Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Capítulo 15 Câncer de Fígado (Carcinoma Hepatocelular) MA N UA I S D E CO N D U TA S | 279 Editora: Dra. Anelisa Kruschewsky Coutinho Autores: Dra. Anelisa Kruschewsky Coutinho, Dr. Paulo Marcelo Gehm Hoff, Dr. Frederico Perego Costa, Dr. Roberto de Almeida Gil, Dr. Jorge Sabbaga, Dr. Fábio Marinho, Dr. Paulo Herman, Dr. Jorge Bastos, Dr. André Oliveira e Dr. Marcos Menezes 280 | MA N UA I S D E CO N D U TA S Capítulo 15 Câncer de Fígado (Carcinoma Hepatocelular) MA N UA I S D E CO N D U TA S | 281 15.1. Introdução O carcinoma hepatocelular (CHC) é a 5ª neoplasia em incidência no mundo e a 3ª em mortalidade1. Em 80 a 90% dos casos advém como complicação da cirrose hepática, o que se configura importante particularidade na abordagem terapêutica deste tumor. Sua incidência é crescente no mundo ocidental2 e se verifica, principalmente, pela cirrotização relacionada à infecção crônica pelos vírus da hepatite C (VHC), ao abuso do etanol e à esteatohepatite não alcoólica (do inglês non-alcoholic steatohepatitis ou NASH). Esta última encontra-se diretamente relacionada à síndrome metabólica, ao sobrepeso/obesidade, ao diabetesmellitus, às dislipidemias, entre outros fatores3. Na região asiática e africana subsaariana, há maior prevalência de infecção crônica por vírus da hepatite B (VHB), que per se apresenta propriedade oncogênica, podendo contribuir para o desenvolvimento de CHC mesmo na ausência de cirrose hepática. Há várias modalidades terapêuticas atualmente disponíveis para o tratamento do CHC e o tratamento deve ser multidisciplinar. Vários parâmetros devem ser levados em consideração antes de se iniciar tratamento desta doença, tais como extensão tumoral e a gravidade da doença hepática de base, como veremos mais adiante. O diagnóstico precoce do CHC favorece o prognóstico, com melhores resultados do tratamento, e por este motivo recomenda-se rastreamento de pacientes portadores de cirrose hepática de maneira sistemática, com efetiva redução de mortalidade no grupo submetido a esta medida4. 15.2. Classificações e sistemas de estadiamento Há vários sistemas de estadiamento e classificação do CHC atualmente em utilização (calcula- se em torno de 18). Por ser uma condição heterogênea, com múltiplos fatores confundidores, a avaliação destes pacientes pode ser bastante complexa. Devem ser levadas em consideração as características tumorais, a presença de sintomas e de comorbidades, além da avaliação da função hepática remanescente neste paciente. A classificação para avaliação de função hepática mais utilizada é a de Child-Turcotte desde 19645 e modificada por Pugh em 19736 (Classificação CPT). A Tabela 1mostra os parâmetros avaliados e sua significação em termos de prognóstico. A Tabela 2 nos mostra dados de sobrevida de acordo com os estágios da classificação CPT Tabela 1 Critério Bilirrubina total (mg/dL) Albumina sérica (g/dL) RNI Ascite Encefalopatia Hepática 1 ponto <2 >3,5 <1,7 Nenhuma Nenhuma 2 pontos 2-3 2,8-3,5 1,71-2,20 Leve Grau I-II (ou suprimida c/ medicação) 3 pontos >3 <2,8 >2,20 Severa Grau III-IV 282 | MA N UA I S D E CO N D U TA S Quando se analisa, por outro lado, as características relacionadas ao tumor, alguns modelos de estadiamento foram propostos, entre eles a famosa classificação de Okuda7, proposta em 1985. Este modelo leva em consideração a massa tumoral (maior ou menor que 50% do fígado) e algumas características do paciente relacionadas à função hepática, tais como nível de albumina sérica, presença de ascite e do nível de bilirrubina. A classificação TNM, usualmente adotada para outros tumores sólidos não parece suficiente para o estadiamento do paciente com CHC, pois não leva em consideração a função hepática, mesmo em sua versão mais recente, a sétima, de 2009. Há considerações particulares de avaliação do paciente com CHC e cirrose que a tornam mais difícil de ser utilizada, como a presença de linfonodomegalia na região perihilar, achado frequente na cirrose, mas que pode ser confundida com invasão regional do tumor, alterando, assim, o real estadiamento do tumor. Outras classificações tem sido propostas, como a italiana (Cancer of the Liver Italian Program [CLIP]), a chinesa (Chinese University Prognostic Index [CUPI]), a francesa (Grupe d´Etudeet de Traitement du Carcinome Hépatocellulaire [GRETCH], a japonesa (Japanese Integrated Staging [JIS]) e a espanhola (Barcelona Clinic Liver Cancer [BCLC]) 8 (figura 1). Esta última foi recentemente endossada pelas sociedades europeia e americana para estudo do fígado (EASL, AASLD) e vem se tornando a classificação padrão no mundo ocidental. Foi proposta em 1999 e desenhada em forma de algoritmo a partir de dados obtidos de estudos metodologicamente bem desenhados com seguimentos de pacientes com CHCs ressecáveis e irressecáveis. Tem-se mostrado superior na predição prognóstica em relação à de Okuda, TNM, CLIP, GRETCH, CUPI e JIS. Outra vantagem desta classificação sobre as demais é a sua capacidade de elencar propostas terapêuticas para os diversos estádios de doença, também a partir de medicina baseada em evidências, sendo a única a apresentar esta característica. A classificação BCLC divide os pacientes em quatro categorias: A ou precoce, B ou intermediária, C ou avançada e D ou estágio final. São avaliados: estádio do tumor (número de nódulos, tamanho do(s) tumor(es) e presença de invasão de veia porta), função hepática (Classificação de Child-Pugh e presença de hipertensão portal), status físico funcional do paciente (Baseado no ECOG), e a presença de sintomas relacionados ao CHC. Os pacientes nos estádios precoces de doença, portanto, sujeitos a tratamentos curativos, apresentam sobrevida média em 5 anos de 70%. Os paciente dos estádios B e C apresentam sobrevida média de 6 a 16 meses, em média, enquanto os pacientes com classificação BCLC D teriam uma sobrevida média de apenas 3 meses. Na prática, utilizamos preferencialmente as classificações de BCLC e CPT. Há ainda outra ferramenta utilizada para o estadiamento de pacientes CHC e cirrose com finalidade de indicação de transplante de fígado, chamado de sistema MELD (Model for End-Stage Liver Disease). Trata-se de um modelo matemático disponível em vários sites ou programas para PDAs (por exemplo: http://www.mayoclinic.org/meld/mayomodel6.html). Esta ferramenta eletrônica, que tem a complexa fórmula de MELD = 0,957 x Log e (creatinina