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INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 
 
1 
UM OLHAR SOBRE O CONCEITO DE MEMÓRIA DISCURSIVA DE MICHE 
PÊCHEUX 
 
Thyago Madeira França* 
 
 
RESUMO: O presente estudo oferece uma abreviada reflexão acerca de parte dos estudos de Michel 
Pêcheux e da Análise do Discurso decorrente dos mesmos, bem como lançamos um olhar sobre a 
trajetória teórica do conceito de memória discursiva, assim como sobre eventuais projeções de 
identidade teórica com as obras anteriores a 1983, ano de publicação do texto “Papel da Memória”. 
Assim, acreditamos que por mais que as três fases dos estudos de Pêcheux tenham diferenças 
epistemológicas já conhecidas pelos pesquisadores que partem de sua rede teórica, o princípio da 
memória discursiva pode ser reconhecido como constitutivo das diferentes etapas. Dessa forma, esse 
texto busca reconhecer os caminhos trilhados por Pêcheux nas obras de 1969 e 1975 e vincula-los aos 
textos de 1983, quando o conceito de memória discursiva é integralizado pelo autor. 
 
 
RESUMEN: Este estudio proporciona una breve reflexión sobre la parte de Pêcheux estudios y 
análisisdel discurso resultado de lamisma, así como lanzar una mirada a latrayectoria teórica del 
concepto de memoria discursiva, así como sobre lasposiblesproyecciones de identidad teórica com las 
obras antes de 1983, lapublicación de texto año "Papel da Memória". Por lo tanto, creemos que, si 
bienlastres fases de losestudios PECHEUX tienen diferencias epistemológicas yaconocidos por los 
investigadores que salen de sured teórica, elprincipio de la memoria discursiva puede ser reconocido 
como constitutiva de las distintas etapas. Por lo tanto, este texto busca reconocerlos caminhos 
trillados por Pêcheux obras en 1969 y 1975 y los une a 1.983, cuandoel concepto de memoria 
discursiva es construido por el autor. 
 
 
PALAVRAS-CHAVE: Memória Discursiva; Michel Pêcheux; Análise do Discurso. 
PALABRAS-CLAVES: Memoria Discursiva; Michel Pêcheux; Análisisdel Discurso. 
 
 
INTRODUÇÃO 
O filósofo francês Michel Pêcheux (1938-1983) é o precursor e o maior expoente da 
linha de estudos conhecida como Análise de Discurso de escola francesa. Sua obra 
perpassa grande parte da segunda metade do século XX e, de forma didática, pode ser 
dividida em três fases. 
 
A primeira época de seus estudos é marcada pela publicação de Por uma Análise 
Automática do Discurso – introdução à obra de Michel Pêcheux em 1969. Organizado 
por François e Gadet e TonyHak, essa obra contempla a ideia da construção de uma 
ferramenta metodológica computacional que analisaria os sentidos no interior do 
conjunto de documentos em análise - o arquivo. Essa proposta, chamada usualmente de 
 
 
 
 
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 
 
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maquinaria discursiva, é ancorada nas premissas de que toda produção discursiva é 
fechada em si mesma e, por isso, a própria constituição estrutural, a materialidade 
linguística, produzia sentidos. Logo, as análises decorrentes desse dispositivo seriam de 
base sintática, uma vez os sentidos emergiriam dos próprios enunciados. Nesse aspecto, 
a análise seria tomada como automática porque emergiria de um olhar sobre o 
comportamento autônomo do arquivo. 
 
Afastando-se da vinculação estruturalista da 1ª fase, Pêcheux desloca a ideia de 
construção de uma ferramenta metodológica em constrói seus trabalhos sob o viés de 
uma filosofia da linguagem de cunho marxista, em que a discursividade é sempre 
atravessada, constituída e constitutiva de formações ideológicas. Daí decorre a 
publicação de Semântica e Discurso – uma crítica a afirmação do óbvio em 1975, obra 
em que o autor assume a condição histórica de instauração dos discursos e revela um 
sujeito no interior da luta de classes, interpelado pelas formações ideológicas. 
 
Assim, diferente da noção de sujeito-estrutura da Análise Automática, na 2ª época essa 
instância é atravessada pelo processo de assujeitamento. Então, dialogando com os 
estudos de Louis Althusser, Pêcheux toma o indivíduo como um sempre-já sujeito 
nos/pelos discursos produzidos no interior dos Aparelhos Ideológicos de Estado. Logo, 
os sentidos emergem como posições de classe, como uma conjuntura de significações 
que representa as vinculações ideológicas dos sujeitos. 
 
