de forma a impedir que o critério balizador das decisões sobre 
quem fi ca e quem sai da UTI continue sendo o econômico ou a pressão 
da família do doente.
A qualidade de vida terminal
O tema da qualidade de vida terminal está ligado à forma de assistência 
que é dispensada aos moribundos.
Uma das alternativas para o tratamento do doente terminal longe da 
UTI, do ponto de vista da ética, é o cuidado paliativo. Esse cuidado pode 
ser realizado em casa, hospices ou em enfermarias dentro de hospitais 
nas quais os usuários recebem oxigênio, soro e remédios para evitar e 
controlar a dor. Não são feitos procedimentos intrusivos e eles podem 
contar com uma equipe de profi ssionais da saúde para apoio (SOUZA; 
ZAKABI, 2005 p.97-98). Exemplos de instituições onde já há o cuidado 
paliativo: Hospital do Servidor Público Estadual, do Estado de São Paulo 
e o Instituto Nacional de Câncer, no Estado do Rio de Janeiro, ambos 
são da rede pública, mas há outros na rede privada.
No entanto, devido àquela ilusão de amortalidade e à autoprojeção 
que as famílias têm, normalmente se recorre ao tratamento intrusivo 
e condenam a possibilidade de sequer pensar no contrário. Associem 
a essa crença a ideia de que a benevolência é um princípio de ação 
superior, mesmo que isso signifi que passar por cima da autonomia e da 
não-malefi cência. Desse modo, a prática é que familiares pressionem 
os médicos para que eles façam de tudo o que for possível para manter 
o doente vivo, desenvolvendo a prática da distanásia e acarretando 
muito sofrimento a todos os envolvidos.
Moribundo é uma referência 
ao termo clássico “doente 
terminal”, que é aplicado àquela 
pessoa com alguma doença 
incurável ou com quadro clínico 
irrecuperável com estimativa 
de vida de três a seis meses 
(SOUZA; ZAKABI, 2005, p.94). 
Em 2008 discuti a questão da 
nomenclatura moribundo para 
substituir doente terminal, 
paciente terminal etc, nos 
seguintes termos:
“Apesar dos protestos, 
utilizarei o termo moribundo, 
mais comum na sociologia e 
antropologia, para signifi car 
aquilo que nas Ars moriendi é 
descrito como morituri, que 
signifi ca tanto o morrente, 
no sentido daquele que está 
condenado à morte – por 
doença grave ou por sentença 
judicial real ou eclesiástica, 
bem como jacente, no sentido 
daquele que está em seu leito de 
morte. Prefi ro assim às formas 
médicas contemporâneas de 
interdição linguística da morte, 
que propõem termos tais como 
paciente terminal, paciente fora 
de possibilidade terapêutica de 
cura ou paciente em processo 
terminal, cujo conteúdo 
proposicional está associado 
à terminalidade da vida ou à 
impossibilidade de cura e não 
têm como foco a individualidade 
da morte, da pessoa que está a 
morrer.” (GURGEL, 2008, p.16).
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 105
Quando se trata de moribundo, o que ele ganha com esses dias 
extras? Não seria mais ético acrescentar vida aos dias que ainda 
restamdo que dias, de qualquer jeito, à vida? Qual a relação 
custo benefício? O principio de não-malefi cência nos obriga a 
ponderar essa relação. Saber se o adiamento do fi m da vida é mais 
benefi cente, à custa de tanto sofrimento físico e psicológico. Na 
minha opinião não vale a pena, nem do ponto de vista social nem 
do ponto individual submeter um doente terminal ao tratamento 
intrusivo.