mg/dl)+ 0,378 x Log e (bilirrubina mg/dl) + 1,120 x Log e (INR) + 0,643 x 10 e arredondar para valor inteiro). Esta fórmula fornece um escore crescente de 1 a 40 para estratificar pacientes em estádios de gravidade crescente da doença hepática de base. O MELD foi inicialmente criado pela clínica Mayo para estabelecer prognóstico de 3 meses após inserção de shunt portossistêmico em cirróticos. Hoje, este modelo é utilizado em Tabela 2 Pontos 5-6 7-9 10-15 Classe A B C Sobrevida (1 ano) 100% 81% 45% Sobrevida (2 anos) 85% 57% 35% MA N UA I S D E CO N D U TA S | 283 vários países do mundo, incluindo o Brasil, para definição de gravidade de doença hepática e priorização dos receptores de fígado na fila de espera por um transplante. Os pacientes com CHC recebem pontos adicionais ao escore calculado primariamente, para evitar a remoção do paciente de lista por crescimento excessivo do tumor em decorrência de tempo de espera prolongado, diferente do que acontece aos outros pacientes cirróticos sem CHC. 15.3. Estadiamento No estadiamento do paciente com CHC deve-se incluir sempre a função hepática, para classificação de acordo com a proposição CPT (vista acima). Recomenda-se também a dosagem de alfa-fetoproteina (AFP) que, apesar de estar elevada em apenas 50-60% dos pacientes, pode estar diretamente relacionada a carga tumoral, além de ser um parâmetro de avaliação de resposta ao tratamento9. Sempre se deve diagnosticara doença de base, como, por exemplo, as hepatites virais. Neste sentido, a pesquisa do antígeno S da hepatite B (HBsAg) e do anticorpo da hepatite C (anti- HCV) são fundamentais. Outras doenças hepáticas crônicas devem também ser rastreadas a exemplo das doenças metabólicas como a esteatohepatite alcoólica ou não alcoólica. Por ser o CHC tumor intrinsecamente relacionado à cirrose, deve-se ainda avaliar a presença de hipertensão portal com a realização de endoscopia digestiva alta buscando identificação de varizes esôfagogástricas. Na avaliação por método de imagem prefere-se, quando possível, a realização de ressonância magnética com contraste (Gadolínio) ou a tomografia computadorizada com múltiplos detectores também com a utilização do contraste e com a análise das quatro fases (sem contraste, arterial, portal e de equilíbrio). A chave para um diagnóstico e estadiamento precisos está na dinâmica do contraste nos exames de imagem, que deve apresentar padrão típico, de captação arterial da lesão, com washout rápido. Outro método possível, porém menos utilizado, é a ultrassonografia contrastada. A utilização sistemática dos métodos de imagem para diagnóstico e estadiamento do CHC está configurada no chamado “Critério de Barcelona para diagnóstico” (Figura 2). FIGUrA 1 Classificação BCLC. RF (ablação por radiofrequência). TACE (quimioembolização transarterial). PS (Performance Status) 284 | MA N UA I S D E CO N D U TA S Na avaliação das metástases rotineiramente utiliza-se a tomografia computadorizada de tórax. A cintilografia óssea deve ser indicada na presença de sintomas ósseos ou se houver indicação para transplante de fígado. O PET-CT não é validado para estadiamento do CHC. 15.4. Prognóstico O prognóstico do CHC depende substancialmente do estádio que o paciente apresenta quando do diagnóstico. Os pacientes não-cirróticos submetidos a ressecção cirúrgica apresentam excelente prognóstico, enquanto que os pacientes com cirrose hepática, hipertensão portal, função hepática residual reduzida, grandes massas tumorais e estado geral comprometido têm uma sobrevida muito diminuída. O prognóstico dos tumores ressecáveis de fígado em paciente cirrótico (BCLC A sem hipertensão portal) é muito favorável, porém, a recorrência tumoral pode alcançar 70% em 5 anos, pela manutenção da cirrose hepática. O transplante de fígado mudou a história natural dos CHCs após a publicação dos critérios de Milão em 199610. Lá, estabeleceu-se que pacientes que apresentem um único nódulo de até 5cm de maior diâmetro ou até 3 nódulos com o maior apresentando até 3cm podem ser transplantados. A sobrevida média destes pacientes em 5 anos é de cerca de 70%, número igual ao obtido nos transplantados por outras etiologias não neoplásicas. O prognóstico de CHCs intermediários e avançados não tratados foi avaliado numa recente meta-análise11 que observou pacientes que haviam sido alocados em grupos-placebo de ensaios clínicos. Verificou-se que a sobrevida em 1 ano foi de 17,5% e em dois anos de 7,3%, ratificando o péssimo prognóstico desses grupos. Além da AFP, são fatores prognósticos classificação CLIP, trombose portal, volume tumoral e grau de função hepática através do Child-Pugh. Figura 2 - Critério de Barcelona para diagnóstico de CHC 1) Critério Histológico 2) Critério Não Invasivo: RADIOLÓGICO: Duas Técnicas de imagem coincidentes - (USG / TC Helicoidal / RNM / Angiografia) mostrando lesão focal <2,0cm com hipercaptação do contraste na fase arterial COMBINADO: Uma técnica de imagem mostrando lesão focal > 2,0 cm + AFP > 400ng/ml Tabela 3 Check-List de Estadiamento CHC recomendado Hemograma com plaquetas Provas de Função Hepática (Child-Pugh-Turcotte) Provas de função renal Alfa-fetoproteína Sorologias Virais: hepatite B e C RM ou TC de abdome com contraste Endoscopia Digestiva Alta TC de tórax Cintilografia Óssea (sempre em candidatos a transplante) MA N UA I S D E CO N D U TA S | 285 15.5. Tratamento Cirúrgico Os programas de rastreamento do CHC com o uso rotineiro da ultrassonografia são amplamente empregados em pacientes considerados de risco, resultando em aumento da detecção de tumores em fase precoce, onde o tratamento pode ser curativo. Duas variáveis devem ser consideradas no momento da indicação cirúrgica para o tratamento do CHC: o estadiamento do tumor e da doença hepática de base. Apenas 5% a 10% dos carcinomas hepatocelulares desenvolvem-se em fígados não cirróticos ou apenas com fibrose 12,13. O transplante de fígado (TF) é a melhor opção teórica de tratamento do CHC, pois pode propiciar cura tanto do tumor quanto da doença hepática subjacente (cirrose), mas esta modalidade é limitada pela pequena disponibilidade de enxertos. Em um contexto de escassez de órgãos e altas taxas de recidiva tumoral, critérios restritivos foram adotados para alocação de órgãos de doadores falecidos para pacientes com CHC. Na maioria dos países, como no Brasil , para esta finalidade adota-se os critérios de Milão (Tabela 4). No entanto, o