Em 1983, dá-se a publicação de Discurso – estrutura ou acontecimento, texto que baliza 
a 3ª época dos estudos pecheutianos e que apresenta o conceito de acontecimento como 
determinante para a análise discursiva. Nesse estudo, o acontecimento discursivo é 
tomado como uma conjuntura que deve ser analisada como um todo, levando-se em 
consideração os discursos e os sujeitos como constituintes da discursividade. Aqui o 
sentido deve ser tomado como algo que emerge do imbricamento dos elementos do 
acontecimento com as tomadas de posição dos sujeitos inscritos no interior desse 
acontecimento. 
 
Essa breve explanação objetiva demonstrar a existência de tal divisão em épocas dos 
estudos de Pêcheux, uma vez que buscaremos lançar um olhar para um conceito 
específico desenvolvido por esse autor. A partir das três principais obras supracitadas, 
bem como do texto Papel da Memória, publicado em 1983, estabeleceremos uma 
reflexão acerca do conceito de memória discursiva, hipotetizando eventuais caminhos 
percorridos por Pêcheux para a constituição do mesmo. 
 
1. MEMÓRIA DISCURSIVA: EVENTUAIS CAMINHOS 
Ao levarmos em consideração que memória discursiva é conceituada por Pêcheux 
somente em 1983, não podemos cometer o equívoco de considerar as colocações que 
 
 
 
 
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daqui decorrem como sendo o exato caminho desse conceito. Ao lançarmos um olhar 
sobre o conceito de memória discursiva nos textos da década de 1980 (Papel da 
Memória e Discurso – estrutura ou acontecimento), construímos unicamente possíveis 
relações com os textos de 1969 e 1975 (Por uma Análise Automática do Discurso e 
Semântica e Discurso), cooptações teóricas baseadas na arquitetura da episteme desse 
autor. Essas leituras foram possíveis por meio de uma reflexão acerca dos 
deslocamentos e ressignificações estabelecidas por Pêcheux em sua rede conceitual, no 
decorrer de seus estudos. 
 
Ainda que estejamos propondo uma explanação histórica do conceito, quebraremos a 
lógica linear para apresentarmos como a memória é integralizada na 3ª fase dos estudos 
pecheutianos. A memória discursiva diz respeito à recorrência de dizeres que emergem 
a partir de uma contingência histórica específica, sendo atualizada ou esquecida de 
acordo com o processo discursivo, é algo que fala sempre, antes, em outro lugar. 
 
Diferentemente de “lembranças pessoais”, a memória discursiva é concebida numa 
esfera coletiva e social, responsável por produzir as condições necessárias de um 
funcionamento discursivo e, consequentemente, para a interpretabilidade de textos. 
Nesse aspecto, Pêcheux argumenta que “memória deve ser entendida aqui não no 
sentido diretamente psicologista da “memória individual”, mas nos sentidos 
entrecruzados da memória mítica, da memória social inscrita em práticas, e da memória 
construída do historiador (PÊCHEUX, 2010, p.50). 
 
São as redes de memória que possibilitam a retomada de discursos já-ditos, atualizando-
os à historicidade do acontecimento discursivo. A estruturação da discursividade 
constitui, por conseguinte, a materialidade de uma memória social determinada 
historicamente. Para melhor entendermos esse pensamento, apresentamos a definição de 
memória discursiva de Pêcheux: 
 
A memória seriaaquilo que, face a um texto que surge como acontecimento a 
ler, vem restabelecer os „implícitos‟ (quer dizer, mais tecnicamente, os pré-
construídos, elementos citados e relatados, discursos-transversos, etc.) de que 
sua leitura necessita: a condição do legível em relação ao próprio legível 
(PÊCHEUX, 2010, p.52). 
 
A memória, então, é um espaço de retomadas de discursos anteriores, mas não deve ser 
reduzida a somente isso. A memória é, ainda, um componente balizador de uma embate 
entre forças ideológicas que objetivam restabelecer os implícitos (os pré-construídos, 
elementos citados e relatados, discursos-transversos) e forças antagônicas que lutam 
para desestabilizar e desregular os já-ditos, por meio do que Pêcheux chamou de efeitos 
de paráfrase: 
 
Haveria assim sempre um jogo de força na memória, sob o choque do 
acontecimento: - um jogo de força que visa manter uma regularização pré-
 
 
 
 
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existente com os implícitos que ela veicula, confortá-la como “boa forma”, 
estabilização parafrástica negociando a integração do acontecimento, até 
absorvê-lo e eventualmente dissolvê-lo; – mas também, ao contrário, o jogo 
de força de uma “desregulação” que vem perturbar a rede dos “implícitos” 
(PÊCHEUX, 2010, p.53). 
 
