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Seminário 5 - Texto: O Poder Normativo das Agências Reguladoras

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o
A
PODER NORMATIVO DAS
GENCIAS REGULADORAS
ATEXANDRE SANTOS DE ARAGÃO
Coordenador
Alexqndre Santos de Aragão
André Fontes
André-lean Arnaud
Carlos Ari Sundfeld
Carlos Roberto Siqueira Castro
Egon Bockmqnn Moreira
Fábio Barbalho Leite
Florinno de Azeaedo Marques Neto
Cioaani R. Loss
Clauco Mqrtins Guerra
Gustaao Binenbojm
lacintho Arruda Câmara
losé dos SaÀtos Caraalho Fitho
Marçal lusten Filho
Marcos luruena Villela Sottto
Marcos Paulo Verissimo
Maria D'Assunção Costa
Patrícia 
-Regina Pinheiro Snmpaio
Paulo Todescan Lessa Mattos
Sérgío Guerra
Tercio Sampaio Ferraz lunior
Thiago Ma'rrara 
- 
1\-
EDITORA
FORE NSI
Rio de ]aneir<
2006
o DrnErro CoNTEMpoRÂruno ENIRE RrcuLAMENrnçÃo
E RscuLAçÃo: o ExsMpLo Do PruRALrsMo IunÍprco
André-lean Arnaud'
sumário: 1. um realismo limitado: a apreensão do pluralismo pela
dogmática sob o reinado do normativismo jurídico. 2. Um legalismo
renovado: a apreensão do pluralismo pela análise sociocultttral dos sis-
temas jurídicos. 2.1. A alternativa: ensaio de taxonomia.2.2. Estruturação
e dinâmica do pluralismo com fundamento cultural.
Falar de regulação jurídica nos parece uma coisa normal. Na realidade,
a introdução do termo "regulação" no discurso dos juristas é relativamente
novo. Ela não é anterior ao reconhecimento, em especial pelos sociólogos
juristas, da existência de um fato incontornável: a emergência de regulações
paralelas ao direito fora das fontes tradicionais do direito e a aparição, em
conseqüência, de um plttralismo jurídico ameaçador para o direito concebi-
do como atributo da soberania estatal.
Soft lazn, alternativas, procedimentos informais de regulamentação d.os
conflitos se tornaram, é verdade, o quinhão cotidiano dos sociólogos juris-
tas, para quem o pluralismo faz, por assim dizer, parte da prática jurídica.
Para a dogmática jtuídica no entanto não acontece o mesmo, e os juristas
resistem ainda a conceber hipóteses de pluralismo jurídico. Segundo a teoria
"mod.erna" do Estado e do direito 
- 
teoria sobre a qual foram fundados os
direitos de inspiração ocidental 
- 
o pluralismo jurídico é contrário à estrutu-
ra piramidal das normas jurídicas e ao princípio de exclusivismo do direito
estatal. Oficialmente não poderia haver nllmerosas normas jurídicas em vi-
gor num mesmo momento, na mesma sociedade, regulando diferentemente
Llma mesma situação. Na nossa tradição ocidental do direito e do Estado,
fundamentalmente "monocentristà" , opluralismo é, então, tanto Luna curio-
sidade como rlma aberração.
Diretor de Pesquisa no CNRS, Diretor do Réseau Européen Droit et Société. Traduzi-
do por Sonia Branco.
AN D RE -J EAN ARNAU D
Quando os juristas se arriscam a falar de pluralismo, geralmente acen-
tuam o fenômeno da internormativid-ad.e. ocorre 9ü€, diante de um estatu-
to de d.ireito, urn cid.ad.ão se sente fragrnentado pelas regras norrnativas que
advêm de outros tipos de regulação que não a regulação jurídica: ética' reli-
gião, jogo etc. Confrontado a diversas normas que ditam comportamentos
contrad.itórios, o indivíduo não sabe como determinar sua conduta'
gs >uçiúl-6i1o j*ioÊoo) ácpoic d.o a^ac, o-rr.rrrrlârì1 êxeÌYìplos irrefutávgis
d.e,solucões alternativas e infumqls preferidas pelas pessoas em detrimento
das soluções oferecid.as pelo d.ireito ao qual estão normalmente submetidas'
por alternatiaaentenda-se tanto as práticas ou procedimentos propostos pelo
enunciador do direito regítimo como aqueras escorhidas deliberadamente
por pessoas que estabeleceram entre si um elo jurídico fora da esfera de
regulaçacl clo dlreiru eur vigérruia, u qcral seria g-eralrrtcnfc.epJrcál'el a essa
relação. Quanto ao teÍmo informal, e\e se Íefere a toda prática ou procedi-
mento que escapa, de direito ou pela vontade dos atores envolvidos, às
formas ordinárias ou excepcionais ditadas pelo direito em vigor normal-
mente aplicáve1 em hipótese.1
Como permitir aos juristas integrar essas descobertas de que eles não
podem negar a importância nas sociedades contemporâneas, que constituem
tantas facetas do pluralismo jurídico,2 mas que dificilmente podem ser incor-
poradas aos direitos fundados sobre teorias gü€, por princípío, ignoram
esses fenômenos? Há várias maneiras de abordar a questão do pluralismo
jurídico. Uma se refere aos dados tradicionais^de um enfoque sociojurídico
nascido sobre o pedestal das cateljorias fundamentais da dogmática jurídi-
ca; outra remete ao conceito de cultura jurídica. O pluralismo jurídico pode
assim ser abordado de dois pontos de vista radicalmente diferentes. O futu-
ro do d.ireito dependerá em grande parte da atitude que adotarão os juris-
tas entre enfoque normativo e perspectiva cultural. Afim de poder
Não se visará aqui a uma terceira forma de pluralismo que se atém à multiplicidade
das fontes de regulação jurídica e das soluções de direito no interior de uma mesma
ordem jurídica, e que provém mais precisamente do estudo da policentricidade. Cf',
por exemplo, nosso estudo "Legal Pluralism and the Buitding of Europe", in Legal
Polycentricity. Consequences of Plr.tralism in Inw, Hanne Petersen e Henrik Zahle eds.,
Dartmouth Publ., Aldershot, 1995, pp. 149-169.
