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17.1 17.1.1 17 PROPAGANDA POLíTICO-ELEITORAL PROPAGANDA POLÍTICA Caracterização da propaganda política No léxico, propaganda significa difundir, espalhar, propalar, alastrar, multiplicar por meio de reprodução, tornar comum a muitas pessoas. Tecnicamente, traduz procedimentos de comunicação em massa, pelos quais se difundem ideias, informações e crenças com vistas a obter-se a adesão dos destinatários. Busca sempre incutir certos pensamentos nas pessoas, influenciar suas opiniões ou impressões, de modo a despertar-lhes a simpatia ou a rejeição de determinadas ideias, tornando-as propensas ou inclinadas a dado sistema ideológico, político, religioso, econômico ou social. A comunicação externada objetiva criar nos destinatários imagens positivas – ou negativas – acerca do objeto enfocado. A propaganda foi conhecida na Antiguidade. Na Grécia e em Roma, era usada largamente em festas populares e ações estatais com vistas à comunicação social. Reiteradas vezes, a Igreja dela lançou mão para difundir a doutrina e a fé cristãs, e, ainda, condicionar o comportamento dos fiéis. No plano sociopolítico, foi instrumento decisivo da burguesia liberal na peleja contra a monarquia absolutista. O forte poder persuasivo de que é portadora ficou bem evidenciado na história do século XX. Com efeito, contribuiu de forma relevante para a ascensão em toda parte de regimes totalitários, tanto de direita, quanto de esquerda. As desumanidades e os horrores da Segunda Guerra Mundial são de todos conhecidos. Mais recentemente, a propaganda foi recurso essencial nas mãos dos poderosos Estados Unidos, Reino Unido e aliados contra o fraco Iraque. Inaugurando a chamada guerra preventiva, os dirigentes daqueles países souberam forjar um sentimento coletivo favorável ao confronto bélico. O cenário foi todo preparado e montado em cima de fatos que depois se revelaram mendazes. Mas isso não foi feito sem o apoio de parcela expressiva da mídia, sem o suporte de forte aparato propagandístico. Afinal, as decisões dos governantes careciam de respaldo popular. Nas mãos de ditadores, a propaganda transforma-se em perigoso instrumento de manipulação coletiva, sendo, ainda, fundamental para a manutenção do poder. Por isso, a ninguém é dado ignorá-la, muito menos o Estado Democrático de Direito, comprometido que se encontra com os direitos fundamentais da pessoa humana. Apesar de não ser obra da modernidade, foi a partir dos progressos científicos nela conquistados que a propaganda experimentou grande avanço, sobretudo com o desenvolvimento da Psicologia, ciência que investiga a consciência humana e seus reflexos no comportamento. Embora no dia a dia sejam usados como sinônimos, os vocábulos propaganda e publicidade não apresentam idêntico sentido. Enquanto a finalidade da publicidade é sempre econômico-comercial – presentes as ideias de lucro, mercado e consumo –, a propaganda tem em foco a comunicação ideológica. Ambos têm em vista persuadir e chamar a atenção do público, mas a publicidade visa sugerir-lhe ou infundir-lhe desejo acerca de produtos, serviços e marcas colocados no mercado consumidor. Os produtos e serviços são apresentados de forma atraente, de sorte que o consumidor os queira para si e termine por adquiri-los. Note-se, porém, que se classicamente a publicidade era voltada à realização de operações lucrativas, contemporaneamente tem buscado outras alternativas. O mundo dos negócios conscientizou-se de que tão importante quanto vender produtos e serviços é também estabelecer com a clientela relações individualizadas, duradouras, construir marcas fortes e consolidar o reconhecimento no meio em que se opera. Importa frisar que, em si mesma, a publicidade não apresenta compromisso com a verdade, isto é, sua mensagem não tem necessariamente correspondência com a realidade, com o mundo objetivo. Não se dirige à razão, mas à emoção, aos sentimentos. Deveras, há forte apelo à fantasia, ao imaginário. Basta perceber que o ato de consumir determinada bebida, fumar certa marca de cigarro ou usar roupas de determinada grife não torna o indivíduo mais atrativo, nem mais bonito e charmoso, muito menos rico ou poderoso, tampouco inteligente. Na verdade, a função básica da indústria publicitária é promover quimeras, mormente a ilusão de que certo produto proporcionará prazer e felicidade a quem o adquirir. Por igual razão, a propaganda não se confunde com o marketing, termo de significado ainda mais amplo que publicidade, mas também referido ao mercado consumidor e ao lucro. Não obstante, nada impede que a racionalidade, os métodos e as técnicas de publicidade e marketing sejam empregados na propaganda política. Isso, aliás, tornou-se comum nos dias de hoje. Sabe-se que o voto, em geral, não resulta de escolhas estritamente racionais, sendo certo que outros aspectos psicológicos e sobretudo a emoção têm peso decisivo na escolha. O fato de o discurso político da modernidade ter caráter fantasioso e descolado da realidade confirma essa assertiva. Há muito não se assiste a debates político-eleitorais sérios, que tenham em foco autênticos projetos e programas de governo, que discutam com honestidade os problemas nacionais. A discussão pública de grandes questões ligadas a setores como economia, meio ambiente, previdência social, saúde pública, segurança pública foi substituída por discursos fantasiosos. Em geral, esses discursos são cuidadosamente moldados para agradar o povo, conquistar-lhe o voto, devendo ser graciosos e bem articulados, com ares de superior intelectualidade, porém, não necessariamente verdadeiros ou bem intencionados. Tal é igualmente confirmado pela variedade de instrumentos de comunicação de massa explorados nas eleições, com destaque para o rádio e a televisão, além de outras mídias relevantes, como painéis, faixas, mala direta, panfletos, bonecos apostos em vias públicas e cartazes volantes. O foco, sempre, é bem embalar o político, de maneira a alavancar sua imagem pública. Busca-se ampliar sua credibilidade, conferir-lhe ares de transparência, seriedade, retidão de caráter e honestidade, de sorte que as relações estabelecidas com o “público-alvo” – o eleitor – sejam fortes e duradouras, o que termina por refletir no resultado das urnas. Consequentemente, o neologismo marketing político vem lentamente penetrando na linguagem. Diz-se, nesse caso, que o “produto” oferecido é a própria 17.1.2 imagem do homem público. Não há dúvida de que a apresentação do político como produto de consumo transforma o eleitor em consumidor! Na pós-modernidade, votar já não significa optar por uma corrente de pensamento simbolizada pelo candidato, mas mero ato de escolha, semelhante ao que se faz no mercado. Em regra, a opção se dá pela aparência, não pelo real ou verdadeiro. Para que algo seja aceito como verdadeiro, basta que pareça ou como tal seja apresentado. Como resultado, tem-se a degradação do espaço político, a submissão da esfera pública à lógica perversa do capitalismo e do consumo. A propaganda política caracteriza-se por veicular concepções ideológicas com vistas à obtenção ou manutenção do poder estatal. Sublinha Djalma Pinto (2005, p. 214) que ela é voltada para a polis, aí compreendido tudo o que se refere à cidade, ao Estado, ao modo de governá-lo. Tem em vista a conquista do poder, a prevalência de uma posição em plebiscito, referendo ou eleições para preenchimento de cargos eletivos,em que há a manutenção ou substituição de integrantes do governo. Também tem por objetivo informar o povo das atividades e realizações da Administração estatal. Impende registrar que a Constituição assegura as liberdades de expressão e informação, cometendo à lei o estabelecimento de meios adequados que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão destoantes de seus valores básicos, mormente os expressos no artigo 221. Destaca-se, nesse dispositivo, a necessidade de a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderem às finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, bem como respeitarem os valores éticos e sociais da pessoa e da família. Desnecessário ressaltar que a propaganda política deve atender a tais diretrizes. Novas tecnologias comunicacionais A profunda influência que as novas tecnologias têm operado pode ser avaliada a partir da transformação da linguagem em virtude da popularização dos computadores, telefones celulares e Internet. Nas comunicações pela Internet muitas palavras foram reduzidas a abreviações, a acentuação, substituída por letras. Também se nota o largo emprego de neologismos, a exemplo de: deletar (= apagar), e-mail (= correio eletrônico), escanear (= fazer cópia digital), site (= sítio eletrônico), printar (= imprimir). No campo político-eleitoral, as mudanças também já se fazem sentir. Deter informações relevantes e controlar instrumentos e meios de comunicação sempre significou gozar de importante influência no processo político-decisório. Ao promover a descentralização de tais instrumentos, as novas tecnologias de comunicação subverteram a lógica da velha ordem. Por isso, um debate recorrente na atualidade diz respeito às relações entre a política e o papel social dessas novas tecnologias. Se os