Para o autor, há um embate entre as redes de memória e o acontecimento discursivo. De 
um lado uma força que busca restabelecer e estabilizar os implícitos e de outro uma 
força que insiste na desregulação e perturbação dos já ditos. Assim, a regularização 
discursiva que estabiliza “é sempre suscetível de ruir sob o peso do acontecimento 
discursivo novo, que vem perturbar a memória (...), provocando interrupção, pode 
desmanchar essa „regularização‟ e produzir retrospectivamente uma outra série sob a 
primeira” (PÊCHEUX, 2010, p.52). Logo, o acontecimento discursivo novo tem o 
poder de provocar uma desestabilização e deslocar os espaços de memória. 
 
Nesse aspecto, Pêcheux demonstra que, em determinadas conjunturas discursivas, há 
um afastamento entre a palavra e a memória que, ao se desconstruir, desdobra-se em 
paráfrases outras: “sob o „mesmo‟ da materialidade da palavra abre-se então o jogo da 
metáfora, como outra possibilidade de articulação discursiva (...) Uma espécie de 
repetição vertical, em que a própria memória esburaca-se, perfura-se antes de 
desdobrar-se em paráfrase” (PÊCHEUX, 2010, p.53). Em decorrência disso, Pêcheux 
propõe que a análise de discurso se distancie das evidências da materialidade discursiva 
para, assim, buscar uma reflexão sobre os efeitos que emergem dessa materialidade: 
 
Esse efeito de opacidade (correspondente ao ponto de divisão do mesmo e da 
metáfora), que marca o momento em que os “implícitos” não são mais 
reconstrutíveis, é provavelmente o que compele cada vez mais a análise de 
discurso a se distanciar das evidências da proposição, da frase e da 
estabilidade parafrástica, e a interrogar os efeitos materiais de montagens de 
sequências, sem buscar a princípio e antes de tudo sua significação ou suas 
condições implícitas de interpretação (PÊCHEUX, 2010, p.54). 
 
Portanto, é na opacidade do não-dito que ocorrem os deslocamentos, as movências e as 
transformações das redes de memória. Pêcheux demarca o estatuto da memória, 
distanciando-a de um mero conjunto de já-ditos estáveis e homogêneos. Assim, a 
memória não é aniquilada pelo acontecimento novo, mas sobrevive e luta como um 
espaço que comporta os conflitos e discursos antagônicos, e que se ressignifica quando 
necessário. Sobre esse aspecto, Pêcheux conclui: 
 
A certeza que aparece, em todo caso, no fim desse debate é que uma memória 
não poderia ser concebida como uma esfera plena, cujas bordas seriam 
transcendentais históricos e cujo conteúdo seria um sentido homogêneo, 
acumulado ao modo de um reservatório: é necessariamente um espaço móvel 
de divisões, de disjunções, de deslocamentos e de retomadas, de conflitos de 
regularização... Um espaço de desdobramentos, réplicas, polêmicas e contra-
discursos (PÊCHEUX, 2010, p.56). 
 
 
 
 
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Dessa forma, a memória discursiva é um espaço plástico de facetas que autoriza, ao 
mesmo tempo, a repetição dos pré-construídos, mas também se desloca, reinventa-se, 
reconstrói-se e desdobra-se face a um acontecimento que a impele a isso. Assim, frente 
a instauração de um acontecimento novo, a memória se reinventa em paráfrases novas, 
até mesmo sob a forma de contra-discursos. 
 
A partir da conceituação pecheutiana de memória discursiva, pretendemos no presente 
texto construir possíveis associações do conceito de memória discursiva com as obras 
referências da 1ª e da 2ª fase. Nesse sentido, ao trazermos recortes da Análise 
Automática ou do Semântica e Discurso, não estamos construindo um espelhamento do 
conceito em estudo, mas associando elementos teóricos que podem ser tomados como 
constitutivos do conceito de memória. 
 
