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Prévia do material em texto

1 
 
INSTITUTOS SUPERIORES DE ENSINO LA SALLE 
 
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
O MÉTODO PAULO FREIRE E AS CONTRIBUIÇÕES POLÍTICO-
PEDAGÓGICAS PARA A EDUCAÇÃO BRASILEIRA 
 
 
 
 
 
 
 
MARGARETH NEVES DESMARAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NITERÓI 
2011 
 
 
2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MARGARETH NEVES DESMARAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
O MÉTODO PAULO FREIRE E AS CONTRIBUIÇÕES POLÍTICO-PEDAGÓGICAS 
PARA A EDUCAÇÃO BRASILEIRA 
 
 
 
 
 
Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Instituto 
Superior La Salle-RJ como requisito parcial para a 
obtenção do grau de Licenciado em Pedagogia. 
 
 
 
 
ORIENTADOR: Profª Drª Simone Garrido Esteves Cabral 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Niterói 
2011 
 
3 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À Deus, presente em todos os momentos de pesquisa, leitura, 
escrita desta monografia, compartilhando comigo sua infinita 
sabedoria, sussurrando conselhos, afagando-me com ânimo e 
paz. 
 
 
 
4 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
Aos meus pais, Thomaz de Aquino Moreira Desmarais e Eunice Neves Desmarais, e minha irmã, 
Mônica Neves Desmarais, pelo apoio e amor demonstrados durante a confecção da monografia. 
 
À minha orientadora professora Simone Garrido Esteves Cabral pelo estímulo, generosidade e parceria 
na realização desse trabalho. 
 
Ao professor Roberto S. Kahlmeyer-Mertens pelo direcionamento inicial quanto ao tema, bibliografia 
e desenvolvimento do projeto monográfico. 
 
Aos professores do Curso de Pedagogia do La Salle-RJ pelos ensinamentos recebidos. 
 
Às minhas amigas do Curso de Pedagogia pelo apoio, paciência e carinho no transcorrer deste 
trabalho. 
 
Aos funcionários do La Salle-RJ pela atenção dispensada aos alunos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no 
trabalho, na ação-reflexão. Mas, se dizer a palavra verdadeira, 
que é trabalho, que é práxis, é transformar o mundo, dizer a 
palavra não é privilégio de alguns homens, mas direito de todos 
os homens.[...] O diálogo é este encontro dos homens, 
mediatizados pelo mundo, para pronunciá-lo, não esgotando, 
portanto, na relação eu-tu. 
 
Paulo Freire, Pedagogia do Oprimido. 
 
6 
 
RESUMO 
 
Esse estudo tem por objetivo analisar as contribuições político-pedagógicas de Paulo Freire para a 
educação brasileira. Assim, pretende-se, por meio desta pesquisa, descrever o Método Paulo Freire; 
delimitar as propostas pedagógicas de Paulo Freire; traçar os pressupostos político-ideológicos da 
educação de Paulo Freire; definir as repercussões de sua teoria e prática na educação brasileira. 
Partindo desses pressupostos, procura-se, nesse trabalho, abordar o método Paulo Freire, descrevendo 
suas etapas e ressaltando o seu viés revolucionário, posto que institui uma nova relação entre educador 
e educando; tratar das contribuições pedagógicas de Paulo Freire para a sociedade brasileira, 
abordando as premissas básicas da pedagogia dialógica em contraposição às bases da pedagogia anti-
dialógica, utilizada tradicionalmente; analisar os pressupostos político-ideológicos da pedagogia de 
Paulo Freire no contexto brasileiro, explicando as relações de opressão e mecanismos de 
desmobilização feitos pela classe dominante através do sistema educacional; e abordar o papel da 
educação na conscientização e libertação do homem inserido na sociedade brasileira. 
Palavras-chave: Método Paulo Freire; educação dialógica; relações de opressão; conscientização e 
libertação. 
 
ABSTRACT 
 
This study aims to analyze the political and pedagogical contributions of Paulo Freire for Brazilian 
education. Thus, it is intended, through this study was to describe the Paulo Freire method, define the 
educational proposals of Paulo Freire, trace the political and ideological assumptions of education 
Paulo Freire, define the implications of his theory and practice in education in Brazil. Based on these 
assumptions, we seek to, in this work, address the Paulo Freire method, describing their steps and 
emphasizing its revolutionary bias, since establishing a new relationship between educator and 
student; deal with Paulo Freire's educational contributions to Brazilian society, addressing the basic 
premises of dialogical pedagogy as opposed to the bases of anti-dialogical pedagogy, traditionally 
used, analyzing the political and ideological assumptions of the pedagogy of Paulo Freire in the 
Brazilian context, explaining the relationships and mechanisms of oppression demobilization made by 
the ruling class through the education system, and address the role of education in raising awareness 
and liberation of man inserted in Brazilian society. 
 
 
Keywords: Method Paulo Freire; dialogical education; oppressive relations, awareness and liberation. 
 
 
 
7 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
INTRODUÇÃO 08 
 
1. O MÉTODO PAULO FREIRE 
 
10 
1.1. CONTEXTO HISTÓRICO DA APLICAÇÃO DO MÉTODO PAULO FREIRE 
 
11 
1.2. AS ETAPAS DO MÉTODO PAULO FREIRE 
 
14 
 
2. CONTRIBUIÇÕES PEDAGÓGICAS DO MÉTODO PAULO FREIRE 
 
22 
2.1. PRESSUPOSTOS BÁSICOS DA PEDAGOGIA DE PAULO FREIRE 
 
22 
2.2. PEDAGOGIA ANTI-DIALÓGICA OU BANCÁRIA 
 
27 
2.3. PEDAGOGIA DIALÓGICA 
 
30 
 
3. PRESSUPOSTOS POLÍTICO-IDEOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO DE 
PAULO FREIRE 
 
35 
3.1. A REALIDADE SOCIAL VIGENTE E O PAPEL DA EDUCAÇÃO 
 
35 
3.2. ASPECTOS POLÍTICO-IDEOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO 
 
38 
3.3. A EDUCAÇAO COMO ATO DE LIBERTAÇÃO DO HOMEM 
 
42 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 47 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 49 
 
 
8 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
O tema da presente monografia é o Método Paulo Freire e suas contribuições político-
pedagógicas para a educação brasileira. Bem mais que um método de alfabetização, com 
técnicas inovadoras para o ensino da leitura e escrita, Paulo Freire traz à baila o conceito e a 
prática da pedagogia libertadora, na qual o homem se descobre como ser atuante e pensante 
de sua própria história, consciente de seu papel na sociedade, e produtor do seu conhecimento 
e cultura. Para isso, entende que a educação tem um papel de suma importância na sociedade, 
sendo um meio político-ideológico em que é possível lutar por uma sociedade justa e 
humanizada, sem opressores e oprimidos. 
O primeiro capítulo da monografia irá abordar o Método Paulo Freire, suas etapas e 
desdobramentos pedagógicos. Freire alerta para o fato de sua proposta não ser um método 
fechado e pronto, e de não possuir material didático pré-fabricado, e por isso não poder ser 
aplicado da mesma forma e com o mesmo conteúdo em todos os grupos. Ele entende que o 
processo de conhecimento é contínuo, inacabado e dialético, e por isso ninguém se educa 
sozinho, mas os homens se educam mutuamente, mediatizados pelo mundo. Freire propõe, 
assim, uma nova e revolucionária metodologia, baseada numa relação dialógica entre o 
educador e o educando, na qual o primeiro ensina, aprendendo; e o segundo aprende, 
ensinando. Nesta relação não há espaço para autoritarismo e o conteúdo não é oferecido de 
forma unilateral e bancária, mas é construído de forma dialógica, e deve se basear na história 
e nas vivências do educando.O segundo capítulo tratará das contribuições pedagógicos do Método Paulo Freire para 
a sociedade brasileira. Paulo Freire entende que o conhecimento não é um pacote fechado que 
deve ser transferido do educador para o educando, em que todos são sujeitos no processo de 
ensino-aprendizagem. Serão abordadas as premissas básicas da pedagogia dialógica, nas quais 
há respeito pelo educando, estímulo a sua curiosidade; uma relação de afetividade, rigor, 
autoridade e liberdade entre educador e educando; humildade, crença e esperança por parte do 
educador em relação ao educando; e respeito à ética humana. Também serão expostos as 
bases da pedagogia anti-dialógica, oposta à pedagogia freireana, que pressupõe uma realidade 
determinista, imutável, sendo uma pedagogia que não estimula a reflexão, a criticidade, o 
questionamento, o diálogo, e por isso não visa à conscientização e à transformação do ser 
humano. 
9 
 
O terceiro capítulo irá versar sobre os pressupostos político-ideológicos da educação 
de Paulo Freire. Abordará a relação das classes oprimidas e opressoras, sobre a 
desumanização neocapitalista e sobre os mecanismos de desmobilização e isolamento dos 
oprimidos. Desmistificará o fato de que a realidade é imutável e pré-determinada, que o 
homem inserido nesta sociedade pode transformá-la a partir da práxis, que sintetiza teoria, 
palavra e ação. E tratará sobre o papel da educação na conscientização e libertação do homem 
através da revolução cultural, que o insere na sociedade problematizada. 
Assim, o que se pretende neste trabalho é apresentar os pressupostos revolucionários 
da pedagogia Paulo Freire, pensando e repensando as possibilidades levantadas por ele no 
intuito de mudar a história da educação brasileira, numa visão realista e engajada, e 
profundamente amorosa e esperançosa. 
 