tradicionais meios de comunicação como a imprensa e os telejornais são centralizados e unidirecionais, caracteriza-se a Internet por ser um ambiente democrático, interativo, descentralizado. Nela, a comunicação é difusa, ocorrendo instantaneamente entre milhares de pessoas. O novo ambiente propicia uma efetiva interação dos receptores, que deixam de ser passivos diante da informação. Além disso, novas personagens ganham vez e voz, introduzindo no debate pensamentos e realidades antes relegados ao desprezo, pois era restrito o acesso aos instrumentos comunicacionais. É comum nos “jornais digitais” a realização de enquetes, bem como a existência de espaço para que o leitor comente a notícia, externando sua opinião; também poderá reenviá-la a outros usuários da rede; ademais, o fenômeno dos blogs tem transformado internautas em escritores. Conquanto nos lares brasileiros existam muito mais aparelhos de rádio e televisão do que computadores, a verdade é que na nova geração predomina a tendência de buscar informações na Internet, dada sua agilidade e interatividade. Segundo dados do IBOPE, no final de 2008 havia cerca de 50 milhões de pessoas com acesso à Internet no Brasil; em 2009, o país liderava o uso de blogs e redes sociais. Não se pode olvidar que os formadores de opinião acessam a rede e dela se valem para construir discursos e articular as forças políticas nas comunidades. Por certo, não será a só existência de computadores, Internet, “blogosfera”, Twitter e smartphones que influenciará a órbita política de modo relevante e às vezes decisivo. Mas é verdade que esses tesouros da revolução tecnológica ensejam a formação de redes infinitas de interação humana. Isso permite a difusão rápida de informações, a organização de ideias e ações, bem como a redefinição de estratégias. A dinâmica da rede permite que uma informação seja analisada em tempo real em vários ângulos, por inúmeras pessoas, sendo desnudados equívocos, distorções ou inverdades que possa conter. Esse poder de organização e mobilização rápidas ficou claro na derrota sofrida pelo Partido Popular (PP) do ex-Primeiro-Ministro da Espanha, José Maria Aznar, nas eleições de 14 de março de 2004. Segundo amplamente noticiado, após o trágico atentado ocorrido em Madri três dias antes, que resultou na morte de cerca de 200 pessoas e em 1.500 feridos, o governo Aznar empenhou-se junto à grande mídia (imprensa, televisão, rádio) para veicular uma versão que lhe beneficiava eleitoralmente. Contra todas as evidências, sustentou que as explosões nos trens foram provocadas pelo ETA (Pátria Basca e Liberdade), grupo revolucionário nascido de um movimento socialista que desde os anos 1960 luta pela libertação da nação basca do jugo espanhol. No entanto, enquanto nada apontava para a participação do ETA (que, aliás, a negou), havia fortes indícios de que o ataque partiu de terroristas islâmicos como represália à presença de tropas espanholas no Iraque, tropas essas enviadas pelo próprio José Maria Aznar contra a vontade da grande maioria dos espanhóis. A manipulação informativa foi descoberta, tendo sido amplamente divulgada na Internet. Uma vez evidenciada a ação do governo no sentido de converter o massacre em dividendos político-eleitorais, a população, indignada, organizou-se pacífica e espontaneamente. Convocações foram feitas por mensagens de textos enviadas por telefones celulares. Em apenas um dia, um gigantesco protesto foi levado a cabo no centro de Madri, sendo esse ato repetido em todo o país. Impossível negar a influência marcante de tais eventos no pleito de 14 de março. O partido do governo, que antes liderava as pesquisas de opinião, saiu derrotado pelos socialistas (PSOE). Note-se que a “versão oficial” divulgada na grande mídia foi simplesmente deixada de lado. Graças às novas tecnologias, milhares de pessoas puderam rápida e eficazmente estabelecer uma complexa rede de comunicação, organizar-se e fazer prevalecer suas vontades no pleito. Na eleição presidencial brasileira de 2006, alguns analistas – como Luís Nassif (2007, p. 149-158) – “assinalaram o empenho de certos veículos de comunicação de massa contra o candidato da situação, Luiz Inácio Lula da Silva, que, todavia, logrou a vitória. Um dos fatores apontados como relevantes para a redução da influência dos veículos tradicionais na formação da opinião política dos brasileiros foi a presença crescente das novas mídias”. Em geral, a notícia chega primeiro na rede, submetendo-se a um debate impossível de acontecer nos outros veículos. Ainda no Brasil, vale destacar as manifestações de junho que, em 2013, sacudiram todo o país, levando milhões de pessoas às ruas para protestar contra o governo, os agentes estatais e a classe política. A crise teve início com o aumento de passagens de ônibus em várias capitais e grandes cidades, sendo que os altos preços praticados contrastavam com a péssima qualidade dos serviços; várias outras reivindicações foram colocadas na ordem do dia, tais como o combate à corrupção, o fim da impunidade, a diminuição da carga tributária, a melhoria de serviços públicos como saúde e educação. As manifestações se davam mediante passeatas, ocupação de espaços públicos ou cercamento de prédios públicos (em geral sedes dos governos). Não há dúvida de que estão entre as maiores expressões de cidadania da história brasileira. E para que tivessem êxito, o uso de novas tecnologias foi essencial, já que a organização e a convocação dos participantes eram feitas pelas redes sociais. A Internet e as novas mídias também desempenharam papel decisivo na histórica eleição de Barack Obamapara a presidência dos EUA, ocorrida em 4 de novembro de 2008. Em 2003, nas primárias, o pré-candidato Howard Dean já tinha usado, com sucesso, a rede para disputar uma vaga pelo Partido Democrata na eleição presidencial de 2004; mas a escolha do Partido recaiu em John Kerry, que, por sua vez, perdeu as eleições para o Republicano George Bush. Barack Obama foi o primeiro candidato eleito a usar intensamente a Internet e as redes sociais. Destacou-se sua sagacidade ao usar a Internet para se comunicar com os norte-americanos (notadamente com a população jovem e minorias formadas por afrodescendentes e latinos), engendrar um movimento nacional, mobilizar eleitores para comparecer às urnas no dia da eleição (nos EUA o voto não é obrigatório) e mantê-los coesos em torno de sua candidatura, difundir sua mensagem e arrecadar recursos para a campanha. Um bom exemplo disso foi dado por Kollman (2014, p. 472) ao relatar que na campanha de 2008, antes de anunciar publicamente o vice-presidente, a campanha de Barack Obama enviou uma mensagem que dizia simplesmente “VP”; os destinatários foram levados a crer que estariam entre os primeiros a saber a identidade do colega de chapa de Obama; os que respondessem à mensagem receberiam um adesivo da campanha. Essa maneira criativa de usar novas tecnologias ensejou que a campanha de Obama interagisse com seus apoiadores, além de mobilizar jovens que normalmente não comparecem maciçamente às eleições. No tocante ao financiamento, a mudança foi radical. Foram arrecadados pela Internet mais de 500 milhões de dólares, prevalecendo doações inferiores a 200 dólares. A tecnologia possibilitou a pulverização dos patrocinadores da campanha presidencial de Barack Obama, o que enfraqueceu a ação de grandes corporações privadas, sempre ávidas para influir nas decisões estatais pela via do financiamento eleitoral. Chegou-se a dizer que “o dinheiro pequeno venceu o dinheiro graúdo”. 17.1.3 Nesse contexto, preocupa o fato de o controle das grandes redes comunicacionais estar nas mãos de poucos grupos empresariais. Não há dúvida de que as instâncias do poder político-econômico podem se valer desse poderio em seu próprio benefício, para, e. g., influenciar os eleitores em benefício ou prejuízo de determinado candidato. Daí a necessidade de se estabelecer rígido controle nesse setor. Isso, porém, não significa que a Internet e as novas tecnologias devam ser alijadas do debate político-eleitoral. Tal medida mesmo seria inexequível, pois as novas tecnologias já fazem parte da vida contemporânea. Aliás, dão relevante contribuição ao processo democrático, pois facilitam o diálogo e a discussão política. Nessa perspectiva, vale destacar a contribuição das novas tecnologias para o estabelecimento de um novo modo de comportamento no meio político-social, notadamente nas campanhas. Afinal, tudo e todos estão em permanente exposição pública. Se alguém é filmado ou gravado dizendo ou realizando algo inconveniente, indigno, falso, moralmente incorreto ou mesmo ilícito, logo em seguida (ou em momento oportuno) isso provavelmente virá à tona, sendo debatido nas redes sociais, exibido no YouTube e assistido por milhares de pessoas em todo o mundo. Pode-se, pois, dizer que a presença da Internet no jogo político-eleitoral impõe que as pessoas redobrem o cuidado com suas palavras e ações, por conseguinte, elas se tornam menos espontâneas e mais apegadas a roteiros pré-elaborados. Fundamentos da propaganda política A Lei Magna assegura aos partidos políticos acesso gratuito ao rádio e à televisão (CF, art. 17, § 3o). É o que se denomina direito de antena. Ademais, as