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TECNOLOGIA DE ALIMENTOS Brasília-DF. 2 Elaboração Elizabeth Bianchi Wojslaw 3 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ............................................................................................................ 5 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................. 6 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 8 UNIDADE I TECNOLOGIA APLICADA AO CONTROLE E GARANTIA DA QUALIDADE DE ALIMENTOS ........ 12 CAPÍTULO 1 TÉCNICAS DE CONSERVAÇÃO DOS ALIMENTOS .................................................. 14 CAPÍTULO 2 ANÁLISES FÍSICO-QUÍMICAS E SENSORIAIS DOS ALIMENTOS ............................... 40 UNIDADE II TECNOLOGIA DE ALIMENTOS INDUSTRIALIZADOS .......................................................... 53 CAPÍTULO 3 TÉCNICAS DE FABRICAÇÃO ................................................................................................. 54 CAPÍTULO 4 VIDA DE PRATELEIRA ............................................................................................................ 61 - EMBALAGENS....................................................................................................70 - ROTULAGEM DE ALIMENTOS..........................................................................74 UNIDADE III TECNOLOGIA DE ALIMENTOS VEGETAIS ........................................................................ 86 CAPÍTULO 5 GRÃOS E CEREAIS ................................................................................................................ 86 CAPÍTULO 6 FOLHOSOS, LEGUMES E FRUTAS ....................................................................................... 94 UNIDADE IV TECNOLOGIA DE ALIMENTOS DE ORIGEM ANIMAL ........................................................ 102 CAPÍTULO 7 PRODUTOS DE ORIGEM BOVINA ....................................................................................... 102 4 CAPÍTULO 8 PRODUTOS DE ORIGEM AVÍCOLA ..................................................................................... 110 CAPÍTULO 9 PESCADOS E FRUTOS DO MAR ........................................................................ 116 UNIDADE V AVANÇOS TECNOLÓGICOS ......................................................................................... 121 CAPÍTULO 10 ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS ............................................................ 121 CAPÍTULO 11 ENRIQUECIMENTO DE NUTRIENTES ................................................................................ 124 CAPÍTULO 12 BIODISPONIBILIDADE DE NUTRIENTES .............................................................. 128 CAPÍTULO 13 ALIMENTOS FUNCIONAIS PARA FINS ESPECIAIS ................................................ 133 CAPÍTULO 14 SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL ...................................................................... 135 PARA (NÃO) FINALIZAR .............................................................................................. 138 REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 139 5 APRESENTAÇÃO Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 6 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Pensamentos inseridos no Caderno, para provocar a reflexão sobre a prática da disciplina. Para refletir Questões inseridas para estimulá-lo a pensar a respeito do assunto proposto. Registre sua visão sem se preocupar com o conteúdo do texto. O importante é verificar seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. É fundamental que você reflita sobre as questões propostas. Elas são o ponto de partida de nosso trabalho. Textos para leitura complementar Novos textos, trechos de textos referenciais, conceitos de dicionários, exemplos e sugestões, para lhe apresentar novas visões sobre o tema abordado no texto básico. Sintetizando e enriquecendo nossas informações Espaço para você, aluno, fazer uma síntese dos textos e enriquecê- los com sua contribuição pessoal. 7 Sugestão de leituras, filmes, sites e pesquisas Aprofundamento das discussões. Praticando Atividades sugeridas, no decorrer das leituras, com o objetivo pedagógico de fortalecer o processo de aprendizagem. Para (não) finalizar Texto, ao final do Caderno, com a intenção de instigá-lo a prosseguir com a reflexão. Referências Bibliografia consultada na elaboração do Caderno. 8 INTRODUÇÃO Que animais dispõem de inteligência e mãos hábeis para elaborar e manipular utensílios, inclusive aqueles que favoreçam seu próprio ato de se alimentar? A pesquisa com alimentos é tão antiga quanto o homem e provém dos tempos pré-históricos no momento em que, por razões desconhecidas, os pré-hominídeos deslocaram-se das árvores das florestas para as savanas, substituindo sua dieta essencialmente vegetariana pela forma onívora, causando profundo impacto na evolução, tanto do ponto de vista biológico como cultural. Segundo HAWTHORN (1983), estudos da morfologia dentária de fósseis encontrados indicam que a dieta do homem pré-histórico era fundamentada em herbáceas e gramíneas e, mais tarde, quando onívoros, desenvolveram habilidades de caça de grandes animais. A descoberta do fogo constitui um marco na evolução da espécie, pois o fogo não apenas o mantém aquecido, iluminando seu habitat ou protegendo-o dos animais selvagens, mas sim lhe proporciona um centro comunitário, pois todos se reúnem ao redor dele para interagir e trocar experiências, além de modificar profundamente seus alimentos. As carnes assadas têm a textura e o sabor muito diferentes das cruas e também se adulteram mais lentamente, sua digestibilidade melhora e eliminam-se microrganismos potencialmente perigosos. Quando o homem aprendeu a controlar o fogo e o utilizoupara livrar-se do frio e iluminar sua habitação, inconscientemente já estava praticando a defumação. Posteriormente, devido à necessidade de abastecer-se nas épocas de escassez, o homem provavelmente utilizou a defumação e a dessecação como forma de prolongar a vida útil de seus alimentos. Mas é no período Neolítico (9.000 a 3.500 a.C.) que surge a agricultura rudimentar à base de cultivos sazonais, onde o homem também domestica os animais para auxiliá-lo no trabalho e também como alimento, aumentado a diversidade de seus alimentos (especialmente leite e produtos lácteos – leites fermentados e queijos, que se formavam por fermentação espontânea). À partir de então (Idade do Bronze em 3.500 a.C.) iniciou o processo de irrigação dos seus cultivos, razão apontada como uma das causas do enorme crescimento da população da Mesopotâmia, praticando o comércio local e cultivando frutas, legumes e grãos. tâmaras, uvas, etc. Mas foi na Idade do Ferro (1500 anos a.C.), que surge o comércio em grande escala, por mar e por terra, e melhoram-se as ferramentas na lavoura, quando novos alimentos passaram a ser inclusos na dieta: diversas frutas, molhos e especiarias. Somente no período dos gregos e dos romanos é que a agricultura atinge sua plenitude, através da rotação de cultivos, técnicas de avaliação do solo e uso dos fertilizantes, e com o surgimento de técnicas de fermentação em maior escala, nota-se nos registros que os sumérios eram muito dependentes de cerveja. dois, os mais graduados, três, e a nobreza, cinco. No código de Hamurabi (1728 a 1638 a.C.), também se dá atenção especial à cerveja, e proíbe-se a venda do produto com baixo conteúdo alcoólico a preço elevado, prevenindo-se assim a diluição em água, o que exemplifica a intervenção do governo na indústria alimentícia. Os egípcios dessecavam e salgavam o peixe que capturavam no Mediterrâneo e no Nilo; já nas primeiras dinastias, produziam cerveja e vinho e sabiam distinguir entre a primeira 9 fermentação alcoólica e a secundária acética, que permitia obter o vinagre. Também fabricavam queijo e o pão e sabiam a forma de preparar o malte, que, no início, foi usado como adoçante e, mais tarde, na produção de cerveja. Os gregos utilizavam ampla variedade de alimentos (carnes de todos os tipos, principalmente de suíno e aves, peixes e grande variedade de produtos vegetais) e acrescentaram à dieta novos produtos elaborados em escala como o azeite de oliva, que além de ser utilizado como alimento, em ritos religiosos e como cosmético, foi usado como agente conservante, com a finalidade de eliminar o ar. Os gregos também conheciam a forma de arrefecer líquidos por evaporação em recipientes de barro, embora a prensagem, uma das operações tecnológicas para a extração do azeite, tenha sido aperfeiçoada pelos romanos. Sabe-se ainda que os romanos utilizavam recipientes de barro para proteger os alimentos, que praticavam de forma regular a salga e a acidificação com vinagre procedente da oxidação do álcool, que utilizavam o mel como meio de conservação e que dessecavam diversos alimentos ao sol, salgavam e curavam a carne de seus animais domésticos e elaboravam com o peixe diversos tipos de molhos, por salga e adição de especiarias. Mesmo da forma empírica que pudesse ser, curiosamente, também já conheciam e se precaviam do armazenamento e do uso de embalagens elaborados com materiais incompatíveis aos diversos tipos de alimentos que já processavam, como por exemplo, os efeitos desfavoráveis dos metais na auto-oxidação das gorduras, recomendando não utilizar recipientes metálicos para o armazenamento do azeite de oliva. Existem ainda