10 
 
1. O MÉTODO PAULO FREIRE 
 
 
 
O Método Paulo Freire, inicialmente criado para alfabetizar adultos, pressupõe o 
diálogo entre educador e educando, o despertar da curiosidade do educando, a conscientização 
deste para inserir-se no mundo de forma crítica, a vocação ontológica do ser humano de “ser 
mais”, dentro de um contexto social em que convivem uma classe opressora e uma classe 
oprimida. E a libertação do homem enquanto ser oprimido seria via educação. 
Diante das experiências vividas e observadas em sua práxis, Freire entendeu que o 
próprio homem oprimido (e somente ele), participante de uma sociedade ideologicamente 
opressora, poderia se libertar. Nas palavras de Fiori: 
 
 
Nessas sociedades, governadas pelos interesses de grupos, classes e nações 
dominantes, a “educação como prática da liberdade” postula, necessariamente, uma 
“pedagogia do oprimido”. Não pedagogia para ele, mas dele. Os caminhos da 
liberação são os do oprimido que se libera: ele não é coisa que se resgata, é sujeito 
que se deve autoconfigurar responsavelmente. (Prefácio. In: FREIRE, 2011, p. 11) 
 
 
O método pedagógico que viabiliza a referida “pedagogia do oprimido” é todo pautado 
nessa premissa, em que o homem como ser social torna-se consciente de si mesmo, do seu 
entorno, das contradições em que vive, e de forma dialética se transforma e transforma a 
sociedade da qual faz parte. E esse processo de conscientização é algo coletivo, posto que o 
homem vive no mundo e com o mundo. Conforme afirma Fiori: 
 
 
Paulo Freire não inventou o homem; apenas pensa e pratica um método pedagógico 
que procura dar ao homem a oportunidade de re-descobrir-se através da retomada 
reflexiva do próprio processo em que vai ele se descobrindo, manifestando e 
configurando – “método de conscientização”. Mas ninguém se conscientiza 
separadamente dos demais. A consciência se constitui como consciência do mundo 
... As consciências não se encontram no vazio de si mesmas, pois a consciência é 
sempre, radicalmente, consciência do mundo. (Prefácio. In: FREIRE, 2011, p. 20) 
 
 
11 
 
O aludido método traz no seu bojo os conceitos de cultura e humanização porque 
entende que o homem é um ser social, cultural, inserido num mundo repleto de contradições, 
e, que o homem alijado do processo de alfabetização consciente e libertadora, é subjugado por 
uma classe dominante que o absorve, desumaniza e o exclui, vivendo numa sociedade que não 
é dele e nem foi feita para ele. No dizer de Fiori, “todos juntos, em círculo, e em colaboração, 
re-elaboram o mundo e, ao reconstruí-lo, apercebem-se de que, embora construído também 
por eles, esse mundo não é verdadeiramente para eles. Humanizado por eles, esse mundo não 
os humaniza” (Prefácio. In: FREIRE, 2011, p. 24). Dito isso, percebemos que, em 
contrapartida, o método Paulo Freire propõe o encontro do homem consigo mesmo, com seus 
pares, e com sua cultura, que é produto de sua vivência social, tornando-o co-participante e 
responsável pela transformação da sociedade. Fiori ratifica essa realidade quando diz: 
 
 
Alfabetizar-se é aprender a ler essa palavra escrita em que a cultura se diz e, 
dizendo-se criticamente, deixa de ser repetição intemporal do que passou, para 
temporalizar-se, para conscientizar sua temporalidade constituinte, que é anúncio e 
promessa do que há de vir. (Prefácio. In: FREIRE, 2011, p. 25) 
 
 
Paulo Freire entende que ninguém educa ninguém e ninguém se educa sozinho, por 
isso a premissa que irá embasar e orientar todo o método é o diálogo. Segundo afirma 
Brandão: 
 
 
Paulo Freire pensou que um método de educação construído em cima da idéia de um 
diálogo entre educador e educando, onde há sempre partes de cada um no outro, não 
poderia começar com o educador trazendo pronto, do seu mundo, do seu saber o seu 
método e o material da fala dele”. (BRANDÃO, 1981, p.21) 
 
 
1.1. CONTEXTO HISTÓRICO DA APLICAÇÃO DO MÉTODO PAULO FREIRE 
 
 
Paulo Freire, nascido e criado no nordeste do Brasil, viveu desde cedo as agruras do 
povo brasileiro no que diz respeito à educação, saúde e moradia. Perdeu o seu pai aos 13 anos 
de idade, o que o fez experimentar privações financeiras, dentro de um quadro de crise 
mundial, a quebra da bolsa de Nova York. Mas também experienciou a solidariedade de 
muitos que ajudaram a sua mãe na criação dos filhos. Mudou-se para uma região mais pobre, 
passou fome, estudou com dificuldade, atrasou-se nos estudos. Mas todas essas experiências 
foram proveitosas para formar o homem que mudaria a história da educação no Brasil. 
Passaria por outras piores, mas nenhuma delas teve o poder de paralisá-lo, ao contrário, elas 
12 
 
impulsionaram-no e serviram de base para endossar toda a sua teoria que convivia com a 
prática todo o tempo. 
Formou-se em Direito, mas desistiu da carreira para ingressar no magistério, e crescer 
na vida acadêmica. Foi convidado em 1947 para trabalhar no SESI, o que lhe conferiu 
proximidade com a realidade dos trabalhadores e sua educação. Também foi membro do 
Conselho de Educação de Recife e alguns anos depois, diretor da Divisão de Cultura e 
Recreação da Prefeitura Municipal de Recife. Sempre foi um homem do povo, que conviveu e 
ouviu o povo e lutou por ele durante toda a sua vida. E por isso não se fechou dentro de 
escolas e universidades, mas engajou-se em movimentos sociais que lhe deram respaldo e 
base para o método que criaria posteriormente. 
 
 
Extrapolando a área acadêmica e institucional, Freire engajou-se nos movimentos de 
Educação Popular. Foi um dos fundadores do Movimento de Cultura Popular (MCP) 
do Recife e nele trabalhou, juntamente com outros intelectuais, buscando valorizar a 
cultura popular e promover a participação das massas na vida da sociedade brasileira 
e em seu processo de democratização. Foi com essetrabalho que foram lançadas as 
sementes do Método Paulo Freire, com o autor assessorando as campanhas de 
alfabetização em várias regiões do nordeste brasileiro, a exemplo de Natal e 
Angicos, no estado do Rio Grande do Norte. (ZITKOSKI, 2006, p.91) 
 
 
A teoria e prática de Paulo Freire consubstanciadas no seu método de alfabetização 
tinham como pano de fundo um país efervescente em suas questões sócio-políticas-
econômicas. O governo populista de João Goulart, no início dos anos 60, ofereceu condições 
para que esses movimentos de massa acontecessem, os setores de base se organizassem, e os 
sindicatos rurais e urbanos fossem criados e ampliados. 
 
 
A atmosfera da qual se impregnou a cultura contagiou a educação. O Movimento de 
Educação de Base (MEB), por exemplo, já no início dos anos 60, dirigia-se às 
classes trabalhadoras, com o objetivo de ampliar o universo cultural e educacional 
de amplos setores da população. A esquerda participou mais ativamente desse 
movimento, e a União Nacional dos Estudantes (UNE) liderava grande parte do 
programa... Os Movimentos de Cultura Popular (MCPs) também se pautaram nos 
mesmos objetivos de ampliar o universo cultural dos segmentos populares 
brasileiros. (BOMENY, 2003, p. 57 e 58) 
 
 
Nesse contexto, o método Paulo Freire surge e é colocado em prática, inicialmente no 
Nordeste, região mais pobre do Brasil e possivelmente com maior quantidade de analfabetos 
do país. A educação conscientizadora e libertadora proposta por Freire era coerente com os 
movimentos de cultura popular que se faziam presentes no inicio dos anos 60. As primeiras 
13 
 
experiências de base do seu método de alfabetização aconteceram em Angicos, Rio Grande do 
Norte, através do Serviço de Extensão Universitária da Universidade Federal de Pernambuco, 
do qual participaram alguns professores voluntários. Ao final de 45 dias, 300 trabalhadores 
tinham sido alfabetizados pelo método Paulo Freire, pelo qual eram consideradas suas 
experiências de trabalho e de vida, baseando-se no diálogo e na conscientização dos 
educandos. E esta experiência ficou conhecida por muitos, vindo a extrapolar as divisas do 
estado do Rio Grande do Norte. Chegou aos ouvidos dos governantes e da opinião pública 
que reconheceram o seu valor e praticidade, alcançando as massas tão alijadas do processo 
educacional até então. Veio ao encontro de todos os movimentos sociais, políticos e 
estudantis que se faziam na época, e endossando o que mais tarde Paulo Freire chamaria de 
“inédito viável”. Era um novo conceito de educação, que não objetivava, como o MOBRAL, 
posteriormente, somente a possibilidade da leitura e escrita básica, e sim a inserção do homem 
na sociedade em que vivia, por meio de sua conscientização realizada durante a alfabetização: 
 
 
Os resultados obtidos – 300 trabalhadores alfabetizados em 45 dias – 
impressionaram profundamente a opinião pública. Decidiu-se aplicar o método em 
todo o território nacional, mas desta vez com o apoio do Governo Federal. E foi 
assim que, entre junho de 1963 e março de 1964, foram realizados cursos de 
formação de coordenadores na maior parte das Capitais dos Estados brasileiros... O 
plano de ação de 1964 previa a instalação de 20.000 círculos de cultura, capazes de 
formar, no mesmo ano, por volta de 2 milhões de alunos. (FREIRE, p. 18-19) 
 
 
Em 1963, então, Paulo Freire foi convidado por Paulo de Tarso Santos, Ministro da 
Educação, para participar do planejamento e implantação de uma campanha nacional de 
alfabetização de jovens e adultos, o Programa Nacional de Alfabetização. Este programa foi 
apoiado pelo governo de João Goulart e endossado pelo MEC, e intencionava alfabetizar 
cinco milhões de adultos em todo o país. No início de 1964, quando as equipes de educadores 
estavam prontas para iniciar o programa de alfabetização, as forças militares tomaram o país, 
fechando gráficas, invadindo universidades, depondo políticos, prendendo professores e 
estudantes, decretando o fim da democracia no país. 
 