liberdades de informação e de expressão constituem valores da maior relevância, sendo ambos acolhidos no texto constitucional. Conforme anotei alhures (GOMES, 2006, p. 208 ss), enquanto a primeira diz respeito ao direito individual de comunicar livremente fatos e ao direito difuso de ser deles informado, a liberdade de expressão tutela o direito de externar ideias, opiniões, juízos de valor e manifestações de pensamento em geral. Ambas servem de fundamento para o exercício de outras liberdades, além de serem sustentáculos do regime democrático. Nesse quadro, é natural que todo cidadão possua o direito de ser informado acerca da vida política do país, dos governantes, dos negócios públicos, bem como de manifestar sua opinião. Ressalte-se que nas sociedades contemporâneas há clara demarcação entre o público e o privado. Na esfera pública, avultam o bem comum, a ordem pública, os interesses da coletividade em seu conjunto. Por isso mesmo, aí reinam a transparência e a amplitude de informação. Diferentemente, na esfera privada prevalecem interesses e negócios particulares. Aqui se distinguem duas categorias de bens jurídicos, a saber: patrimoniais e não patrimoniais ou de personalidade. Limites são estabelecidos à liberdade de ação individual, buscando-se impedir a ocorrência de prejuízos às pessoas. Entre os bens da personalidade, nomeadamente na seara do right to privacy, destaca-se a intimidade. Trata-se da dimensão em que a atuação do indivíduo cinge-se à satisfação de interesses e necessidades puramente existenciais, realização de valores e modos de vida. É aí que todos podem se recolher com paz e tranquilidade, sem ter de medir os gestos e as palavras. A inviolabilidade da intimidade é assegurada no artigo 5o, X, da Constituição Federal. Na sociedade política, há forte interação entre as esferas pública e privada. Daí que, sob o prisma patrimonial, importa saber quais interesses econômico-financeiros o político representa, quem o financia, a quais grupos se encontra ligado. É ingenuidade acreditar que o homem público só age em atenção ao bem comum e ao interesse público. Desnudar tais relações constitui passo decisivo para o exercício consciencioso do direito de sufrágio. Já sob a óptica não patrimonial, discute-se se personalidades públicas – como é o caso de políticos – teriam resguardados seus direitos à privacidade, ao segredo e à intimidade. Tem-se acentuado a necessidade de se salvaguardar ao menos o círculo íntimo da vida individual, já que a dignidade da pessoa humana constitui cláusula geral prevista no artigo 1o, III, da Constituição Federal, que ancora todos os direitos parcelares da personalidade. Obtempera-se que, mesmo que se trate de político, personalidade pública por excelência, por maiores que sejam as controvérsias que o cerquem, não se poderia ir ao ponto de revelar a todos determinadas relações de cunho íntimo, como, e. g., o adultério, a existência de filho com concubina ou seu comportamento privado. Todavia – apenas no que concerne ao exercício de cargo público-eletivo –, é induvidoso que interessaria aos eleitores bem intencionados conhecer algumas peculiaridades acerca da intimidade do destinatário de seus votos, de sorte que a cidadania seja exercida com grau maior de consciência e responsabilidade. Ocioso dizer que isso é vital para a democracia. Há fatos ocorridos na esfera íntima de um candidato que eventualmente podem esclarecer o eleitorado, pois deixam entrever sua cosmovisão e a direção que provavelmente imprimirá ao mandato caso seja eleito. Certamente, as intenções de um discurso bem urdido serão mais bem avaliadas se se puder compará-lo com as posições assumidas pelo orador quando confrontado com temas controvertidos como aborto, direito de minorias, religião, bioética eequilíbrio. Imagine-se, por outro lado, alto agente político que seja toxicômano, alcoólatra, desonesto em suas relações privadas, que surre seu cônjuge com frequência, que seja réu em ação criminal ou de improbidade administrativa. Em tais hipóteses, não há dúvida de que o direito à intimidade deve ceder o passo ao interesse público ligado ao regime democrático de direito, já que certas posições e eventuais vícios desqualificam o cidadão para o exercício de mandato público-eletivo, retirando-lhe o decoro, a decência e a legitimidade. Afrontaria a consciência política mandatário que, por trás de aparente imagem de eficiência e honestidade – criada e sustentada pela mídia –, levasse vida excessiva e desregrada, oposta à boa figura propalada. Não se trata de violentar a personalidade do político, pregar a intolerância, o ódio, ou disseminar preconceitos, mas apenas de se permitir que o eleitorado seja bem informado sobre fatos relevantes para o desempenho de mandato público, de sorte a exercer conscientemente seu direito de voto, a bem escolher seu candidato. Isso contribui para a autenticidade da representação política. Nesse quadro, embora certas situações caiam na esfera íntima da pessoa, é óbvio que, tratando-se 17.1.4 de político, depositário da confiança e das esperanças dos eleitores, o direito à intimidade fica bastante enfraquecido. Na verdade, o direito forte, bem protegido, que, aí, deve prevalecer, é o direito à informação, de maneira que os cidadãos exerçam o sufrágio com plena consciência. Acresce que o direito à informação é passo significativo para a eliminação de práticas perniciosas como o curral eleitoral, o voto de cabresto, os coronéis antigos e novos, bem como o câncer que é a compra de votos, práticas ainda comuns no Brasil contemporâneo, mesmo em Casas Legislativas, como acabamos de ver. Princípios da propaganda política Nem tudo é permitido na propaganda política. Ao contrário, ela se submete à observância de alguns princípios, a uma rígida disciplina legal e ao controle da Justiça Eleitoral, o qual é exercido quer no âmbito do poder de polícia, quer no jurisdicional. Entre os princípios, destacam-se os seguintes: Legalidade – a propaganda política é regulada por lei, sendo esta de ordem pública, insuscetível de derrogação pelos interessados. A competência legislativa é privativa da União (CF, art. 23, I). Ao Tribunal Superior Eleitoral é dado regulamentar o tema, sem, porém, invadir a competência do legislador. Liberdade – desde que se respeitem os limites legais, há liberdade quanto à criação da mensagem a ser veiculada na propaganda. Ademais, é livre a realização de qualquer ato de propaganda, em recinto aberto ou fechado, não sendo necessária a obtenção de licença municipal nem autorização de autoridade policial (LE, art. 39; CE, art. 245). Liberdade de expressão ou comunicação – a livre circulação de ideias é essencial à democracia. Sem ela, não floresce a criatividade, estorva-se o diálogo, ficam tolhidas as manifestações de inconformismo e insatisfação. Não se pode olvidar o papel histórico dessa liberdade na própria formação do Estado Democrático, na reivindicação de direitos fundamentais individuais e sociais, na expressão e afirmação de doutrinas políticas, ideologias e religiões. Bem por isso, prescreve o artigo 5o, IV, da Lei Maior ser “livre a manifestação do pensamento”. Já o artigo 220 assegura que: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.” O § 2o desse dispositivo veda “toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”. Note-se, todavia, que a liberdade em apreço não apresenta caráter absoluto. Em certas situações, admite-se sua limitação. Mas isso só é concebível em casos de evidente e reconhecida gravidade, de modo que não se imponha à sociedade mal maior que o bem perseguido. Deve haver sempre a ponderação dos interesses e valores em jogo. A lei censura, e. g., a comunicação de guerra, que incite a prática de atentados contra pessoas e bens, que calunie pessoas (CE, art. 243). 17.1.5 17.2 Liberdade de informação – os cidadãos têm direito a receber todas as informações – positivas ou negativas – acerca do candidato, de sorte que possam formular juízo seguro a respeito de sua pessoa, das ideias e do programa que representa. Conforme aludido, o direito à privacidade, ao segredo e à intimidade sofre acentuada redução nesse terreno. Veracidade – os fatos e informações veiculados devem corresponder à verdade. Reflexo desse princípio é a proibição de utilização de imagens ou cenas incorretas ou incompletas, efeitos ou quaisquer outros recursos que distorçam ou falseiem os fatos ou sua comunicação, bem como degradem ou ridicularizem candidato, partido ou coligação (LOPP, art. 45, § 1o, III; LE, art. 45, II). Demais, o artigo 323 do Código Eleitoral tipifica como criminosa a conduta de “divulgar, na propaganda, fatos que sabe inverídicos, em relação a partidos ou candidatos e capazes de exercerem influência perante o eleitorado”. Igualdade ou isonomia – todos os interessados, inclusive partidos e coligações, devem ter iguais oportunidades para veiculação de seus programas, pensamentos e propostas. A igualdade, aí, é meramente formal, não material, já que os maiores partidos contam com maioria no Parlamento e, consequentemente, detêm maior espaço na propaganda partidário-eleitoral. Ademais, não há uniformização de gasto nas campanhas eleitorais, o que permite que algumas sejam milionárias e outras