Na 1ª fase, como já afirmamos, Pêcheux objetivava a construção de um dispositivo 
informatizado que possibilitasse uma análise lógico-formal dos documentos 
compunham o arquivo. Nessa lógica, acreditamos que é possível relacionar o conceito 
de memória como a anterioridade histórica no interior do arquivo. Para o autor: 
 
O processo discursivo não tem, de direito, início: o discurso se conjuga 
sempre sobre um discursivo prévio, ao qual ele atribui o papel de matéria-
prima, e o orador sabe que quando evoca tal acontecimento, que já foi objeto 
de discurso, ressuscita no espírito dos ouvintes o discurso no qual este 
acontecimento era alegado, com as “deformações” que a situação presente 
introduz e da qual pode tirar partido (PÊCHEUX, 1997b, p.76). 
 
Nessa perspectiva, quando o autor faz referência a um discurso prévio que funcionaria 
como uma matéria-prima inerente ao processo discursivo, podemos associar ao conceito 
de memória discursiva, uma vez que esse é tomado como o lugar de restabelecimento 
dos discursos já-ditos. Esses discursos anteriormente constituídos são “ressuscitados” 
(consciente e inconscientemente) pelos sujeitos inscritos no processo discursivo. Além 
disso, quando o autor diz “com as „deformações‟ que a situação presente introduz e da 
qual pode tirar partido”, é possível remeter à plasticidade constitutiva da memória, a 
qual comporta lugares de conflito e que se reconfigura quando necessário, ou seja, 
quando a historicidade da situação discursiva pede certa movimentação parafrástica dos 
discursos relativamente cristalizados pela memória. 
 
Outra referência do Análise Automática que pode ser tomada como marca embrionária 
do conceito de memória é a afirmação de que o discurso não é uma unidade fechada em 
si, mas que remete a uma série de dizeres anteriores. Sobre isso, Pêcheux afirma que 
 
um discurso não apresenta, na sua materialidade textual, uma unidade 
orgânica em um só nível que se poderia colocar em evidência a partir do 
próprio discurso, mas que toda forma discursiva particular remete 
 
 
 
 
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necessariamente à série de formas possíveis, e que essas remissões da 
superfície de cada discurso às superfícies possíveis que lhes são (em parte) 
justapostas na operação de análise, constituem justamente os sintomas 
pertinentes do processo de produção dominante que rege o discurso 
submetido à análise(PÊCHEUX, 1997b, 105-106). 
 
Nessa citação apreendemos que o autor declara que uma manifestação discursiva 
remonta,necessariamente, a discursos anteriores, os quais devem ser justapostos no 
processo de análise. Logo, é plausível relacionarmos o conceito de memória (3ª fase) 
com a ideia de uma certa historicidade dos objetos que compõem o arquivo(1ª fase). 
Assim, ponderamos que a memória pode ser associada aqui como uma instância 
histórica que baliza a materialidade do arquivo e que influencia nas relações semânticas 
presentes no mesmo. 
 
Ao afirmar que “o processo de produção de um discurso é representado pela rede de 
relações que afetam os domínios semânticos previamente colocados em evidência” 
(PECHÊUX, 1997b, p.147), acreditamos que as redes de relações discursivas possíveis 
não só são determinantes do processo discursivo, como também influenciam na 
construção dos sentidos. Dessa forma, associar a historicidade dos objetos do arquivo 
com o conceito de memória discursiva é admissível, uma vez que estamos ponderando 
balizadores históricos que se fazem presentes nas manifestações discursivas por meio de 
retomadas dos pré-construídos ou deslocamentos, paráfrases e desdobramentos do real 
histórico. 
 
Como deslocamento da proposta de maquinaria discursivo-estrutural da 1ª fase de 
Pêcheux, a publicação de Semântica e Discurso lança um olhar filosófico acerca dos 
processos de significação. Aqui, o autor apreende que as relações de (re)produção e 
transformação intervêm na constituição dos discursos presentes na sociedade e, por 
conseguinte, nos processos de subjetividade. Dessa forma, a teoria psicanalítica do 
inconsciente e o marxismo althusseriano são agora constitutivos da forma de pensar o 
discurso, que não é desvinculado do princípio da luta de classes e do princípio dos 
esquecimentos. 
 
Como já afirmamos, na 2ª fase os sentidos estão intrinsecamente relacionados aos 
sujeitos por meio da interpelação e, por conseguinte, relacionados às posições de classe. 
Ao adotar o conceito de formação discursiva (FD), Pêcheux abandona de vez a noção de 
maquinaria, uma vez que a FD é um lugar de inscrição dos sujeitos e dos discursos, 
constantemente invadido/atravessado por FDs outras, que podem asseverar os pré-
construídos ou fazerem emergir discursos-outros. Não era mais possível idealizar a 
maquinaria fechada. 
 