Eu não sou um moribundo e alguém pode alegar que eu mudaria de 
opinião se estivesse no lugar de um. Pois bem, é verdade que alguns 
moribundos não aceitam o cuidado paliativo e não se preparam para 
o morrer, mesmo após a consciência do diagnóstico. Alguns até 
acreditam que uma morte dolorosa seja uma forma de expiação. No 
entanto, mesmo convivendo com a crença de que um milagre possa 
reverter o seu diagnóstico, quando perguntados sobre seu estado 
terminal a maioria se recusa a morrer na UTI. A revista Veja (9/11/05) 
trouxe a seguinte informação:
Pesquisas feitas no Brasil e nos Estados Unidos 
mostram que, já na fase de aceitação da doença e da 
proximidade da morte, acima de 70% dos pacientes 
terminais fazem aos médicos e à família dois pedidos. 
Primeiro, não querem sofrer. Segundo, querem morrer 
em casa (CORREA, 2005, p.100).
Essa já não é mais a minha opinião, é a opinião da maioria das pessoas 
submetidas à distanásia às quais agora dei voz. Entre uma coisa e 
outra, elas preferem a boa morte, na qual prevalece o princípio de não-
malefi cência.
Se isso for verdade, a quem a família quer agradar quando pratica a 
distanásia? A quem o profi ssional de saúde quer servir quando faz o 
mesmo? A quem a justiça quer defender quando retira o seu direito 
civil de escolher como quer morrer? Perdeu-se o foco no bem-estar do 
usuário. O único bem-estar que faz parte do jogo é o bem-estar próprio? 
O da família, que posa de boazinha, mas não quer esse incômodo em 
casa? O do profi ssional de saúde que posa de competente e ético, mas 
Curso de Bioética106
não quer dispensar os cuidados paliativos, preferindo uma prática 
imoral e frustrante para o usuário? A do juiz, que posa de justo, quando 
na verdade está aquém do rábula?
A questão está em aberto.
Considerações sobre o conteúdo da unidade
Até que ponto podemos dispor dos animais? Quem tem o poder de 
decisão desse uso? O que signifi ca discutir essas questões? Esses 
questionamentos são decorrentes de um modo fi losófi co de tratar o 
tema “experimentação animal”: o da discussão sobre especismo e anti-
especismo.
Observamos que não se deve perder de vista que esse uso específi co 
ocorre como segmentação de uma discussão acerca dos diferentes 
usos dos animais pelo homem. Afi nal, práticas culturais da humanidade 
exemplifi cam a presença dos diversos usos de animais pelos humanos, 
usos que vão desde a adoração e alimentação, até o desdém, sacrifício 
e entretenimento. Ou seja, torna-se difícil romper com a lógica 
antropocêntrica que impera as relações sociais.
Esse antropocentrismo, segundo Lima (2009, p.1), apesar de não ser 
louvável, é até compreensível, devido estarmos “imersos em nossa 
própria humanidade”, que condiciona nossa existência à nossa “auto-
reverência” e estende à tudo aquilo que não é “humanamente nosso” 
um olhar distorcido de superioridade. Assim, podemos inferir que 
trazer à tona essas questões, em pleno século XXI, signifi ca reconhecer 
que existe um jogo de poderes entre visões, na qual cada grupo expõe 
argumentos que visam legitimar ou abolir, respectivamente, o uso dos 
animais pelos humanos.
Enquanto os defensores da experimentação argumentam que abolir 
esse uso privaria os humanos dos benefícios da ciência, os anti-
vivisseccionistas, em sua grande maioria, apregoam que tal prática além 
de se constituir em um método equivocado, trata-se de uma violação 
dos direitos animais. Nessa ótica os animais são compreendidos como 
seres dotados de sensibilidade e passíveis de sofrimentos, o que é 
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 107
uma pré-condição para possuírem interesses para serem defendidos. 
Por outro lado, fi ca a questão: o benefício de uns é legítimo perante o 
sacrifício de outros tantos?