franciscanas. Responsabilidade – a responsabilidade pela propaganda deve sempre ser atribuída a alguém. Em princípio, é carreada ao candidato, partido e coligação, que respondem civil, administrativa e criminalmente pelo seu teor e pelos excessos ocorridos. Eventualmente, o veículo e o agente da comunicação também podem ser responsabilizados. A esse respeito, o artigo 241 do Código Eleitoral estabelece o princípio da solidariedade, pelo que: “Toda propaganda eleitoral será realizada sob a responsabilidade dos partidos e por eles paga, imputando-lhes solidariedade nos excessos praticados pelos seus candidatos e adeptos.” Controle judicial – a propaganda submete-se ao controle da Justiça Eleitoral, à qual é atribuído poder de polícia para controlá-la e coibir abusos. Daí a possibilidade de o juiz eleitoral agir ex officio, determinando, por exemplo, que cesse ou que seja retirada propaganda que infrinja as regras pertinentes. Espécies de propaganda política Distinguem-se quatro tipos de propaganda política: partidária, intrapartidária, eleitoral e institucional. Em seguida, far-se-á breve análise a respeito dessas modalidades. PROPAGANDA PARTIDÁRIA A propaganda partidária é regulamentada nos artigos 45 a 49 da Lei Orgânica dos Partidos Políticos (LOPP), bem como pela Resolução TSE no 20.034/97 (com as alterações da Res. no 22.503/2006). O Código Eleitoral não a prevê, embora contemple a propaganda eleitoral. O título II da parte quinta (art. 240 ss) desse diploma usa erroneamente a expressão propaganda partidária. Mas o que regula, na verdade, é a propaganda eleitoral, isto é, aquela feita por candidatos a cargos eletivos já durante o período eleitoral, e cujo objetivo é o convencimento do eleitor com vistas a obter-lhe o voto. Consiste a propaganda partidáriana divulgação de ideias, projetos e programa do partido. Tem por finalidade facultar-lhe a exposição e o debate público de sua ideologia, de sua história, de sua cosmovisão, de suas metas, dos valores agasalhados, do caminho para que seu programa seja realizado, enfim, de sua doutrina e, pois, de suas propostas para o desenvolvimento da sociedade. Com isso, a agremiação aproxima-se do povo, ficando sua imagem conhecida e, pois, fortalecida. Pode haver confronto de opiniões, teses, propostas de soluções para problemas nacionais, regionais ou locais, mas sempre à luz do ideário partidário. Desnecessário dizer que a propaganda presta auxílio fundamental para a conquista e manutenção do poder político, já que atrai para a agremiação as pessoas que se identificam com seu ideário. A Lei Maior, consoante acentuado, assegura aos partidos políticos direito de antena, o qual é traduzido no “acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei” (CF, art. 17, § 3o). O artigo 45, § 6o, da Lei no 9.096/95 veda a realização de propaganda paga ou fora dos limites legalmente traçados. Tanto a Constituição quanto a Lei no 9.096/95 apenas aludem à propaganda no rádio e na televisão. Diante disso, discute-se se poderia ser veiculada propaganda partidária em outras mídias, como a imprensa escrita ou eletrônica, Internet, outdoors. Relevando o respeito devido à liberdade de expressão e seu assento constitucional, a jurisprudência já afirmou ser permitida a propaganda partidária pela imprensa, “desde que se o faça dentro dos princípios da ética, e em obediência aos preceitos legais que compõem o nosso ordenamento jurídico” (TRE-SC – Res. no 7.133 de 8-9-1999). A seu turno, ao responder à Consulta no 1.132/DF (Res. no 21.983/2005), a Corte Superior Eleitoral reconheceu inexistir norma específica que discipline a propaganda partidária em tais veículos, concluindo pela licitude de sua realização, desde que sejam “observadas as vedações previstas para a propaganda nas leis que disciplinam o Direito Eleitoral”. Infere-se, pois, que a realização de propaganda partidária fora do rádio e da televisão submete-se à mesma disciplina da propaganda eleitoral, sendo, ainda, expressamente vedado que se pague por ela. Assim, e. g., é proibida a propaganda partidária mediante outdoor (LE, art. 39, § 8o); se feita pela imprensa escrita, deve submeter-se às restrições do artigo 43 da Lei no 9.504/97; em qualquer caso, frise-se, não poderá ser paga. Por outro lado, conforme se extrai do artigo 57-B, II, da LE, nada impede que a agremiação política mantenha página na rede mundial de computadores, sendo vedada a hospedagem em sítios de provedores internacionais; entre outras coisas, tal página poderá conter links, remetendo o internauta a outros sítios de interesse da entidade, bem como blog em que sejam discutidos assuntos de seu interesse. Além disso, ante o disposto no inciso III do aludido artigo, é dado ao partido enviar “mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente”, sendo vedada a aquisição onerosa de cadastro de endereços eletrônicos. A regulamentação da propaganda partidária deve ter o sentido de assegurar a isonomia entre as agremiações. Se investido em publicidade, o arsenal econômico detido por algumas entidades pode ensejar o desequilíbrio de futura disputa eleitoral. Os relevantes reflexos nas eleições podem ser visualizados com clareza nas eleições proporcionais, nomeadamente no voto de legenda, conforme preveem os artigos 146, IX, c, e 175, § 4o, ambos do Código Eleitoral, e o artigo 59, § 2o, da Lei no 9.504/97. Nesse tipo de eleição, o voto dado à legenda compõe o cálculo do quociente partidário (CE, art. 107), sendo, pois, essencial para a determinação do número de cadeiras a serem preenchidas pela entidade partidária. A propaganda partidária no rádio e televisão pode ser gravada em estúdio ou em ambiente aberto, ou seja, ao ar livre. É veiculada em horário nobre, pois deve ir ao ar entre as 19 horas e 30 minutos e as 22 horas. Além disso, é gratuita. Mas a gratuidade é relativa. Nos termos do artigo 52, parágrafo único da LOPP, o veículo emissor é sempre ressarcido pelos cofres públicos por meio do mecanismo de compensação tributária. São objetivos da propaganda partidária: (a) difundir os programas partidários; (b) transmitir mensagens aos filiados sobre a execução dos programas, dos eventos com estes relacionados e das atividades congressuais do partido; (c) divulgar a posição do partido em relação a temas político- comunitários; (d) promover e difundir a participação política feminina (LOPP, art. 45). A produção do programa e a geração de mídia para sua veiculação são de responsabilidade dos partidos. As transmissões são realizadas em âmbito nacional e estadual. Duas são as formas previstas: cadeia e inserção. Caracteriza-se a cadeia por suspender as transmissões das emissoras, de sorte que a mensagem partidária vai ao ar simultaneamente em todos os canais. Sendo nacional, não pode haver “quebra” na transmissão em cadeia (TSE – Res. nos 23.010 e 23.011 – DJe 10-3-2009, p. 35), de modo que a mensagem seja veiculada em apenas um ou alguns Estados da Federação. Já a inserção consiste na intercalação feita na programação normal, não havendo simultaneidade na transmissão nos diversos veículos. Assim, as emissoras a levarão ao ar em momentos distintos, conforme lhes convier, mas sempre dentro dos limites temporais estabelecidos em lei. Tanto a cadeia quanto as inserções nacionais devem ser requeridas ao Tribunal Superior Eleitoral pelo órgão de direção nacional da agremiação interessada. O requerimento deve ser protocolizado até o dia 1o de dezembro do ano anterior às transmissões. A não observância dessa data-limite acarreta a perda do direito de veiculação da propaganda partidária no ano respectivo. A cadeia forma-se às quintas-feiras, mas, sendo necessário, poderá ser autorizada em outro dia. A seu turno, as inserções devem ser veiculadas às terças-feiras e quintas-feiras e aos sábados. No requerimento, devem constar as datas de veiculação, para o primeiro e segundo semestres. Havendo coincidência de data, terá prioridade o partido que tiver apresentado o requerimento em primeiro lugar. Ademais, é necessário que conste do requerimento a indicação das emissoras geradoras e a prova do direito à transmissão. Essa prova é feita mediante certidão expedida pela Mesa da Câmara dos Deputados, comprobatória da bancada eleita naquela Casa. No âmbito estadual, a Resolução TSE no 22.503/2006 suprimiu a formação de cadeia, prevendo tão só inserções. O requerimento – subscrito pelo órgão de direção esta dual do partido – deve ser endereçado ao Tribunal Regional Eleitoral. As inserções estaduais devem ir ao ar às segundas, quartas e sextas-feiras. Para viabilizar a transmissão, as mídias contendo os programas em cadeia ou em inserções devem ser entregues pelos partidos às emissoras com a antecedência mínima de 12 horas do início da transmissão; as inserções de rádio podem ser enviadas por meio de correspondência eletrônica (LOPP, art. 46, § 5o, com a redação da Lei no 12.891/2013). O artigo 7o da Resolução TSE no 20.034/97 previa prazo mais ampliado, de 24 horas, que, agora, fica prejudicado. O lapso legal enfocado decorre da necessidade de se viabilizar a reorganização da grade da emissora caso o material não lhe seja disponibilizado ou haja cancelamentoda transmissão. O § 8o do artigo 46 da lei partidária (acrescido pela Lei no 