tempo de espera para órgãos tem aumentado significativamente a um ponto onde a progressão do tumor leva a perda da indicação do transplante 14,15. A utilização do score MELD é mandatória para determinar a pontuação como critério de urgência para posicionamento na fila para obtenção de órgão para TF. Tabela 4 - Critérios para indicação de transplante de fígado Critérios de Milão - nódulo único de até 5cm - até 3 nódulos, de até 3cm Portador de doença hepática crônica Ausência de metástases a distância utilizando estadiamento obrigatório com cintilografia óssea e TC tórax A ressecção hepática (RH) foi o tratamento de escolha por muitos anos, mas era limitada pelas altas taxas de morbi-mortalidade e de recidiva hepática por doença hepática subjacente16. No entanto, as limitações do TF e, especialmente, a melhora dos resultados cirúrgicos da RH modificaram esta realidade17,18,19. Atualmente, a ressecção do CHC pode ser realizada em centros especializados, com mortalidade inferior a 5% e índices globais de sobrevida em 5 anos comparáveis aos do transplante para tumores iniciais. Apenas cerca de 10 a 15% dos pacientes com CHC são candidatos à ressecção cirúrgica. A ressecção hepática tem como vantagem ser rapidamente aplicável, pois ao contrário do transplante, não há lista de espera. Além disto, não há restrições absolutas em relação ao tamanho do nódulo a ser ressecado. Para indicação de ressecção, deve-se considerar dois aspectos: “qualidade do fígado” ou função hepática e “quantidade de fígado remanescente” ou volume de fígado remanescente. A ressecção hepática é o tratamento de escolha nos pacientes com CHC em fígados sem cirrose (cerca de 10% dos casos), independentemente do tamanho. Uma questão ainda controversa no tratamento cirúrgico do hepatocarcinoma é a indicação de ressecção versus transplante nos pacientes portadores de cirrose, com boa função hepática que se encontram dentro dos critérios de Milão e na ausência de hipertensão portal relevante (gradiente venoso hepático < 10mmHg; ausência de varizes de esôfago; número de plaquetas > 100.000/mm3). Para os que apresentam nódulos múltiplos, há concordância na literatura que o transplante é a melhor opção terapêutica, com taxas de sobrevida de 80% em 5 anos20 . Estes pacientes com mais de um nódulo podem ser submetidos à ressecção, no entanto, apresentam inquestionavelmente um pior prognóstico. Trabalhos do leste asiático ressaltam que a ressecção só é benéfica quando a 286 | MA N UA I S D E CO N D U TA S doença é oligonodular (até 3 nódulos). Para os pacientes portadores de nódulo único, a ressecção pode ser indicada, com taxas de sobrevida similares às do transplante, mesmo considerando sua maior taxa de recidiva. A hepatectomia é uma modalidade mais disponível, e o paciente pode ser transplantado normalmente em casos de recidiva ou piora da função hepática em decorrênciado agravamento da doença de base21,22,23 (Tabela 5). Vale ressaltar que em nódulos menores que 3cm, a ablação por radiofrequência também é uma modalidade terapêutica que pode ser contemplada em alguns casos e tem sido respaldada na literatura. A ressecção pode ser segura mesmo para tumores de grandes dimensões (>10cm), contanto que a função hepática esteja preservada (Child A) e o volume remanescente hepático seja maior que 40%24,25. Pode-se empregar a embolização portal pré-operatória nas grandes ressecções hepáticas (> 60%) para promover a hipertrofia do fígado remanescente. A hipertrofia torna a ressecção mais segura com menores taxas de morbimortalidade, e pode ser utilizada como uma prova de avaliação funcional do fígado, pois pode demonstrar indiretamente a capacidade regenerativa do parênquima hepático. Em outro grupo de pacientes, com doença localmente avançada, pode-se adotar a estratégia da utilização de técnicas de regressão fisiopatológica (downstaging), como quimioembolização. Existe controvérsia na literatura sobre as margens ideais de ressecção cirúrgica, com trabalhos demonstrando que ressecções segmentares de todo o segmento ou setor onde o tumor está localizado, incluindo-se o seu pedículo portal, apresentam resultados superiores às enucleações e trabalhos que não demonstram esta superioridade26,27. Diversos estudos mostram que a obtenção de margens maiores do que 1,0cm de extensão estão associadas com maiores taxas de sobrevida28. Outro item que deve ser debatido é a presença de invasão vascular macroscópica, especialmente portal. A invasão vascular é sabidamente um fator de mau prognóstico e está associado a altas taxas de recidiva tumoral. Nestes casos, a ressecção mostra-se muito pouco benéfica (índices de sobrevida global <10%), sendo contra-indicada em muitos serviços29,30. A nossa opinião é também de desfavorecer esta indicação. Tabela 5 - Critérios para indicação de ressecção hepática • Pacientes sem cirrose • Pacientes com cirrose, porém função hepática preservada: Child A • Ausência de hipertensão portal relevante • Qualquer tamanho de tumor, desde que volume remanescente hepático > 40% e Child A. • Preferencialmente que atendam aos critérios de Milão: melhor prognóstico • Ausência de invasão vascular macroscópica (veia porta / veia cava) • Ausência de invasão de cápsula hepática Nos últimos anos, muitos autores têm preconizado a via laparoscópica para a ressecção de tumores de pequenas dimensões (<5cm) localizados em regiões periféricas do fígado. Nestes casos selecionados, o sangramento intra-operatório e a morbidade pós-operatória, especialmente. a ocorrência de ascite, são menores. Até o momento, pode-se apenas afirmar que a ressecção laparoscópica é factível e não fere os princípios oncológicos31. Nos pacientes selecionados para a ressecção, a sobrevida em 5 anos varia entre 35 e 50%, mas pode chegar a 70% quando dentro dos critérios de Milão26. Apesar da maioria dos estudos reportarem taxas de sobrevida tardia superiores para o transplante quando comparado à ressecção, quando se analisa a sobrevida tardia em pacientes com tumores dentro dos critérios de Milão submetidos à ressecção, esta é semelhante à sobrevida reportada para pacientes listados para o transplante hepático (intenção de tratar), especialmente quando se leva em conta os pacientes que faleceram ou tornaram- se inelegíveis ao TF em razão do longo tempo de espera na lista. O índice de recidiva tumoral após RH é alto, podendo chegar a 50%. A recidiva pode estar relacionada à metástase do tumor