Além disso, a FD é responsável por dissimular a transparência dos sentidos. Para 
Pêcheux, para se evitar a ilusão subjetiva de transparência da linguagem (efeito 
 
 
 
 
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Münchhausen), é indispensável conceber que a Ideologia é responsável por mascarar o 
“caráter material do sentido”. Dessa forma, os sentidos tem dependência constitutiva do 
“todo complexo das formações ideológicas”, e, por conseguinte, das posições de classes 
ocupadas pelos sujeitos discursivos. Sobre essa questão, Pêcheux afirma que: 
 
Cada formação ideológica constitui desse modo um conjunto complexo de 
atitudes e de representações que não são nem “individuais” e nem 
“universais”, mas que se relacionam mais ou menos diretamente a posições 
de classes em conflito umas em relação às outras (PÊCHEUX et al, 1997, 
p.26, grifos do autor). 
 
A formação ideológica, nesse sentido, tem em sua constituição o conflito das posições 
de classe. Assim, como poderíamos então pensar o conceito de memória discursiva 
nessa 2ª fase? Acreditamos que a memória discursiva pode ser aqui tomada como as 
inscrições ideológicas dos sujeitos (processos de interpelação) em determinadas 
formações ideológicas. Se “todo processo discursivo se inscreve numa relação 
ideológica de classes” (PÊCHEUX, 1997, p.92),as interpelações ideológicas as quais os 
sujeitos sofrem serão determinados pelo crivo da memória, que será sui generis, fazendo 
emergir FDs com configurações únicas para cada processo discursivo. 
 
Se para Pêcheux, “a expressão processo discursivo passará a designar o sistema de 
relações de substituição, paráfrases, sinonímias etc., que funcionam entre elementos 
linguísticos – “significantes” – em uma formação discursiva dada.” (PÊCHEUX, 1997, 
p.161), acreditamos que a memória discursiva pode ser associada às inscrições 
ideológicas dos sujeitos, determinando as tomadas de posição e as vinculações 
ideológicas dos sujeitos no interior dos processos discursivos. Logo, a memória será um 
elemento constituinte do interdiscurso, uma vez que o mesmo contempla em seu “todo 
complexo” todas as FDs. Assim, na 2ª fase, a memória estabelece de um lado uma 
relação de reprodução dos sentidos e das ideologias do interdiscurso, de outro é também 
um lugar de contradições e deslocamentos dos pré-construídos, fazendo emergir os 
espaço de reformulação-paráfrase. 
 
Para que possamos fechar a presente proposta de trajetória teórica do conceito de 
memória discursiva, partiremos agora para a construção de um olhar para a obra 
Discurso – estrutura ou acontecimento de julho de 1983. Tanto esse texto quanto o 
Papel da Memória, de abril de 1983, inscrevem-se no mesmo período de estudos de 
Pêcheux. 
 
Na 3ª fase, o sentido emerge do imbricamento do acontecimento com as tomadas de 
posição dos sujeitos. Assim, ao analisar a vitória do presidenciável francês François 
Mitterand, Pêcheux demonstra que a instauração do acontecimento histórico de 10 de 
maio de 1981 desencadeia uma série de textos (fatos, declarações, entrevistas, 
comentários) que convocam a memória discursiva organizada em torno da vitória do 
Partido Comunista e do enunciado “On a gagné”: 
 
 
 
 
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Uns e outros vão começar a “fazer trabalhar” o acontecimento (o fato novo, 
as cifras, as primeiras declarações) em seu contexto de atualidade e no espaço 
de memória que ele convoca e que já começa a reorganizar: socialismo 
francês de Guesde a Jaurès, o Congresso de Tour, o Front Popular, a 
Liberação... (PÊCHEUX, 2006, p.19) 
 
Assim, o acontecimento discursivo “On a gagné” faz emergir espaços de memória que 
remontam a história do socialismo na França, por exemplo, o debate histórico entre 
Guesde a Jaurès em 1900. São também esses espaços de memória que permitirão a 
vinculação do enunciado em destaque “grito coletivo dos torcedores de uma partida 
esportiva cuja equipe acaba de ganhar (PÊCHEUX, 2006, p.21). Sobre isso, Pêcheux 
argumenta que o enunciado “On a gagné” não possui nem forma nem conteúdo nem a 
estrutura de um dizer comum ao discurso político. 
 