Cada grupo busca legitimar seus argumentos com critérios científi cos, 
louvando ou criticando o método em questão. Algo que exige de nós 
uma postura que nos leva a questionar desde os fundamentos dessas 
práticas até o modo de se conceber o problema entre aqueles que 
estão sob determinado paradigma científi co. Leva-nos a questionar 
também como as ideias são traduzidas em discursos sociais que visam 
a reprodução de um dado sistema social vigente, em nome de uma 
“verdade” científi ca.
Observa-se que o debate sobre o uso dos animais em nossa atualidade 
ainda é uma realidade em construção, pois assim como existe o 
reconhecimento dos chamados benefícios que a prática traz aos 
humanos, não sabemos ao certo o quanto essa é um realidade distorcida 
e promovida perante o não desenvolvimento de recursos alternativos, 
confi gurando-se, portanto, como práticas desrespeitosas para com 
os animais. E, sendo uma realidade em construção, demanda uma 
postura que priorize uma abordagem multidisciplinar, onde possam 
ser contemplados os aspectos, biológicos, sociais, jurídicos, discursivos 
e fi losófi cos da questão, a fi m de que novos estudos sejam trazidos a 
tona para subsidiar as políticas públicas sobre o uso dos animais não 
humanos em fi ns científi cos. Além disso, que as dúvidas lançadas sobre 
essa prática específi ca, lance questionamentos mais amplos acerca dos 
diferentes usos (e abusos) que os animais sofrem em nome de práticas 
ditas culturais ou tradicionais, sob a luz da ética.
No outro tópico, enfrentamos a questão da qualidade de vida terminal, 
ou seja, de como é bom morrer, desde que já tenha-se decidido que há 
algo de bom em morrer.
Evocamos Montaigne (1972) que já tinha demonstrado não ser fácil 
lidar com a experiência da morte, uma vez que “[...] as pessoas se 
apavoram simplesmente com lhe ouvir o nome: morte!” (MONTAIGNE, 
1972, p.49). Daí a postura do homem vulgar que toma como remédio 
o não pensar na morte. E, se for pensar, será quando “os condenou o 
médico” (MONTAIGNE, 1972, p.49), cuja maior obra sobre o assunto 
é, na maioria das vezes, o testamento. Daí que, desde os romanos, 
as palavras morte e morrer foram sempre tratadas pelo emprego de 
Curso de Bioética108
perífrases, como parou de viver, viveu, se foi, faleceu etc. Logo, o temor 
à morte está inversamente proporcional à vida virtuosa.
Aquele que leva uma vida virtuosa não tem porque temer ou prezar a 
morte (MONTAIGNE, 1972, p.49). No entanto, a maioria esmagadora 
das pessoas não pensa a morte de forma racional. Poucas pessoas 
costumam pensar no que querem ser quando morrerem. Isso porque 
simplesmente não pensam no que são enquanto vivem. E, não dá 
para pensar na forma como morrer somente quando o dia fatídico se 
aproximar. Isso por duas razões: primeira, não sabemos qual é esse 
dia; segunda, na maioria dos casos, quando esse dia está próximo, não 
estamos em condições de escolher como queremos morrer. Por isso, 
planejar o morrer é, antes de tudo, planejar o viver: o como realizar os 
sonhos, o falar abertamente sobre os desejos e temores relacionados 
à morte, positivar ideias e vontades.
Mesmo que a questão da qualidade de vida dos doentes terminais 
tenha mobilizado sociedades médicas no Brasil e no exterior, faltam 
estudos mais aprofundados sobre a questão da morte e do morrer 
associada ao uso ético e político das UTIs. Há mesmo, nas pesquisas 
e debates sobre a questão tanatológica, uma perspectiva de mudança 
com relação ao tratamento que se deve dedicar aosmoribundos. Essas 
mudanças passam pelo deslocamento da ênfase do manter a vida a 
qualquer custo para um alívio da dor, do controle dos sintomas e dos 
cuidados emocionais do paciente. Essa ênfase não pode ser deslocada 
dentro do atual modelo das UTIs, ou poderá ser, com muito esforço e 
resistência. Em geral, as UTIs praticam a distanásia e não a boa morte.