 
Não houve tempo para passar das primeiras experiências para os trabalhos de amplo 
fôlego com a alfabetização de adultos. Em fevereiro de 1964, o governo do Estado 
da Guanabara apreendeu na gráfica milhares de exemplares da cartilha do 
Movimento de Educação de Base: Viver é Lutar. Logo nos primeiros dias de abril, a 
Campanha Nacional de Alfabetização, idealizada sob direção de Paulo Freire, pelo 
governo deposto, foi denunciada publicamente como “perigosamente subversiva”. 
Em tempo de baioneta a cartilha que se cale. Aqueles foram anos – cada vez piores, 
14 
 
até 1968 – em que por toda a parte educadores eram presos e trabalhos de educação, 
condenados. (BRANDÃO, 1981, p.19) 
 
 
Paulo Freire foi considerado subversivo, baderneiro, contraventor da ordem pública e 
por isso convidado a sair do país. Ficou exilado durante 16 anos. Mas o que poderia ser 
considerado fracasso e esquecimento futuro foi transformado em prodigiosa experiência 
prática e produção literária daquilo que já tinha sido gerado no Brasil. Ganhou força, 
reconhecimento, e vitalidade. Voltou ao Brasil para continuar fazendo história, ocupando os 
melhores cargos da educação, sem contudo deixar de relacionar-se com a população de base e 
continuar acreditando na revolução cultural do seu país. Isso veio provar que o Método Paulo 
Freire não era um modismo educacional, mas atravessou épocas diferentes do século XX e 
não se extinguiu; e, ainda hoje, pode ser colocado em prática com as devidas adequações. 
 
1.2. AS ETAPAS DO MÉTODO PAULO FREIRE 
 
De forma diferente dos métodos de alfabetização tradicionais, que têm sua base 
ideológica e técnica na escolástica, o método Paulo Freire preconiza a dialética do ser humano 
que é um ser social e histórico, e o seu inacabamento. Por isso, é um método que se refaz a 
cada momento em que é utilizado, em cada comunidade onde é aplicado. Não é fechado, 
pronto, concluído, porque pressupõe que o homem se constrói, se forma e se historiciza nas 
suas relações com o mundo, donde conclui-se que não pode receber um conteúdo educacional 
hermético e feito por outros. Exatamente por isso, no método Paulo Freire, não existem 
cartilha, material didático, questionário de pesquisa, avaliação ou qualquer outra ferramenta 
pedagógica pronta. Aliás, esse procedimento é condição sine qua non para que o método 
possa existir e ser usado de forma bem sucedida. 
Trataremos aqui das etapas do método Paulo Freire para seu melhor entendimento e 
para destrincharmos os seus desdobramentos. Mas com certeza, como prevalece o sentido 
dialético em toda a sua extensão, essas etapas se entrelaçam e se misturam; não são estanques. 
Possuem, no entanto, uma ordem cronológica para que o processo de ensino-aprendizagem 
aconteça de maneira completa e significativa tanto para quem aprende, quanto para quem 
ensina. 
15 
 
A pedagogia de Paulo Freire está baseada no pressuposto de que “ninguém educa 
ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo 
mundo” (FREIRE, 2011, p. 95). Essa premissa irá permear todas as etapas do método Paulo 
Freire, do início ao fim, e ele entende que não pode ser de outra maneira, porque senão pode 
se cair no engodo da educação tradicional que pressupõe a existência de alguém que sabe 
mais e o que nada sabe, e por isso precisa aprender. Para Freire, a educação nunca é 
verticalizada, de cima para baixo, mas entende que os homens que se relacionam entre si e 
com o mundo, e por isso todos devem participar ativamente do seu próprio processo de 
educação. Como dissemos anteriormente, nenhuma parte do método está pronta ou fechada, 
mas deve ser “preparada”de forma conjunta, numa relação intrínseca entre educador e 
educando. E para isso o diálogo é parte fundamental do processo. 
A primeira etapa do método é a investigação temática, que é a pesquisa extensiva e 
meticulosa do conteúdo falado entre os homens e mulheres da comunidade onde será aplicado 
o método de alfabetização. Leva-se em conta a sua cultura, seus modos de falar, de entender o 
mundo, seus mitos, suas percepções. Este é um momento que requer cuidado e atenção, pois 
esta investigação não deve ser invasiva ou tomada de prepotência. No dizer de Carlos 
Brandão: 
 
 
Assim, nas primeiras experiências, depois de a comunidade aceitar envolver-se com 
o trabalho de alfabetização, a tarefa que inicia a troca-que-ensina é uma pequena 
pesquisa. É um trabalho coletivo, co-participado, de construção do conhecimento da 
realidade local: o lugar imediato onde as pessoas vivem e irão ser alfabetizadas. 
(BRANDÃO, 1981, p. 24) 
 
 
Nos diversos livros de Paulo Freire esta etapa ganhou outros nomes, “mas sempre 
permaneceu viva a mesma ideia: a ideia de que há um universo de fala da cultura da gente do 
lugar, que deve ser: investigado, pesquisado, levantado, descoberto.” (BRANDÃO, 1981, p. 
24-25). Essa fase é de suma importância, pois entende-se que a realidade do educando que 
está inserido nessa comunidade precisa ser pesquisada, analisada, entendida, posto que será a 
base do conteúdo programático, estudado através da codificação e decodificação. Este contato 
inicial é feito com a aceitação e envolvimento da comunidade, onde algumas pessoas por livre 
e espontânea vontade aderem ao grupo de investigadores, num momento coletivo, como diz o 
próprio Freire “agentes de educação e as gentes da comunidade” (BRANDÃO, 1981, p. 29). E 
esta relação educador-educando, que se traça desde o início, é muito importante para o 
desenvolvimento e sucesso do método, que se faz de forma coletiva e dialética. Eles 
16 
 
perceberão que tudo o que for proposto na fase de codificação e decodificação é fruto da 
investigação temática, é retirado da realidade cultural e antropológica deles. E isso confere 
significado a tudo o que será aprendido e trocado no processo de ensino-aprendizagem 
proposto pelo método. Nenhuma palavra ou discussão está alijada do cotidiano da 
comunidade em questão, e por isso mesmo o método não pode ser formatado ou sistematizado 
para ser aplicado da mesma forma, com o mesmo conteúdo em diversas comunidades e locais 
diferentes. Ele é singular no seu preparo e utilização. Como disse Carlos Brandão: 
 
 
Das muitas conversas com o mundo da comunidade: pessoas, casais, famílias, 
pequenos grupos, equipes locais, todas as situações de vida e trabalho podem ser 
exploradas. É tão importante saber como os lavradores do lugar fazem o seu trabalho 
com a terra, como saber de que modo as mulheres guardam a sabedoria do cuidado 
de seus filhos. O vivido e o pensado que existem vivos na fala de todos, todo ele é 
importante: palavras, frases, ditos, provérbios, modos peculiares de dizer, de 
versejar ou de cantar o mundo e traduzir a vida (BRANDÃO, 1981, p. 26) 
 
 
Outra questão que está implícita na investigação temática é o que se pretende 
pesquisar, ou melhor, quem é o sujeito e o objeto dessa pesquisa, pois o esclarecimento dessas 
instâncias irá definir o tipo de investigação que será feita, que deve ser sempre favorável ao 
educando. Paulo Freire expressa muito claramente essa relação quando diz: 
 
 
Esta é a razão pela qual (em coerência ainda com a finalidade libertadora da 
educação dialógica) não se trata de ter nos homens o objeto da investigação, de que 
o investigador seria o sujeito. O que se pretende investigar, realmente, não são os 
homens, como se fossem peças anatômicas, mas o seu pensamento-linguagem 
referido à realidade, os níveis de sua percepção desta realidade, a sua visão do 
mundo, em que se encontram envolvidos seus temas geradores (FREIRE, 2011, p. 
121-122) 
 
 
E ainda: 
 
 
Por isso é que, para nós, o risco da investigação não está em que os supostos 
investigados se descubram investigadores, e, desta forma, “corrompam” os 
resultados da análise. O risco está exatamente no contrário. Em deslocar o centro da 
investigação, que é a temática significativa, a ser objeto da análise, para os homens 
mesmos, como se fossem coisas, fazendo-os assim objetos da investigação 
(FREIRE, 2011, p. 138-139) 
 
 
Com a investigação temática não se deseja entender e anotar o modo de falar ou os 
trejeitos da comunidade, mas de forma muito mais profunda, captar a forma de pensar das 
17 
 
pessoas que compõem essa comunidade, suas relações inter-pessoais, suas subjetividades, sua 
forma de ver o mundo e de se relacionar com ele, conforme afirma Freire: 
 
 
A investigação da temática, repitamos, envolve a investigação do próprio pensar do 
povo. Pensar que não se dá fora dos homens, nem num homem só, nem no vazio, 
mas nos homens e entre os homens, e sempre referido à realidade. Não posso 
investigar o pensar dos outros, referido ao mundo, se não penso. Mas, não penso 
autenticamente se os outros também não pensam. Simplesmente, não posso pensar 
pelos outros nem para os outros, nem sem os outros. A investigação do pensar do 
povo não pode ser feita sem o povo, mas com ele, como sujeito do seu pensar. 
(FREIRE, 2011, p. 140 e 141) 
 
 
Após esse contato vasto e proveitoso com a comunidade, e várias reuniões para 
discutir o que foi observado em campo, parte-se para o momento seguinte que é a escolha das 
palavras e temas geradores. Recebem o nome de geradoras porque serão a base objetiva que 
irá gerar novas palavras e temas, num desdobramento futuro. As palavras geradoras são 
escolhidas mediante critérios bem definidos e específicos. Esses critérios estão bem 
explicados na Fundamentação Teórica do Programa: 
 