Logo, é a memória discursiva que autoriza o sujeito/analista a vincular tal enunciado 
como um dizer que remete ao espaço discursivo esportivo: ““On a gagné” 
[“Ganhamos”], cantado com um ritmo e uma melodia determinados (on-a-gagné/dó-dó-
sol-dó) constitui a retomada direta, no espaço do acontecimento político, do grito 
coletivo dos torcedores de uma partida esportiva cuja equipe acaba de ganhar” 
(PÊCHEUX, 2006, p.21). 
 
Nesse aspecto, o conceito de memória discursiva em Discurso – estrutura ou 
acontecimento pode ser sintetizado como uma presença virtual na materialidade, como 
uma instância que não se faz presente como um enunciado, mas é responsável por 
reestabelecer possíveis leituras implícitas e constitutivas do real sócio-histórico. Sobre 
isso, Pêcheux afirma que: 
 
E o fato de que exista assim o outro interno em toda memória é, a meu ver, a 
marca do real histórico como remissão necessária ao outro exterior, quer 
dizer, ao real histórico como causa do fato de que nenhuma memória pode ser 
um frasco sem exterior. (PÊCHEUX, 2010, p.56). 
 
Dessa forma, o estatuto da memória, enquanto conceito constituído na 3ª fase 
pecheutiana, transcende uma mera vinculação a discursos anteriormenteconstituídos e 
que, ocasionalmente, são retomados no interior do processo discurso. A memória 
comporta e contempla o seu outro, aquilo que lhe denega, destrói, desvela. A memória 
não pode ser um frasco sem exterior porque não existe frasco que engesse as fronteiras 
da memória, que não cessa de existir e significar porque sua característica plástica e 
mórfica acompanha sempre os limites do acontecimento novo. 
 
PALAVRAS FINAIS 
 
 
 
 
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A partir das reflexões aqui empreendidas, oferecemos somente uma abreviada reflexão 
acerca dos estudos de Michel Pêcheux, bem como lançamos um olhar sobre a trajetória 
teórica do conceito de memória discursiva, bem como sobre eventuais projeções de 
identidade teórica com as obras anteriores a 1983. Por mais que as três fases dos estudos 
do autor tenham diferenças epistemológicas, o princípio da memória pode ser 
reconhecido nas diferentes etapas. Abaixo, um esquema que busca esquematizar os 
caminhos do conceito de memória nas três fases dos estudos de Pêcheux: 
 
Dessa forma, mesmo emergindo como conceito somente na 3ª época, afirmamos que o 
construto teórico da memória discursiva pode ser tomado como constitutivo do 
pensamento teórico das fases anteriores. 
 
Ao retornarmos à fase da maquinaria discursiva, acreditamos que remontar a 
historicidade dos elementos que fazem parte do arquivo pode ser associada ao princípio 
da memória discursiva. Já na 2ª fase, a influência dos princípios marxistas da luta de 
classes toma o processo de interpelação como determinante dos processos discursivos. 
Assim, a memória discursiva insere-se na luta de classes e pode ser tomada como as 
inscrições ideológicas dos sujeitos, intervindo/determinando as tomadas de posição dos 
sujeitos. Em Papel da Memória e em Discurso – estrutura ou acontecimento, a 
memória é explicitada como um conjunto de já ditos, que também contempla conflitos e 
ressignificações, quando a instauração do acontecimento assim exige. 
 
REFERÊNCIAS 
 
 
 
 
INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 4, Edição número 22, de Outubro/2015 a Março,/ 2016 - p 
 
10 
PÊCHEUX, M. O papel da memória. In: ACHARD, P. et al. O papel da memória. 
Tradução de José Horta Nunes. 3. ed. Campinas: Pontes, 2010. 
 
PÊCHEUX, M. O discurso: estrutura ou acontecimento. Tradução de Eni Pulcinelli 
Orlandi. 4. ed. Campinas: Pontes, 2006. 
 
PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Tradução de 
Eni Pulcinelli Orlandi et al. Campinas: UNICAMP, 1997. 
 
PÊCHEUX, M. Análise Automática do Discurso (AAD-69). In: GADET F.; HAK, T. 
(Orgs.) Por uma Análise Automática do Discurso: uma introdução à obra de Michel 
Pêcheux. Trad. de Eni P. Orlandi. Campinas: Unicamp, 1997b. 
 
 
* Doutorando - Instituição: UEG – Câmpus Morrinhos/UFU-PPGEL

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