12.891/2013) veda “a veiculação de inserções idênticas no mesmo intervalo de programação, exceto se o número de inserções de que dispuser o partido exceder os intervalos disponíveis, sendo vedada a transmissão em sequência para o mesmo partido político”. O tempo da propaganda partidária varia em função da representação parlamentar do partido. Quanto maior o número de votos obtidos na eleição para a Câmara de Deputados, maior será o tempo disponibilizado. A esse respeito, dispõe o art. 49 da Lei no 9.096/95 (com a redação da Lei no 13.165/2015): “Art. 49 Os partidos com pelo menos um representante em qualquer das Casas do Congresso Nacional têm assegurados os seguintes direitos relacionados à propaganda partidária: I – a realização de um programa a cada semestre, em cadeia nacional, com duração de: a) cinco minutos cada, para os partidos que tenham eleito até quatro Deputados Federais; b) dez minutos cada, para os partidos que tenham eleito cinco ou mais Deputados Federais; II – a utilização, por semestre, para inserções de trinta segundos ou um minuto, nas redes nacionais, e de igual tempo nas emissoras estaduais, do tempo total de: a) dez minutos, para os partidos que tenham eleito até nove Deputados Federais; b) vinte minutos, para os partidos que tenham eleito dez ou mais Deputados Federais. Parágrafo único. A critério do órgão partidário nacional, as inserções em redes nacionais referidas no inciso II do caput deste artigo poderão veicular conteúdo regionalizado, comunicando-se previamente o Tribunal Superior Eleitoral.” Não se admite a utilização comercial da propaganda em apreço, assim considerada a que vise à promoção de marca ou produto. Ademais, deve-se respeitar o direito de autor. Deveras, ao titular de direito autoral é dado representar à Justiça Eleitoral a fim de coibir prática violadora de seu direito. Mas eventuais indenizações devem ser buscadas perante a Justiça Comum. Também é proibida na propaganda partidária: (a) a participação de pessoa filiada a partido que não o responsável pelo programa; (b) a divulgação de propaganda de candidatos a cargos eletivos e a defesa de interesses pessoais ou de outros partidos; (c) a utilização de imagens ou cenas incorretas ou incompletas, efeitos ou quaisquer outros recursos que distorçam ou falseiem os fatos ou a sua comunicação (LOPP, art. 45, § 1o). No tocante à proibição aludida na letra a, tem-se que a utilização do horário de propaganda por candidato de agremiação diversa constitui uso indevido dos meios de comunicação social postos à disposição do partido. Nessa linha, assentou a Corte Superior Eleitoral: “O uso do tempo de propaganda partidária para beneficiar político filiado a outra agremiação, com ostensiva intenção de concorrer a cargo eletivo no pleito a realizar-se no período eleitoral subsequente, traduz falta gravíssima sujeita a sanção correspondente ao máximo previsto em lei: a cassação de todo o direito de transmissão a que o infrator faria jus no semestre subsequente” (TSE – Ac. no 766 – DJ 9-6-2006, p. 133). Quanto à letra b, a lei é clara ao vedar a divulgação, no horário partidário, de propaganda de candidatos a cargos eletivos e a defesa de interesses pessoais ou de outras agremiações. Proibida, pois, de forma cristalina e precisa, a promoção pessoal que ostente coloração eleitoral. Tais ocorrências desnaturam os princípios inspiradores da propaganda partidária. A promoção dos interesses de outras agremiações políticas também ofende a igualdade, pois os beneficiados estariam obtendo, por via transversa, tempo maior do que teriam realmente direito. De mais a mais, se, por um lado, não é vedada a presença de filiados, ainda que notórios, potenciais candidatos ou pré-candidatos no programa partidário, por outro, a presença deles não pode reportar suas candidaturas, antecipando o debate eleitoral; tampouco o conjunto da comunicação pode ser direcionado a esse enfoque. Isso significaria claro desbordamento dos limites traçados pelo sistema jurídico, pois a propaganda em nada se relacionaria com a divulgação do programa partidário, tampouco com a atuação histórica e conquistas do partido. Tal ocorre, por exemplo, quando há adjetivação das qualidades de potencial candidato, quando se enfatizam suas realizações, seus feitos como administrador, sua atuação política atual ou pretérita, a história de sua vida, suas pretensões, enfim, quando ostensivamente se apresenta alguém como a pessoa ideal – a mais competente, a mais honesta, a mais habilidosa – para ocupar determinado cargo eletivo. O desvirtuamento da propaganda partidária pode ocorrer ainda que o beneficiário seja detentor de mandato eletivo. Nesse sentido, tem o TSE asseverado: (i) “[…] 3. O parlamentar que participa de programa partidário enaltecendo sua própria pessoa a fim de promover sua candidatura, é parte legítima para figurar no polo passivo da representação […]” (Ac. no 26.183 – DJ 1o-2-2007, p. 228); (ii) “[…] A utilização parcial do espaço destinado à propaganda partidária para mera promoção pessoal de filiado, titular de mandato eletivo, com alusão nítida a futura candidatura, no pleito subsequente, induz à aplicação da penalidade prevista no § 2o do art. 45 da Lei dos Partidos Políticos, por infração ao inciso II do § 1o do mesmo dispositivo, proporcional à natureza e à extensão da falta […]” (Rp no 662/BA – DJ 4-32005, p. 115); (iii) “[…] A utilização de programa partidário para exaltação de feitos de pré- candidatos, em exclusiva promoção pessoal, com nítido caráter eleitoral, configura violação ao disposto no inciso II do § 1o do art. 45 da Lei no 9.096/95, ensejando a cassação do direito de transmissão, no semestre seguinte à decisão, de tempo proporcional à gravidade da falta” (Rp no 695/ SP – DJ 4-2-2005, p. 186); (iv) “[…] A comparação entre o desempenho de filiados a partidos políticos antagônicos, ocupantes de cargos na administração pública, durante a veiculação de programa partidário, é admissível, desde que não exceda ao limite da discussão de temas de interesse político-comunitário e que não possua a finalidade de ressaltar as qualidades do responsável pela propaganda e de denegrir a imagem do opositor, configurando, nesta hipótese, propaganda eleitoral subliminar e fora do período autorizado em lei. Caracterizada a utilização de parte da propaganda para ostensiva propaganda de conotação eleitoral, impõe-se a aplicação da pena de multa pela ofensa ao art. 36 da Lei das Eleições, no caso concreto, em seu grau mínimo” (Rp no 1.277/PE – DJ 22-5-2007, p. 178). Em verdade, a promoção de potencial candidato no horário destinado à propaganda partidária constitui falta grave. Além da perda de tempo no semestre seguinte (LOPP, art. 45, § 2o), a cristalina dicção do § 3o do artigo 36 da Lei das Eleições autoriza a aplicação de multa ao partido responsável pela transmissão. A dupla punição à agremiação decorre da violação de regras diversas, cada qual visando à proteção de diferentes bens jurídicos. A jurisprudência tem perfilhado esse entendimento: “Existindo mais de um responsável pela propaganda irregular, a pena de multa deverá ser aplicada a cada um, respeitando-se os valores mínimo e máximo estipulados em lei” (TSE – Ag. no 4.900/PA – DJ 18-2- 2005, p. 121). Por fim, a regra inscrita na alínea c veda a adulteração ou a descaracterização da realidade pelo uso de trucagem (efeito realizado em áudio ou vídeo),montagem (junção de registro de áudio ou vídeo) ou simplesmente apresentação de cenas incorretas ou incompletas. A violação dos citados preceitos, com o desvirtuamento da propaganda, enseja a punição da agremiação política: (i) nas transmissões em bloco, com a cassação do direito de transmissão no semestre seguinte; (ii) nas transmissões em inserções, com a cassação de tempo equivalente a cinco vezes ao da inserção ilícita, no semestre seguinte (LOPP, art. 45, § 2o, I e II). Não se afigura razoável essa solução. De lege ferenda, a fixação do tempo de transmissão a ser perdido como punição pelo ilícito praticado deve considerar a quantidade de tempo usada irregularmente na comunicação. Na transmissão em bloco, e. g., não é justa a perda total se o desvirtuamento tiver afetado diminuta parcela da comunicação, salvo se a falta for considerada grave, como nas hipóteses de propaganda eleitoral extemporânea e promoção de pessoa filiada a partido diverso daquele responsável pelo programa. Para que a perda da transmissão se concretize, é necessário que se instaure demanda judicial contra o partido infrator. Prescreve o § 3o do artigo 45 da LOPP que a representação somente pode ser oferecida por partido político. No entanto, soa inconstitucional essa restrição da legitimidade ativa. Considerando não se tratar de matéria interna corporis, e estando presente o interesse público, é defensável a legitimidade ativa do Ministério Público, sobretudo em razão de seu papel constitucional de defensor do regime democrático e dos interesses sociais. Não bastasse isso, tem-se que a publicidade partidária é custeada pelo erário, e certamente interessa à sociedade fiscalizar o correto emprego dos pesados impostos que paga. Por outro lado, dificilmente um partido irá demandar a perda do tempo de transmissão de outro, mormente se for beneficiado com