É bastante comum encontrarmos quem veja as UTIs como o último 
estágio, o lugar onde se morre, o que, em certa parte, é verdade. Mas 
essa verdade se dá justamente porque ela não discute mais os seus 
critérios de seleção de leitos e porque lhe falta uma alternativa.
A alternativa de uma boa morte pode signifi car trocar o tratamento 
intensivo pelo cuidado paliativo. Ou seja, trocar mais alguns dias ou 
semanas de convivência nas UTIs com estranhos e máquinas, por 
momentos mais breves, porém mais calorosos e recompensadores 
com os entes queridos em casa. Qual seria a escolha de quem tivesse 
essa alternativa? Normalmente as pessoas não pensam nesse tipo 
de alternativa, mas a realidade das UTIs brasileiras exige que ela seja 
pensada. E, não se trata apenas de uma questão seletiva, é mesmo 
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 109
um modelo de sociedade que está em jogo, de uma sociedade que 
não exclui a pessoa nos seus últimos momentos, fazendo dele um ato 
solitário, frio e tenebroso. Se há uma qualidade de vida, igualmente 
há uma qualidade de morte, que se realiza justamente na forma de 
morrer. E, se já temos tantas políticas voltadas para o nascer, para o 
viver, por que não as temos igualmente para o morrer?
RESUMO
Nessa unidade examinamos duas questões, ambas polêmicas e que 
permanecem em aberto, como forma ilustrativa das questões em Bioética: 
a questão da disposição dos animais não-humanos por parte dos humanos 
e a questão da disposição da forma de morte. O primeiro é o tema fi losófi co 
do especismo, o segundo, o da qualidade de vida terminal.
O especismo defende que o homem pode dispor dos animais, até 
porque sempre tem feito isso, principalmente quando isso trouxer 
benefícios para ambas as espécies, senão, para a espécie humana.
Em termos de experimentação animal, o especismo tenta se justifi car 
assegurando que:
a) a pesquisa com animais não humanos benefi cia a ambos;
b) a não utilização de animais não humanos põe em cheque o futuro 
da ciência; e,
c) a não utilização de animais não humanos pode interferir em 
condutas éticas.
Os não-especistas e anti-especistas tentam se justifi car assegurando 
que:
a) os animais humanos e não humanos são radicalmente diferentes, 
não é possível usar os experimentos realizados em um para 
benefício dos outros;
b) é um mito acreditar nos benefícios advindos da experimentação 
animal;
c) o que existe é um ocultamento de dados em pesquisas com animais 
para fi ns comerciais.
Curso de Bioética110
Há solução para esse confl ito? Algumas declarações propõem formas 
éticas de tratar os animais, como aquela baseada nos 3Rs: Replacement 
(substituição); Reduction (redução); e Refi nement (refi namento), 
seguido de Respect (Respeito) – na ótica de Hossne (2008). No entanto, 
o que essa alternativa faz é apenas declarar que há erros éticos no trato 
com os animais e que o discurso permanece em aberto.
No tocante à questão da qualidade de vida terminal viu-se que, com a 
medicalização do morrer, a morte se tornou algo muito mais complicado 
e se envolveu em uma teia de relações éticas e tecnológicas que a cada 
dia se torna mais complexa.
A morte nas UTIs, que pode ser uma aspiração, pode ser também um 
local de muito sofrimento e prolongamento artifi cial do processo de 
morrer, graças a um desejo e ilusão de amortalidade.
Essa prática faz nos deparar com novas formas de morte a cada dia, 
tais como distanásia, eutanásia, suicídio assistido etc. Bem como com 
novas formas de assistência, como a dos cuidados paliativos.
Em que sentido a AMA diz que não utilização de animais não 
humanos pode interferir na conduta ética das pesquisas 
científi cas?