ressecado ou MA N UA I S D E CO N D U TA S | 287 ao surgimento de novos focos de CHC (de novo). Apesar do transplante propiciar menores taxas de recidiva, isto é, maiores taxas de sobrevida livre de doença, cerca de 10% dos pacientes submetidos ao transplante também apresentam recidiva23. É evidente que o parênquima hepático remanescente permanece com a doença, estando associado a um risco de recidiva com o aparecimento de novos focos de HCC, acarretando em menor sobrevida livre de doença do que o TF. No entanto, a RH preserva a possibilidade de TF de resgate, técnicas de ablação ou novas ressecções em casos de recidiva. Finalmente, a avaliação histológica do espécime cirúrgico da RH têm sido proposta como um guia para a seleção de candidatos ao TF, considerando-se nestes casos a RH como um procedimento de ponte para o TF. Em uma época de escassez de órgãos, estudos mostram que a RH apresenta vantagens sobre o TF em pacientes com CHC solitário e doença hepática compensada. Algumas vantagens da RH que podem ser citadas são: (A) é imediatamente disponível quando em centro especializado, (B) carrega um baixo risco em pacientes bem selecionados, (C) permite uma precisa avaliação histológica, (D) propicia taxas de sobrevida global comparáveis às da intenção de transplantar, (E) oferece a possibilidade de TF de resgate em casos de recidiva, desde que os pacientes sejam monitorados de perto para diagnosticar precocemente as recorrências e (F) pode propiciar uma diminuição de custos sobre a economia global do TF. Recomendações relacionadas ao tratamento cirúrgico: 1. A ressecção com margens livres é o tratamento de escolha para o CHC em pacientes sem cirrose e para pacientes selecionados com cirrose (Child A, sem hipertensão portal) com nódulo único, independentemente do seu tamanho. 2. O volume do fígado residual tem impacto direto na evolução pós-operatória. 3. Pacientes altamente selecionados com CHC multifocal ou invasão vascular macroscópica podem ser candidatos à ressecção, mas com resultados muito controversos. A eficácia da ressecção nestes pacientes ainda necessita ser elucidada. 4. A ressecção laparoscópica é factível, mas seu papel ainda não está claro. 5. No momento, não há nenhuma indicação para tratamento adjuvante após RH. Há estudos em andamento analisando esta questão. 15.6. Terapias ablativas percutâneas 15.6.1. Ablação percutânea por radiofrequência A ablação por radiofrequência (ARF) no CHC utilizando a via percutânea guiada por imagem é hoje um procedimento consagrado, já sendo realizado há mais de 15 anos na Europa32 e EUA33. Neste procedimento, a agulha é dirigida até a lesão hepática utilizando-se USG e TC como guia. Uma vez que a posição ideal é alcançada, o gerador descarrega uma corrente elétrica alternada rápida (energia de radiofrequência) na ponta da agulha. O calor gerado no local pela fricção das moléculas de água e componentes iônicos causa necrose de coagulação do tumor quando uma temperatura de 55 a 60ºC é alcançada no tecido tumoral circunjacente à ponta da agulha, o objetivo do tratamento é a ablação do tumor e de uma margem de tecido ao redor do tumor de 1cm, mimetizando uma margem cirúrgica. O amplo uso dessa nova tecnologia apresentou um impacto significativo no tratamento do CHC. Antigamente, a ressecção cirúrgica constituía a única opção terapêutica curativa para tumores primários do fígado. No entanto, a grande maioria dos pacientes com CHC apresenta-se com cirrose hepática, hipertensão portal e outras comorbidades, de modo que frequentemente não são candidatos cirúrgicos. Nesse cenário, a ARF percutânea possibilitou o tratamento curativo de pacientes “não-cirúrgicos”, especialmente em estágios iniciais do hepatocarcinoma. Um estudo coorte sobe ARF demonstrou que a ablação completa de lesões menores que 2cm é possível em mais de 90% 288 | MA N UA I S D E CO N D U TA S dos pacientes com recorrência local menor que 1%. Não há estudos randomizados comparando ARF e ressecção. Devido ao alto índice de recidivas/novos focos de CHC nos pacientes cirróticos na espera para transplante hepático e também pela reserva hepática reduzida destes pacientes, a ARF percutânea apresenta vantagens estratégicas frente à ressecção cirúrgica. Estudos controlados e randomizados demonstraram que a ARF é mais efetiva que injeção de etanol paratratamentos de pequenas lesões34, com taxa de necrose completa do tumor maior na ARF e requerendo menor número de tratamentos35. Em relação à resposta de longo termo, a ARF também se provou melhor que a alcoolização, com uma melhor resposta completa um ano após o tratamento. Tem como desvantagem o custo bem mais elevado que a alcoolização. No tratamento do CHC as indicações são elas: • Estádios iniciais de CHC36- Algumas meta-análises colocam inclusive as terapias ablativas como tratamento de escolha para CHC pequenos (até 3,0 cm), devido aos menores índices de complicações quando comparado à ressecção cirúrgica37. • Pacientes com comorbidades severas ou inoperáveis. O procedimento, em muitos hospitais, é realizado rotineiramente com sedação consciente, reduzindo dessa forma o risco anestésico para pacientes debilitados. • Pacientes com CHC único ou múltiplos, enquanto esperam pelo transplante hepático38, pois o método é minimamente invasivo, impede que esses tumores ultrapassem o número e medidas estabelecidas pelo critério de Milão e possibilita ao máximo preservar parênquima hepático, diminuindo o risco de insuficiência hepática. Tabela 6 - Contra-indicações à ArF • Doença extra-hepática • Invasão vascular ou biliar • Cirrose hepática avançada (Child-Pugh C) ou infecção ativa. • Encefalopatia hepática ou insuficiência hepática descompensada. • CHC multifocal. Diversos estudos recomendam ARF como método de escolha se menos de três lesões com até 3,0cm cada39,40. • Lesões maiores que 5cm • Lesões centrais e em proximidade com ductos biliares principais A ARF constitui um procedimento de baixo risco, com baixas taxas de morbidade e mortalidade41,42. As complicações menores relacionadas à ARF ocorrem em menos de 5% dos procedimentos, ao passo que complicações graves variam entre 0,9 e 2% em séries de até 3554 lesões tratadas43 (Tabela 7). A taxa de mortalidade, na maior série de casos, foi de 0,3%. Síndrome pós-ablação caracteriza uma série de sinais e sintomas que cerca de 40% dos pacientes apresentam após o procedimento41. Dentre eles, febre baixa (até 38oC), desconforto, mal estar, náusea, fadiga e prostração. A síndrome pós-ablação pode permanecer por até 14 dias após o procedimento, mas usualmente dura de dois a três dias. MA N UA I S D E CO N D U TA S | 289 15.6.2. Injeção percutânea de etanol A injeção de etanol foi o primeiro método ablativo percutâneo descrito. Trata-se de injeção de álcool absoluto por uma agulha fina no interior do tumor frequentemente guiada por ultra-som. Apesar de menos eficaz que a ARF e, geralmente, necessitar de múltiplas sessões, representa importante método no nosso meio devido ao baixo custo quando comparado a ARF. Pode ser indicado em tumores menores de 3cm, sem disseminação extra-hepática ou vascular. 