 
A melhor palavra geradora é aquela que reúne em si a maior porcentagem possível 
dos critérios sintático (possibilidade ou riqueza fonêmica, grau de dificuldade 
fonêmica complexa, de manipulabilidade dos conjuntos de sinais, as sílabas, etc), 
semântico (maior ou menor intensidade do vínculo entre a palavra e o ser que 
designa, maior ou menor adequação entre palavra e ser designado, etc), pragmático 
(maior ou menor teor de conscientização que a palavra trás em potencial, ou 
conjunto de reações sócio-culturais que a palavra gera na pessoa ou grupo que a 
utiliza. (BRANDÃO, 1981, p. 31) 
 
 
Essas palavras são retiradas da realidade da comunidade que foi pesquisada e por isso 
são carregadas de significado e importância para os educandos que lá vivem. Dessa forma, a 
etapa posterior (codificação e decodificação) poderá ser feita de forma ágil e prazerosa, pois 
os educandos se verão, se reconhecerão nas palavras geradoras. Mas os dois primeiros 
critérios de escolha, o sintático e o semântico, não podem ser deixados de lado, mas precisam 
ser considerados, pois eles darão condições para o educando de ser alfabetizado em sua 
língua, e dessa forma inserir-se criticamente na sociedade em que vive. Esse é o objetivo 
maior da pedagogia de Paulo Freire, alfabetizar, conscientizar e inserir o homem na 
sociedade, para que ele possa transformá-la. 
Após algumas reuniões em grupo com os investigadores temáticos, que envolvem os 
educadores e educandos, são escolhidas algumas palavras e temas geradores. Segundo 
18 
 
Brandão, o processo de codificação, que será a base do processo de decodificação, se inicia 
neste momento: 
 
 
... estas poucas palavras codificam o modo de vida das pessoas dos lugares onde a 
“descoberta” foi feita. Para serem decodificadas num outro momento de descoberta, 
o docírculo de cultura, a cada palavra foi associado um núcleo de questões, ao 
mesmo tempo existenciais (ligadas à vida) e políticas (ligadas aos determinantes 
sociais das condições da vida).1 (BRANDÃO, 1981, p. 33) 
 
 
Ou seja, as palavras que servirão para alfabetizar um grupo de pessoas de uma 
determinada comunidade são únicas porque codificam o modo de vida daquelas pessoas que 
se relacionam naquele contexto social. Por isso o método Paulo Freire jamais poderá ser 
utilizado da mesma forma em todos os lugares, por mais que sejam similares. Assim também 
são com os temas geradores que dizem respeito às questões cotidianas da vida de uma 
determinada comunidade. Conforme afirma Brandão: 
 
 
... estes temas concretos da vida que espontaneamente aparecem quando se fala 
sobre ela, sobre seus caminhos, remetem a questões que sempre são as das relações 
do homem: com o seu meio ambiente, a natureza, através do trabalho; com a ordem 
social da produção de bens sobre a natureza; com as pessoas e grupos de pessoas 
dentro e fora dos limites da comunidade, da vizinhança, do município, da região; 
com os valores, símbolos, idéias. (BRANDÃO, 1981, p. 37-38) 
 
 
Partindo dessa premissa, os educadores irão confeccionar fichas de cultura que “são 
desenhos feitos em cartazes ou projetados em slides. Uma após a outra, elas provocam os 
primeiros debates, as primeiras trocas de ideias entre o animador e os educandos, ou entre os 
educandos.” (BRANDÃO, 1981, p. 41). Estes desenhos são codificações das palavras 
geradoras, ou seja, são representações figurativas das palavras geradoras que serão discutidas 
e ensinadas no círculo de cultura. Desta forma, o educando, ao entrar em contato com o 
desenho e a respectiva palavra, fará a conexão entre os dois enquanto se discute o sentido 
pragmático desta palavra para ele como ser social, e o processo de alfabetização acontecerá de 
maneira consequente. Essas fichas de cultura podem ser feitas pelos educadores ou pelos 
próprios educandos, sejam elas desenhos ou fotos, mas precisam sempre retratar a realidade 
na qual a comunidade está inserida. 
 
1
 Círculo de cultura é uma expressão criada por Paulo Freire que substitui a palavra e a estrutura de sala de aula 
tradicional, onde os educandos e o educador se encontram, discutem, aprendem e ensinam. O formato é de um 
circulo, colocando no mesmo patamar de aprendizado os educadores e educandos. E o círculo é de „cultura‟ 
porque é um local onde as formas de viver, de pensar e produzir dos educandos são discutidas e repensadas. 
19 
 
Os participantes do círculo são convocados e iniciam-se os encontros de ensino e 
aprendizagem. Num primeiro momento o educador expõe e discute a proposta de 
alfabetização e logo depois as fichas de cultura são mostradas por ele aos educandos. O 
educador, também chamado por Freire de animador, inicia uma discussão a partir da primeira 
ficha de cultura: “Sugere que digam o que estão vendo: o que a figura mostra? Quais são as 
partes, os elementos dela? O que será que ela quer dizer? Com o que é que parece?” 
(BRANDÃO, 1981, p. 45). Para Freire, o diálogo é parte inerente ao processo de ensino-
aprendizagem, e só acontece verdadeiramente se educandos e educadores dialogarem, 
questionarem um ao outro, pensarem e repensarem a vida através da discussão. Não há outra 
forma de se “fazer” educação. Desta maneira as fichas de culturas são mostradas e discutidas 
uma após a outra, num tempo próprio, na medida em que o grupo processa o conhecimento e 
analisa a própria realidade. No dizer de Carlos Brandão: 
 
 
Estas são as finalidades das fichas de cultura, que sugerem os debates a partir das 
imagens das situações existenciais: levar o grupo de educandos a rever criticamente 
conceitos fundamentais para pensar-se e ao seu mundo; motivá-lo para assumir, 
critica e ativamente, o trabalho de alfabetizar-se.” (BRANDÃO, 1981, p. 50) 
 
 
O papel do educador no círculo de cultura é propor questionamentos, inserir perguntas, 
orientar a discussão, ele deve ser um facilitador e não aquele que detém o saber, ou seja, “o 
animador deve sempre evitar fazer para ou por. Deve criar as situações em que, com a sua 
ajuda, o grupo faça o trabalho de pensar, de refletir coletivamente. Por isso ele não guia, mas 
favorece, orienta” (BRANDÃO, 1981, p. 51). Nisso consiste a decodificação, em que os 
educandos identificam as palavras por meio das figuras, enquanto discutem o significado 
delas no contexto em que vivem. Inicialmente é mostrada a figura, discute-se sobre ela e 
depois parte-se para a palavra que codifica a figura. A discussão continua com base na palavra 
exposta, sempre trazendo questões relacionadas ao cotidiano do educando. Depois, o 
educador mostra um cartaz com os fonemas que formam a palavra, e em seguida a família 
silábica desses fonemas. Ele repetirá em voz alta a família silábica dos fonemas, seguindo a 
ordem das vogais e em todas as direções, e solicita que os educandos façam o mesmo, 
sentados ou em pé mostrando o que leem no cartaz. Como disse Brandão: “todos veem, leem 
e repetem com o monitor, sozinhos, em coro. A mão acompanha agora os pedaços, saltando 
de um para o outro.” (BRANDÃO, 1981, p. 58) Quando perceber que o grupo aprendeu e 
absorveu os fonemas mostrados, ele pode sugerir que algumas pessoas tentem construir novas 
20 
 
palavras com estes fonemas de forma livre, após exemplos dados pelo próprio educador. O 
educador repetirá o processo com todas as palavras geradoras. 
 
 
O coordenador do círculo deve construir apenas poucas palavras. Deve mostrar, sem 
ensinar como, uma lógica, um processo de reconstrução de palavras. Se no meio de 
seu trabalho alguém quiser formar uma palavra, tudo bem. Que ele faça. De novo 
deve incentivar o grupo a que faça o trabalho de criar outras palavras, ou de recriar 
as mesmas que ele acabou de formar. As pessoas podem ser convidadas a fazerem 
como ele, a virem na frente pra tentar a coisa. Alguns chegam perto, apontam 
pedaços, formam palavras... (BRANDÃO, 1981, p. 61) 
 
 
A problematização ocorre enquanto a decodificação é feita, alias, todas as etapas do 
método se entrelaçam, se imiscuem, não são estanques, separadas. A educação proposta por 
Paulo Freire é problematizadora, questionadora, inquisitória, o tempo todo dialética. Não é de 
forma nenhuma estática, nem linear. E a problematização só acontece mediante o diálogo, a 
troca humilde e transformadora que se dá entre o educador e o educando, e entre o educando e 
o mundo. O pano de fundo da problematização é a reflexão tão incentivada pelo método Paulo 
Freire, em que educador e educando se debruçam sobre o mundo, percebem e assimilam 
novos conceitos, e reformulam sua realidade interna. Com relação a estes aspectos, Paulo 
Freire, pondera, ainda: 
 
 
 (...) enquanto a prática bancária, como enfatizamos, implica uma espécie de 
anestesia, inibindo o poder criador dos educandos, a educação problematizadora, de 
caráter autenticamente reflexivo, implica um constante ato de desvelamento da 
realidade. (FREIRE, 2011, p. 97). 
 