Pesquisas científi cas na área médica podem abrir mão da 
experimentação animal, segundo Peter Singer? Por qual 
razão?
Há solução ética para a questão da experimentação animal? 
Quais são os posicionamentos?
O que é a medicalização do morrer? E qual a base fi losófi ca 
dessa ideologia?
4
Unidade 4 | Bioética: problemas e re� exões 111
Qual a diferença entre aprender a morrer e se preparar 
para a morte, segundo Montaigne?
Qual a diferença entre eutanásia, distanásia, mistanásia e 
ortotanásia?
O que são cuidados paliativos? Eles são uma alternativa a 
quê?
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Considerações Finais 115
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estamos chegando ao fi m deste curso, o que não signifi ca que 
esgotamos as questões aqui levantadas. Longe disso. Elas apenas 
vieram à fala. É hora de voltarmos ao início e nos perguntarmos, afi nal 
de contas, o que é mesmo Bioética?
Não temos uma resposta, mas várias. E, por termos várias, podemos 
escolher qualquer uma, desde que saibamos fundamentar a nossa 
escolha.
Vou apresentar aqui uma opção para direcionar sua escolha: pense 
Bioética como uma nova forma de controle social.
Afi nal, que Bioética é, fundamentalmente, uma forma de controle 
social sobre as práticas científi cas, ou o estudo desse controle, já é 
uma hipótese corrente, cujo argumento mais importante é o de que 
ela captura o sentimento geral desenvolvido desde épocas anteriores 
acerca do temor das possibilidades científi cas e suas consequências.
Vejamos.
Há muito o limite das práticas científi cas vem sendo tema dos 
mais diferentes discursos. Em alguns deles, essa prática deveria 
ser permitida somente a iniciados: homens e mulheres que foram 
amplamente treinados nos princípios de respeito à pessoa humana. 
Em outros, deveria ser escrava da vigilância constante de sacerdotes 
ou de instituições morais. Ou ainda, não deveria reconhecer limites ou 
fi car apenas à mercê da consciência e responsabilidade daqueles que 
a praticam. Assim, essa investigação deve também trazer à fala o que 
tem sido Bioética antes mesmo da sua formulação verbal, quando há 
algo que faz o papel de, mas não se nomeia como tal.
Essa tarefa já encontra, de antemão, um caminho que antecede a 
questão e se prolonga como inacabado, percorrido por aqueles que 
operam com o termo protobioética, como o faz Pellegrino (1999). Pois, 
Curso de Bioética116
o que se pretende dizer com um conceito pode ser anterior à criação 
do termo que o expressa.
Nessa direção, existem séries inacabadas de acontecimentos históricos 
que concorrem para a formação de um repertório de críticas, 
princípios, fundamentos, normas e até mesmo leis que antecedem e 
se prolongam durante a fundição do termo. Essas séries, que podem 
até ser enumeradas como eventos singulares, estão conectadas entre 
si por um mesmo sentimento geral que se manterá presente durante a 
elaboração do termo e a ele dará sentido conceitual.
Com base nisso, postula-se que a elaboração conceitual é um momento 
de apreensão e síntese desse sentimento presente na geração para a 
qual o termo se torna usual. Dizer, portanto, que há algo que faz o 
papel de, mas não se nomeia como tal, é o mesmo que atribuir aos 
fenômenos antecedentes a germinação, mesmo marcada por inúmeras 
contradições, do que se prosseguiu.
• Bioética e o sentimento geral de controle social sobre as práticas 
científi cas
Como se sabe, não é recente a crítica das fi losofi as, das religiões, dos 
sistemas jurídicos e dos livres-pensadores sobre as práticas científi cas. 