15.6.3. Quimioembolização arterial hepática A quimioembolização intra-arterial é atualmente o método mais utilizado e recomendado como primeira linha de tratamento paliativo para o manejo dos pacientes com CHC44, sendo também empregada para o controle e redução das lesões hepáticas nos pacientes que se encontram na fila para transplante hepático. O suprimento de sangue do CHC é provido principalmente pelo sistema arterial e a infusão de drogas citotóxicas permite maiores concentrações no tumor, assim como a interrupção do suprimento sanguíneo do tumor pela embolização induz a isquemia e necrose. A comprovação científica do uso da quimioembolização como método terapêutico nos pacientes com CHC foi respaldada em meta-análise publicada em 2003, que incluiu sete estudos randomizados, onde foi demonstrado aumento médio de dois anos na sobrevida dos pacientes com CHC submetidos à embolização45. Além disso, também foi observado que alguns pacientes foram convertidos de inoperáveis para operáveis após a terapia intra-arterial. As contra-indicações absolutas e relativas à quimioembolização encontram-se resumidas na Tabela 8. Tabela 8 - Contra-indicações à quimioembolização Absolutas • Candidatos a ressecção ou ablação percutânea • Infecção sistêmica intratável. • Função hepática comprometida (Child-Pugh C). • Fluxo hepatoportal comprometido. Tabela 7 - Complicações relacionadas à ArF Menores • Dor no ombro. • Hematoma subcapsular. • Derrame pleural/ ascite. • Queimadura/celulite na região dos adesivos que absorvem a energia de radiofrequência. • Pequeno hemoperitôneo, sem necessidade de transfusão sanguínea. • Pequeno pneumotórax, sem necessidade de intervenção. Maiores • Sangramento peritoneal. • Lesão de alças intestinais • Colecistite aguda • Lesão biliar, levando a estenose de ductos biliares centrais. • Hemoperitôneo, necessitando de intervenção. • Pneumotórax, necessitando de intervenção. • Infecção/abscesso hepático. • Trombose portal. • Implante tumoral ao longo do trajeto da agulha. 290 | MA N UA I S D E CO N D U TA S O sucesso da utilização dessa terapia depende da seleção criteriosa dos pacientes, sendo os melhores resultados encontrados naqueles com função hepática preservada e lesões assintomáticas sem invasão vascular ou metástases extra-hepáticas. O procedimento pode ser realizado tanto sob sedação consciente ou anestesia geral. Existem vários regimes quimioterápicos utilizados, sendo a doxorrubicina (50-100mg) em associação com microesferas embolizantes (100-300 μm) o esquema monoterápico mais indicado atualmente. O uso da doxorrubicina, associada ou não a cisplatina e/ou mitomicina-C é uma alternativa na indisponibilidade das microesferas. Sugere-se que um novo exame de imagem (TC ou RM) seja realizado quatro semanas após o procedimento para a avaliação da resposta terapêutica e planejamento das possíveis sessões subsequentes. A falta de resposta ao tratamento após a primeira sessão não deve ser encarada como falha terapêutica, devendo muitas vezes, os mesmos segmentos arteriais serem embolizados em diferentes sessões até se obter a resposta desejada, tornando crítica a participação do radiologista intervencionista no seguimento desses pacientes. A complicação mais comumente relacionada a qualquer quimioembolização é a chamada síndrome pós-embolização. Esse quadro é caracterizado pela presença de alterações clínicas e laboratoriais como náusea, vômitos, febre, dor abdominal, fadiga, leucocitose e elevação das transaminases. Virtualmente todos os pacientes submetidos a procedimentos de embolização/ quimioembolização irão evoluir com essa síndrome em diferentes graus de manifestação nas primeiras 48 horas após o procedimento. Outras complicações mais raras incluem a formação de abscessos hepáticos, infarto da vesícula biliar, sepse, embolização sistêmica do agente quimioembólico e insuficiência hepática irreversível. 15.7. Tratamento sistêmico Apenas uma minoria de pacientes pode se beneficiar de tratamento curativo nesta doença. Mais de 80% dos casos de CHC já se apresentam em estádios mais avançados ao diagnóstico, sendo inelegíveis para tratamentos cirúrgicos, seja ressecção ou transplante. Adicionalmente, a taxa de recorrência após terapia potencialmente curativa pode chegar a 50% em 2anos, dependendo das características da neoplasia. Os pacientes com CHC avançado apresentam predominantemente doença confinada ao fígado. As metástases extrahepáticas ocorrem em aproximadamente 15% dos casos e os linfonodos abdominais, pulmões e ossos são os principais sítios. Embora os pacientes com doença hepática relativas • Envolvimento tumoral >50% do fígado. • Presença de doença metástatica extra-hepática. • Bilirrubina >2,0 mg/dl. • DHL>425 U/l. • AST>100U/l. • Insuficiência renal ou cardíaca. • Ascite. • Sangramento recente relacionado a varizes. • Trombocitopenia significativa. • Fístula arteriovenosa intratável. • Presença de anastomose portocava. • Trombose portal extensa. • Invasão tumoral da veia cava inferior. MA N UA I S D E CO N D U TA S | 291 avançada possamse beneficiar de terapias intrahepáticas, pacientes com doença extrahepática têm opções mais limitadas de tratamento. É muito importante considerar fatores como função hepática, velocidade de progressão da neoplasia e sintomatologia para definição da melhor estratégia terapêutica. As principais indicações para tratamento sistêmico em hepatocarcinoma são: doença metastática extrahepática, progressão de doença na ausência de indicação de qualquer outra modalidade de terapia cirúrgica ou locoregional, geralmente pacientes classificados com critério de Barcelona, BCLC = C. Não se recomenda tratamento específico em pacientes Child-Pugh C, já que a terapia antineoplásica não atribui nenhum