 
E essa percepção do mundo e da subjetividade humana, na qual o homem dialoga com 
os seus limites e possibilidades existenciais, possibilita a transformação de sua própria 
realidade e o mundo que o cerca. Também no dizer de Freire: 
 
 
A educação problematizadora se faz, assim, um esforço permanente através do qual 
os homens vão percebendo, criticamente, como estão sendo no mundo com que e em 
que se acham. Se, de fato, não é possível entendê-los fora de suas relações dialéticas 
com o mundo, se estas existem independentemente de como as percebem,é verdade 
também que a sua forma de atuar, sendo esta ou aquela, é função, em grande parte, 
de como se percebam no mundo. (FREIRE, 2011, p. 100) 
 
 
No círculo de cultura, a problematização se dará na medida em que o educando for 
tomando consciência da sociedade na qual está inserido, de suas contradições, e da 
21 
 
necessidade de superação da realidade opressora através de ações de cunho social, político e 
cultural. Enquanto o educando entra em contato com as figuras e respectivas palavras, é 
discutido o que elas representam para ele e para a comunidade, já que foram retiradas de sua 
realidade. O grande salto pedagógico do método Paulo Freire é essa conexão entre o que é 
lido e escrito, e a tomada de consciência do valor que existe nas palavras lidas e escritas. Daí 
o ato de alfabetizar é um ato de conscientizar, de problematizar a existência. No momento em 
que são expostas para o educando as famílias de fonemas que formam as palavras e lhe é 
possibilitado criar novas palavras, na verdade ele está “dizendo a sua palavra”, está 
verbalizando a sua existência. E tendo a possibilidade de mudar a sua existência no mundo, 
conforme afirma Paulo Freire: 
 
 
Os homens, pelo contrário, ao terem consciência de sua atividade e do mundo em 
que estão, ao atuarem em função de finalidades que propõem e se propõem, ao terem 
o ponto de decisão de sua busca em si e em suas relações com o mundo, e com os 
outros, ao impregnarem o mundo de sua presença criadora através da transformação 
que realizam nele, na medida em que dele podem separar-se, e separando-se, podem 
com ele ficar, os homens ao contrário do animal, não somente vivem, mas existem e 
sua existência é histórica. (FREIRE, 2011, p. 124) 
 
 
A conscientização e transformação do homem como ser social e político deve ser a 
finalidade última da educação, na visão de Paulo Freire. Nesse sentido, ele descreve a fala de 
um educando que participou de um círculo de cultura: 
 
 
Talvez seja eu, entre os senhores, o único de origem operária. Não posso dizer que 
haja entendido todas as palavras que foram ditas aqui, mas uma coisa posso afirmar: 
cheguei a esse curso ingênuo e, ao descobrir-me ingênuo, comecei a tornar-me 
crítico. Essa descoberta, contudo, nem me fez fanático, nem me dá a sensação de 
desmoronamento. (FREIRE, 2011, p. 32) 
 
 
Através da educação, o homem é conscientizado de sua vocação ontológica de “ser 
mais” e do seu papel na sociedade, papel esse que não pode ser desempenhado por ninguém, 
por nenhuma instância superior, e sim por ele mesmo. Desta forma, o objetivo da educação 
seria conscientizar o ser humano, através da problematização de sua existência, tornando-o 
crítico e não mais ingênuo diante da sociedade que o cerca. 
22 
 
2. CONTRIBUIÇÕES PEDAGÓGICAS DO MÉTODO PAULO FREIRE 
 
O modelo escolar adotado pelo Brasil desde a época da colonização baseou-se na 
escolástica, criado na Idade Média, em que, na educação, não eram permitidos nem 
estimulados o questionamento, a análise do conteúdo, nem a troca entre professor e aluno. 
Esse modelo vem sendo aplicado nas diversas escolas brasileiras, passando por inúmeras 
análises e críticas, mas sendo modificado de forma superficial, e por isso continuando a 
apresentar os mesmos problemas de base, como currículo, metodologia, avaliação, conteúdo, 
relação entre professor-aluno, entre outros. Vários educadores e profissionais afins, entre eles 
Paulo Freire, pensaram e discutiram a educação com o objetivo de mudá-la para que todos 
tivessem maior proveito e pudessem realmente crescer como seres sociais. 
Em suas observações e práticas, Paulo Freire entendeu a educação de forma 
diferenciada do que era praticado nas escolas. Ele propôs uma nova pedagogia, baseado em 
novos pressupostos, que ele viu ser possível em sua práxis, quando praticava e teorizava a 
educação. Destacaremos alguns desses pressupostos básicos da pedagogia de Paulo Freire, 
que estavam presentes em todas as etapas do método freireano, e traçaremos um paralelo com 
a pedagogia tradicional aplicada no Brasil. 
 
2.1. PRESSUPOSTOS BÁSICOS DA PEDAGOGIA DE PAULO FREIRE 
 
Segundo Paulo Freire, o conhecimento não é um pacote fechado que deve ser entregue 
pelo professor ao aluno. O conhecimento, para ele, é algo dinâmico e, por isso, não há como 
ser transmitido de uma pessoa para outra apenas, mas sim construído de forma crítica e 
conjunta. Nessa perspectiva, ele afirma que: 
 
É preciso, sobretudo, e aí vai um destes saberes indispensáveis, que o formando, 
desde o princípio mesmo de sua experiência formadora, assumindo-se como sujeito 
também da produção do saber, se convença definitivamente de que ensinar não é 
transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua produção ou a sua 
construção. (FREIRE, 1996, p. 22). 
 
 
Nesse fragmento, Paulo Freire ressalta a necessidade do educando se convencer de que 
ele faz parte do processo do conhecimento, de que ele é sujeito desse processo e não um 
23 
 
objeto, de que ele produz o saber e não recebe o saber pronto. Assim, algo importante a se 
destacar é o conceito de “ensinar” como sendo a criação de possibilidades para que a 
construção do conhecimento aconteça, e esse é o papel do educador, que deixa de ser aquele 
que transfere o conhecimento, para ser o facilitador, o orientador na produção do saber, cujo 
sujeito é o aluno. O educador, por assim dizer, desce do “palco” e permite que o educando 
suba, para que ele exerça o papel de protagonista do conhecimento. Na pedagogia tradicional, 
não progressista, isso não é possível. O professor é visto como o individuo que detém o saber, 
que sabe infinitamente mais que o aluno, e que este entra na escola para obter conhecimento 
porque nada sabe, e por isso não tem com o que contribuir. Nesse posicionamento, o 
conhecimento não é construído, mas é doado, é transferido, como um depósito feito pelo 
professor na mente do aluno. Por isso, Paulo Freire subverte essa perspectiva ao descrever o 
papel do educador e do educando: 
 
 
Ninguém pode conhecer por mim mesmo assim como não posso conhecer pelo 
aluno. O que posso e o que devo fazer é, na perspectiva progressista em que me 
acho, ao ensinar-lhe certo conteúdo, desafiá-lo a que se vá percebendo na e pela 
própria prática, sujeito capaz de saber. (FREIRE, 1996, p. 124) 
 
 
Ressalta-se o respeito que o educador deve ter pelo saber do educando, que deve ser 
instigado durante as aulas, e interligado com o conteúdo que se pretende ensinar. É 
precisamente este respeito que ajuda o educador a entender que o saber é construído e não 
dado. O currículo escolar e a metodologia educacional deveriam estar calcados nesta 
premissa, em que o aluno fizesse parte do conteúdo programático e pudesse questioná-lo 
juntamente com o educador. Como disse Freire: 
 
 
... pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à escola, o dever de não só 
respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os das classes populares, 
chegam a ela saberes socialmente construídos na prática comunitária – mas também, 
como há mais de trinta anos venho sugerindo, discutir com os alunos a razão de ser 
de alguns desses saberes em relação com o ensino dos conteúdos. (FREIRE, 1996, p. 
30) 
 
 
Outro pressuposto da pedagogia freireano, a meu ver importantíssimo, é que o 
educador deve, em sua prática, despertar a curiosidade no educando, e por isso o conteúdo 
não pode ser algo pronto, fechado, acabado, nem pode dispensar a vivência do educando 
como ser sócio-politico-cultural. O conteúdo, a metodologia, a forma de avaliação, devem 
estimular, provocar o educando para que ele se torne realmente desejosode conhecer, de 
24 
 
aprender. Caso contrário, ele esquecerá o que aprendeu em pouco tempo. Uma vez instigada a 
sua curiosidade, a busca pelo conhecimento é uma conseqüência inevitável e rápida, 
considerando a curiosidade como algo intrínseco a essência humana. No dizer de Freire: 
 
 
Como professor devo saber que sem a curiosidade que me move, que me inquieta, 
que me insere na busca, não aprendo nem ensino... Com a curiosidade domesticada 
posso alcançar a memorização mecânica do perfil deste ou daquele objeto. 
(FREIRE, 1996, p. 85) 
 
 
E ainda: 
 
 
O exercício da curiosidade convoca a imaginação, a intuição, as emoções, a 
capacidade de conjecturar, de comparar, na busca da perfilização do objeto ou do 
achado de sua razão de ser... Satisfeita a minha curiosidade, a capacidade de 
inquietar-me e buscar continua de pé. Não haveria existência humana sem abertura 
de nosso ser ao mundo, sem a transitividade de nossa consciência. (FREIRE, 1996, 
p. 88) 
 
 
Nessa perspectiva, o verdadeiro educador não tem medo de perguntas, de 
questionamentos vindos dos educandos, muito pelo contrário, ele irá instigar o lado 
inquiridor, rebelde, crítico do educando, porque só assim o educando aprenderá ensinando e o 
educador terá condições de ensinar aprendendo. Como disse Freire (1996, p. 47), “quando 
entro em uma sala de aula devo estar sendo um ser aberto a indagações, à curiosidade, às 
perguntas dos alunos, a suas inibições; um ser crítico e inquiridor, inquieto em face da tarefa 
que tenho – a de ensinar e não a de transferir conhecimento”. O educando responde de 
maneira favorável, saindo de uma posição cômoda de receptor e arriscando-se frente ao 
conhecimento. Na pedagogia tradicional, percebe-se que essa premissa não é sequer apreciada 
quanto mais estimulada. Por conta da quantidade de conteúdo, do tempo disponível para 
“transferir” esse conteúdo, da didática aplicada, a última coisa que se pensa em sala de aula é 
a curiosidade do aluno. Não há espaço para “presença de educadores e de educandos 
criadores, instigadores, inquietos, rigorosamente curiosos, humildes e persistentes” (FREIRE, 
1996, p. 26). 
Outro aspecto interessante da pedagogia de Paulo Freire é a humildade que deve 
permear o discurso e a prática do educador. Humildade no sentido de perceber o outro como 
igual, de lidar com a diversidade do ser humano como algo enriquecedor e não ameaçador, de 
respeitar os educandos na suas escolhas e na sua cultura. Se não for assim, o diálogo em sala 
25 
 
de aula torna-se impossível, ou torna-se superficial, e não algo natural e imprescindível para 
que o processo de ensino-aprendizagem aconteça. O educador precisa ter humildade para 
escutar o seu aluno de maneira verdadeira, entendendo que ele tem vivências diferentes que 
irão agregar ao aprendizado. Como disse Paulo Freire: 
 