Ao contrário, é lugar-comum na história do pensamento euro-americano 
cristão a preocupação com as possibilidades e os limites das práticas 
científi cas, especialmente as experimentais, o que tem resultado nas 
mais diferentes e ambíguas posturas. Por um lado, nota-se a presença 
de uma postura permissiva ao extremo que identifi ca o progresso das 
ciências com o sucesso da humanidade, como a postura de Comte 
(2006). Por outro lado, nota-se também a postura, de uma grande 
maioria, que desconsidera a estreiteza da relação entre progresso 
científi co e progresso humano.
Dentre os que desconsideram a equação progresso científi co igual a 
progresso humano, gostaria de apresentar dois tipos-ideais: Rousseau 
e a Santa Inquisição. Os dois partem do mesmo princípio: a livre-prática 
científi ca não é sinônima de crescimento moral. No entanto, há algumas 
diferenças a considerar.
Considerações Finais 117
• Bioética e o controle social das pesquisas pela inquisição
Os inquisidores, principalmente os inquisidores modernos, não 
condenavam a prática científi ca porque pura e simplesmente lhe 
fossem contra. Ao contrário, eles atribuíam aos seus métodos de 
investigação caráter científi co.
Suas queixas não eram contra a ciência em si, mas contra o modo 
operacional de alguns cientistas que, segundo os inquisidores, 
conduziam-na para longe de Deus. E, ao afastar-se de Deus, afastava 
também o homem do plano salvífi co, aproximando-o do Diabo, já que 
não havia alternativa neutra.
Daí as opções: ou a prática científi ca deve se submeter ao controle 
social eclesiástico ou ser proibida.
• Bioética e o controle social das pesquisa pelo romantismo
Rousseau (1989), como representante do romantismo, de todo, 
não é indiferente ao espírito da Santa Inquisição. Ele também não é 
contrário à ciência por essa ser ciência. Afi nal, algumas de suas teses 
foram apresentadas como monografi as científi cas, das quais uma 
delas ganhou premiação literário-científica da Academia de Dijon. No 
entanto, ele não é contra o modo de se fazer ciência porque esse afasta 
o homem de Deus. Ou, pelo menos, não diretamente.
Digamos que ele fala desse afastamento de forma velada quando 
postula que a prática científi ca de sua época afastava o homem comum 
dos mandamentos divinos, como guias de crescimento moral-espiritual.
Sua razão explícita é a de que essa prática tem afastado o homem de 
si mesmo, indo de encontro à sua natureza, à sua liberdade e grandeza 
de espírito, cuja solução é uma espécie de controle social moral sobre 
as práticas científi cas.
Curso de Bioética118
• Bioética e o controle social sobre o que pode e o que se deve fazer 
em ciência
Em ambos os casos, Inquisição e Rousseau, trata-se da proposta de se 
exercer controle social sobre as práticas científi cas, cujo dilema está 
pautado, como já apresentei na análise que fi z do Frankenstein de 
Shelley (Gurgel, 2004), pela disputa entre o que é possível e o que se 
deve fazer. Não se trata mais de uma simples equação metodológica 
ou técnica para saber se determinada teoria ou método funciona ou 
não. É mais que isso, como já falamos anteriormente, é saber quais 
as prováveis implicações presentes e futuras para os envolvidos no 
processo, tanto para os indivíduos, quanto para a espécie e o planeta.
Isso não desconhece a importância das práticas científi cas para o 
desenvolvimento social, apenas argumenta que tais práticas precisam 
responder à sociedade. Algumas dessas argumentações são bastante 
severas, mas a maioria é bastante aberta ao diálogo. Assim, a discussão 
levantada por Stevenson (1996) ou Shelley (2001) são mais do que 
modelos literários, são desejos sociais diante de um pesadelo coletivo.
• Bioética e o controle social sobre a ciência desencantada
Some-se a isso, o fato de que as ciências se apresentavam como 
desencantadas, conforme denunciou Weber (1993), as questões metafísicas 
estavam relegadas ao âmbito da mediocridade, como propusera o Círculo 
de Viena, a moral solapada em seus fundamentos, conforme as críticas de 
Nietzsche (2006), e a possibilidade de que tudo isso fosse real conforme 
o testemunho de acontecimentos envolvendo cobaias humanas e não 
humanas, para termos uma dimensão desse pesadelo.