Questão tratada em detalhe no Gouaernants sans frontières,Paris,LGDJ,1998, vol. 1,
tomo 2 da Critique de la raison iuridique.
o DIREITo coNTEMpoRANEo ENTRE REcULAMENTAÇÃo...
demonstr â-Io, compaïar-se-á e avaliar-se-á em seguida uma e outra diligên-
cia. Para tanto, se adotarâ, no desenvolvimento que segue, um ponto de
vista sistêmico, método suscetível a uma modelização do que se pretende
mostrar. O pluralismo, desse ponto de vista, se descreve como a presença
de subsistemas no interior de um mesmo sistema jurídico.
1.. UM REALISMQLIMITADO: A APREENSÃO DO PLURALISMO
PELA DOGMÁTICA SOB O REINADO DO NORMATIVISMO
1UnÍUICO
Seria falso pretend.er que os juristas não assinalam jamais/contradiçóõ
de normas. Entretanto, païa eles, essas contradições estão sempre sob apa-
rências de contrariedade, e são chamadas a se resolver por uma invocação
seja à@tes, seja à t
tras, seja, ainda, aos . Em resumo/ no inte-
rior de uma ordem jurídica, ao menos naquelas da tradição ocidental d.e que
nós tratamos, não poderia haver, em regra geral, normas contraditórias. E
para o caso disso acontecer, existiriam, sempre, no princípio dessa ordem,
f regras internas legulando esse tipo de conflito. De toda maneira , o juíz náo
tem a obrigação de estatuir mesmo em caso de silêncio ou obscuridade da
lei?3 Foi mesmo forjado, ao longo do tempo, em nossos países 
- 
bem como,
ou mais ainda, naqueles países da Common Law onde o direito se funda,
essencialmente, sobre os "precedentes" 
- 
uma jurisprudência cuja unidade é
assegurada pela existência de uma Corte superior
Fora das regras de direito em vigor, existem, frequentemente, na reali-
dade cotidiana, situações que païecem contradizer essa impossibilidade ló-
gica de pluralismo jurídico. O sociólogo jurista compreenderá, antes de mais
nada, que tais hipóteses se produzemfora do Palácio, quando as pessoas em
conflito rejeitam o recuïso aos tribunais. Se um caso vindo do pluralismo
jurídico, em que as partes requisessem a aplicação em seu favor de textos
contraditórios, fosse colocado diante dos juízes, a solução seria geralmente
clara. Poderíamos nos encontrar diante de três eventualidades. A primeira
consistiria em que os tribunais de diversas ordens não se entenderiam sobre
3 Código civil francês, art. 4.
AN D RE -J EAN ARNAUD
a regra aplicável 
- 
hipótese de atrsência de jurisprudência estabelecida. A
segunda é que a causa seria considerada como escaPando à legislação em
.vigor - hipótese de lacuna "legislativa". Convém notar aqui a forte significa-
íça"d.equeestáimpregnadaapa1avra,,lacttna,,.aumI'r
J direito possa comportar lacunas é reconhecer que_q "9iryj-lql-ygcagã-qP-Ta
regular tudo; é reco+hecerimplicilaTenteiqe, se_a legu!_e_!_o*lg:_t:gj-9t
_ 11glis_tçrrlq e_ltxl1*lerlg;1ado c,a!o/ cabe à.+g$$$!e que poss"i lgi-
dade para editar o direito, e somente a ela, preenòfieíesse vazio. A terceira
_. 
.-_..,é..:- 
.-_.r--
eventualidade reside na qualificação do comportamento da parte que nãg
@ídicaemvig8r,emrelaçãoàortodoxia.ointeressadoé
ionsiderad.o, simplesmente, como tendo transgredido " aleí" . Estamos rpot-
tanto, em presença de um caso de "desvtO" (lato Sensu).
É a idéia de desuio que poderia ser inovadora em matéria de pluralismo,
numa perspectiva de análise a partir da dogmática jurídica. O conceito de
lautna,corn efeito, só leva a Llm desfecho: a uma demanda de intervenção da
autoridade encarregada de dizer o direito na sociedade considerada' A idéia
de deÊllorao contrârto, comporta uma possibilidade de aberttlïa com uma
concepção menos restrita que a da dogmática jurídica pura. Se há desvio,
segurtdo as arrá\ises dessa últirna, é potque alguérn não atr-roll coÍno setia o
esperado pelos demais membros da comunidade, de acordo com a regra do
jogo estabelecida pelo corpo de direito em vigor. Nessa hipótese, explica a
dogmática jurídica, a sociedade não tem dificuldades em reestabelecer o
jogo, por um momento perturbado por esse ato, pois as instituições são pre-
vistas para reestabelecer o vínculo'de direito ofendido pela pessoa desviante.