 
Se a estrutura do meu pensamento é a única certa, irrepreensível, não posso escutar 
quem pensa e elabora seu discurso de outra maneira que não a minha. Nem 
tampouco escuto quem fala ou escreve fora dos padrões da gramática dominante. E 
como estar aberto às formas de ser, de pensar, de valorar, consideradas por nós 
demasiado estranhas e exóticas de outra cultura? [...] A humildade exprime, pelo 
contrário, uma das raras certezas de que estou certo: a de que ninguém é superior a 
ninguém. A falta de humildade, expressa na arrogância e na falsa superioridade de 
uma pessoa sobre a outra, de uma raça sobre a outra, de um gênero sobre o outro, de 
uma classe ou de uma cultura sobre a outra, é uma transgressão da vocação humana 
do ser mais. (FREIRE, 1996, p. 121) 
 
 
No modelo escolar tradicional não se pratica de forma genuína nem se estimula o 
desenvolvimento deste sentimento nas relações professor-aluno. Isso é visto na disposição 
estrutural da sala de aula, na escolha do currículo, na metodologia utilizada, e principalmente 
na ideologia que atravessa os conteúdos. O aluno não é realmente escutado, não é „trazido‟ 
para dentro do conteúdo, não é respeitado enquanto um ser único que traz consigo uma 
diversidade cultural enorme que deve ser aproveitada dentro de sala de aula. 
Paulo Freire, em suas análises, traça um paralelo sobre alguns pontos que a educação 
tradicional entende como antagônicos. Ele analisa como a afetividade e o rigor, a autoridade e 
a liberdade podem e devem conviver amigavelmente nas práticas educacionais. A afetividade 
na perspectiva freireana não é o extremo oposto da seriedade, nem a alegria oposta ao rigor, 
quando se fala de educação nos diversos espaços onde ela exista. O educador deve 
desenvolver uma relação de afetividade, amorosidade e alegria enquanto ensina, pois quanto 
mais amoroso for, mais condição terá de ser rigoroso, exigente e firme com os alunos. Uma 
coisa não contradiz a outra! Mas atualmente percebe-se uma dicotomia a esse respeito na 
relação professor-aluno, em que são exaltados professores mais exigentes e autoritários, mas 
pouco afetivos; ou professores dúbios, que são falsamente amorosos e também pouco 
rigorosos. Da mesma forma, a autoridade deve conviver bem com a liberdade, e o bom 
educador sabe dosar essas duas práticas. Segundo Freire: 
 
 
Na verdade, preciso descartar como falsa a separação radical entre seriedade docente 
e afetividade. Não é certo, sobretudo do ponto de vista democrático, que serei tão 
melhor professor quanto mais severo, mais frio, mais distante e “cinzento” me ponha 
26 
 
nas minhas relações com os alunos, no trato dos objetos cognoscíveis que devo 
ensinar. A afetividade não se acha excluída da cognoscibilidade. O que não posso 
obviamente permitir é que minha afetividade interfira no cumprimento ético de meu 
dever de professor no exercício de minha autoridade. (FREIRE, 1996, p. 141) 
 
 
Outro aspecto importante abordado por Freire é a ética. E essa questão é algo mais 
profundo do que simples valores morais. No fragmento abaixo, ele refere-se a “princípios 
fundamentalmente éticos da nossa existência”. A ética infelizmente tem sido pouco valorizada 
na nossa sociedade, e consequentemente na escola. Como a escola tem sido tratada como uma 
empresa (que de fato ela é), o procedimento cobrado e elogiado por parte dos docentes e 
direção escolar, muitas vezes, não é tão ético, porque tem prevalecido o lucro que o aluno 
proporciona e não a formação deste. Por conta disso, aprovam-se alunos que não atingiram 
um bom nível de aprendizagem, que possuem distúrbios de aprendizagem que não foram 
tratados e comprometeram a aprendizagem, que tiveram péssimo comportamento durante o 
ano. A ética passa também pela relação de respeito à vivência e esforço do aluno por parte do 
professor. O bom educador é aquele que não negocia com a formação de seu aluno, e que por 
isso compromete-se em ensinar respeitando a cultura, a experiência, a liberdade e a 
curiosidade do aluno. 
 
 
O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua 
inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o 
professor que ironiza o aluno, que o minimiza, que manda que “ele se ponha em seu 
lugar” ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, tanto quanto o professor que se 
exime do cumprimento de seu dever de propor limites à liberdade do aluno, que se 
furta ao dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora 
do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos da nossa existência 
(FREIRE, 1996, p. 59, 60) 
 
 
Podemos destacar ainda como um pressuposto da pedagogia de Paulo Freire, a 
importância do educador escutar o educando, como única forma legítima de se relacionar com 
o mesmo, valorizandoa sua fala e suas expectativas diante do mundo. 
 
 
Se na verdade, o sonho que nos anima é democrático e solidário, não é falando aos 
outros, de cima para baixo, sobretudo, como se fôssemos os portadores da verdade a 
ser transmitida aos demais, que aprendemos a escutar, mas é escutando que 
aprendemos a falar com eles. Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, 
fala com ele, mesmo que, em certas condições, precise de falar a ele. (FREIRE, 
1996, p. 113) 
 
 
27 
 
Freire entendeu que tanto o educador como o educando tem algo a dizer e por isso os 
dois têm sempre algo a escutar. E que a formação do ser humano acontece através de um 
permanente diálogo, onde um fala e outro ouve, e assim consecutivamente. E essa relação só é 
possível se houver humildade das duas partes, e entendimento de que, como já foi dito, o 
educando aprende ensinando e o educador ensina aprendendo. 
 
2.2. PEDAGOGIA ANTI-DIALÓGICA OU BANCÁRIA 
 
O conceito de pedagogia, que em sua origem tem um significado diferente do que é 
compreendido atualmente, é definido da seguinte forma: 
 
 
Em grego antigo paidós significa “criança” e agodé indica “condução”, aglutinadas e 
adaptadas ao português elas nos dão a palavra pedagogia. Na Grécia Antiga o 
paidagogo era o condutor da criança. [...] Ao notarmos a origem da palavra 
pedagogia, o que importa é ver que ela guarda, ainda hoje, algo do significado 
utilizado no mundo grego antigo. Quando usamos a palavra pedagogia não estamos 
nos referindo propriamente ao conteúdo do que é ensinado, mas aos meios de 
ensino, aos procedimentos para que alguém tenha acesso a um determinado 
conhecimento de modo a aproveitá-lo da melhor maneira possível. 
(GHIRALDELLI, 2007, p. 10, 11) 
 
 
Este conceito nos remete a uma das formas de condução ao conhecimento, bastante 
questionada por Paulo Freire, que ele chama de anti-dialógica ou bancária. Segundo ele, a 
pedagogia anti-dialógica é passivadora e não reflexiva, determinista e não revolucionária. É 
anti-dialógica porque não se baseia nem valoriza o diálogo como única forma de educar, de 
levar o educando ao conhecimento. Analisando a etimologia da palavra, diálogo quer dizer 
palavra dividida, partilhada entre duas ou mais pessoas. A pedagogia escolar atual não tem 
feito uso do diálogo para formar os educandos. Como disse Paulo Freire (2011, p. 79), “as 
relações educador-educandos, na escola, em qualquer de seus níveis (ou fora dela)... 
apresentam um caráter especial e marcante – o de serem relações fundamentalmente 
narradoras, dissertadoras”. Nessa relação narradora, dissertadora, existe o educador que atua 
como o narrador e os educandos como meros ouvintes, e essas posições nunca são 
convertidas. 
A pedagogia anti-dialógica entende a realidade como algo estagnado, imutável, e a 
relação entre os seres humanos e destes com o mundo não é dialética, mas é estável e linear. 
28 
 
Desta maneira, a pedagogia anti-dialógica não poupará esforços para manter o status quo nas 
práticas educacionais, já que o mundo e os homens que nele vivem não apresentam mudanças 
significativas. E para isso utiliza-se de conteúdos que não dizem respeito à vivência do aluno, 
como algo que ele não sabe e por isso precisa „aprender‟. Freire irá questionar essa prática 
extremamente usual que precisa ser revista, analisada: falar da realidade como algo parado, 
estático, compartimentado e bem-comportado, quando não falar ou dissertar sobre algo 
completamente alheio à experiência existencial dos educandos, vem sendo, realmente, a 
suprema inquietação dessa educação (2011, p. 79). Outro aspecto da pedagogia anti-dialógica 
é o seu caráter bancário, expressão bastante utilizada por Freire. A pedagogia bancária 
entende o educador como detentor do conhecimento que é fechado e estagnado, e o educando 
como depositário deste conhecimento, e que por isso deve ouvir e acolher passivamente o 
conteúdo „depositado‟. Como disse Paulo Freire: 
 