Por isso, quando Fritz Jahr propusera, em 1927, o termo alemão Bio 
Ethik, estava correspondendo a esse sentimento geral presente na sua 
época e nas gerações circundantes, principalmente nos espíritos mais 
religiosos. Disse ele:
Considerações Finais 119
Objetivamente a Bioética não é, de modo algum, 
uma descoberta do presente. Como um exemplo 
interessante do passado, podemos lembrar a fi gura 
de São Francisco de Assis (1182-1226) com seu grande 
amor também pelos animais, que em sua acolhedora 
simpatia para com todos os seres vivos foi um precursor 
da exaltação de Rousseau de toda a natureza séculos 
depois (JAHR, 1927, p.1).
Sua intenção, ao forjar esse termo, é a de propor uma abordagem 
diferenciada do fazer científi co, conforme aparece no subtítulo do 
artigo: um panorama sobre as relações éticas do ser humano com os 
animais e as plantas.
Nessa ótica, de clara inspiração kantiana, Bioética seria fundamentada 
em uma necessidade emergente de obrigações éticas não apenas com 
o homem, mas com todos os seres vivos, como aparece no Imperativo 
Bioético: “Respeita cada ser vivo em princípio como uma fi nalidade em 
si e trata-o como tal na medida do possível” (JAHR, 1927, p.3). Mas, era, 
sobretudo, a necessidade de impor limites às pesquisas que vinham sendo 
desenvolvidas, principalmente no âmbito da Psicologia, com os animais:
A partir da Biopsicologia é necessário apenas um passo 
até a Bioética, isto é, até a aceitação de obrigações 
morais não apenas perante os homens, mas perante 
todos os seres vivos (id ibid, p.2).
Potter (1970) também procura se manter no horizonte da ideia de que 
as ciências precisam de controle social, ao que ele chamou de uma 
nova sabedoria, cuja tarefa é manter-se preocupada com as prioridades 
profi ssionais e ambientais para uma sobrevivência aceitável. O mesmo 
se repete em 1971, quando ele fala que Bioética deve estabelecer “(...) 
um sistema de prioridades médicas e ambientais para a sobrevivência 
aceitável” (POTTER, 1971, p.2).
• Bioética e o controle social sobre os fatos biológicos
A tese de Potter nessa obra, reforçada em 1988, é a de que é impossível 
separar os valores éticos dos fatos biológicos, sendo que o segundo 
deve se submeter ao primeiro. Assim, Potter (1971) propõe um ponto 
de encontro entre as ciências experimentais e as ciências humanas, do 
qual surge a necessidade de uma ética da vida. Essa ética nos ajudaria 
Curso de Bioética120
a enfrentar, principalmente, três graves problemas, agora em âmbito 
global (POTTER, 1988):
a) a questão demográfi ca,
b) a tecnologia do DNA recombinante, e
c) o advento da bomba biológica.
Ou, como ele escreveu, permitiria um “[...] entendimento realista do 
conhecimento biológico e seus limites, a fi m de fazer recomendações 
no campo das políticas públicas” (POTTER, 1970, p.127-131). Em uma 
palavra, nos permitiria manter controle social sobre as prioridades 
(fi nanciamento), as práticas (metodologias) e a aplicação (uso social) 
das ciências.