Essas instituições são tanto instituições de arbitragem ou de julgamento,
como instituições de proteção, como ainda instituições de coação. Elas têm
por função seja obrigar, tanto quanto possível, à pessoa desviante a respon-
der convenientemente às expectativas, seja, eventualmente, respondeï em
seu lugar, seja, ainda, para os casos onde essas soltrções se asseveram impos-
síveis, instaurar um modo de reparação apto a remediar o dano ou prejtrízo
sofrido pela não-resposta à expectativa. Segundo os tempos e os lugares,
segundo a situação política, social e econômica, segundo o contexto históri-
co e culttrral próprio a cada sociedade, uma ou outra dessas instituições se
encontra mais ou menos desenvolvida.
Pela expressão "instituições de arbitragem ou de julgamento" compre-
enda-se o conjunto do aparelho judiciário e parajudiciário. As "instituições
de proteçáo" são, em geral, organismos públicos ou privados encarregados
o DIRErro coNTEMpoRANEo ENTRE RBcULAMENTAÇÃo...
de desempenhar o papel que o indivíduo desviante não representou (paga-
mentos dos fundos de garantia de segurança, fundos de garantia de pen-
sões alimentares, intervenção imediata do seguro social etc.). Quanto às
"instituições de coação", elas são, essencialmente, representadas pelo apare-
lho repressivo oficial de cada sociedade. Pode se resumir:
Relação legal ordinária
Justiça 
- 
Polícia (lógica do "Certo/Errado)
Ora, há uma outra maneira de ver as coisas, segundo a qual convém se
perguntar qual é a vontade do autor no completamento do ato desviante 
-
ou qualificado como tal. Desejaria ele infringir a noïma não respondendo
as expectativas de uma dada situação? Não desejaria ele, antes, por esse
ato, responder a uma outra referência normativa em vez daquela da lei em
vigor?
Se traduzimos essas situações em termos d
Formal
Não-alternativa
lntervenção do estado
olissistemia colocamo-
não-cumprida
reestabelecida
nos na hipótese de embates entre sisteairs jtrrídicos contraditóttor." na pers-
pectiva eventual de uma mudança jurídica. Por que haveria mudanças de
r -- -f.---l
Itrção @ na re_gulq11gntaç4gjurlqlçgqa sociedade é asseve-
;istemas de direitos, senão poÍque, em um determinado momento, uma so
t+de llAdequa4A? 9s juristas costumarndízer, em tal caso, que o legislador
se inspira nos fatos paramudar o direito. Falando propriurn"rlr"
nãopoderiamod.ificarodireito.Seumaregradedireitoou.,-.o,.jffi'
^,-..-_pode,",ï..odificado,éporque,potencial-Ji-rerto 
- 
um Í
ntente, Llma regÍa da mesma natureza, LtÍn conjunto da mesma natureza 
-
ir.nr sistema participante da mesma natureza: Ltrrr sistema jurídico 
- 
veio se
:inpor em detrimento do sistema de direito em vigor. Uma tal regra se en-
Jr-rfl.trâ nturr "sistema jurídico" paralelo e concorrencial ao sistema de direito.
\esse úrltrmo qtle, como vimos, é também um sistema jurídico, a expectativa
:';e A teria em relação a B não foi preenchida. No sistema que vai lhe suce-
ANDRE-JBAN ARNAUD
der com a mudança jurídica, a afuação de B corresponde a uma expectativa
que é a de um A', enquanto que a expectativa de A permanece não preenchida
pelo ato completado por B. É necessário ainda que as instituições de justiça e
de polícia -
_pgl4gqs}b-e]9!lryglJo*4a relação perturbada pelo ato desviante. E isso pode
aconteceï por mudanças nos costumes, nas práticas, nas mentalidades etc.
ão-satisÍeita
EI(_I
Papel concebido /desempenhado
Íora da Leiestatutária
Sistema jurídico alternativo
B
Expectativa satisfe ila
,^, 
'-r-'----
\-7 L_
^\/l\ Expectativa n
I
Expectativa
reestabelecida
Sistema legaldo Estado
Ç-,.',o - loúu^
Seguem-se assim ações coletivas que levam a mudanças legislativas. Mas
a hipótese pode ser estendida às ações coletivas que introduzem modifica-
ções de jurisprudência, quando os magistrados que têm que se pronunciar
sobre um caso ou sobre um julgamento anterior voltam sua atenção sobre
aquilo que urna grand.e parte da. população, frequentemente rendida pela
imprensa e pelas mídias, considera como uma injustiça. Às reres, mesmo
urna mudança legislativa intervém sobre urna reviravolta brutal de jurispru-
dência. Foi o caso, por exemplo, em vários países, de mudanças de direito
em matéria de proibição do aborto. Num primeiro tempo, o Ministério Pú-
blico não perseguia mais os casos de aborto que, uma vez tornados tão nu-
merosos, teriam lotado os tribunais e, se fazendo fenômeno de costumes,
poderiam colocar os magistrados em embaraços. Num segundo tempo, os
coletivos de mulheres exigiram ser treinados em justiça, para evitar que a
diligência anterior continuasse a ocultar o que lhes aparecia e que, na reali-
dade, constituía um grave problema de sociedade. Num terceiro tempo, os
fribunais condenaram sisfemaficamenfe a penas simbóhcas e com síírsís, ãr1-
tes de as relaxar também sistematicamente por motivos variados. Num quarto
tempo, o legislador se amparou na matéria e moditicou a lei.
O DIREITO CONTBMPORANEO ENTRE RBGULAMENTAÇÃO...