a irregularidade. Vale registrar que a legitimidade ativa do Parquet é acolhida na jurisprudência, a ver: TSE – AgRg-REspe no 6065-33/SP – PSS 18-9-2012. A competência jurisdicional para conhecer e julgar a demanda liga-se ao órgão detentor de atribuição para autorizar a transmissão. Assim, a competência será do TSE, quando se tratar de programa em bloco ou inserções nacionais, e do TRE, quando se tratar de inserção estadual. Quanto ao prazo para o ajuizamento, prescreve o § 4o do artigo 45 da LOPP que ele se encerra “no último dia do semestre em que for veiculado o programa impugnado”. Se a transmissão tiver ocorrido nos últimos 30 dias do semestre, o ajuizamento poderá ser ultimado “até o 15o (décimo quinto) dia do semestre seguinte”. Ultrapassado tais lapsos, opera-se a decadência do direito de ingressar com a ação. O rito a ser observado é, no que couber, o previsto nos incisos I a XIII do art. 22 da LC no 64/90 (TSE Res. no 22.696/2008). Na hipótese de competência do TRE, do acórdão Regional que julgar o pedido procedente, caberá recurso com efeito suspensivo para o TSE. Vale registrar que a execução da cassação do direito de transmissão deve ocorrer no semestre seguinte ao trânsito em julgado da decisão condenatória. “[…] O desvio de finalidade na propaganda partidária expõe o partido infrator à penalidade de cassação do direito de transmissão no semestre seguinte, por decisão do Tribunal competente, em representação ajuizada pelos entes a que a norma confere legitimidade, conforme disciplina a Lei no 9.096/95, art. 45, § 2o, sendo as agremiações partidárias responsáveis pelo conteúdo da propaganda exibida, nos termos do art. 11 da mencionada resolução (Res. – TSE 20.034/97, art. 11)” (TSE – ARp no 888/DF, de 21-3-2006 – DJ 5-5- 2006, p. 152). No segundo semestre do ano da eleição, é proibida a veiculação de propaganda partidária no rádio e na televisão, ainda que paga (Lei no 9.504/97, art. 36, §§ 2o e 3o). Por conseguinte, nesse ano, se o partido tiver cassado o direito de transmissão no segundo semestre, tal decisão só poderá ser 17.3 executada no primeiro semestre do ano subsequente. É que a propaganda política realizada no semestre da eleição tem natureza diversa: não é partidária, mas, sim, eleitoral. Evidente que o partido não poderia ter cassado seu direito à realização de propaganda eleitoral se a irregularidade foi cometida no espaço dedicado à propaganda partidária. Não se pode baralhar esses dois tipos de propaganda política. De qualquer sorte, é preciso reconhecer que a cassação do direito de transmissão do partido no semestre seguinte às eleições é sanção que apresenta diminuto efeito prático. Melhor seria que a agremiação perdesse o direito no mesmo semestre em que ocorreu a irregularidade. PROPAGANDA INTRAPARTIDÁRIA Antes do dia 15 de agosto do ano da eleição, faculta-se aos postulantes a candidatura ou “candidatos a candidato” a realização de propaganda intrapartidária. A permissão consta do artigo 36, § 1o, da Lei Eleitoral, consoante o qual “ao postulante a candidatura a cargo eletivo é permitida a realização, na quinzena anterior à escolha pelo partido, de propaganda intrapartidária com vista à indicação de seu nome, vedado o uso de rádio, televisão e outdoor”. Como a própria expressão sugere, essa propaganda não se dirige aos eleitores em geral, senão aos filiados à agremiação que participarão da convenção de escolha dos candidatos que disputarão os cargos eletivos. Daí a vedação do uso de meios de comunicação de massa, como rádio, televisão e outdoor. Vale lembrar que a escolha dos candidatos pelos partidos deverá ser feita no período de 20 de julho a 5 de agosto do ano em que se realizarem as eleições (LE, art. 8o, caput, com a redação da Lei no 13.165/2015). A propaganda em foco somente pode ser realizada nos 15 dias que antecedem a data prevista para a convenção. Seu desvirtuamento – com a realização de propaganda eleitoral endereçada aos eleitores e não aos convencionais – rende ensejo à sanção prevista no artigo 36, § 3o, da Lei das Eleições, pois pode caracterizar-se como propaganda eleitoral extemporânea. Nesse sentido: “1. Os limites da propaganda intrapartidária foram ultrapassados, pois foi realizada propaganda eleitoral antecipada por meio de outdoor, fixado em caminhão, estacionado em via pública, em frente ao local designado para a convenção partidária, de forma ostensiva e com potencial para atingir os eleitores. […]” (TSE – AgR-AI no 3815/RJ – DJe, t. 36, 20-2-2014, p. 47). Conforme já assinalado, antes das convenções, é dado à agremiação optar pela realização de prévias partidário-eleitorais, com vistas a antecipar a definição de seu candidato. A realização de prévias (inclusive sua propagação com a distribuição de material informativo, divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos) não se qualifica como propaganda eleitoral antecipada, pois destina-se à consulta e definição dentro do partido (LE, art. 36-A, III). Mas há mister que não se extrapole o âmbito partidário. Note-se que o § 1o do artigo 36-A da LE proíbe “a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias”, sendo, porém, permitida “a cobertura dos meios de comunicação social.” 17.4 17.4.1 17.4.2 PROPAGANDA ELEITORAL Definição Denomina-se propaganda eleitoral a elaborada por partidos políticos e candidatos com a finalidade de captar votos do eleitorado para investidura em cargo público-eletivo. Caracteriza-sepor levar ao conhecimento público, ainda que de maneira disfarçada ou dissimulada, candidatura ou os motivos que induzam à conclusão de que o beneficiário é o mais apto para o cargo em disputa. Nessa linha, constitui propaganda eleitoral aquela adrede preparada para influir na vontade do eleitor, em que a mensagem é orientada à atração e conquista de votos. O Código Eleitoral regula a matéria nos artigos 240 a 256. Já a Lei das Eleições dedica ao tema os artigos 36 a 57, cuidando o artigo 58 do direito de resposta. A propaganda eleitoral distingue-se da partidária, pois, enquanto esta se destina a divulgar o programa e o ideário do partido político, a eleitoral enfoca os projetos dos candidatos com vistas a atingir um objetivo prático e bem definido: o convencimento dos eleitores e a obtenção de vitória no certame. Não se confunde, ademais, com a propaganda intrapartidária, a qual é endereçada aos convencionais do partido e somente pode ser realizada nos 15 dias anteriores à data marcada para a convenção. Classificação Sob vários aspectos se pode classificar a propaganda eleitoral: forma de realização, sentido, momento em que é levada a efeito. Quanto à forma de realização – a esse respeito, pode a propaganda ser expressa ou subliminar. Expressa é aquela que pode ser percebida e compreendida racionalmente, na dimensão consciente da mente; por isso, o teor de sua mensagem é claro, induvidoso. Subliminar é palavra derivada da expressão latina sub limen, significando o que está abaixo ou no limiar da consciência. Há estímulos tão fracos que não chegam a ser percebidos pela denominada “mente consciente”, mas que são assimilados na dimensão inconsciente. Sem que tenha plena ciência, a mente humana é capaz de interpretar palavras ou fragmentos de palavras, desvendar símbolos, expressões corporais e mímicas, bem como captar sons aparentemente inaudíveis. Os estímulos ou as mensagens subliminares dirigem-se à dimensão inconsciente da mente e visam atingir certos efeitos, como induzir o destinatário a realizar determinada ação ou adotar determinado ponto de vista, instilar- lhe opiniões (positivas ou negativas). No campo científico, há controvérsia acerca da relevância dos “efeitos” que se podem alcançar com estímulos subliminares. Conforme informa Uhlhaas (2014), para alguns psicólogos, não seria possível “ler” palavras e símbolos no patamar inferior à consciência. Assinala, ainda que, embora já se tenha demonstrado que estímulos não captados conscientemente possam provocar reações no cérebro, não é aceitável falar em manipulação profunda de nossos julgamentos e decisões. Isso, sobretudo, quando o estímulo considerado não atingir a consciência do destinatário, porque nesse caso a suposta influência seria fugaz, com pouco tempo de duração. Propaganda subliminar, nesse contexto, são estímulos de conteúdo político-eleitoral inseridos em um discurso (ou em uma comunicação) que, porém, não são percebidos conscientemente pelos destinatários. No Direito Eleitoral, ela é associada à comunicação político-eleitoral disfarçada, ambígua, que se encontra subjacente ao discurso que a envolve. Quanto ao sentido – pode a propaganda ser positiva ou negativa. Naquela, exalta-se o beneficiário, sendo louvadas suas qualidades, ressaltados seus feitos, sua história, enfim, sua imagem. Como assinalam Clift e Spieler (2012, p. 73), na propaganda positiva (positive political ads) o candidato alardeia suas realizações e personalidade, fazendo todo o possível para se apresentar sob uma luz positiva, de maneira a passar uma imagem com a qual os votantes possam facilmente se identificar. Nela podem ser veiculadas informações sobre desempenhos anteriores do candidato no exercício de funções públicas (ex.: “quando senador, o candidato João votou projetos que melhoravam escolas