 
Nela, o educador aparece como seu indiscutível agente, como seu real sujeito, cuja 
tarefa indeclinável é “encher” os educandos dos conteúdos de sua narração. [...] A 
narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização 
mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em “vasilhas”, 
em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo” os 
recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se 
deixem docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão. (FREIRE, 2011, p. 
80) 
 
 
Na educação bancária “o „saber‟ é uma doação dos que se julgam sábios aos que 
julgam nada saber” (FREIRE, 2011, 81). Ela não visa à transformação, a mudança das 
consciências e da realidade vigente, não prima pela construção do conhecimento genuíno. 
Muito pelo contrário, os educandos são controlados no seu pensar e agir, e sendo por isso 
oprimidos de maneira necrófila. Isso é ratificado na seguinte fala de Freire: 
 
 
A opressão, que é um controle esmagador, é necrófila. Nutre-se do amor à morte e 
não do amor à vida. A concepção “bancária”, que a ela serve, também o é. No 
momento em que se funda num conceito mecânico, estático, espacializado da 
consciência e em que transforma, por isso mesmo, os educandos em recipientes, em 
quase coisas, não pode esconder sua marca necrófila. Não se deixa mover pelo 
ânimo de libertar o pensamento pela ação dos homens uns com outros na tarefa 
comum de refazerem o mundo e de torná-lo mais e mais humano. (FREIRE, 2011, p. 
91) 
 
 
O que se pretende na pedagogia anti-dialógica é a adaptação dos educandos à 
realidade na qual vivem, sem nenhum tipo de questionamento, crítica, ato rebelde ou contrário 
29 
 
à classe hegemônica, que é opressora. É por isso “que ao educador não cabe nenhum outro 
papel que não o de disciplinar a entrada do mundo nos educandos” (FREIRE, 2011, p. 88). 
Nessa perspectiva, Freire comenta: 
 
 
E porque os homens, nesta visão, ao receberem o mundo que neles entra, já são seres 
passivos, cabe à educação apassivá-los mais ainda e adaptá-los ao mundo. Quanto 
mais adaptados, para a concepção bancária, tanto mais educados, porque adequados 
ao mundo. Esta é uma concepção que, implicando uma prática, somente pode 
interessar aos opressores, que estarão tão mais em paz, quanto mais adequados 
estejam os homens ao mundo. E tão mais preocupados, quanto mais questionando o 
mundo estejam os homens. (FREIRE, 2011, p. 88) 
 
 
Por conta disso, os opressores têm que controlar de forma minuciosa e veemente o 
pensar dos oprimidos, com o objetivo de conhecer cada vez mais as expectativas e maneira de 
pensar deles, e poder oprimi-los mais. A pedagogia anti-dialógica não estimulará no educando 
o verdadeiro pensar, mas irá controlar o pensamento deste para evitar qualquer tipo de 
conscientização e mudança. Nas palavras de Freire: 
 
 
Nas aulas verbalistas, nos métodos de avaliação dos “conhecimentos”, no chamado 
“controle de leitura”, na distância entre o educador e os educandos, nos critérios de 
promoção, na indicação bibliográfica, em tudo, há sempre a conotação “digestiva” e 
a proibição ao pensar verdadeiro. (FREIRE, 2011, p. 89) 
 
 
Segundo Freire, a pedagogia anti-dialógica possui quatro características básicas de 
atuação. Uma delas é a conquista do oprimido pelo opressor, “cada vez mais, através de mil 
formas. Das mais duras às mais sutis. Das mais repressivas às mais adocicadas, como o 
paternalismo” (FREIRE, 2011, 186). E a classe opressora se utilizará de muitos „mitos‟ para 
convencer os oprimidos do seu valor e potencial, quando na verdade não darão espaço para 
que os oprimidos vençam na vida. Esses mitos irão tambémjustificar o agir das elites 
dominadoras, colocando-os como “as promotoras do povo, devendo este, num gesto de 
gratidão, aceitar a sua palavra e conformar-se com ela” (FREIRE, 2011, p. 189). Seguem 
alguns desses mitos tão veiculados em nossa sociedade: 
 
 
O mito do direito de todos à educação, quando o número de brasileiros que chegam 
às escolas primárias do país e o dos que nelas conseguem permanecer é 
chocantemente irrisório. O mito da igualdade de classe, quando o “sabe com quem 
está falando?” é ainda uma pergunta dos nossos dias. O mito do heroísmo das 
classes opressoras, como mantenedoras da ordem que encarna a “civilização 
ocidental e cristã”, que eles defendem da “barbárie materialista”. (FREIRE, 2011, p. 
188) 
30 
 
 
 
Outra característica da teoria da ação anti-dialógica é a divisão da classe oprimida para 
manter a opressão. A classe opressora é sempre contrária a qualquer tipo de união, de 
agregamento organizado, de movimento coletivo da classe oprimida, posto que são uma 
ameaça na medida em que os oprimidos param e pensam sobre sua realidade, com o objetivo 
de agir para mudar. Essa atitude ficou muito clara durante a ditadura militar no Brasil, em que 
toda e qualquer reunião de estudantes ou profissionais foi proibida veementemente. Freire 
(2011, p. 190) expressa essa realidade quando diz: “O que interessa ao poder opressor é 
enfraquecer os oprimidos mais do que já estão, ilhando-os, criando e aprofundando cisões 
entre eles, através de uma gama variada de métodos e processos”. 
A teoria anti-dialógica possui, ainda, outra característica que é a manipulação com o 
mesmo objetivo de fazer com que a classe oprimida se adapte a realidade e não questione as 
suas contradições. E para isso a classe opressora fará alguns pactos com a classe oprimida, 
através de governos e líderes populistas. Como disse Freire (2011, p. 199): 
 
 
A manipulação aparece como uma necessidade imperiosa das elites dominadoras, 
com o fim de, através dela, conseguir um tipo inautêntico de “organização”, com 
que evite o seu contrário, que é a verdadeira organização das massas populares 
emersas e emergindo. (FREIRE, 2011, p. 199) 
 
 
E a última característica da pedagogia anti-dialógica, analisada por Freire foi a invasão 
cultural. 
 
 
Como não há nada que não tenha seu contrário, na medida em que os invadidos vão 
reconhecendo-se “inferiores” necessariamente irão reconhecendo a “superioridade” 
dos invasores. Os valores destes passam a ser a pauta dos invadidos. Quanto mais se 
acentua a invasão, alienando o ser da cultura e o ser dos invadidos, mais estes 
quererão parecer com aqueles: andar como aqueles, vestir à sua maneira, falar a seu 
modo (FREIRE, 2011, p. 206-207) 
 
 
A invasão cultural pode ser explícita ou velada, e se utiliza de diversos meios de 
comunicação, com o intuito de “anestesiar as massas populares para que não pensem”, mas 
sejam pelos opressores dominados. 
 
2.3. PEDAGOGIA DIALÓGICA 
31 
 
 
A pedagogia de Paulo Freire se baseia na dialogicidade, na palavra dividida, trocada, 
comungada entre os seres humanos. Na sua visão, não há possibilidade de educação sem 
diálogo, sem que os homens falem sobre suas vivências construídas diariamente, suas 
reflexões feitas sobre mundo. Por isso educação é um processo sócio-político-cultural, que 
considera as relações sociais que acontecem num determinado espaço e tempo. Dessa forma, 
não pode ser estática, imutável, e verticalizada, mas a educação se constrói de maneira 
dinâmica e dialética, em que educador e educando falam e são ouvidos o tempo todo. Para 
Freire (2011), “o diálogo é este encontro dos homens, mediatizados pelo mundo, para 
pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação eu-tu”. Ou seja, dialogar, “dizer a sua 
palavra” é algo inerente ao processo pedagógico, que visa à transformação do mundo, e não 
simplesmente à conversa entre pessoas que aprendem. Segundo Paulo Freire, o diálogo, a 
palavra, possui duas dimensões, ação e reflexão, e entende que uma não prescinde a outra, 
mas ao contrário, elas se complementam. 
 
 
Assim é que, esgotada a palavra de sua dimensão de ação, sacrificada, 
automaticamente, a reflexão também, se transforma em palavreria, verbalismo, blá-
blá-blá. Por tudo isso, alienada e alienante. É uma palavra oca, da qual não se pode 
esperar a denúncia do mundo, pois que não há denúncia verdadeira sem 
compromisso de transformação, nem este sem ação. Se pelo contrário, se enfatiza ou 
exclusiviza a ação, com o sacrifício da reflexão, a palavra se converte em ativismo. 
Este, que é ação pela ação, ao minimizar a reflexão, nega também a práxis 
verdadeira e impossibilita o diálogo. (FREIRE, 2011, p. 108) 
 
 
Paulo Freire defenderá a ideia de que o diálogo genuíno no processo pedagógico só 
será possível se for desenvolvido junto com outras práticas humanizantes, como a humildade, 
esperança, pensamento crítico, confiança, amor, sentimentos que devem embasar a relação 
educador-educando. 
Conforme disse Paulo Freire, “sendo fundamento do diálogo, o amor é, também 
diálogo”. Para ele, o diálogo é um ato de amor que não é piegas nem tão pouco manipulador. 
E isto porque não existe diálogo verdadeiro sem amor, que é um ato de encontro e 
compromisso com o outro. No dia a dia da escola, o diálogo amoroso deve desembocar numa 
atitude transformadora tanto do educando como do educador, mudança que atinja a vida deles 
e de seu entorno. A educação precisa ter esse viés transformador que acontece através do 
diálogo amoroso. 
 