Analisado sob a forma de sistemas jurídicos, segundo o esquema pÍece-
dente, o processo se torna claro. A explicação se faz emtermos de polissistemia
simultânea, onde o sistema de direito se vê concorrenciado por um sistema
iurídico fundado sobre "concebidos" (urr, imaffi jurídico) e sobre uma
prática coletiva (um uiaido jurídico), e cuja coesão e importância o colocam
em condições de afrontar diretamente o sistema de direito em vigor.
De tudo isso convém tirar alguns ensinamentos:
1") O estudo das normas jurídicas sob a forma de sistemas (no sentido
estrito do sistemismo) constitui uma ferramenta incomparável à medida que
permite uma explicação sobre eventuais afrontamentos entre direito e práti-
cas (aparentemente) degviantes. Permit"
uma avaliação da força de afrontamento entre o sistema de direito e o(s)
sistema(s) jurídico(s) portador(es) dessas práticas.a
2") Esse tipo de abordagem designa o direito aparente como o sistema
constituído pelo conjunto das relações jurídicas que se realizam em confor-
midade com as normas em vigor editadas sob o controle do Estado e com
sua garantia. Mas ele revela igualmente a existência de relações jurídicas
9ü€, embora não provindo do direito no sentido estrito, não podem ser
reduzidas a simples relações de fato.
3") Vários sistemas jurídicos podem coexistir num só tempo e espaço,
regulando o mesmo tipo de relação entre as mesmas pessoas. Só a um desses
sistemas, porém, é chamado "direlto" . Os outros são sistemas (simplesmen-te) jtrrídicos, tirando essa natureza não apenas de sua proximidade com os
fenômenos de direito, mas também do fato de que têm vocação a se tornar
direito em caso de mudança legislativa, jurisprudencial, até mesmo consue-
tudinária. Como nomear, com efeito, fenômenos que, sem provir do direito
em sentido estrito 
- 
do direito oficial 
- 
não são, por outro lado, puramente
sociais?s Há aqui mais uma razã.o para se distinguir claramente o direito do
Estado, oficial, em vigor, direito "imposto" 
- 
como se pode nomeá-lo 
- 
dos
sistenms jurídícos güe, esses sim, ultrapassam freqüentemente o direito, o que
Sobre a quantificação, ver André-Jean Arnaud, Critique de la raison juridique, Paris,
LGDJ, 7981, vol. I 
- 
Oü aa la sociologie du droit?,2" parte.
Isso foi bem demonstrado, por exemplo, em se tratando da regulamentação de aci-
dentes de carro no ]apão (cf. Takao Tanase, op. cit.) ou dos litígios nas comunidades
africanas de Cape Town (cf. Sandra Burman, wilfried Schârf, op. cit.).
10
ANDRE-JBAN ARNAUD
não pode ser negligenciado pelos juristas por mais que desejem manter o
controle no momento de afrontar a realidade. O direito não é mais que uma
imagem da realidade social, enquanto que os sistemas jurídicos são a vida, a
carne mesmo dessa regtrlação que não pode ser qualificada rigorosamente
nem de simplesmente social, nem de simplesmente lúdica, nem de simples-
mente religiosa, 
^.g* de simplesmente 
política, nem de simplesmente econô-
mica. Esses sistemas jurídicos não são, entretanto, diretto, vez que não
ocrlparam legitimamente o lugar do direito em vigor.
4') Um tal tipo de abordagem sistêmica apresenta trma visão heurística
do pluralismo jurídico no quadro do normativismo. Ela está centrada sobre
a questão da criação d a norma jurídica e mais partictrlarmente da criação do
d.ireito 
- 
a mudança sendo considerada como um modo de criação/ mesmo
não sendo r1m modo primitivo, originârro, de produção de direito.6 Como
se encontra oficialmente relegado à fase de criação do direito, o pluralismo
jurídico só pode existir, nllma perspectiva normativista, no pré enunciar-direi-
to,7 essafase em que o enunciador de direito faz aescolha daquilo que será
o direito.s A dogmática jurídica não está errada, nesse sentido, em não ad-
mitir o pluralismo enqtranto polissistemia simultânea no tratamento da prâ-
tica cotidiana dos juristas.
5') O jurista não pode, por natureza, ser somente um homem de ga-
binete, Llm manipulador de códigos e de coletâneas de jurisprudência. Se
ele se pretende antes de mais nada um excelente profissional do direito,
como deve, é fund.amental qtte Aaiba em certos momentos pôr o direito
entre parênteses para observar o pluralismo jurídico em obra no seio da
sociedade.
7
B
Pode-se perguntar se um modo de criação originário não provém da hipótese da
escola, u Àirtó.iu do direito se aparentando à de uma seqüência de mudanças jurídicas'
Cf. André-Jean Arnaud, "Le médium et le savant; signification politique de
l'interprétation juridique" nos Archiaes de Philosophie du Droit, Paris, 1972, pp' 165-181'
Expressão traduzida em outros textos por "Antes-de-dizer-o-direito" [NTi'
Sobre a análise detalhada de "l'nt)ant dire-droit", cf. Critique de la raison juridique, op.
cit., pp. 338-386.
uma análise socioÌógig4or:g"s jurídicos a parliljl{rma ahorclagem
ta/ mas culttrral. P orluÍh rdentende-se hoje
O DIREITO CONTEMPORÃNEO BNTRE REGULAMENTAÇÃO...