benefício e neste grupo deve-se oferecer a melhor terapia de suporte. Por muitos anos, não se dispunha de nenhum tratamento sistêmico que tivesse demonstrado aumento de sobrevida nesta doença e as taxas de resposta sempre foram ínfimas. Recentemente, esta perspectiva mudou quando houve aprovação da primeira droga sistêmica para o tratamento do hepatocarcinoma avançado, com benefício em sobrevida. Trata-se do sorafenibe, uma pequena molécula, inibidor de tirosina quinases, que atua bloqueando a sinalização de PDGF, VEGF, c-kit e RAF tanto nas células tumorais quanto nas células endoteliais circundantes. No estudo SHARP, foram randomizados 602 pacientes com HCC avançado e cirrose Child-Pugh A, para uso do sorafenibe 400mg via oral duas vezes ao dia, ou placebo e os resultados mostraram benefício estatisticamente significativo em SG, de 10,7 versus 7,9 meses e HR: 0,69 e SLP 5,5 versus 2,8meses e HR 0,58 favorecendo o sorafenibe. Neste estudo, mais de 95% dos pacientes eram Child-Pugh A e > 80% classificados como BCLC = C. As maiores toxicidades grau 3-4 foram diarréia em 8% e síndrome mãos-pés em 8% dos pacientes em uso da droga 46. O estudo do grupo asiático também confirmou o mesmo benefício relativo, porém numericamente menor, já que a população tratada neste estudo era de pior prognóstico. Em vista destes dados, sorafenibe tornou-se a principal opção sistêmica de tratamento para pacientes com doença avançada em pacientes com função hepática preservada. Embora seja uma droga bem tolerada, o sorafenibe tem taxa de resposta objetiva muito baixa, cerca de 2%, sem impacto real no controle de sintomas ou qualidade de vida. Em pacientes com hipertensão portal ou trombose de veia porta, os cuidados preventivos quanto ao risco de sangramento nos portadores de varizes esofageanas são fundamentais, especialmente quando se considera o tratamento com drogas antiangiogênicas. Várias drogas quimioterápicas vêm sendo estudadas ao longo dos anos. O fluorouracil foi o primeiro agente testado no tratamento do hepatocarcinoma, entretanto, a droga mais estudada nesta doença foi a doxorubicina. Os melhores resultados foram de um estudo de fase II, muito pequeno, com apenas 14 pacientes e taxa de resposta de 78% que não se repetiu em outros estudos posteriormente47. Subsequentemente, estudos que avaliaram a doxorubicina mostraram taxas de resposta entre 10-30% (Tabela 9). A doxorubicina também foi comparada em estudo de fase III que incluiu 188 pacientes, com uma combinação de drogas no esquema conhecido como PIAF, composto de cisplatina, interferon, doxorubicina e fluorouracil. Apesar de uma tendência, as melhores taxas de resposta no esquema PIAF, não houve diferença significativa nas taxas de sobrevida global, e sim maior toxicidade com a combinação48. A capecitabina, também foi avaliada e demonstrou taxa de resposta de 11%, tempo mediano para progressão de 2,9 meses e sobrevida mediana de 10,1 meses nos 37 pacientes avaliados em um dos estudos49. Diversas outras drogas isoladas foram testadas ao longo dos anos, infelizmente com mínimas taxas de resposta e sem benefício de sobrevida demonstrado, dentre elas, mitoxantrona, epirrubicina, doxorrubicina lipossomal, mitomicina, etoposido, irinotecano, interferon (Tabela 10). Algumas combinações de drogas têm sido estudadas. O esquema GemOx, composto de gencitabina e oxaliplatina, foi avaliado em estudo de fase II, com apenas 34 pacientes e demonstrou taxas de resposta de 18%, estabilidade de doença em 58% e uma sobrevida global mediana de 11,5meses, com perfil de toxicidade bastante aceitável50. Recentemente, o esquema FOLFOX, 292 | MA N UA I S D E CO N D U TA S composto por fluorouracil, ácido folínico e oxaliplatina, foi comparado com a doxorrubicina isolada. Este estudo de fase III chamado EACH, incluiu 371 pacientes, predominantemente Child A (87%) e B, e a maioria (> 80%) portadora de vírus da hepatite B. A análise apresentada após 266 eventos demonstrou sobrevida global mediana superior no grupo Folfox, 6,4 versus 4,97 meses, entretanto, não estatisticamente significativa naquele momento 51. Entretanto, os dados de análise posterior, após 305 eventos demonstraram uma diferença estatisticamente significativa em SG favorecendo o braço da combinação, com p =0,0425. A sobrevida livre de progressão foi significativamente maior no grupo Folfox, 2,93 versus 1,77 meses, assim como a taxa de resposta: 8% versus 3%. O esquema em estudo foi bem tolerado, tendo como maior toxicidade graus 3 e 4 a neutropenia em 30% dos pacientes. Com o exposto, conclui-se que o esquema Folfox é comparável a doxorrubicina, com tendência a alguma superioridade, com perfil de toxicidade bastante razoável, porém, com números ainda muito modestos no que tange a beneficio (Tabela 11). Foi recentemente publicado foi o estudo que comparou doxorrubicina associado a sorafenibe versus doxorrubicina isolada52. Este estudo randomizou 96 pacientes Child A e demonstrou tempo mediano para progressão de 6,4 meses versus 2,8 meses; sobrevida global mediana de 13,7 versus 6,5meses, além de sobrevida livre de progressão de 6,0 versus 2,7 meses, todos os índices favorecendo o grupo que recebeu a combinação com sorafenibe. As toxicidades mais importantes neste esquema foram gastrointestinal e hematológica, porém manejáveis. Estes resultados são bastante interessantes, porém não conclusivos em relação ao benefício, devendo-se à combinação ou simplesmente à ação do sorafenibe. Com a intenção de esclarecer este ponto, atualmente está em andamento estudo de fase III comparando doxorrubicina associado a sorafenibe versus sorafenibe isolado e os resultados são aguardados. Um estudo de fase II avaliou a combinação de Bevacizumabe e Erlotinibe em 40 pacientes. O objetivo primário do estudo foi SLP em 16 semanas e foi de 62,5%. Resposta objetiva foi alcançada em 25% dos pacientes, assim como SG mediana de 15,65 meses53. Este esquema teve como principais toxicidades fadiga (20%), hipertensão (15%), diarréia (10%), elevação de transaminases (10%) e hemorragia gastrointestinal (12%). Esta combinação merece avaliação adicional, mas ainda não é recomendada na rotina atual de tratamento. Também comparado recentemente em estudo fase III, Sorafenibe versus Sunitinibe em um grupo de 1.074 pacientes, entretanto, o Sunitinibe não demonstrou benefício em nenhum dos parâmetros avaliados, SG, SLP ou taxas de resposta, além de ter apresentado maior