• Bioética e o controle social sobre os benefícios das ciências
O mesmo conteúdo proposicional de que Bioética é uma forma de 
controle social sobre as práticas científi cas será reapresentado em 
quase todas as compilações. Nas duas versões da Enciclopédia de 
Bioética, organizadas por Reich (1978), o termo aparece como o estudo 
sistemático da conduta humana no âmbito das ciências examinada à 
luz de valores e princípios morais. O mesmo sentimento está presente 
na Declaração de Gijón, (art. 15), que delimita como tarefa da Bioética 
proteger o ser humano pela harmonização entre ciência e direitos 
humanos. Por harmonizar, essa Declaração entende submeter os usos 
das produções científi cas às Declarações e Convenções mundiais de 
Bioética e de Direitos Humanos:
Uma importante tarefa da Bioética, que constitui 
uma atividade pluridisciplinar, é harmonizar o uso das 
ciências biomédicas e suas tecnologias com os direitos 
humanos, em relação com os valores e princípios 
éticos proclamados nas Declarações e Convenção 
antes mencionadas, enquanto que constituem um 
importante primeiro passo para a proteção do ser 
humano (DECLARAÇÃO DE GIJÓN, art.15).
Considerações Finais 121
Não é por acaso que em muitos países despontaram comitês de ética 
e Bioética disponíveis para o exercício desse controle sob a égide da 
defesa dos princípios democráticos. No Brasil, a criação desses comitês 
está ligada justamente a um órgão de controle social, o Conselho 
Nacional de Saúde, e se apresenta como movimento social em prol da 
democratização e universalização do acesso aos benefícios produzidos 
pelas pesquisas científi cas.
• Bioética e o controle social sobre a ruptura entre Filosofi a e Ciência
Jonas (1990) defende que a necessidade dessa harmonia é porque 
houve uma ruptura entre Filosofi a e Ciência, dado que Bioética deve 
procurar, na verdade, o controle que estava perdido, de modo que a 
refl exão fi losófi ca sobre a ética passe urgentemente a fazer parte da 
mentalidade do homem tecnológico.
Sem tal refl exão esse homem poderá muito bem não só desorganizar a 
vida deste planeta, como também mudar radicalmente os fundamentos 
da vida, de criar e destruir a si mesmo, fazendo com que todos os 
avanços políticos, toda a tradição democrática, toda a luta por justiça 
e isonomia entre os povos e as pessoas estaria prontamente decidida 
como uma hipótese falida.
• Bioética e o controle socialsobre o terror
Essa vontade de demonstrar a necessidade de controle sobre as 
práticas científi cas, faz com que Jonas (1990) e muitos outros, graças à 
essa pedagogia do medo, transformem Bioética em mais um produto 
da Sociedade do espetáculo, em algo que vale a pena ser consumido. O 
slogan mercadológico é: consuma Bioética ou o mundo será destruído.
Isso é tão forte que às vezes me pergunto: não seria o combate ao 
terror o sentido oculto de Bioética? Fico tentado a pensar assim, no 
entanto, percebo que mesmo autores como Ramsey e Farley (1970), 
que não concordam com essa visão catastrófi ca da realidade, são 
adeptos assumidos da noção de controle sobre as práticas científi cas.
Curso de Bioética122
Minha conclusão não poderia ser outra. Não é o combate ao terror que 
faz de Bioética ser o que é. Diria até que esse é o seu sentido aparente, 
o que é de mais evidente. O sentido oculto vem de mais longe, vem da 
disputa pelo poder, pois, onde há poder, há tentativa de controle.
Graças a isso, os discursos que se apresentam como bioeticistas estão 
pautados pelas contradições inerentes à nossa época. Contradições que 
envolvem tanto a defesa incondicional do papel do sujeito individual 
como centro das decisões morais – tal como o percebemos no modelo 
de Bioética euro-americano – quanto o daqueles que centram o sujeito 
coletivo e o lugar social dos que tomam as decisões – como acontece 
com uma facção de Bioética latino-americana. O fato é que, diante de 
tantas disparidades e disputas conceituais, torne-se mais prudente 
falar de Bioética como um movimento que compreende diversas 
facções e modos de apresentação, dentre os quais, a que apresento 
aqui é apenas uma delas, como uma provocação para debate.
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