2. UM LEGALISMO RENOVADO: A APREENSÃO DO PLURALISMO
PELA ANÁLISE SOüOCULTURAT DOS SISTEMAS IURÍDICOS
Um outro modo de apreensão do pluralismo consiste em desenvolver
Lrma análise sociológica dos si
não apenas técnicas de exposiçãoãíterpreÌãfro empregadas pelos opera-
dores do direito, não apenas o conjunto das opiniões qlre possuem as pes-
soas da lei, não apenas o conjunto dos valores, princípios, ideologias
relativas ao direito, mas também o "conjunto das diferenças nacionais e
locais no psnsamento e na priiÉgjurídicas".e
Esta abordagem do pluralismo veio à luz pelo desenvolvimento das
pesquisas sobre alternativas à regtrlação jurídica estatal e, mais precisamen-
te, sobre a reestruturação das instituições e dos modos formais e oficiais de
regulamentação de conflitos, bem como da emergência de instituições e de
modos informais e não-oficiais de regulamentação de conflitos. É necessário
ainda operar distinções prévias nas alternativas levantadas pelos antropólo-
gos e sociólogos juristas, antes de se tentar uma modelização da estruttrra e
da dinâmica do pluralismo jurídico assim concebido.
2.1-. A Alternativa: Ensaio de Taxonomia
Por muito tempo compreendeu-se por "alternativa" o que a equipe ita-
liana de Pietro Barcellona havia introduzido nos anos 1970 sob a expressão
"tlso alternativo clo direito". Significa que, usando tudo o que o direito em
I'igor poderia oferecer de meios, mesmo inabituais ou inusitados, o jurista 
-
e sobretttdo o magistrado 
- 
estaria em condições de transformar o estado
mesmo da sociedade. Em caso de acidente de trabalho numa empresa, não
era comtlm que um magistrado prendesse preventivamente o patrão: mas
em o fazendo, dava à sociedade uma imagem de uma justiça igual para to-
los. e não mais de uma justiça de classe. O uso alternativo do direito podia
permitir, ao menos assim se pensava na época,10 renovar a imagem mesma
Co direito e da justiça.
Giorgio Rebuffa e Erhard Blankenburg, v. "Culture juridiqtte", no Diccionnnire
:'::ilclo1sedique de Théorie et de Sociologie du droit, op. cit.
E r,ecessário, hoje em dia, numa análise aprofundada, contar com os efeitos perver-
s,-rs dessas conquistas dos anos 1970. A França ficou traumatizada após o caso Bruay
e::r ,\rtois, onde, por motivos evidentes de justiça de ciasse, um notável que havia
S--lrì 
€rìcârcerado foi em seguida declarado inocente.
1l
x-
ANDRE-JEAN ARNAUD
No entanto, às -vezes, as regras do direito em vigor parecem não ofere-
cer todas as possibilidades necessárias para se alcançar tal imagem de
equidade à qtral aspira o jurz. Nesse caso, verificaram-se revoltas pessoais (o
llbq13tgi1$lgT"d" !_!: Franpa, em fins do século XIX, Por exemplo)ll ou
coletivas, como o movimento dito "dos juízes alternativos" no Brasil, nos
anos L990.12 Estava claro, nesse caso, que o debate se situava no plano não
da ciência jurídica, mas da ética e do engajamento político.
Da alternativa, hoje em dia, se diz sobretudo das formas de interven-
ção com as quais, como crêem os pesquisadores,t'os profissionais do d,ireito
estarão cada vez mais confrontados nos próximos anos. Elas existem e se
multiplicam no campo jurídico, Llma vez que sua inserção na sociedade im-
pede mesmo a sua exclusão. Mas é necessário distinguir os vários tipos de
alternativas. Algumas se situam no próprio quadro do direito estatal; outras
escapam dele. Pode-se, enfim, descobrir casos limites de conjuntos normativos
jurídicos paralelos 
- 
até mesmo contrários 
- 
ao direito estatal.
L" 
- 
No qundro do direito do Estado, vê-se multiplicar, em numerosos paí-
ses, vias parajudiciais de regulamentação dos litígios. Trata-se, em geral, de
formas alternativas ou informais de solução dos conflitos que revelam a
aparição e o desenvolvimento de rlma regulação jurídica à margem do direi-
to oficial. O decano Carbonnier já a havia invocado outrora, tratando de
fenômenos de internorntatiuidade, oLtseja, casos onde os sistemas noÍmativos
não-jurídicos entravam em conflito com o direito. Trata-se aqui de fenôme-
nos de internormativid.ade entre sistemas normativos jtrrídicos, mas cuja
juridicidade não está oficialmente estabelecida.
11 Les Juristes face à la société, du XIXe siècle à nos jours, Paris, PUF, 1975, pp. 1.02,103-105.
12 Cf. detalhes em Wanda Capeller e Eliane Junqueira, s. V. " Alternatif (droit), Alternntiae
(justice)", no Diccionnaire encyclopédique de Théorie etde Sociologie du droit,2" ed., Paris,
LGDJ, L993.
13 A literatura sobre o assunto é abundante e não cessa de se renovar. Como um ponto
de partida deve-se consultar o Diccionnaire Ëncyclopédique de Théorie et de Sociologie dtt
Droit, op. cit.. Ainda não se trata aqui de entrar no debate sobre as vantagens e
desvantagens das alternativas que, criadas para desenvolver "menos estado", têm
por conseqüência, freqüentemente,levar a "mais estado". Cf. Stanley Cohen, Visions
of social control, Polity Press, Basic Blackwell, Cambridge/Oxford e New York, 1985,
nota 168.
I2
O DIREITO CONTEMPORANEO ENTRE REGULAMENTAÇÃO...