dados que revelam que os imperadores mandavam resfriar o vinho e outros alimentos com gelo trazido das montanhas, e também utilizavam bebidas geladas no verão. Já a Idade Média representou um longo parêntese no estudo dos novos procedimentos de conservação e processamento de alimentos mas sabe-se que as cruzadas possibilitaram a entrada de diversas frutas e verduras até então desconhecidas no continente europeu e, na Itália, desenvolveram-se as massas, possivelmente trazidas por Marco Polo de suas viagens à China (HAWTHORN, 1983). A destilação começou a ser utilizada na Itália por volta do ano 1100 de nossa era, e sua prática era normal na Europa do século XIV. O açúcar da cana foi outro produto surgido no Egito e no Oriente Médio no último período da Idade Média. Com a descoberta da América, a partir do século XV a dieta do homem europeu sofreu importante mudança: o tomate, o milho e a batata, principalmente, e com frequentes viagens à Índia e intensificação do comércio entre os povos, surgiu o uso intenso das especiarias e seus poderes de conservação e qualidades sensoriais. E em 1795 surge um importante impacto no plano tecnológico, quando Nícolas Appert, um confeiteiro frances, conseguiu conservar diversos alimentos ao acondicioná-los em recipientes lacrados e depois aquecê-los em água fervente, razão pela qual, em 1810, foi contemplado por Napoleão Bonaparte com um prêmio. Esse procedimento idealizado por Appert permitiu a conservação dos alimentos destinados às tropas distantes do aprovisionamento, e constituía-se num dos meios mais eficazes de destruição dos microorganismos dos alimentos, um dos avanços científicos mais importantes da indústria alimentícia, que originaria a indústria dos enlatados (HAWTHORN, 1983). A esterilização das latas, em 1860, era feita a 100º C por cinco ou seis em água fervente. Em 1874, conseguiu-se aumentar a temperatura reduzindo-se o tempo de esterilização com a 10 introdução da autoclave, que ainda hoje é utilizado de forma mais automatizada. Atualmente, graças ao desenvolvimento das técnicas de acondicionamento asséptico, é possível esterilizar os alimentos líquidos a temperaturas muito elevadas, reduzindo os efeitos prejudiciais do aquecimento sobre as propriedades nutritivas e sensoriais dos alimentos e sobre os esporos formados por alguns microorganismos. Também a utilização do frio industrialmente foi um importante avanço principalmente à partir de 1838 nas embarcações pesqueiras, possibilitando capturas em águas mais distantes e maior flexibilidade da introdução de novas espécies de pescados aos hábitos alimentares dos povos. Em 1867, Reece inventou a primeira unidade de resfriamento, baseada no ciclo compressão/expansão de amoníaco, que foi aperfeiçoada entre os anos de 1874 e 1876 por Von Linde, Boyle e Pictet, possibilitando então mais um grande avanço a partir da aplicação das temperaturas de congelamento e o transporte dos alimentos por longas distâncias através dos mares e por terra. No século XIX, desenvolveram-se outros processos de interesse. Cabe citar, por exemplo, o que produziu a margarina. Napoleão III, no século XIX, ofereceu um prêmio a quem encontrasse um substituto para a manteiga, surgindo então a margarina, idealizada pelo vencedor Mege-Mouries, que patenteou seu procedimento em 1869. Além disso, constatou-se também que os microorganismos específicos também eram capazes de originar outros alimentos em maior escala, através da implementação dos processos fermentativos em nível industrial. Os cultivos puros para a fabricação de cerveja foram introduzidos nos últimos anos do século XIX, o que levou à melhoria da qualidade. Em 1877 foi inventada a centrífuga de Laval para a separação da nata do leite, poupando espaço e mão de obra, e aumentando a eficácia da produção de manteiga e soro láctico. Em 1835, patenteou-se um aparelho para a evaporação do leite, e, em 1860, desenvolveu-se o leite condensado, que logo foi aceito como um alimento de excelente qualidade microbiológica. Adesidratação do leite teve seu procedimento patenteado na Grã-Bretanha em 1855, mas a boa qualidade do leite em pó só foi obtida no século XX. Portanto todos os procedimentos de conservação de alimentos se beneficiaram com o desenvolvimento da ciência a partir da revolução industrial. O progresso dos métodos de conservação prosseguiu no século XX, com enorme melhoria das antigas técnicas (defumação, desidratação, emprego do frio, tratamentos térmicos, uso de conservantes, acondicionamento, transporte, etc.) e a criação de outras (radiações ionizantes, aquecimento dielétrico, concentração por osmose inversa, ultrafiltração, etc.). As tecnologias mais recentes já comprovaram sua eficiência e eficácia (atmosferas modificadas ou extração de certas substâncias com fluidos supercríticos, como a cafeína redução e acréscimo de nutrientes específicos – alimentos light e diets, alimentos modificados, alimentos enriquecidos, etc.) e outras ainda estão em fase de experimentação (altas pressões, aquecimento ôhmico, impulsos elétricos ou termomanosonicação). Atualmente é possível dizer que o controle científico já domina o processo de conservação e de transformação dos alimentos, substituindo o empirismo como arte, e convertendo-se em ciência. Assim, no que diz respeito ao conhecimento da composição química dos alimentos e ao estabelecimento das necessidades nutritivas do homem, houveram evoluções enormes, bem como no que se refere ao conhecimento e à forma de controlar os agentes causadores de alterações (tanto 11 biológicos como químicos), à compreensão dos princípios físicos que regem os métodos de conservação, ao controle de muitos e, em alguns casos, de todos os fatores que intervêm nos processos de fabricação dos diferentes alimentos. Considera-se que o nascimento oficial dessa ciência ocorreu simultaneamente nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha em 1931 quando, neste mesmo ano, a Universidade de Oregon empregou o termo Tecnologia de Alimentos quando introduziu um novo curso sobre o tema. Também neste mesmo ano o conselho da Society of Chemical Industries (SCI) da Inglaterra criou um novo grupo, com o nome de Society of Food Industry, ao qual seriam incorporados os membros da sociedade original interessados no problema dos alimentos. Em 1937 no Canadá, a seção da SCI naquele país criou uma subdivisão dedicada ao estudo dos alimentos, denominada Food and Nutrition Group, e nos Estados Unidos, neste mesmo ano, outros movimentos similares surgiram quando foi realizada a primeira reunião sobre problemas relacionados à conservação dos alimentos; na segunda, ocorrida em 1939, no Massachussets Institute of Technology, foi fundado o Institute of Food Technologists. A evolução dos estudos e publicações deste grupo originou, em 1948, na Universidade de Cambridge, o primeiro curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos, iniciativa esta logo imitada por outros países, surgindo a utilização do termo Food Science pelos cientistas britânicos. Segundo HAWTHORN (1983) em 1950, um comitê designado entre professores da Universidade definiu a Ciência dos Alimentos como “a ciência que se ocupa do conhecimento das propriedades físicas, químicas e biológicas dos alimentos e dos princípios nutritivos” e a Tecnologia de Alimentos como “a exploração industrial desses princípios básicos” e, atualmente, em diversos países, há sociedades similares e, na maioria destes países, o ensino de Ciência e Tecnologia de Alimentos é oferecido em nível superior. 12 Objetivos > Identificar as mudanças ocorridas na alimentação do ser humano, desde os tempos primitivos até a atualidade, compreendendo o progresso dos diferentes métodos de conservação utilizados. > Conhecer a importância da Tecnologia de Alimentos. > Apresentar os métodos de conservação e os processamentos tecnológicos de alimentos, visando também o desenvolvimento da visão crítica na avaliação destes processos. > Compreender as implicações nutricionais e sensoriais resultantes nos alimentos processados. > Promover os conhecimentos sobre as propriedades químicas, físicas e biológicas dos alimentos a partir do emprego dos processamentos tecnológicos dos mesmos, avaliando suas vantagens e desvantagens. > Conhecer os princípios dos avanços tecnológicos para a produção de alimentos: organismos geneticamente modificados, alimentos enriquecidos, alimentos funcionais e para fins especiais. 