e combatiam a criminalidade”), sobre sua biografia (ex.: “o candidato João bem serviu ao seu país, criou muitos empregos como empresário, combateu a corrupção enquanto governador”). Já a propaganda negativa tem por fulcro o menoscabo ou a desqualificação dos candidatos oponentes, sugerindo que não detém os adornos morais ou a aptidão necessária à investidura em cargo eletivo. Os fatos que a embasam podem ser total ou parcialmente verdadeiros, e até mesmo falsos. Clift e Spieler (2012, p. 73) bem a resumem: “Esses anúncios publicitários, não surpreendentemente, são destinados a tornar o adversário aparecer incompetente, corrupto, distante [out-of-touch], desagradável, e, geralmente, em favor de todos os tipos de coisas terríveis [dreadful things]. Tais anúncios podem exibir uma foto comprometedora ou mesmo adulterada de um político oponente, ou usar imagens granuladas em preto-e-branco [grainy black-and-white footage] para fazer suas ações parecerem ameaçadoras. Tais anúncios podem ser moderados (‘O senador Thomas votou cinquenta e sete vezes para aumentar os seus impostos…’) ou fortes (‘O senador Thomas votou para colocar assassinos, estupradores e molestadores de crianças em liberdade …’).” Como tática, a propaganda negativa pode provocar sérios danos à imagem de suas vítimas. Sobretudo quando fundada em fatos mendazes, se for inteligente e de fácil compreensão, pode ser devastadora para a campanha adversária. Quanto ao momento de realização – pode a propaganda ser tempestiva ou extemporânea. Será tempestiva ou azada se ocorrer dentro do período legalmente demarcado; tal lapso inicia-se no dia 16 de agosto do ano da eleição, encerrando-se no dia do pleito (CE, art. 240, caput; LE, art. 36, caput; Lei no 12.034/2009, art. 7o). Qualificar-se-á, porém, de extemporânea, irregular, se levada a cabo fora desse período, sujeitando os agentes responsáveis pela sua criação e divulgação, bem como o beneficiário, 17.4.3 quando demonstrado seu prévio conhecimento, à sanção pecuniária prevista no artigo 36, § 3o, da LE. Generalidades Ao apreciar a regularidade do evento propagandístico, não deve o intérprete cingir-se tão só à literalidade da mensagem estampada no texto veiculado. Cumpre ir além, reparando mormente no contexto em que ela se desenvolve. Do conjunto da comunicação despontam relevantes elementos informativos, a exemplo da ambientação das cenas, da sequência das imagens, da entonação do discurso. Pela regra da adstrição, na propaganda eleitoral de candidatos a cargo majoritário deverão constar, também, o nome dos candidatos a vice ou a suplentes de Senador. Nesse sentido, estabelece o § 4o do artigo 36 da LE (com a redação da Lei no 13.165/2015) que o nome do vice e suplentes deve ser expresso “de modo claro e legível, em tamanho não inferior a 30% (trinta por cento) do nome do titular”. Alguns tipos de propaganda são expressamente vedados pelo ordenamento. Nos termos do artigo 243 do Código, não será tolerada propaganda: “I – de guerra, de processos violentos para subverter o regime, a ordem política e so cial ou de preconceitos de raça ou de classes; II – que provoque animosidade entre as forças armadas ou contra elas, ou delas contra as classes e instituições civis; III – de incitamento de atentado contra pessoa ou bens; IV – de instigação à desobediência coletiva ao cumprimento da lei de ordem pública; V – que implique em oferecimento, promessa ou solicitação de dinheiro, dádiva, rifa, sorteio ou vantagem de qualquer natureza; VI – que perturbe o sossego público, com algazarra ou abusos de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;VII – por meio de impressos ou de objeto que pessoa inexperiente ou rústica possa confundir com moeda; VIII – que prejudique a higiene e a estética urbana [o artigo 41 da LE revogou a parte final desse inciso, que dizia: ‘ou contravenha a posturas municipais ou a outra qualquer restrição de direito’]; IX – que caluniar, difamar ou injuriar quaisquer pessoas, bem como órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública”. Ademais, o artigo 40 da Lei no 9.504/97 considera ilícito e tipifica como crime “o uso, na propaganda eleitoral, de símbolos, frases ou imagens, associadas ou semelhantes às empregadas por órgãos de governo, empresa pública ou sociedade de economia mista”. Observe-se que os “símbolos, frases ou imagens” de entes da Administração direta e indireta a que esse dispositivo se refere não se confundem com os símbolos nacionais, de Estado Federado ou Município, como bandeiras e hinos. Apesar de não se tolerar propaganda que desrespeite ou avilte símbolos nacionais, não existe vedação legal para a exibição ou utilização deles na propaganda eleitoral. Conquanto seja ilícito o uso na propaganda de “símbolos, frases ou imagens” de entes da Administração direta e indireta, não há irregularidade em o candidato apresentar “as realizações de seu governo”, pois isso é inerente à natureza do debate envolvido na disputa eleitoral e desenvolvido na propaganda (TSE – RCED no 698/TO – DJe 12-8-2009, p. 28-30). É natural que o candidato exponha suas realizações e sua experiência anterior, ensejando ao eleitor informações para sopesar sua escolha. Estabelece o parágrafo único do artigo 3o da LOPP (acrescido pela Lei no 12.891/2013) que os candidatos, partidos políticos e coligações gozam de “autonomia para definir o cronograma das atividades eleitorais de campanha e executá-lo em qualquer dia e horário, observados os limites estabelecidos em lei”. Desde que exercida em harmonia com a legislação eleitoral, não pode a propaganda sofrer censura (LE, art. 41, § 2o), nem ser coibida por autoridade pública, tampouco por particular. Tanto é assim que o Código Eleitoral prevê como crime a conduta de “inutilizar, alterar ou perturbar meio de propaganda devidamente empregado” (art. 331). Também tipificou o “impedir o exercício de propaganda” (art. 332). Na mesma linha é o artigo 41 da LE, que reza: “A propaganda exercida nos termos da legislação eleitoral não poderá ser objeto de multa nem cerceada sob alegação do exercício do poder de polícia ou de violação de postura municipal, casos em que se deve proceder na forma prevista no art. 40.” A redação desse dispositivo foi alterada pela Lei no 12.034/2009. Em sua parte final, modifica a regra inscrita no artigo 243, VIII, do Código Eleitoral. Esse inciso VIII proscreve a propaganda que “contravenha a posturas municipais ou a outra qualquer restrição de direito”. à consideração de que a competência para legislar sobre assuntos de interesse local foi atribuída ao Município (CF, art. 30, I), entendia-se que a norma local só devia prevalecer quando contivesse restrições a qualquer tipo de publicidade, independentemente de sua natureza, pois seria inconstitucional se limitasse a realização de propaganda eleitoral, pois o artigo 22, I, da Lei Maior fixa a competência privativa da União para legislar sobre matéria eleitoral. Tomando posição sobre esse assunto, o transcrito artigo 41 da LE é cristalino ao estabelecer que a propaganda exercida nos termos da legislação eleitoral não pode ser cerceada sob alegação de violação de postura municipal. Assim, na hipótese de conflito entre normas federal eleitoral e local, prevalece aquela. O desvirtuamento da propaganda por partidos e candidatos beneficiários caracteriza ilícito que pode e deve ser rechaçado pela Justiça Eleitoral seja ex officio – no âmbito do exercício do poder de polícia (LE, art. 41, §§ 1o e 2o) –, seja mediante provocação de interessado ou do Ministério Público – já no campo jurisdicional. A atuação da Justiça tem o sentido de restabelecer a igualdade de oportunidades que deve sempre nortear essa matéria. Também tem o propósito de preservar a veracidade e a seriedade das mensagens veiculadas. Nesse diapasão, adverte Djalma Pinto (2005, p. 215) que a “liberdade de expressão deve ser preservada para que o eleitor não seja enganado sobre o real perfil do candidato pelo qual optou nas urnas”. Em diversos dispositivos, a Lei das Eleições impõe sanção à conduta que violar as regras atinentes à propaganda. O sistema sancionatório contempla várias espécies. Vejam-se, por exemplo, os artigos 36, 17.4.4 § 3o (multa), 37, § 1o (restauração do bem e multa), 39, § 8o (retirada do outdoor e multa), 43, § 2o (multa), 53, § 1o (perda do direito à veiculação de propaganda), 53, § 2o (impedimento de reapresentação de propaganda), 55, parágrafo único (perda de tempo no horário eleitoral gratuito), 56, caput (suspensão da programação normal da emissora). Algumas vezes, a sanção limita-se à cessação da conduta (art. 39, § 3o), à adequação ou retirada da propaganda irregular (como ocorre na afixação de adesivo ou papel com dimensões excedentes à legalmente fixada – LE, art. 37, § 2o). A restauração do bem, adequação e retirada de propaganda irregular podem ser determinadas administrativamente pelo juiz eleitoral, já que são providências atinentes ao poder de polícia. Significa dizer que não é preciso que se ajuíze ação, com todas as formalidades envolvidas nesse ato, para que tais sanções sejam aplicadas. Sendo ferido direito líquido e certo em razão de ilegalidade ou abuso de poder decorrentes de atos praticados por autoridade eleitoral, pode-se