Contrariamente ao que se passava até esse momento na tomada de de-
cisão em matéria de regulamentação dos litígios, por exemplo, apareceram e
se gener alrzarair. ltntqiatlas soctaly', experiências espontâneas emanando
du ulgtgt to.iuit it t*t s, geralmente agrupadosjm organrzações (con- A4 €
_ 
@%
snmidores, locatários, famílias).1a Em certos casos, o reconhecimento oficial
de vias de regulação não-jurídicas verifica produzir resultados mais eficazes
que:uma regulação pelo direito: o que alguns exprimem comumente dizen-
do que alas inteiras do direito se "socialízam". Essa maneira de se exprimir
chocaria, ainda, não poucos professores de direito; é necesário, entretanto,
tomá-la a sério.
O movimento sistemático de "iniciativas sociais", inaugurado nos anos
1970, nos Estados Unidos, é resultado de urna campanha efetuada à época
sob o impulso do Ministério da |ustiça, com o objetivo de ilrl[lect1ir os proces- "?
sos em direção a modos informais de solução e à mediação.ls IsÀo culminou
nos programas Alternatiae Dispute Resolution (ADR). Na época, na França,
iniciavam-se as 'boutique.s de direito', concebidas como uma ajuda àqueles
QLlê, por sua origem, sua educaçáo, sua situação ou recursos, l4spossuíam . 13
@.NosEstadosUnidos,amiranãoeraameSma.Essas
formas de ADR 
- 
que visavam, notadamente, a regulamentação dos peque-
nos litígios 
- 
foram introduzidas para desbloquear os tribunais e as cortes
atravancados por assuntos pendentes. Se lhes retirou da competência do
juiz ordinário.16 Esse sistema, com atraso, foi introduzido parcialmentelT na
França, apesar de estudos sociojurídicos terem mostrado os perigos e os
limites da experiência americana.
Esse tipo de alternativas, que os juristas em exercício devem hoje em
dia dominar, já tem uma história.O que as caracteríza, sobretudo em maté-
Jean-Pierre Bonafé-Schmitt, Les justices du quotidien: les modes formels et informels de
règlement des petits litiges, Lyon, GLYSI-Université de Lyon II,Igg6,p. 30; ID,,,Lapart
et le rôle joués par les modes informels de règlement des litiges dans le développement
d'un pluralisme judiciaire. Étude comparative France-USA-, em Droit et Société, n" 6,
1987 (Normes, déréglementation, économie), p. 27I.
Christine Harrington, Shadow Justice: The ideotogy and Institr.ttionalization of Alternatiaes
to Court, Westport (CT), Greenwood press, 1985.
Detalhe em EAD., s. v, " Alternatif (droit), Alternatiae (justice), l(', em Dicionnaire,
op. cit.
um bom resumo das novas medidas no Le Monde,21 de maio de 1,994.
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t4
ANDRE-JEAN ARNAUD
ria de procedimento judiciário, é o fato de que olgsgl@e: TligaTÌ
cada vez menos textos e argtunentos jurídicos, mesmo quando' como ainda
é frãqiiente em iáiot áu p"qnenos litígios, eles decidem recorrer a urna lns-
tância oficial. o recurso ao juiz como simples ratificador ou como árbitro se
d,esenvolve igualmente, de forma a que a regulação vinda do direito não
seja mais qrle aparência. Mas, muito frequentemente, para os peqllenos lití-
gios, é o modo informal de regrrlamentaçã-oggg Le-Yg-a!1elhor' Se a presença
dos profissionais de direito permanece importante, isso não significa qlle a
decisão seja tomada por uma instância de ordem judiciária. A presença des-
ta é mesmo cada vez mais redttzida, ao ponto em que o rectlÍso a outros
tipos de regulamentações, aIém daqtrelas que são a consequência de uma
conciliação otr de um procedimento judiciário, se tornam um comportamen-
to largamente majoritário.18
Essas manifestações de uma transformação progressiva das relações
jtrdiciárias parecem ligadas à manutenção de uma sociedade indtrstr rahzada
complexa, que não tem por tradição grande confiança no direito'le ott qtte
tende a perder a confiança nele. As atrtoridades estão bem conscientes deste
fato,já que procuram melhorar as relações sociais mais do que legislar' o
movimento de dejudici arrzaçáoperceptível através dos ADR se funda sobre
rlma nova apreensão do conflito: a consideração d.e sua dimensão social'20
-+.'.'>-.'_
Convém notar qlle essas alternativas não derrogam, na sl1a essência, a
ideologia jurídica tradicional. Notemos qlle a denominação mesma do pro-
cesso de deiudiciarizaç âo: delegnlizntion, em inglês, foi forjado a partir do
radical legal.2l Em otrtros termos, não tendo apffic americana sido mais que
trm destaque contemporâneo dado àpazbttgttesn,zz a destegulação em senti-
d,o amplo também não é mais que tlm arranjo do sistema preexistente' atra-
18 Jean-Pierre Bonafé-Schmitt, Les iustices du
gg 
, 751 , 224, L59 , 184, r90-L91 , 218 , 245 '
quotidien, op. cit., respectivamente Pp'94,
19 Particularmente verificado no que concerne ao Japão. Cf. Takar: Tanase, oP' cit',
pp. 685-687.
20 iean-Pierre Bonafé-Schmitt, Les ittstices dtt rytotidien, op' crt', p' 253'
27 Christine Harrington, oP' crt', p' 171'
ZZ André-Jean Arnaird, "La paix bourgeoise " , em Quaderni fiorentini per In storis del' pensiero
gittridico nroderno,Milano, Giuffrè, 1973, pp.1'47-176. Ver también Ln Regln tlel Juego en
la paz Bttrggesa: ensayo cíe analisis estrttctttictí del codigo ciuil f'nncés, trad' Brigitte Bernard,
Maracaïbo, IFD / LUZ, 197 8'
O DIREITO CONTEMPORÂNEO ENTRE REGULAMENTAÇÃO...
vés de uma modificação momentânea do contorno de suas fronteiras. Isso
não altera em nada sua natureza.