13 UNIDADE I TECNOLOGIA APLICADA AO CONTROLE E GARANTIA DA QUALIDADE DE ALIMENTOS Os objetivos da agricultura enquanto exploração econômica dos vegetais é a produção de alimentos e sua comercialização, contribuindo significativamente para o PIB do país. Assim como os alimentos originários da atividade zootécnica, a produção de vegetais requer técnicas agronômicas visando o melhor rendimento e a melhor qualidade, enquanto que a comercialização é feita de forma continuada e paulatina e, neste processo, para que os alimentos mantenham sua qualidade, são necessárias técnicas de conservação e de transformação (OETTERER, 2006). Originalmente tais técnicas foram adquiridas a partir da experiência dos produtores rurais na busca da proteção e conservação de suas safras e rebanhos, obtendo açúcar e bebidas, extraindo óleos, produzindo doces, obtendo farinhas, secando grãos e realizando processos fermentativos que originaram muitos outros produtos também de origem animal. As técnicas agrícolas foram continuadas com o aperfeiçoamento e introdução de novas tecnologias com produtos animais, pesquisas e ciência aplicada e, cada vez mais, podem ser evidenciadas as duas direções da tecnologia de alimentos: de um lado, dando continuidade à produção e incremento de alimentos mais sofisticados, nutritivos, convenientes e mais atrativos, resultando em uma série de produtos voltados às pessoas de maior poder aquisitivo. Por outro lado, o desenvolvimento das tecnologias visando impulsionar ainda mais o aproveitamento de subprodutos e elementos usualmente não consumidos em outras épocas, como as cascas de vegetais e as partes não convencionais dos alimentos, para resultarem em produtos mais nutritivos e de baixo custo, que possam ser acessíveis à população mundial hoje carente em alimentos (GAVA, 2009). Sabe-se também que a produção de alimentos tem aumentado em alguns países, graças à racionalização das técnicas agropecuárias, porém, em muitos países, o nível de produção é inferior ao crescimento demográfico, acarretando o problema crucial da fome e a necessidade de regularização da distribuição equânime da produção de alimentos por todo o globo terrestre. Neste sentido, o papel da Ciência e Tecnologia de Alimentos é o de corrigir essas deficiências, através da utilização de ciências correlatas e alicerçando-se em atividades multiprofissionais: Nutrição, Química, Química Industrial, Farmácia, Veterinária, Biologia e específicas de Engenharia (agronômica, de alimentos, química e, recentemente, da pesca). Diante desse contexto, são muitas as definições para Ciência e Tecnologia de Alimentos, algumas mais simples, como a ciência que se ocupa do estudo dos alimentos que, porém, embora por si mesma possa delimitar seu objeto, ou seja, os alimentos, não oferece um conceito claro da riqueza dessa ciência e tampouco é suficiente para que se possa compreender o significado dessa disciplina ou das disciplinas que existem dentro dela. 14 HAWTHORN (1983) afirmou que “em seu sentido mais autêntico, começa no campo e termina na mesa do consumidor” e que “os progressos tecnológicos dos alimentos penetraram no campo para exercer sua influência sobre a própria agricultura”, abrangendo de forma ampla todas as atividades relacionadascom os alimentos. Essa opinião é justificada mediante situações de necessidades que envolvem, por exemplo, a otimização e a preservação das características sensoriais, microbiológicas, nutritivas e comerciais dos alimentos. Por exemplo, para que as ervilhas congeladas mantenham seu viço, cor e textura, é necessário escolher a variedade, preparar a terra para esse fim, colhê-las e transportá-las em condições ótimas. Finalmente, outras definições foram sugeridas por diversas instituições dedicadas ao estudo dos alimentos e alteradas à medida que avançavam as pesquisas científicas e tecnológicas. Entre elas, apresenta-se a definição mais moderna, de 1992, partindo do Institute of Food Technologists dos Estados Unidos, talvez a instituição de maior prestígio internacional entre aquelas que se dedicam ao estudo e à difusão de todas as atividades relacionadas com os alimentos. Diz o seguinte: a Ciência dos Alimentos é a disciplina que utiliza as ciências biológicas, físicas, químicas e a engenharia para o estudo da natureza dos alimentos, das causas de sua alteração e dos princípios em que repousa o processamento dos alimentos, enquanto a Tecnologia de Alimentos é a aplicação da Ciência de Alimentos para seleção, conservação, transformação, acondicionamento, distribuição e uso de alimentos nutritivos e seguros. A ciência dos alimentos refere-se ao estudo das características físicas, químicas e biológicas dos alimentos, enquanto a tecnologia dos alimentos inclui a sequência de operações que utilizam métodos e técnicas para a obtenção, armazenamento, processamento, controle, embalagem, distribuição e utilização dos alimentos. Portanto, o estudo dos alimentos engloba também uma somatória de conhecimentos necessários para entender as alterações que a matéria prima sofre desde a produção agrícola até as necessidades do consumidor. Nos capítulos seguintes também serão apresentadas as análises físicas e químicas dos alimentos, as quais permitem sua avaliação quanto às suas características estruturais, composição química e valor nutricional, assim como a determinação das ações das substâncias indesejáveis e a existência de perigos físicos nas matérias–primas e produtos acabados. As análises microbiológicas dos alimentos são utilizadas para avaliar riscos à saúde do consumidor e o desempenho do controle higiênico–sanitário na elaboração dos produtos alimentícios. Para complementar os estudos sobre a composição e características físicas dos alimentos, são apresentadas as técnicas de análise sensorial, que permitem qualificar aroma, sabor, textura e cor dos produtos em diversas situações, como avaliação de matérias–primas e processos, desenvolvimento de novos produtos e aceitação pelo consumidor. 15 CAPÍTULO 1 Técnicas de Conservação dos Alimentos 1.1 OBJETIVOS DA TECNOLOGIA DE ALIMENTOS O primeiro objetivo da Tecnologia de Alimentos, que se destaca sobre os demais, é buscar a plena garantia de apresentar ao consumidor, produtos nutritivos, com características sensoriais melhoradas e de grande tempo de vida útil, garantindo o abastecimento de alimentos nutritivos e saudáveis para o homem, que, como animal heterótrofo, necessita suprir suas necessidades energéticas e plásticas mediante o consumo de diversos produtos procedentes dos reinos animal, vegetal e mineral. Portanto, a Tecnologia de Alimentos é, antes de qualquer outra premissa, uma tecnologia de conservação dos alimentos, já que os produtos procedentes dos reinos animal e vegetal são altamente perecíveis, cuja vida útil é extremamente curta. Mas, é fundamental ao homem alimentar-se diariamente, e vários dos alimentos que consome são produzidos sazonalmente e, com frequência, em pontos muito distantes dos locais de consumo. Como o abastecimento regular dos alimentos requer seu armazenamento e transporte, operações que demandam certo tempo, durante o qual os alimentos ficam expostos à ação deletéria de todo tipo de agentes alteradores de suas características naturais, é necessário evitar a ação desses agentes. Assim, o objetivo primordial da Tecnologia de Alimentos é controlar tais agentes, transformando a matéria-prima perecível em produto estável, que seja facilmente transportado e conservado durante um determinado tempo, aumentando a vida útil dos alimentos e possibilitando seu armazenamento e transporte aos locais de consumo em estado nutritivo e saudável. Além desse objetivo principal, a Tecnologia de Alimentos tem outros objetivos importantes. Isto porque, para que o alimento seja aceito pelo ser humano, não basta que ele supra suas necessidades, mas também é fundamental que seja apreciado, apresente variedades, diversidades e inovações para não levar à monotonia alimentar, e sem causar rejeição, com possibilidades de escolha. Este é outro objetivo da Tecnologia de Alimentos, ou seja, a diversificação dos produtos, visando satisfazer essa necessidade psicológica do homem, provavelmente herdada na época em que só utilizava seus sentidos para distinguir entre os alimentos benéficos e os nocivos, e para prover-se de dieta completa mediante alimentação variada (HAWTHORN, 1983). Essa é uma finalidade muito considerada pela indústria alimentícia moderna, pois muitos dos processos aplicados aos alimentos são idealizados apenas para atingir esse objetivo, como por exemplo o desenvolvimento da ampla variedade de leites fermentados, especialmente o iogurte, que pode ser encontrado no mercado sob diversas formas de apresentação e palatabilidade (iogurte de frutas, com adoçantes, aromatizantes, iogurte líquido, etc.). Um terceiro objetivo da Tecnologia de Alimentos engloba a escassez contínua de alimentos perante as necessidades crescentes da humanidade, e no futuro terá grande importância, é o de extrair o máximo de aproveitamento dos recursos nutritivos provenientes da terra e buscar outros, a partir de fontes até agora não exploradas, como exemplo a produção de alimentos a partir de espécies marinhas que atualmente são subutilizadas. Finalmente, a Tecnologia de Alimentos também tem por objetivo o preparo de produtos para indivíduos com necessidades nutritivas especiais, como crianças, idosos, diabéticos, etc. O emprego das diferentes metodologias de processamento requer profundo conhecimento da 16 composição química dos alimentos, inclusive das propriedades físicas, químicas e funcionais das substâncias que as compõem. Um novo produto não pode ser elaborado sem que se conheça a resposta de seus componentes em relação ao processo ao qual será submetido, já que não se pode aplicar um processo sem que se conheça o resultado de suas ações sobre os princípios nutritivos, ou que reações sensoriais serão produzidas. Neste sentido, é a Bioquímica (ou a Química) dos Alimentos, que está inserida nas Ciências dos Alimentos, que permite o controle de todos esses fenômenos, possibilitando o profundo conhecimento dos aspectos que são anteriores aos processos tecnológicos. As mesmas considerações poderem ser feitas acerca da Microbiologia dos Alimentos, disciplina que constitui a outra base da Tecnologia de Alimentos, pois os microrganismos são os principais agentes de