toxicidade54. Várias outras drogas biológicas e associações vêm sendo estudadas nesta doença, entretanto, ainda são consideradas investigacional no momento (Tabela 12). Certamente o desafio para tratamento sistêmico nesta doença ainda é grande onde pesam múltiplas variáveis, baixos índices de resposta das terapias existentes e onde por vezes o melhor que podemos oferecer é terapia de suporte, especialmente nos pacientes com doença tumoral não volumosa e sem sinais evidentes de progressão. Tabela 9 - Principais estudos com doxorrubicina em hepatocarcinoma Autor/ano Olweny/1975 Chlebowski/1984 Lai/1988 Sciarrino/1985 n 14 157 106 109 Fase II II III II rr 78% 11% 5 % 10% MA N UA I S D E CO N D U TA S | 293 Tabela 11 - Principaisesquemas quimioterápicos atuais em hepatocarcinoma Esquema GemOx FOLFOX Capecitabina Doxorrubicina SG mediana 11,5 meses 6,4 meses 10,1 meses 10,6 semanas Taxa de resposta 18% 8% 11% 3% Fase II III II III Tabela 13 - recomendação de modificação de doses do Sorafenibe para toxicidade cutânea Toxicidade cutânea Grau 1 Grau 2 Grau 3 Ocorrência Qualquer Primeira Segunda ou terceira Quarta Primeira ou segunda Terceira Continuar Sim Sim Interromper Não Interromper Não Modificar Tratamento tópico para alívio sintomático Tratamento tópico para alívio sintomático, reavaliar em 7dias Até resolução para grau < 1 e reduzir dose para 400mg/dia ou em dias alternados. Descontinuar Até resolução para grau < 1 e reduzir dose para 400mg/dia ou em dias alternados Descontinuar Tabela 12 - Estudos fase II: associação de quimioterápicos e anticorpos monoclonais Estudo GemOx + Bmabe Cape + Bmabe Xelox+ Bmabe GemOx+ Cmabe Bmabe + Erlotinibe Fase II II II II II Pacientes 33 45 30 45 40 Tx resposta 20% 16% 11% 20% 25% Doença estável 27% 78% SGm 9,6 meses 10,7 meses 9,5 meses 15,6 meses Tabela 10 - Quimioterápicos isolados em hepatocarcinoma: taxas de resposta Drogas rr Doxorrubicina 0-20% Mitoxantrona 8-17% Epirrubicina 10-25% Doxorrubicina lipossomal 0-10% Cisplatina 0-15% Combinações com Cisplatina 15-27% Paclitaxel 0 VP-16 18% Capecitabina 3-25% Irinotecano 7% 5FU + IFN 18% 5FU + LV 28% 294 | MA N UA I S D E CO N D U TA S 15.8. Seguimento O seguimento de pacientes com CHC tem o objetivo de diagnosticar precocemente as recidivas em pacientes submetidos a terapêuticas potencialmente curativas. Reintervenções locoregionais são factíveis e podem determinar a curabilidade destes pacientes. Além de exame físico bi ou trimestrais, recomenda-se dosagem de AFP a cada 2 ou 3 meses e exames de imagem a cada 3 ou 6 meses. 15.9. Prevenção A prevenção do CHC é baseada na prevenção da doença hepática crônica, visto que a grande maioria dos tumores está relacionada à cirrose hepática. Assim a vacinação para hepatite B, por exemplo, já se mostrou de grande efetividade em Taiwan na redução da incidência de CHC55. Ainda não se dispõe de vacinação para hepatite C. A incidência de carcinoma hepatocelular é dramaticamente reduzida após tratamento exitoso com erradicação viral na hepatite C crônica e na supressão viral da hepatite B crônica, estando, nesta última, a carga viral diretamente relacionada à incidência de CHC. Surpreendentemente, apenas o fato de um paciente com hepatite C ter sido tratado, mesmo sem erradicação viral, já reduz risco de incidência de CHC de acordo com meta-análise56. Para os pacientes tratados cirurgicamente, há meta-análise57 que evidencia redução significativa de recorrência do CHC com a instituição de tratamento antiviral, quer para hepatite crônica B quer para hepatite crônica C. Por fim, o consumo diário de café em pacientes com doença hepática crônica parece reduzir incidência de CHC de acordo com elegante meta-análise 58. Bibliografia Sugerida 1. Parkin DM, Bray F, Ferlay J, Pisani P. CA Cancer J Clin. 2005;55(2):74-10 2. Pons-Renedo F, Llovet JM. MedGenMed. 2003 Jul 22;5(3):1 3. http://www.cdc.gov/mmwr/preview/mmwrhtml/mm5917a3.htm acessado em 12/06/2011 4. Bruix J, Sherman M . Management of hepatocellular carcinoma: an update. Hepatology 53 (3): 1020-22, 2011 5. Child CG, Turcotte JG. Surgery and portal hypertension. In: The liver and portal hypertension. Edited by CG Child. Philadelphia: Saunders 1964:50-64 6. Pugh RN, Murray-Lyon IM, Dawson JL, Pietroni MC, Williams R. The British journal of surgery 1973 60: 646 7. Okuda K, Ohtsuki T, Obata H Cancer 1985;56:918 8. Llovet JM, Brú C, Bruix J. Prognosis of hepatocellular carcinoma: The BCLC staging classification. SeminLiverDis1999;19:329 9. Chan S, Mo F, Johnson P, et al. New utility of an older marker: serial alfa fetoprotein measurement in predicting radiologic response and survival of patients with hepatocellular carcinoma undergoing systemic chemotherapy. J Clin Oncol 27:446-52, 2009 10. Mazzaferro V., Regalia E.,Doci R., et al. N Engl J Med 1996; 334:693-699 11. Cabibbo G,Enea M, Attanasio M, Bruix J, Craxı A, Camma C Hepatology 2010;51:1274 12. Abrams P., Marsh,W. Current approach to Hepatocelular carcinoma. Surg Clin N Am 90: 803 – 816; 2010 MA N UA I S D E CO N D U TA S | 295 13. Bryant R., Laurent A., Tayar C., et al. Liver resection of hepatocelular carcinoma. Surg Oncol Clin N Am 17: 607 – 611; 2008 14. Llovet JM, Fuster J, Bruix J. Intention-to-treat analysis of surgical treatment for early hepatocellular carcinoma: resection versus transplantation. Hepatology 30:1434–1440, 1999. 15. Yao FY, Bass NM, Nikolai B, et al. Liver transplantation for hepatocellular arcinoma: analysis of survival according to the intention to-treat principle and drop-out from the waiting list. Liver Transpl8:873–883, 2002. 16. Belghiti J, Panis Y, Farges O, et al. Intrahepatic recurrence after resection of hepatocellular carcinoma complicating cirrhosis. Ann Surg214:114–117, 1991. 17. Torzilli G, Makuuchi M, Inoue K, et al. No-mortality liver resection for hepatocellular carcinoma in cirrhotic and noncirrhotic patients: is there a way? A prospective analysis of our approach. Arch Surg134:984–992, 1999. 