2o 
-Numerosas alternatiaas aos regulamentos dos conflitos vêm àLuzdo dia
fora da esfera do direito estatal, e isso acontece em todas as ctrlturas jurídi-
cas/ mesmo na nossa, onde há uma velha tradição de formalismo e de
legalismo.23 Elas aparecem, geralmente, onde o direito se assev era incapaz
de reeular os assuntos segundo a economia vigente na sociedade considera-
da. Há muito os estudos já mostravam que os titígios eram solucionados por
vias específicas lá onde o direito estatal 
- 
apesaï de existente 
- 
não penetra-
va. No Brasil, a criação de assoc:iqõgs_{e-:mglldores nas favelas do Rio de
l@'oseinscreVent1mesforçodereabi1itaçãodãffi;:EGaSãSSocia-
ções representam um elo entre as administrações pr"'rblicas e a comunidade
local, mantendo a ordem e a seguranÇâ, 
€ assistindo seus membros tanto
quanto possível.2a Diante do não-efetivamento da regulação pelo direito, as
autoridades compreenderam que uma regulação local mais social que jurídi-
ca no sentido estrito permitirratrazer à tona os problemas dessas comunida-
des. A África do Sul d.o apartheid nos oferece a imagem de um país 9ü€,
submetido teoricamente à mesma justiça de Estado, se encontrava no entan-
todivididoentreaiusticaestatalparaosbrancoSeuma'@
dosstreetcottttltittermosdonossoestudo,isso
'
equivale a dtras tentativas sucessivas de redefinição de uma regulação jurí-
dica: primeiro, pelos mais velhos, em seguida, pela nova geração; ambas ten-
tativas fora do direito estatal existente. Isso significa que a necessidade d.e
Llma regulação jurídica não desapareceu com a incapacidade do direito ofi-
cial de regular as relações. A novidade é o arranjo de uma regulação infor-
mal e alternativa, e não o desaparecimento de uma regulação d.as relações
sociojurídicas; é também o arranjo de uma tal regulação à margem do direi-
Cf. para a Europa Ocidental, J. P. Bonafé-Schmitt , Diccionnaire Encyclopédique deThéorieet de Sociologie du Droit, op. cit., v . " Alternatif (droit), Alternatiae ( justice),' , l.
Boaventura de Souza Santos, "The Law of the Opressed: The Construction and
Reprodtrciion of Legality in Pasárgada",itlLaw and Society Reuiew,vol.12,n" I,7977,
pp' 118 e segs. Cf. também Wanda Capeller, Eliane Junqueira , v. " Alternatif (droit),
Alternntiae (justice)" III, no Diccionnaire Encyclopédique de Théorie et de Sociologie du
Droit, op. cit.
Sandra Burman, Wilfried Schárf, v. "Alternatif (droit), Alternatiae (jnstice),,,lV, no
Diccionnnire Encyclopédique de Thêorie et de Sociologie du Droit, op. cit.
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ANDRB-JEAN ARNAUD
to estatal, e como direito; é enfim a tomada de consciência progressiva da
complexid.ade na elaboração e na gestão dessa regulação.
Esses testemunhos são interessantes sobretudo Por serem exemplares,
ou seja, atraem a atenção Para o fato de que existem numerosos modos de
regulamentação dos litígios nas mais diversas sociedades/ que escapam ao
d.ireito do Estado. Assim: ue esses litígios prorrompem sobre interesses
mesmo pouco importantes, o advogado é chamado à representação' Nós
vimos, falando de "glob altzaçáo", lue os atores sociais recorrem cadavez
mais ao conselho de profissionais do direito Para se assegurar sobre a con-
duta a ser encaminhada num mundo onde o estilo generalizado da econo-
mia não se conforma mais ao estilo tradicional do direito. Cabe ao
pesquisador, que se consagra aos estudos sociojurídicos, efetuar sínteses a
partir de estudos de campo realizados no maior número possível de países,
para que se prossiga no desenvolvimento dessas alternativas bem como Se
thes compreenda o sentido.
g" 
- 
A aparição de conjuntos normatiuos alternatiaos que se aplicam às rela-
ções jurídicas é frequente nas baterias de
soluções alternativas dadas a esses conflitos que nascem fora do quadro do
Estado. Com efeito, com a finalidade de renovar um gênero de regulamen-
tação de conflitos, um corpo de re8ïas formais começa a se forjar' Trata-se
geralmente de regras consuetudinárias, às quais se torna conveniente seguir
para beneficiar a regulamentação alternativa de um litígio' Nesse caso não
se trata apenas de alternativa provinda do informal, sendo necessário dis-
tinguir rigorosamente os dois conceitos. Pode-se ter tanto alternativa for-
mal quanto informal no direito - embora mais raramente, mas encontrada
em matéria de costumes comeÍciais ou marítimos, por exemplo, ou mesmo
em matéria de mediação Penal.
Um exemplo de um tal corpo de dire,ito alternativo consiste igualmente
nachamadWe/aolad.oouàmargemdodireitointernaciona1,
se instaura como.r*.or,i.*to de regras jurídicas de relações de mercado no
mundo globalizado.26
26 Existe, hoje em dia, um grande número de trabalhos sobre o tema lex mercatoria'
O DIREITO CONTEMPORÂNEO BNTRE REGULAMENTAÇÃO..