alteração. Destruí-los ou desativá-los é a meta de muitos processos que se aplicam aos alimentos para aumentar sua vida útil. Entretanto, nem todas as ações dos microrganismos são deletérias, já que a atividade de alguns deles podem ser utilizadas na elaboração de certos produtos que, às vezes, são muito diferentes da matéria-prima de que se partiu, como o pão, o vinho, a cerveja, diversos produtos lácteos e embutidos maturados. Nos países desenvolvidos, estima-se que mais da metade dos alimentos consumidos são processados de alguma forma, e processos industriais nesta escala não podem se basear em métodos inspirados na arte e no empirismo,mas requerem métodos seguros que proporcionem alimentos estáveis, agradáveis e de qualidade uniforme. Desses métodos, ocupa-se a Engenharia dos Alimentos, que é o estudo dos princípios em que se fundamentam as operações a que são submetidos os alimentos desde sua chegada à indústria até serem entregues no mercado. Por último, uma das missões da Tecnologia de Alimentos é fazer chegar ao consumidor alimentos seguros, isentos de agentes nocivos, tanto bióticos como abióticos, e com composição e valor nutritivo determinado. Para atingir essa meta, é necessário que os alimentos sejam produzidos com a máxima higiene e limpeza, que se utilizem boas práticas de fabricação e que se façam ajustes a certas normas. A responsabilidade por todas essas questões, sua inspeção e toda legislação referente cabem à disciplina Higiene e Inspeção dos Alimentos (HAWTHORN,1983). A deterioração dos alimentos de origem animal e vegetal, em sua maioria, começa à partir do abate do animal ou da colheita do vegetal, e a técnica empírica para a preservação dos alimentos sempre foi utilizada no decorrer dos séculos sendo, em parte, utilizada ainda nos dias de hoje: o emprego do sal, a secagem, a defumação, bem como o uso do vinagre e do álcool. As técnicas de preservação têm por objetivo manter, durante o maior tempo possível, as qualidades sanitárias do alimento reforçando os efeitos pelo tratamento empregado. As principais medidas são: higiene, manipulação, agentes físicos ou químicos, embalagem, armazenamento, transporte. As técnicas de conservação têm por objetivo principal a destruição dos microorganismos, impedindo toda e qualquer ação demandada por esses agentes, por enzimas ou por outras causas deteriorantes (GAVA, 2008). Assim, os princípios dos processos de conservação baseiam-se na eliminação total ou parcial dos agentes que alteram os produtos, ou a modificação ou eliminação de um ou mais fatores que tornem o meio desfavorável a qualquer manifestação vital ou atividade bioquímica, o que também pode ser obtido através da adição de certas substâncias. De qualquer forma, os processos mais recomendados são aqueles que, garantindo a conservação satisfatória, menos alteram as condições naturais dos produtos. E, para finalizar os processos de conservação empregados, o uso da embalagem adequada é fundamental. A seguir, os métodos de conservação serão abordados de forma conjunta, agrupando as técnicas conforme a metodologia empregada: 1- Calor 2 – Frio 17 3 – Fermentações 4 – Açúcar 5 – Aditivos 6 – Irradiação 7 – Métodos recentes 1 – Conservação pelo uso do calor Os alimentos diferem entre si, portanto as exigências para seu processamento também o são. O binômio tempo X temperatura é comumente utilizado como processo de conservação, e a determinação de cada um deles depende do efeito que o calor seja capaz de exercer sobre o alimento, e quais os outros métodos de conservação que serão utilizados conjuntamente. O objetivo do tratamento térmico é destruir todos os microorganismos, ou destruir aqueles mais prejudiciais e retardar ou prevenir o crescimento dos sobreviventes. 1.1 – Branqueamento É o processo térmico de curto tempo de aplicação, com características de pré- tratamento, que visa, principalmente, inativar enzimas de frutas e hortaliças que serão congeladas. Portanto, é um pré-tratamento muito utilizado antes do congelamento ou secagem. Outros objetivos: � a retirada do ar e gases dos tecido vegetais � diminuição da carga bacteriana � o amolecimento da casca � a fixação da cor de certos vegetais 1.1.1 – Processamento Os produtos são aquecidos à temperatura de 70ºC a 90ºC durante alguns minutos, inativando as enzimas naturais (poligalacturonases, peroxidases, polifenoloxidases, catalases, etc.) que são responsáveis por alterações específicas. Esse aumento progressivo da temperatura, além de inativar as enzimas, também leva à redução dos microorganismos contaminantes e por isso, tem um efeito de pasteurização. Também os tecidos vegetais ficam amolecidos, retirando o ar dos espaços intercelulares. Os equipamentos ao diversos, e chamam-se “branqueadores” e baseiam-se na passagem do alimento por banho de água quentes ou por uma atmosfera de vapor (GAVA, 2008). 1.2 – Pasteurização É o processo térmico criado por Pasteur, em 1864, que tem por objetivo a eliminação total dos microrganismos patogênicos e parcial dos microrganismos deteriorantes. A temperatura máxima é 100ºC, em pressão atmosférica normal, proveniente de vapor, radiações ionizantes, água aquecida, microondas, etc. (POLLONIO, 1993). A pasteurização é utilizada quando: para alguns alimentos os processos térmicos em temperaturas elevadas podem interferir e suas características sensoriais (sucos, leites, entre outros); em outros, os agentes microbianos possuem baixa termorresistência (exemplo: leveduras das frutas); ou 18 quando os agentes competitivos possam ser destruídos para que o alimento seja, posteriormente, submetido a um processo de fermentação (por exemplo, na elaboração de queijos). Usualmente o processo de pasteurização é complementado com outro método, como por exemplo: adição de altas concentrações de açúcar (no caso do leite condensado), refrigeração (leite), ou com a criação de anaerobiose (fechamento dos recipientes a vácuo), entre outros. Porém, qualquer que seja o método posterior, a pasteurização confere curto espaço de tempo para a manifestação da perecibilidade dos alimentos, como por exemplo até 60 dias no caso dos sucos e até 16 dias no caso do leite (GAVA, 2008). 1.2.1 – Tipos Os tipos de pasteurização dependem do método e do produto a ser tratado. � Pasteurização lenta - LTLT (Low Temperature Long Time) que emprega a temperatura relativamente baixa, em relação à pasteurização rápida, por um prazo de tempo maior de 63°C por 30 min, no caso do leite; � Pasteurização Rápida - HTST (High Temperature Short Time) que emprega a temperatura relativamente alta num curto espaço de tempo, cerca de 72° C a 75º C por 15 a 20 segundos. Na indústria de laticínios pode ocorrer ainda outros processos complementares: a termização (onde o leite é aquecido por 15 segundos entre 63ºC e 65ºC, já na etapa de recepção para a estocagem por horas ou dias, e imediatamente estocado a, no máximo, 4ºC) e a ultrapasteurização (que aumenta o tempo de vida útil em 30 a 40 dias, reduzindo as principais fontes de recontaminação, já que utiliza-se temperaturas entre 125ºC e 130 ºC por 2 a 4 segundos, resfriando-se abaixo de 7ºC, durante a comercialização). Esses processos não inativam a fosfatase (POLLONIO, 1993). Na pasteurização a definição da relação tempo X temperatura ocorre em função (72ºC por 15 segundos) ocorre em função da sua eficácia contra microorganismos patogênicos, como a tuberculose e a brucelose, em alimentos com pH superior 4,5, como o leite (reduz 99,99% das células patogênicas existentes), além de aumentar sua vida útil por alguns dias (GAVA, 2008). Já nos produtos com pH inferior a 4,5 (sucos de frutas) a pasteurização tem por objetivo reduzir os microorganismos deteriorantes (fungos e bactérias), e a pasteurização da cerveja (60ºC por 20 minutos) para destruir microorganismos deteriorantes (leveduras e bactérias láticas). 1.2.2 – Processamento Os alimentos líquidos podem ser pasteurizados a granel (ovos, leites, sucos de frutas, etc.) ou embalados (sucos de furtas e cervejas, entre outros). Usualmente os equipamentos mais comuns são os trocadores de calor de placas, tubulares, de vasos encamisados ou de superfície raspada, dependendo da viscosidade e do tamanho das partículas do alimento, nos quais existem áreas distintas de aquecimento e resfriamento, localizadas estrategicamente ao longo do percurso efetuado pelo alimento, visandoo estabelecimento da relação tempo X temperatura pré-determinada, segundo as características do produto a ser processado. 