17* 18. Poon RT, Fan ST, Lo CM, et al. Improving survival results after resection of hepatocellular carcinoma: a prospective study of 377 patients over 10 years. Ann Surg234:63–70, 2001.18* 19. Grazi GL, Ercolani G, Pierangeli F, et al. Improved results of liver resection for hepatocellular carcinoma on cirrhosis give the procedure added value. Ann Surg234:71–78, 2001.19* 20. Makuuchi, M.; Kokudo, N.: Clinical practice guidelines for hepatocelular carcinoma: The first evidence based guidelines from japan. World J Gastroenterol12: 828 – 829; 2006 21. Takayama, T.: Hepatocelular Carcinoma. In: Malignant Liver Tumors – Current and Emerging Therapies. Clavien, P.A.; 3rd ed. – Wiley – Blackwell, UK – 2010 22. Makuuchi, M.; Kokudo, N; Arii, N.: et al: Development of evidence-based Clinical Guidelines for the Hepatoculular Carcinoma in Japan Hepatol Res 38: 37 – 51; 2008 23. Belghiti, J.: Cortes, A.; Abdalla, EK,; et al: Ressection prior to liver transplantation for Hepatocelular carcinoma. Ann Surg238(6): 885 – 892; 2003 24. Liau KH, Ruo L, Shia J, Padela A, Gonen M, Jarnagin WR et al Outcome of partial hepatectomy for large (>10 cm) hepatocellular carcinoma. Cancer 104:1948–1955, 2005. 25. ang LY, Fang F, Ou DP, Wu W, Zeng ZJ, Wu F. Solitary large hepatocellular carcinoma: a specific subtype of hepatocellular carcinoma with good outcome after hepatic resection. Ann Surg 249:118–123, 2009. 26. Belghiti J, Kianmanesh R. Surgical treatment of hepatocellular carcinoma. HPB (Oxford) 7:42– 49, 2005. 27. Poon RT, Fan ST, Ng IO, Wong J. Significance of resection margin in hepatectomy for hepatocellular carcinoma: a critical reappraisal. Ann Surg 231:544–551, 2000. 28. Shi, M.; Guo, R.; Lin, X.; Chen, M.; Zhang, C.; Lau, W.; Li, J.: Partial hepatectomy with wide versus narrow resection margin for solitary hepatocelular Carcinoma. A prospective randomized trial. Ann Surg 245 (1): 36 – 40; 2007 29. Ng KK, Vauthey JN, Pawlik TM, et al. Is hepatic resection for large or multinodular hepatocellular carcinoma justified? Results from a multi-institutional database. Ann Surg Oncol 12:364–373, 2005. 30. Pawlik TM, Poon RT, Abdalla EK, et al. Hepatectomy for hepatocellular carcinoma with major portal or hepatic vein invasion: results of a multicenter study. Surgery 137:403–410, 2005. 31. Vigano L, Tayar C, Laurent A, Cherqui D. Laparoscopicliver resection: a systematic review. J Hepatobiliary Pancreat Surg 16:410–421, 2009. 32. Buscarini E, Cavanna L, Quaretti P, Squassante E, et al. Percutaneous radiofrequency interstitial thermal ablation in the treatment of small hepatocellular carcinoma. Cancer J Sci Am. 1995 May-Jun;1(1):73-81. 33. Goldberg SN, Gazelle GS, Dawson SL, Rittman WJ, Mueller PR, Rosenthal DI. Tissue ablation with radiofrequency: effect of probe size, gauge, duration, and temperature on lesion volume. Acad Radiol. 1995 May;2(5):399-404. 296 | MA N UA I S D E CO N D U TA S 34. Brunello F, Veltri A, Carucci P, Pagano E, Ciccone G, Moretto P, et al. Radiofrequency ablation versus ethanol injection for early hepatocellular carcinoma: A randomized controlled trial. Scand J Gastroenterol. 2008;43(6):727-35. 35. Livraghi T, Goldberg SN, Lazzaroni S, Meloni F, Solbiati L, Gazelle GS. Small hepatocellular carcinoma: treatment with radio-frequency ablation versus ethanol injection. Radiology. 1999 Mar;210(3):655-61. 36. Crocetti L, Lencioni R. Thermal ablation of hepatocellular carcinoma. Cancer Imaging. 2008;8:19-26. 37. Jansen MC, van Hillegersberg R, Chamuleau RA, van Delden OM, Gouma DJ, van Gulik TM. Outcome of regional and local ablative therapies for hepatocellular carcinoma: a collective review. Eur J Surg Oncol. 2005 May;31(4):331-47. 38. Lau WY, Lai EC. The current role of radiofrequency ablation in the management of hepatocellular carcinoma: a systematic review. Ann Surg. 2009 Jan;249(1):20-5. 39. Lencioni R, Cioni D, Crocetti L, Bartolozzi C. Percutaneous ablation of hepatocellular carcinoma: state-of-the-art. Liver Transpl. 2004 Feb;10(2 Suppl 1):S91-7. 40. Lencioni R, Della Pina C, Bartolozzi C. Percutaneous image-guided radiofrequency ablation in the therapeutic management of hepatocellular carcinoma. Abdom Imaging. 2005 Jul- Aug;30(4):401-8. 41. Carrafiello G, Lagana D, Ianniello A, Dionigi G, Novario R, Recaldini C, et al. Post-radiofrequency ablation syndrome after percutaneous radiofrequency of abdominal tumours: one centre experience and review of published works. Australas Radiol. 2007 Dec;51(6):550-4. 42. Livraghi T, Solbiati L, Meloni MF, Gazelle GS, Halpern EF, Goldberg SN. Treatment of focal liver tumors with percutaneous radio-frequency ablation: complications encountered in a multicenter study. Radiology. 2003 Feb;226(2):441-51. 43. Giorgio A, Tarantino L, de Stefano G, Coppola C, Ferraioli G. Complications after percutaneous saline-enhanced radiofrequency ablation of liver tumors: 3-year experience with 336 patients at a single center. AJR Am J Roentgenol. 2005 Jan;184(1):207-11. 44. A comparison of lipiodol chemoembolization and conservative treatment for unresectable hepatocellular carcinoma. Groupe d'Etude et de Traitement du Carcinome Hepatocellulaire. N Engl J Med. 1995 May 11;332(19):1256-61 45. Llovet JM, Burroughs A, Bruix J. Hepatocellular carcinoma. Lancet. 362(9399):1907-17, 2003. 46. Llouvet JM, Ricci S, Mazzaferro V et al. Sorafenib in advanced hepatocellular carcinoma. N Eng J Med 2008; 359:378-390 47. Olweny C, Toya T, Katongole-Mbidde E, et al. Treatment of hepatocellular carcinoma with adriamycin. Cancer 1975; 36 (4): 1250 48. Yeo W, Mok T, Zee B, et al. A randomized phase III study of doxorubicin versus cisplatin/ interferon -2b/ doxorubicin/fluorouracil (PIAF) combination chemotherapy for unresectable hepatocellular carcinoma. J Natl Cancer Inst 2005; 97(20):1532 49. Patt Y, Hassan M, Aguayo A, et al. Oral Capecitabine for the treatment of hepatocellular carcinoma, cholangiocarcinoma, and gallbladder carcinoma. Cancer 2004; 101:578-586 50. Louafi S, Boige V, Ducreux M, et al. Gemcitabine plus oxaliplatin (GemOx) in patientes with advanced hepatocellular carcinoma (HCC). Cancer 2007; 109 (7):1384-1390 51. Qin S, Bay Y, Ye S, et al. Phase III study of oxaliplatin plus 5-fluorouracil/leucovorin (FOLFOX) versus doxorubicin as palliative systemic chemotherapy in advanced HCC in Asian patients. J Clin Oncol 2010; 28:abst 4008 52. Abou-alfa G, Johnson P, Knox J et al. Doxorubicin plus sorafenib versus doxorubicin alone in patients with advanced hepatocellular carcinoma: a randomized trial. JAMA 304(19):2154, 2010 53. Thomas M, Morris J, Chadha R et al. Phase II trial of the combination bevacizumab and erlotinib in patients who have advanced hepatpcellular carcinoma. J Clin Oncol 27:843-850, 2009 54. Cheng A-L, Kang Y, Lin D et al. Phase III trial of sunitinib versus sorafenib in advanced hepatocellular carcinoma. J Clin Oncol 29:abst 4000 , 2011
Compartilhar