32 
 
 
Porque é um ato de coragem, nunca de medo, o amor é compromisso com os 
homens. Onde quer que estejam estes, oprimidos, o ato de amor está em 
comprometer-se com sua causa. A causa de sua libertação. Mas este compromisso, 
porque é amoroso, é dialógico. [...] Se não amo o mundo, se não amo a vida, se não 
amo os homens, não me é possível o diálogo. (FREIRE, 2011, p. 111) 
 
 
Outro ponto importante é a humildade, algo que quem deseja se envolver no processo 
educativo, precisa possuir. Como disse Freire, “a pronúncia do mundo, com que os homens o 
recreiam permanentemente, não pode ser um ato arrogante”. É necessário ver o outro como 
um ser que está no mesmo patamar de conhecimento vivenciado, de qualidades, de 
virtuosidades, de sabedoria. Se o educador vê o educando de forma diferente, e o subestima, o 
inferioriza, não o valoriza, não conseguirá dialogar verdadeiramente com ele, não conseguirá 
sequer se aproximar dele. A auto-suficiência precisa ser abolida para que haja verdadeira 
formação educacional. Vejam os questionamentos de Freire: 
 
 
Como posso dialogar, se me admito como um homem diferente, virtuoso por 
herança, diante dos outros, meros “isto”, em quem não reconheço outros eu? Como 
posso dialogar, se me sinto participante de um gueto de homens puros, donos da 
verdade e do saber, para quem todos os estão fora são “essa gente”, ou são “nativos 
inferiores”? Como posso dialogar, se parto de que a pronúncia do mundo é tarefa de 
homens seletos e que a presença das massas na história é sinal de sua deteriorização 
que devo evitar? (FREIRE, 2011, p. 111) 
 
 
E ainda: 
 
 
Se alguém não é capaz de sentir-se e saber-se tão homem quanto os outros, é que lhe 
falta ainda muito que caminhar, para chegar ao lugar de encontro com eles. Neste 
lugar de encontro, não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos: há homens 
que, em comunhão, buscam saber mais. (FREIRE, 2011, p. 112) 
 
 
O diálogo preconizado por Paulo Freire deve ter sua base na fé e esperança no ser 
humano. A fé é no sentido de crença no poder criativo, transformador, inquietador dos 
homens, e que deveestar presente antes mesmo de haver diálogo. Segundo Paulo Freire, a fé 
nos seres humanos deve gerar sua libertação, considerando que parte da sociedade está sendo 
oprimida e alienada de seus direitos básicos. Nesta perspectiva, o educador deve conscientizar 
o educando sobre seu poder transformador, e para isso acreditar que ele o possui, desde a 
educação infantil até os últimos anos de vida acadêmica do educando. 
 
 
33 
 
Não há também diálogo se não há uma imensa fé nos homens. Fé no seu poder de 
fazer e refazer. De criar e recriar. Fé na sua vocação de ser mais, que não é 
privilégio de alguns eleitos, mas direito dos homens. [...] Está convencido de que 
este poder de fazer e transformar, mesmo que negado em situações concretas, tende 
a renascer. Pode renascer. Pode constituir-se. Não gratuitamente, mas na e pela luta 
por sua libertação. (FREIRE, 2011, p. 112-113) 
 
 
É importante perceber que se o educador não acreditar que o educando possui esse 
poder transformador, criador, essa vocação de ser mais, tampouco o educando que está sendo 
formado acreditará. E como disse Paulo Freire, o educador deve acreditar que esse poder 
transformador do educando renasce no meio de situações adversas, em sua luta pela 
libertação. Não é algo pronto, mas que se constitui, se constrói nesse processo de luta. 
E a esperança também precisa estar presente no diálogo. Como disse Paulo Freire 
(2011), “se o diálogo é o encontro dos homens para ser mais, não pode fazer-se na 
desesperança. Se os sujeitos do diálogo nada esperam do seu quefazer, já não pode haver 
diálogo. O seu encontro é vazio e estéril. É burocrático e fastidioso”. 
O diálogo genuíno gera confiança que é um sentimento que deve sempre permear a 
relação entre educandos e educador. A confiança, segundo Freire, vai sendo gerada e 
construída na medida em que se desenvolve o amor, a fé, a humildade na relação dialógica. Se 
a confiança não se instaura ou se quebra no „meio do caminho‟, é sinal de que os sentimentos 
citados anteriormente foram mal trabalhados ou inexistiam na relação educador-educando. 
Como disse Freire: 
 
 
Um falso amor, uma falsa humildade, uma debilitada fé nos homens não pode gerar 
confiança. A confiança implica o testemunho que um sujeito dá aos outros de suas 
reais e concretas intenções. Não pode existir, se a palavra, descaracterizada, não 
coincide com os atos. Dizer uma coisa e fazer outra, não levando a palavra a sério, 
não pode ser estímulo à confiança. (FREIRE, 2011, p. 113) 
 
 
Por fim, o diálogo objetiva o desenvolvimento do pensamento crítico, do pensamento 
não ingênuo da realidade. Nesse sentido, devemos considerar a relação linguagem-
pensamento, onde o homem dialoga consigo mesmo no momento em que pensa, e dialoga 
com o mundo, quando fala, não de maneira estanque mas simultânea e relacionada. E por isso 
Freire entende que é possível desenvolver essa criticidade do pensamento através do diálogo 
crítico, reflexivo entre educador e educando. Segundo Freire: 
 
 
34 
 
Finalmente, não há diálogo verdadeiro se não há nos seus sujeitos um pensar 
verdadeiro. Pensar crítico. Pensar que, não aceitando a dicotomia mundo-homens, 
reconhece entre eles uma inquebrantável solidariedade. Este é um pensar que 
percebe a realidade como processo, que a capta em constante devenir e não como 
algo estático. Não se dicotomiza a si mesmo na ação. “Banha-se” permanentemente 
de temporalidade cujos riscos não teme. (FREIRE, 2011, p. 114) 
 
 
O educador que reconhece a realidade como algo mutável, não estático, opressor, não 
humanizante, que precisa ser mudado, alterado, trans-formado, irá desenvolver durante suas 
atividades teóricas e práticas o pensamento analítico-crítico sobre a sociedade nos seus 
educandos. O diálogo, neste sentido, é problematizador, é conscientizador, é libertador! 
35 
 
3. PRESSUPOSTOS POLÍTICO-IDEOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO DE PAULO 
FREIRE 
 
Todo ato pedagógico é um ato político, segundo Paulo Freire. Essa premissa é 
marcante em sua pedagogia, pois ele entende que não há como dissociar a educação da 
política; estão intrinsecamente ligadas. Ou seja, as práticas educacionais em nenhum 
momento são neutras, mas sempre produzirão efeitos e consequências na vida do educando, 
do educador e na sociedade na qual estão inseridos. No dizer de Zitkoski: 
 
 
Para Freire a educação nunca poderá ser neutra politicamente. Todo e qualquer 
projeto pedagógico, ou proposta de educação, e todo e qualquer ato educativo é, 
fundamentalmente, uma ação política. Ou seja, o educador, ao definir uma 
determinada metodologia de trabalho, planeja, decide e produz determinados 
resultados formativo-educacionais que têm conseqüências na vida dos educandos e 
na sociedade onde educador e educandos se encontram. (ZITKOSKI, 2006, p.51) 
 
 
Não há neutralidade político-ideológica na teoria e prática do educador, mas ele 
sempre se mostrará a favor de quem e contra quem está atuando, se a favor da classe 
dominante ou da classe dominada. Conforme disse Freire: 
 
 
É nesse sentido também que, tanto no caso do processo educativo quanto no do ato 
político, uma das questões fundamentais seja a clareza em torno de a favor de que e 
do quê, portanto contra quem e contra o quê, fazemos a educação e de a favor de que 
e do quê, portanto contra quem e contra o quê, desenvolvemos a atividade política. 
Quanto mais ganhamos esta clareza através da prática, tanto mais percebemos a 
impossibilidade de separar o inseparável: a educação da política. (FREIRE, 1987, 
p.27) 
 
 
As questões ideológicas estarão presentes no currículo, na metodologia, nas formas de 
avaliação, no rigor didático, no plano de aula, enfim, em todas as práticas educacionais 
seguidas pela equipe pedagógica. Essas práticas estarão embasadas na ideologia da educação 
bancária, opressora por excelência, neoliberal; ou na ideologia da educação problematizadora, 
que pretende conscientizar e libertar o ser humano para transformar a sociedade na qual vive. 
 
3.1. A REALIDADE SOCIAL VIGENTE E O PAPEL DA EDUCAÇÃO 
 
36 
 
Segundo Paulo Freire, a sociedade se encontra dividida em duas classes bem definidas 
e antagônicas: uma formada por oprimidos e outra por opressores. Esta leitura de mundo 
baseia-se na filosofia marxista e nas práticas observadas por Freire no Brasil e em outros 
paises. Ideologicamente, a classe opressora é aquela que detém os meios de produção e o 
capital, e a classe oprimida é formada por aqueles que vendem a força de produção, o seu 
trabalho, em troca de um salário. Daí dizer que a classe opressora é a dominante e a classe 
oprimida é a dominada. Freire irá aprofundar estes conceitos, trazendo questões que estão 
implícitas nas relações sociais como, desumanização, perda dos direitos humanos, medo da 
liberdade existencial, injustiça social, entre outros, e abordará como a educação tem um papel 
crucial na libertação tanto do oprimido quanto do opressor, na medida em que denuncia, 
conscientiza e abre caminhos para a transformação da sociedade vigente. Paulo Freire 
chamará de pedagogia do oprimido: 
 
 
Aquela que tem de ser forjada com ele e para ele, enquanto homens ou povos, na 
luta incessante de recuperação de sua humanidade. Pedagogia que faça da opressão e 
de suas causas objeto da reflexão dos oprimidos, de que resultará o seu engajamento 
necessário na luta por sua libertação, em que esta pedagogia se fará e refará. 
(FREIRE, 2011, p.43) 
 
 
Segundo Paulo Freire o oprimido introjeta, “hospeda” o opressor dentro de si, vivendo 
uma dualidade existencial. Enquanto não tem consciência dessa dualidade, não pode lutar 
contra isso, e se libertar.

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