1.3 – Esterilização e produtos apertizados (enlatados) É o processo que visa à destruição completa de microrganismos patogênicos e deteriorantes presentes no produto. Emprega processos enérgicos que influenciarão na qualidade do alimento. No caso dos produtos apertizados (enlatados) nunca será obtida uma esterilidade absoluta, por isso são empregados os termos “comercialmente estéril” ou “estéril”. Por esse motivo BENDER (1982) define a apertização como o “termo aplicado pelos franceses ao processo de destruição de microorganismos de significado alimentar”, desenvolvido por 19 Nicolas Appert, confeiteiro parisiense premiado por Napoleão Bonaparte por descobrir o novo processo de conservação dos alimentos. O termo é também conhecido como esterilidade comercial, pois alguns microorganismos permanecem vivos, mas não se multiplicam. É o processo de maior importância industrial, tanto em nível da grade indústria como também da produção doméstica. Consiste na esterilização da embalagem e do produto conjuntamente, através de tratamento térmico em recipientes hermeticamente fechados. Por isso a vida de prateleira é bastante aumentada, ao limite das prováveis reações que possam ocorrer devido a fatores diversos que não sejam relacionados ao crescimento de microorganismos deteriorantes. Porém, após aberto, o alimento deverá ser consumido imediatamente ou, dependendo do produto, em até alguns dias se mantido sob refrigeração. Os mais comuns são: conservas vegetais (grãos, legumes, frutas e seus derivados, etc.), pescados, carnes, sopas, entre outros, pois a indústria alimentícia está em inovação constante. Alterações microbiológicas, físicas e químicas podem ocorrer nos alimentos apertizados. As contaminações microbiológicas podem ocorrer em todas as fases, dede o tratamento térmico até o envase, especialmente por vazamento nesta última fase, levando à produção de ácidos com ou sem gases, produção de gás sulfídrico, bolores e leveduras, além de bactérias esporuladas ou não. No caso das alterações das latas, as mais comuns são o estufamento: a atividade microbiana ou a corrosão da lata levam à formação de gases no compartimento interno da lata (gás carbônico, hidrogênio, e até mesmo gás sulfídrico e gás carbônico, entre outros) aumenta a pressão interna, e os extremos da lata, antes ligeiramente côncavos devido ao vácuo, passam a ser ligeiramente convexos. Os danos de ordem física relacionam-se à deficiência das técnicas de operações de autoclavagem, o que pode deformar a lata ou quebrar o vidro, deficiência na formação do vácuo ou enchimento das embalagens em excesso. Os recipientes de vidro podem conter alimentos sensorialmente alterados devido à incidência da luz direta. A movimentação, manejo e transporte dos recipientes também podem ocasionar alterações de vários tipos nos alimentos apertizados. A aplicação do calor em níveis adequados à obtenção da esterilidade comercial dos alimentos apertizados provoca alterações organolépticas e nutritivas, como por exemplo: alterações de textura, sabor, aroma, viscosidade e perdas de enzimas e significativas de algumas vitaminas, estas em percentual considerável no caso da tiamina – B1 (até 75%) e ácido ascórbico – vitamina C (destruído pelo calor) (OETTERER et all, 2006), alem de desnaturação de proteínas e reações de oxidação de lipídeos, principalmente. 1.3.1 – Processamento Térmico Consiste no princípio do processo criado por Appert aperfeiçoado através de melhoramentos crescentes, introduzidos no decorrer das décadas, definido como o simples aquecimento do produto, previamente preparado, em recipientes fechados, na ausência relativa de ar, para que seja atingida determinada temperatura num tempo suficiente, ou seja, que possibilite a destruição dos microorganismos, sem alterar sensivelmente as características físicas e químicas do alimento. Ou seja, o processamento térmico é a aplicação de calor ao alimento (em temperatura cientificamente determinada), durante um período de tempo visando alcançar a esterilidade comercial (GAVA, 2008). Fatores de interferência no processamento térmico � Espécie, forma e quantidade de microrganismo: diferenciando não apenas as espécies, mas também as formas vegetativas e de resistência (esporos). 20 � pH do produto: alimentos ácidos, com pH menor que 4,5 (sucos de frutas e de tomates, bebidas isotônicas, chás e bebidas energéticas), podem ser processados por aquecimento em água fervente sob pressão atmosférica em cozinhadores, onde a alta acidez elimina a possibilidade de desenvolvimento de microorganismos e, consequentemente, das toxinas destes, embora os esporos possam estar presentes e sobreviver ao tratamento térmico. Já os alimentos de baixa acidez, com pH igual ou maior que 4,5 (ervilhas, milho, feijão, água de coco, leite, soja, etc.) requerem altas temperaturas sob pressão de vapor, e devem ser suficiente para eliminar esporos de Clostridium botulinum. Alimentos como alcachofra, palmito e cebola são alguns dos produtos de baixa acidez onde o processamento térmico a altas temperaturas pode vir a alterar sua qualidade, e por isso são adicionados de substâncias para baixar o pH (vinagre ou ácido cítrico) até o limite onde o processamento em água fervente seja suficiente. � Velocidade de penetração do calor do meio externo até o centro do vasilhame: influenciada pelos líquidos que contém o alimento (xaropes, salmoura), tipo do alimento e do recipiente (tamanho, formato, material de composição). � Tempo X Temperatura: quanto mais alta a temperatura ou mais longo o tempo de cozimento, maior a eficiência da esterilização, mas tempo e temperatura devem ser usados com critérios para não danificar o alimento. � Temperatura inicial: o pré-aquecimento e o envase do produto já pré-aquecido diminui o tempo de esterilização. Acredita-se que a destruição dos microorganismos pela ação do calor é devido à desnaturação de suas proteínas e de seus sistemas enzimáticos, responsáveis pelo metabolismo dos mesmos, influenciados por inúmeros fatores que influenciam a termoressistência das formas vegetativas e dos esporos (quantidade de células vegetativas, espécies, condições de crescimento, idade, meio ambiente, pH, composição do alimento, natureza do calor úmido ou seco, entre outros) (OETTERER et all, 2006). Por isso a duração de um processamento térmico está condicionada principalmente pela velocidade de transmissão do calor ao interior da lata e pela resistência dos microorganismos. O esporo bacteriano é uma adaptação de certas espécies de microorganismos (gênero Bacillus, Clostridium e Desulfotomaculum) como forma de resistência, quando ao redor deles forma- se uma camada protetora permitindo-lhes enfrentar o calor e outras intempéries do meio externo. A formação dos esporos ocorre, normalmente, na fase do crescimento exponencial das células microbianas ou em face às condições adversas do ambiente, e é influenciado por fatores como o pH, presença de oxigênio, manganês, carboidratos e compostos nitrogenados. A maioria dos esporos importantes para estudos diante da deterioração de alimentos apertizados pode resistir durante diversas horas em água fervente, porém, pode ser destruída em poucos minutos a altas temperaturas (em torno de 115ºC a 120ºC). Desta forma, o tempo e a temperatura do processamento são estabelecidos com base na resistência ao calor por parte dos esporos de Clostridium botulinum, cuja destruição de esporos é considerada como o mínimo do processamento térmico para alimentos apertizados. Em meio anaeróbio e em pH acima de 4,5 , condições favoráveis à forma vegetativa do C. botulinum, ocorre a produção de sua poderosa toxina, muitasvezes fatal. Porém, somente os esporos são resistentes ao calor, e a toxina e a forma vegetativa desta bactéria são facilmente destruídas perante o tratamento térmico. Mesmo assim, os esporos devem ser destruídos para que, em condições ideais, não germinem à forma vegetativa e produzam a toxina (GAVA, 2008). O tempo necessário para a destruição dos esporos nos alimentos com pH favorável (maior que 4,5) chega a várias horas a 100ºC, o que prejudica as características dos alimentos apertizados, tornando-os inaceitáveis. Por este motivo, o tratamento térmico a ser efetuado em alimentos de baixa acidez ocorre em temperaturas entre 115ºC e 125ºC em autoclave de pressão a vapor, sem prejudicar deleteriamente a qualidade dos produtos, cujo tempo de tratamento é varia em função do pH e da temperatura empregada, conforme pode ser observado na Tabela 1. 21 ALIMENTO pH Temperatura (ºC) Tempo (minutos) Ervilhas 6,0 116 35 Milho 6,1 116 50 121 25 Cogumelos 6,3 116 23 121 12 Abóbora 5,1 116 65 Azeitona 6,9 116 60 Batata doce 5,2 116 90 Abacaxi 3,7 100 20 Suco de tomate 4,2 100 55 Pepinos (picles) 3,1 85 10 Pêssego 3,6 100 15 Morangos 3,4 100 5 Tabela 1: Processamento térmico de alguns alimentos apertizados. Fonte: GAVA, 2008 1.3.2 – Recipientes para produtos apertizados Os recipientes, obrigatoriamente, devem ter fechamento hermético. Os mais utilizados são a lata e o vidro, pois oferecem resistência considerável contra as ações dos produtos compostos e alimentos diferentes que estão sendo envasados. Atualmente é cada vez mais frequente o uso das embalagens laminadas (sachês) autoclaváveis, feitas especialmente a base de nylon e poliéster por resistirem às altas temperaturas, podendo ser combinadas com alumínio ou outro filme soldável pela ação do calor. Os diversos tipos de embalagens serão abordados no Capítulo 5. 