2.2.Estruturação e Dinâmica do Pluralismo com Fundamento Cultural
Se nós nos voltamos aos esquemas apresentados acima no quadro de
análise do pluralismo jurídico num contexto normativista, nós somos, em
virtude do que acaba de ser dito, levados a completar esse esquema para
fazer aí figurar os modos de intervenção não-estatais perceptíveis por uma
observação sociocultural das relações jurídicas.
Etica
Relação legal ordinária
1 Alternativa inÍormal não-estatal
2 Alternativa formal não-estatal
3 Alternativa informal estatal
4 Alternativa Íormal estatal
5 lntervenção formal não-alternativa
do estado
Justiça 
- 
Polícia (Lógica do "Certo/Errado)
6 Guerra 
- 
Violência 
- 
A lei do mais Íorte
PERDE
Entre a relação jurídica ordinária (duas pessoas jurídicas A e B em urna
relação recíproca) e sua eventual substituição pela intervenção da instituição
judiciária, ou mesmo policial (|-P: caso tro 5), existem uma série de soluções
aos conflitos que, não sendo até aqui absolutamente estranhas às práticas
dos profissionais do direito, nem por isso foram menos subestimadas a pon-
to de não se f.azerem objeto de uma apresentação sistemática e estruturada
nas Faculdades de Direito, à disposição dos estudantes. Ora, são essas solu-
ções intermediárias que tendem a se desenvolver e que devem ser coloca-
I
@
I
@
VENCE
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1B
AN D RE -J BAN ARNAU D
das em evidência pelos pesquisadores que se consagram ao estudo sociojtr-
rídico.
Distinguir-se-á com rigor os diversos modos alternativos, formais ou
informais, de soluções de conflitos, que permitem a uma relação jurídica se
completaï convenientemente, pela absorção dos casos de não-cumprimento
das obrigações nascidas da"adoção ou da outorga de direito de um estatuto'
Assim, se a relação jurídica não se completa da maneira mais ordináriã, Po-
dem intervir de forma sucessiva, alternativa oll rectlrsiva antes da solução
clássica (caso no 5), e com o consentimento e a vontade de cada uma d,as
partes engajadas: um modo de solução do conflito alternativo e informal
não provindo do controle do Estado (caso no 1); um modo de solução do
conflito alternativo previsto segundo as formas procedurais e não provindo
clo controle do Estado (caso n" 2); um modo de solução do conflito alterna-
tivo e informal previsto no quadro de direito do Estado (caso no 3); e um
modo de solução do conflito alternativo previsto segundo as formas
procedurais provindas do controle do Estado (caso n" 1)."
Aliás, o famoso "retorno à ética" a que observam sociólogos e psicólo-
gos contemporâneos encontra setr lugar nesse esquema. Com efeito, o que
surpreende é que, quanto mais se ascende na escala de soltrções, mais as
partes presentes têm a ganhar; ao contrârro, quanto mais as partes decidem
recorrer a Lrma solução mais baixa na escala, mais arriscam perder. Ora, a
solução trsual para nós, gente de direito, é tradicionalmente a solução no 5,
ou seja, o úrltimo recurso, a mais próxima ao uso puro e simples da força. A
força à qtral recorrem as partes é a força pública, a da instituição judiciária e
eventualmente policial. Nesse caso há trm vencedor - o qual perde sempre
alguma coisa no processo * e rlm perdedor que, às vezes, não perde comple-
tamente tudo. De qualquer forma, as partes saem do processo raramente
satisfeitas, até mesmo descontentes, frequentemente raivosas, geralmente
decepcionadas com "a" ]ustiça, com setls artífices e atrxiliares. Com as soltr-
27 Todas essas questões devem ser relacionadas igualmente ao estudo da "mobllização"
do direito, ou "pesquisa sobre os processos de seleção, a probabilidade, as alternati-
vas, as motivações, os objetivos e a diferenciação social da utilização das instâncias de
direito" lGtinter Hôrmann e Donald Black, v. "Mobilisation (du droit)" , emDiccionnaire
encyclopédiryte de Théorie et de Sociologie fut droit, op. cit.l.
o DIRETTO CONTEMPORANEO BNTRE REGULAMENTAÇÃO.. .
ções alternativas, as partes teriam podido esperar um desenlace próximo a
satisfazer sua vontade de ação, quando tenha sido encontrada uma saída
para suas controvérsias. Nós encontramos aqui a idéia de "projeto" já am-
plamente defendida.2s
Os profissionais do direito deverão, no futuro, chegar a forjar as men-
talidades de maneira a substituir a lógica "vencefperde" pela busca de um
proieto de ação païa além do qonflito, e na esperança de que cada uma das
partes saia dele o menos mal possível, uma e outra com um sentimento "_g-
ced.or" por não ter trtilizado uma solução mais radical para a resolução dã:
litígio que as optrnha. Em outros termo",tt u\?r4y!_lr"td!:l .r|glyd!1leva
rlma vantagem progressiva sobre a tradicional ordem jurídica imposta, tal
como conhecem as nossas sociedades. Mas é de Llma verdadeira mtr"dança
das mentalidades qrle se trata. Como persuadir os responsáveis pelo ensino
do Direito a passar de um lqeltsqq_lim&4g a rlm l@o, ten-
do em conta o pluralismo jttrídico cada vez rnais evidente até nas nossas
velhas sociedades ocidentais? Aqui está averdadeira questão.
Cf. "Droit et Societé: du constat à la construction d'un champ commlln", em Droit et
S:;!été, 20 / 27, 7992, pp. 17 -38.
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