cogitar a impetração de mandado de segurança. No que concerne à multa e outras punições, como a suspensão de programação de emissora de televisão ou rádio, só podem ser impostas pela jurisdição, após regular processo judicial, assegurado o devido processo legal, em que sejam oportunizados à parte o contraditório e a ampla defesa. Sobre isso, dispõe a Súmula no 18 do TSE: “Conquanto investido de poder de polícia, não tem legitimidade o juiz eleitoral para, de ofício, instaurar procedimento com a finalidade de impor multa pela veiculação de propaganda eleitoral em desacordo com a Lei no 9.504/97.” Nesse sentido, o artigo 96 da Lei Eleitoral instituiu via procedimental expedita para que as infrações a seus preceitos sejam conhecidas e julgadas com a celeridade imposta pelas circunstâncias. Não obstante essa via tenha sido denominada representação, na verdade, cuida-se de verdadeira ação, com todas as condições a ela inerentes. A depender da natureza e do volume, irregularidades na propaganda eleitoral podem configurar abuso de poder econômico ou político, rendendo ensejo à decretação de inelegibilidade, bem como à cassação do registro de candidatura ou do diploma do candidato eleito, conforme consta dos artigos 19 e 22, XIV, ambos da Lei Complementar no 64/90. Propaganda eleitoral extemporânea ou antecipada Conforme salientado, a propaganda eleitoral só é permitida a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição até o dia do pleito, durante, pois, o período eleitoral (LE, art. 36, caput). Nessa oportunidade, o candidato já terá sido escolhido na convenção e seu pedido de registro já deverá ter sido requerido à Justiça Eleitoral, pois o prazo para a prática desse ato encerra-se às 19 horas do dia 15 de agosto. Se feita fora desse período, qualifica-se comoextemporânea ou antecipada. A publicidade em apreço caracteriza-se pela atração ou captação antecipada de votos, o que pode ferir a igualdade de oportunidade entre os candidatos e desequilibrar as campanhas. Tal como ocorre com a propaganda eleitoral em geral, pode a propaganda antecipada ser expressa ou subliminar. É árdua a identificação da propaganda antecipada subliminar, pois seu conteúdo é sempre veiculado de maneira implícita ou subjacente, no mais das vezes resultando do contexto da comunicação. Já se intentou estabelecer critérios objetivos mínimos para a sua identificação, tendo sido apontados os seguintes: (i) alusão a processo eleitoral, externada pela menção a nome do pretenso candidato ou candidatura; (ii) exaltação de suas qualidades, procurando inculcar a ideia de que é o melhor para o cargo almejado; (iii) pedido de voto, ainda que implícito; (iv) ações políticas que pretende implementar. “[…]. Elementos caracterizadores da propaganda antecipada: (I) referência à pretensa candidatura, (II) pedido, expresso ou implícito, de votos, (III) ações políticas que se pretende desenvolver ou (IV) ideia de que o beneficiário é o mais apto para o desempenho da função pública eletiva. Desprovimento. […]. 5. A configuração da propaganda eleitoral extemporânea exige que seja levado ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, referência à pretensa candidatura, pedido de voto, ações políticas que se pretende desenvolver ou a ideia de que o beneficiário é o mais apto para o desempenho da função pública eletiva. 6. Agravo regimental desprovido. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, desproveu o agravo regimental, nos termos do voto do Relator.” (TSE – AgR-AI no 152.491/PR – DJe t. 72, 16-4-2015, p. 83-84). “[…] 7. A configuração de propaganda eleitoral antecipada não depende exclusivamente da conjugação simultânea do trinômio candidato, pedido de voto e cargo pretendido. Nesse sentido, o pedido de voto não é requisito essencial para a configuração do ilícito, desde que haja alusão à circunstância associada à eleição (AgRg no Ag no 5.120, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 23-9-2005). 8. Para a identificação deste trabalho antecipado de captação de votos, é comum que o julgador se depare com atos que, embora tenham a aparência da licitude, possam configurar ilícitos como a propaganda antecipada que podem acabar por ferir a igualdade de oportunidade dos candidatos no pleito (RCED no 673/RN, Rel. Min. Caputo Bastos, DJ de 30-10-2007). Na presente hipótese, a aplicação da teoria da fraude à lei significaria que, embora determinado discurso ou participação em inaugurações possam ser considerados lícitos, se analisados superficialmente, o exame destes em seu contexto pode revelar que o bem jurídico tutelado pelas normas regentes da matéria foi, efetivamente, maculado […]” (TSE – ARp no 205-74/DF – DJe 11-5-2010, p. 31-32). Não fixa a lei um marco temporal a partir do qual (= dies a quo) a comunicação política possa ser caracterizada como “propaganda antecipada”. Diante disso, tem-se entendido que o evento pode ocorrer em qualquer tempo, mesmo no ano anterior ao do pleito. Conforme ressalta Zílio (2010, p. 286), receia-se que “a delimitação de um rígido critério temporal importe, na via transversa, em um estímulo à inesgotável prática de propaganda eleitoral extemporânea, tornando, assim, a véspera do pleito eleitoral em um período excessivamente conturbado e litigioso”. Já entendeu a Corte Superior ser irrelevante “a distância temporal entre o ato impugnado e a data das eleições ou das convenções partidárias de escolha dos candidatos”. Por isso, considerou propaganda extemporânea – em relação à eleição presidencial de 2010 – comunicação feita há mais de um ano antes (em 29 de maio de 2009), por ocasião de cerimônia de inauguração de obra. A ver: “1. Considerados os dois principais vetores a nortearem a proibição do cometimento do ilícito, quais sejam, o funcionamento eficiente e impessoal da máquina administrativa e a igualdade entre os competidores no processo eleitoral, a configuração de propaganda eleitoral antecipada independe da distância temporal entre o ato impugnado e a data das eleições ou das convenções partidárias de escolha dos candidatos. 2. Nos termos da jurisprudência da Corte, deve ser entendida como propaganda eleitoral antecipada qualquer manifestação que, previamente aos três meses anteriores ao pleito e fora das exceções previstas no artigo 36-A da Lei no 9.504/97, leve ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que somente postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou as razões que levem a inferir que o beneficiário seja o mais apto para a função pública […]” (TSE – RRp no 1.406/DF – DJe 10-5-2010, p. 28). Em outra oportunidade, o mesmo sodalício censurou propaganda realizada no mês de janeiro do ano do pleito. Confira-se: “Propaganda extemporânea. Finalidade eleitoral. 1. Cartilha publicada em janeiro de 2006 contendo louvores às realizações do Governo Federal, sem objetivo de orientação educacional, informação ou comunicação social. 2. Extrapolação potencializada do art. 37, § 1o, da CF. 3. Princípios da legalidade e da moralidade violados. 4. Intensa publicidade do Governo Federal com dados comparativos referentes às realizações da Administração anterior. 5. Documento que, em ano de eleição, se reveste de verdadeiro catecismo de eleitores aos feitos do Governo Federal. 6. Multa imposta de acordo com o § 3o do art. 36 da Lei no 9.504/97. Valor de R$ 900.000,00 (novecentos mil reais), equivalente ao custo de publicidade. 7. Proibição de distribuição da referida propaganda (art. 36 da Lei no 9.504/97). 8. Procedência da representação” (TSE – Rp no 875/DF – DJ 12-9-2006, p. 148). No entanto, é mais razoável a interpretação que fixa o termo a quo no mês de janeiro do ano das eleições. Antes desse marco, o recuo do tempo em relação ao início do processo eleitoral (sobretudo em relação ao dia do pleito) enseja a diluição de eventual influência que a comunicação possa exercer na disputa, de modo a desequilibrá-la. Inexistiria, pois, lesão relevante ao bem jurídico protegido pela norma. Note-se que é a partir do mês de janeiro que se iniciam algumas restrições em função do pleito, tais como a necessidade de registro de pesquisas de opinião pública e a proibição de distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública (LE, arts. 33 e 73, § 10). Sob essa perspectiva, desde que levada a efeito no ano eleitoral e antes de 15 de agosto, tem-se como consumada a ilicitude da propaganda. O artigo 36-B da LE (acrescido pela Lei no 12.891/2013) prevê hipótese de propaganda antecipada, in verbis: “Art. 36-B. Será considerada propaganda eleitoral antecipada a convocação, por parte do Presidente da República, dos Presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal, de redes de radiodifusão para divulgação de atos que denotem propaganda política ou ataques a partidos políticos e seus filiados ou instituições. Parágrafo único. Nos casos permitidos de convocação das redes de radiodifusão, é vedada a utilização de símbolos ou imagens, exceto aqueles previstos no § 1o do art. 13 da Constituição Federal.” À luz desse dispositivo, estará configurada propaganda antecipada se na comunicação houver a divulgação de atos que denotem: (i) propaganda política; (ii) ataques a partidos
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