1.3.3 – Processamento asséptico – UHT ou UAT No caso dos alimentos não ácidos (água de coco, leite, bebidas a base de soja, etc.) o processamento asséptico pode ocorrer através do aquecimento do produto a temperaturas ultraelevadas ou altas (UAT ou UHT), entre 130ºC e 150ºC, por 2 a 4 segundos, através de processamento térmico contínuo e, logo após, imediatamente resfriado a uma temperatura inferior a 32ºC. Em seguida os alimentos são envasados em condições assépticas em embalagens estéreis e fechadas hermeticamente. Para o caso do leite UHT ou UAT a Portaria MAPA 370/97 aprova o Padrão de Identidade e Qualidade (PIQ) para o leite submetido a esse processo. <http://extranet.agricultura.gov.br/sislegis- consulta/consultarLegislacao.do?operacao=visualizar&id=1252> Acessado em 05/11/2012. O termo UHT significa Ultra Hight Temperature, devido ao processamento asséptico ocorrer em alta temperatura por curto espaço de tempo, por isso o processo afeta bem menos as propriedades sensoriais e nutritivas do alimento, fazendo com que este produto tenha obtido alta aceitação no mercado. Este mesmo processo também é utilizado para uma enorme variedade de alimentos líquidos, inclusive ovos e misturas para sorvetes, podendo também ser empregado no 22 processamento de alimentos que contenham partículas pequenas (alimentos infantis, ricota, molhos e conservas a base de tomate, frutas e hortaliças, entre outros). As condições desse processo proporcionam características assépticas finais do produto onde ocorre ausência de microorganismos e, inclusive, esporos viáveis. É importante lembrar que a indústria de alimentos utiliza os termos asséptico, estéril e “comercialmente estéril” alternativamente. Vantagens do processamento asséptico para o convencional (onde embalagem e conteúdo são aquecidos juntos): melhoria das características organolépticas (aroma, cor, textura e sabor), melhor preservação dos nutrientes, melhor controle do resfriamento da embalagem e do excesso de cozimento, possibilidade de estocagem e comercialização dos produtos sem a necessidade de refrigeração e a uniformidade do produto, não importando o tamanho da embalagem. Volumes das embalagens assépticas: podem variar de 80 ml até volumes industriais de 1.000 quilos (leite, purê de tomates e polpa de bananas), tanques de transporte (entre 400 mil à 10 milhões de litros), até mesmo tanques de armazenamento e navios transportadores de suco de laranja concentrado (de 20 a 100 mil quilos) (GAVA, 2008). Limitações do processo UHT: constituem-se, principalmente, na viabilização dos custos e na complexidade das unidades fabricantes, devido aos controles e instalações do processamento e envase asséptico, tubulações, assepsia dos tanques de armazenamento e pessoal especializado. A esterilidade comercial deve ser mantida durante todo o sistema, desde o momento do aquecimento do produto até o envase nos recipientes hermeticamente. Os agentes de esterilização das embalagens e das superfícies internas dos equipamentos são: o calor, produtos químicos (água oxigenada), radiações de alta energia (ultravioleta, gama e feixe de elétrons) ou, até mesmo, a combinação deles. Embalagens assépticas utilizadas: latas metálicas e compostas, recipientes de vidro, tambores, copos plásticos, recipientes de papelão cartonado laminado e de plástico, sacos ou bolsas pré-formadas, entre outros. Exemplos de marcas: Tetra Pak, International Paper e Combibloc (cartonados); Scholle e Liquibox (bag-in-box); Serac (garrafas e latas), entre outros. Alterações físico-químicas nos alimentos assépticos: além de oferecer um produto de melhor qualidade, o sistema asséptico visa permitir a comercialização à temperatura ambiente por um período de tempo extenso. Livre de microorganismos patogênicos ou não, mesmo com o aumento do shelf-life (vida útil) são inevitáveis as transformações de origem química devido à temperatura, oxigênio e composição do produto. A Reação de Maillard e a caramelização, que proporcionam alterações de cor, bem como as reações de oxidação, que alteram o sabor e o aroma dos produtos asséptico, podem ocorrer, por exemplo, nos sucos de frutas e água de coco. Porém, as pesquisas continuam na busca de soluções para minimizar os problemas. 1.3.4 – Mais considerações sobre o controle de qualidade dos alimentos apertizados O controle de qualidade do produto final apertizado começa no campo, através do controle da matéria prima, o que deve ser continuado durante todo o processamento, já que em nenhuma de suas etapas o produto poderá ser melhorado, mas pelo contrário, poderá perder qualidade caso as fases de transformação não sejam controladas de forma adequada. Isso implica dizer, pelos motivos anteriormente relatados, que o produto final apertizado nunca terá qualidade superior à matéria prima. Assim, o controle de qualidade deverá contemplar as seguintes fases: matéria prima (inspeção e classificação), processamento e análise do produto acabado. Exemplos de pontos críticos importantes no processamento: frescor ou grau de maturação, presença de elementos estranhos (insetos, agentes físicos ou químicos), carga microbiana, qualidade da água de limpeza, embalagem, compostos de preparo (salmoura ou calda), enchimento, espaço livre na embalagem, pH, Brix, peso drenado, acidez titulável, branqueamento, vácuo, recravação (aplicação da tampa), tratamento térmico, resfriamento e análises finais do produto acabado (GAVA, 2008). 23 1.3.4.1 – Corrosão da lata A lata ainda é a embalagem mais utilizada em produtos apertizados, sendo as chapas de aço (folhas de flandres) o produto mais utilizado em sua fabricação. Embora todos os avanços tecnológicos, a mesma premissa dos tempos antigos se mantém: o produto deve manter as adequadas condições de consumo durante todo o tempo de prateleira. A corrosão externa tem causas variadas, e pode ser enferrujamento, manchamentoe destanhamento. Porém, a corrosão interna pode ocorrer, principalmente devido a fatores eletroquímicos, quando o estanho da superfície da chapa pode ser comprometido na presença de alimentos quimicamente complexos, tornando crítica a manutenção da sua qualidade no decorrer do tempo de prateleira do produto acabado (cerca de dois anos, dependendo de cada empresa e de cada produto). Dentre as prováveis corrosões internas que podem ocorrer são mencionadas as seguintes: • Perfurações: pequenos furos nas paredes internas (corrosão localizada do ferro), fazendo com que o produto seja extravasado, podendo ocasionar o estrago de outras latas também. • Estufamento: devido ao aumento da pressão interna pela formação de gases, levando ao descarte do produto já que alterações bacterianas podem ser as causas deste problema. • Destanhamento: é a dissolução do estanho que protege a superfície da folha de flandres, conferindo alteração do sabor. Segundo GAVA (2008) é aceitável em alguns casos, como no aspargo, mas inadmissível em outros. • Enferrujamento: corrosão com a formação de óxido-férrico (ferrugem). • Manchamento: ocasionada pelo depósito de sulfeto de estanho na superfície da chapa. 1.3.4.2 – Inspeção da recravação Após o tratamento térmico, o fechamento hermético das latas deve ser rigorosamente inspecionado. A qualidade desta etapa de processamento pode ser comprometida devido às más condições do equipamento (recravadeira), ao material da lata (por exemplo, variações na espessura da chapa), e tamanho da lata (comprometendo a eficiência do processo automático e mecanizado). 1.4 – Secagem Constitui-se na remoção de água ou de qualquer outro líquido, de um material sólido, a qual passa da forma de vapor para uma fase gasosa insaturada, por meio de mecanismo de vaporização térmica, em temperatura inferior à de ebulição (BOBBIO & BOBBIO, 1992). Consequentemente é reduzida a atividade de água que afeta o crescimento microbiano, as reações enzimáticas e outras alterações de natureza física e química. A atividade de água é a medida da quantidade de água livre no alimento, que tem uma escala de 0 a 1,00. A Atividade de água (Aw ou Aa) é o fator que melhor representa a água disponível no alimento, e sua redução é capaz de prolongar a vida útil do alimento, mas apesar de reduzir o crescimento microbiano e a atividade enzimática, não provoca sua inativação, fazendo com que qualquer aumento do teor de umidade durante a estocagem resulte em deterioração, como por exemplo, caso a embalagem seja defeituosa. A redução da Aw pode proporcionar, em alguns produtos, a boa aceitação de suas características físicas e nutritivas, e quando se lhes restitui a água, retornam às suas características bem aproximadas das iniciais, e os processos e equipamentos de secagem objetivam reduzir tais alterações. 24 Em relação dos métodos de conservação dos alimentos, é um dos mais antigos utilizados pelo homem, aprendido com a natureza e constantemente aperfeiçoado, utilizada principalmente em regiões de clima árido. A secagem ocorre de forma natural no caso dos grãos e sementes, no próprio campo de cultivo e, muitas vezes de forma tão eficiente que não há necessidade de intervenção do homem. Suas vantagens são muitas, conferindo melhor conservação do produto e redução de seu peso, de volume, além de ser mais econômica em relação a outros processos de conservação. Isso também representa economia na embalagem, no transporte e no armazenamento, pois a redução de peso pode ocorrer entre 50% e 80% em relação ao produto in natura, também devido à retirada de partes não comestíveis (cascas, sementes, caroço, vísceras, gordura, etc.). Portanto, apresenta vantagem econômica em relação aos outros processos de conservação, pois diminui o peso e o volume do alimento, diminuindo o custo de embalagem em tamanho e quantidade, transporte, estocagem, armazenamento à temperatura ambiente, menor mão de obra. Além desses fatores, o alimento seco apresenta-se mais concentrado quanto aos seus nutrientes, podendo ser útil na elaboração de dietas (bem como de alimentos). Alimentos submetidos ao processo de secagem são muitos, como por exemplo: frutas secas, hortaliças, chás, nozes, café, leite, charque, pescados, frutos do mar, massas alimentícias, farinhas, ovos, condimentos, e vários outros. Todos os processos podem ser classificados em dois grupos: secagem natural ou ao sol, e secagem artificial (desidratação). Os regionalismos, especialmente as condições climáticas da região (horas de sol, ventos favoráveis, temperatura mais ou menos alta, baixa umidade relativa do ar, etc.), custos de produção, exigências do mercado, mão de obra, natureza do alimento, entre outros fatores, é que determinam qual o processamento a ser utilizado. Em condições controladas, a desidratação confere melhores condições sanitárias ao produto, enquanto que a secagem natural propicia o contato dom poeira, insetos, pássaros e roedores, que são fontes de problemas, além de ocupar menos espaço em relação à secagem natural. 1.4.1 – Secagem natural Regiões como Grécia, Espanha, Mendoza (Argentina), Ásia, Chile, entre outras, apresentam condições climáticas favoráveis à secagem natural. O local de secagem deve ser distante de vias de acesso devido aos problemas com a poeira. É recomendável que o processo de secagem ocorra em duas fases: a primeira, para a redução de até 70% da umidade, deverá ser feita ao sol, e a segunda, à sombra, evitando o ressecamento dos produtos e as perdas de sabor e aroma. Caso a secagem deseja feita totalmente ao sol, no caso das frutas, estas escurecem. O maior problema nos produtos secos são as condições empíricas de processamento, além da formação de camada endurecida na superfície do alimento, devido à alta temperatura do ar agregado à baixa umidade relativa, acarretando a evaporação da água da superfície de forma mais rápida que a água do interior do alimento. Normalmente são projetados espaços com piso de cimento ou pedregulho, capazes de irradiar calor, sobre os quais são acomodados os suportes e, sobre estes, os tabuleiros contendo os alimentos, de forma que ocorra fácil circulação de ar quente sobre e entre os produtos. Os tabuleiros são dispostos em três camadas sobrepostas, que vão sendo baixadas, retirando- se a camada inferior, e substituindo-a por nova camada na parte superior. Entretanto, esse processo fica subordinado a condições climáticas, podendo ocorrer fermentação dos açúcares dos frutos (pelo próprio metabolismo do fruto), contaminação microbiana e de insetos. Por outro lado, a cor desenvolvida é melhor, pois o fruto ainda verde pode desenvolver suas características sensoriais (pois o processo de secagem é lento). A secagem à sombra deve acontecer em ambientes fechados, e ocorre de forma mais adequada com o uso de ventiladores ou aspiradores. 25 O tempo necessário para a secagem depende do alimento e do percentual de água, além da irradiação solar, e em climas tropicais demanda de dois a doze dias, em média. Assim, a umidade que normalmente é em torno de 90% na fruta fresca, será reduzida para 20% a 25% na fruta seca. 1.4.2 – Desidratação Ocorre em condições de temperatura, umidade e corrente de ar criteriosamente controladas, onde o calor necessário à evaporação da água nos alimentos (ou, no caso da liofilização, sua sublimação) pode ser transmitido por radiação, por condução ou por convecção, mas geralmente se combinam (GAVA, 2008). Os vários métodos de desidratação (dessecação) podem ser: • desidratação com ar quente (adiabáticos) – o alimento entra em contato com uma corrente de ar quente (convecção); • desidratação por contato: o alimento é colocado sobre uma superfície sólida que lhe transmite calor (condução); • desidrataçãopor energia radiante: quando ocorre a transmissão de calor por radiação; • desidratação por energia eletromagnética, microondas e aquecimento dielétrico; • liofilização: quando a água, após congelada, é sublimada com a utilização de qualquer um dos mecanismos comentados anteriormente. Nesses processos, o ar é o condutor de calor para o alimento e o responsável pela evaporação da água. O ar também é o veículo que transporta o vapor úmido liberado do alimento. Em relação à secagem natural, a desidratação oferece algumas vantagens. Quais sejam: a. Na desidratação tem-se o controle das condições ambientais e na secagem natural não; b. O processo de desidratação exige menor área de trabalho do que o processo natural; c. As condições sanitárias da desidratação são mais controláveis do que o natural, que são feitos em ambiente aberto e, portanto de fácil contaminação por poeira, insetos, pássaros, roedores; d. A desidratação é um processo mais caro que o natural, no entanto, a qualidade do produto final é melhor; e. Não se perde açúcar na desidratação por não ocorrer fermentação e respiração dos tecidos como ocorre no processo natural; f. A cor das frutas secas pelo processo natural pode ser mais apresentável que na desidratação, pois o desenvolvimento da cor em certas frutas imaturas continua lentamente durante a secagem natural, o que não acontece na desidratação; g. A qualidade de cozimento dos alimentos desidratado é superior. Todavia, os produtos de origem animal apresentam excelentes qualidades quando secos ao sol (secagem natural); h. A desidratação é mais rápida do que a natural. Existem diversos tipos de desidratadores, patenteados ou não, cujo tipo a ser utilizado é determinado pelo tipo do alimento a ser desidratado, pelas condições econômicas e de operação: secadores de cabine, de túnel, fornos secadores, secador de tambor, desidratadores a vácuo, entre outros. Os secadores são divididos em duas categorias: a. Secadores Adiabáticos: 26 • Secador de cabina • Secador de túnel • Secador de aspersão ( spray driers ) b. Secadores de Transferência: • Secador de tambor • Secador de prateleira a vácuo Métodos de Secagem Como visto acima, pode-se utilizar gases, ar aquecido e aplicação direta do calor para a secagem do alimento. O ar é o meio mais barato. Muito mais ar é necessário para condução de calor ao alimento (cinco a sete vezes mais) do que para arraste de vapor para fora da câmara. A capacidade de absorção de umidade do ar está na dependência direta da temperatura. A cada 15 °C de aumento de temperatura do ar, aumenta-se a sua capacidade de reter água (umidade). Razão de Evaporação A razão de evaporação da água do alimento aumenta quanto maior for: a. A área de superfície livre do alimento; b. A porosidade do alimento; c. A velocidade do fluxo de área sobre o alimento; d. A temperatura do ar; e. A diferença de temperatura do ar que entra e a temperatura do ar que sai da câmara de secagem. A velocidade de secagem de um alimento é rápida quando o conteúdo passa de 80 para 6% de umidade. Abaixo desse percentual, maior será o tempo de secagem, pois se chega ao valor de equilíbrio (osmótico), podendo ocorrer a formação de crosta (em função da elevação de temperatura para evaporar a umidade restante). A formação de crosta ocorre devido à alta temperatura e baixa umidade relativa do ar de secagem. Com isso, a água contida na superfície do alimento é retirada abruptamente, impedindo que a água contida no interior do alimento migre para o exterior, formando uma crosta. Esta situação pode ser evitada, controlando a temperatura e a umidade relativa do ar circulante. 1.4.2.1 – Desidratação: alterações decorrentes As alterações mais importantes referem-se às perdas de aroma e sabor, alterações de textura, modificações na cor e no valor nutritivo. A perda da umidade leva ao aumento da concentração de nutrientes por unidade de peso, em relação ao produto fresco, levando também à perda de alguns de seus constituintes. Por essa razão, mesmo após reidratado ou reconstituído, embora chegue a assemelhar-se ao produto natural, nunca terá as mesmas características deste mas, para alguns alimentos isso não se enquadra como motivo de recusa por parte do consumidor, como por exemplo no caso do achocolatado, leite em pó, frutas secas (banana, uvas, figos, tâmaras, etc.), charque, pescados, entre outros. 27 As hortaliças desidratadas apresentam frequentemente reações de oxidação lipídica, reações de escurecimento não enzimático, oxidação de pigmentos (clorofila e carotenoides), bem como oxidação de vitaminas (C e B1) como os fatores mais responsáveis por sua deterioração. No caso das frutas os fatores comumente responsáveis pela deterioração são escurecimento não enzimático e as reações enzimáticas. Alterações celulares também ocorrem, e são as responsáveis pelas maiores modificações importantes na textura dos alimentos sólidos, com perda de qualidade, pois ocasionam a cristalização da celulose, gelatinização do amido e variações da umidade interna durante a secagem, conferindo aparência enrugada e encolhida ao alimento. As altas temperaturas de secagem também provocam a perda de aroma, sabor e formação de uma dura capa na superfície, devido às mudanças físicas e químicas nas celular mais expostas ao ar, principalmente nas frutas e nas carnes. Ocorrem também reações importantes referentes às ações dos pigmentos e enzimas e a reação de Maillard (caramelização), responsáveis pelas alterações de cor nos alimentos secos. Para minimizar, diminuir ou evitar essas alterações são utilizadas embalagens à vácuo com atmosfera modificada (gás apropriado), além do controle do processo de secagem, adição de antioxidantes, baixas temperaturas de estocagem, uso de dióxido de enxofre, exclusão da luz, manutenção de baixos teores de umidade, enfim, a indústria alimentícia recorre à utilização de técnicas conhecidas e também investe recursos incansavelmente na busca de produtos com qualidade superior. 1.4.2.2 – Desidratação: perdas nutricionais decorrentes Devido às variações, diversidades e tipos de processamento utilizados no processo de desidratação as perdas nutricionais também são muito variáveis, ocorrendo especialmente com relação às vitaminas, as quais são facilmente afetadas não apenas pelos processos de aquecimento e oxidação durante o processo de secagem propriamente dito, mas também durante a estocagem, despendendo das condições em que esta ocorre, e do preparo do alimento. As perdas mais comuns são de vitamina C (ácido ascórbico), já que esta é a vitamina mais sensível de todas por ser hidrossolúvel e facilmente destruída pelo calor e pela oxidação, cujas perdas durante o processo podem variar de 10% à 50%, dependendo da atividade de água (Aw) do alimento, do processo de preparo e das condições utilizadas (GAVA, 2008). Porém, as vitaminas do complexo B (exceto a vitamina B1, tiamina, mais termossensível) são mais termorresistentes que a vitamina C, e por este motivo as perdas oscilam em torno de 5% a 10%. Com relação às vitaminas liposolúveis (A, D, E e K), as respectivas perdas são decorrentes das reações com os peróxidos provenientes da oxidação lipídica, e podem ser minimizadas com o uso de antioxidantes, redução da concentração de oxigênio, redução da incidência de luminosidade e controle da temperatura de estocagem. Com relação às proteínas, os tratamentos a baixas temperaturas visando a desidratação dos alimentos podem aumentar a digestibilidade, enquanto que os tratamentos a altas temperaturas por tempo prolongado poderão afetar o valor biológico das estruturas proteicas,em relação ao produto inicial. Da mesma forma, a rancidezé mais incidente às altas temperaturas, razão pela qual é importante a utilização de antioxidantes para proteger a degradação das gorduras. O teor de carboidratos nas frutas é significativo, razão pela qual as alterações destes devem ser controladas com a utilização de antioxidantes e dióxido de enxofre, visando prevenir as alterações de escurecimento provocadas por enzimas ou reações químicas. 28 1.4.2.2 – Desidratação: ação sobre os microorganismos e enzimas As atividades metabólicas dos microorganismos está diretamente relacionada à presença de umidade nos alimentos, portanto a retirada de água é um fator fundamental para o controle do crescimento dos microorganismos. Sabe-se que o crescimento de bolores pode ocorrer em substratos com menos de 5% de umidade, enquanto que as leveduras e bactérias crescem em alimentos que apresentem umidade em torno de 30%. Como as frutas secas apresentam umidade em torno de 15% à 25% não se constituem em substratos ideais ao crescimento microbiano. Os produtos que tem alto teor de amido devem apresentar umidade controlada entre 2% e 5% (POLLONIO, 1993). Como já comentado é necessário o controle da atividade enzimática visando minimizar as reações de degradação e alterações organolépticas e, portanto, a ação do calor úmido em temperaturas superiores à atividade enzimática, através do branqueamento, é uma forma eficaz de controle dessas alterações indesejáveis. Porém, a aplicação do calor seco já não oferece sensibilidade à atividade enzimática. 1.5 – Instantaneização Consiste no processo de fabricação dos alimentos instantâneos ou aglomerados, os quais podem ser facilmente dissolvidos em água. O processo de obtenção resume-se no fato de, após a operação de secagem, os produtos podem ser acrescidos por substâncias dispersantes. Já a aglomeração ocorre quando os produtos que necessitam de uma mudança na estrutura da partícula. Pós finamente divididos são reagrupados para a obtenção de partículas de maior tamanho e identidade física especial, o que também favorece o aumento da quantidade de ar entre as partículas (EVANGELISTA 1992). Leite em pó, café solúvel, farinhas, sopas e sobremesas desidratadas, farinhas e outros produtos são obtidos através do processo de instantaneização. O produto final deverá apresentar algumas propriedades especiais que lhe conferem a qualidade desejada, ou seja: • molhabilidade: capacidade do pó de adsorver água em sua superfície. O alto teor de gordura confere ao alimento uma molhabilidade ruim; • imersibilidade: após ter sido umedecido, o pó deverá apresentar a capacidade de imergir na água, o que também depende da diferença de densidade entre o pó e o líquido de imersão; • dispersibilidade: constitui-se na capacidade do aglomerado de se separar; • solubilidade: diz respeito à velocidade de dissolução e à solubilidade total. 1.6 – Liofilização Liofilização é o processo de desidratar uma solução congelada, impedindo seu descongelamento, enquanto se processa a evaporação; desse modo, a solução reduzida à massa gelada sublima o próprio solvente e se transforma diretamente em substância seca. É também conhecida como criosecagem, compreendendo o processo onde ocorre a desidratação dos produtos sob condições de pressão e temperatura específicas, de forma que a água, previamente congelada, passa do estado sólido diretamente para o estado gasoso (processo físico de sublimação). A realização em temperaturas baixas na ausência de ar, faz com que as características organolépticas do alimento praticamente sejam mantidas. 29 Conforme as condições de temperatura e pressão qualquer substância pode se apresentar em um dos estados de agregação: sólido, líquido ou gasoso ou, dependendo das características de cada substância, podem coexistir dois ou até mesmo esses três estados. Desta forma, todo o processo de liofilização requer condições específicas de temperatura e pressão, ou seja, temperatura inferior a 0ºC e pressão inferior à 4,7 mm de mercúrio. Por ser um processo mais caro, entre cinco a dez vezes mais dispendioso quando comparado aos processos convencionais, a liofilização é utilizada no processamento de alimentos mais caros também (frutos do mar, café, cogumelos de espécies exóticas). Inicialmente a liofilização começou a ser utilizada pela indústria farmacêutica, aqui no Brasil, especialmente para antibióticos e vitaminas, por permitir a preservação da atividade biológica desses produtos, mesmo à temperatura ambiente. Atualmente, no Brasil, é utilizada para café, refeições prontas e muitos outros ingredientes, e como o teor de umidade é requisito fundamental à sua conservação, a embalagem é um item muito importante para os alimentos liofilizados. Normalmente o alimento é congelado à -40ºC, onde o aumento da temperatura acelera o processo de sublimação. A liofilização requer aparelhagem especial e alto vácuo. O processo é iniciado a partir do alimento congelado, seguido de sublimação. O alimento fica seco, com seu volume muito pouco reduzido e com as características sensoriais e nutritivas quase intactas depois do processo. O liofilizador é compreendido de um congelador, da câmara de secagem, da câmara de condensação e a bomba de vácuo. Alimentos liofilizáveis: nem todos os alimentos podem ser liofilizados, por sofrerem perdas durante o processo. Os alimentos que melhor se adaptam à liofilização, por ficarem porosos e de fácil reidratação, são: abacaxi maracujá morango Banana (exceto: d’água e nanica) coco Legumes diversos cogumelo Suco de fruta milho alho cebola Extrato de café leite camarão peixe Ovo (clara ou gema) carnes preparações 1.7 – Conservação dos alimentos pela salga A salga é um processo de desidratação devido ao fenômeno da osmose, mas apresenta características peculiares. Há microrganismos que não se desenvolvem na presença de sal e outros que só sobrevivem a uma determinada concentração de sal. Existem 3 origens do sal: o solar ou marinho, de minas profundas (extraídas com água) e de minas superficiais. O primeiro apresenta maior contaminação por microrganismos (105) e os outros apresentam uma contagem em torno de 103. Os principais gêneros que se desenvolvem no sal são Bacillus e Micrococcus (70%), que crescem a 20 e 37o C. Halobacterium cutirubrum é uma bactéria que sobrevive a altas concentrações de sal, e desenvolve uma cor vermelha ou rosa na superfície de alimentos salgados. Só é destruída na presença de bacitracina. Geralmente o sal “velho” contém um menor número de microrganismos, porque os microrganismos não resistem tanto tempo no sal, diminuindo seu número com o passar do tempo. O sal de minas é o menos contaminado, porém, é o que contem mais contaminantes químicos como cloretos ou sulfatos de magnésio ou cálcio que retarda a penetração do sal no alimento e pode causar gosto amargo. Na concentração de 1%, esses contaminantes podem causar endurecimento e clareamento do alimento. A salga não é muito recomendada para alimentos gordurosos porque pode favorecer a rancificação do produto, alterando suas características sensoriais. 30 O sal apresenta várias vantagens como intensificar o paladar e o sabor dos alimentos, ajuda à digestão, controla a intensidade da fermentação de produtos submetidos a esse processo, fixa a água para formar a estrutura do pão, branqueia massas em que entra farinha. 1.8 – Conservação dos alimentos pela adição do açúcar O açúcar é um bom agente conservante para produtos derivados de frutas, pois cria condições desfavoráveis para o crescimento microbiano, promovendo um aumento da pressão osmótica (diminuição da atividade de água). Só os microrganismos osmofílicos são capazes de se desenvolverem neste meio. Por isso, esses produtos são complementados com tratamento térmico.
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