Buscar

PATOLOGIA DO SISTEMA NERVOSO RUMINANTES

Prévia do material em texto

958
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
RESUMO.- O objetivo deste trabalho é descrever os prin-
cipais aspectos epidemiológicos e clínico-patológicos das
principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e
equinos diagnosticadas no Laboratório de Patologia Vete-
rinária (LPV) da Universidade Federal de Santa Maria
(UFSM) para servir como base para veterinários de campo
ou que trabalham em laboratórios de diagnóstico. Esses
dados foram buscados em trabalhos publicados pela equi-
pe do LPV-UFSM ou retirados dos arquivos do laboratório.
As principais doenças do sistema nervoso diagnosticadas
em bovinos foram a raiva, a encefalopatia hepática decor-
rente de insuficiência hepática por ingestão de Senecio
spp., a meningoencefalite por herpesvírus bovino, a babe-
siose cerebral, a intoxicação por Solanum fastigiatum, a
febre catarral maligna e a polioencefalomalacia. Em ovi-
nos foram diagnosticadas a cenurose, a meningoencefali-
te por Listeria monocytogenes, o tétano, os abscessos
encefálicos ou vertebrais e a raiva. Meningoencefalite por
L. monocytogenes foi a única doença do sistema nervoso
descrita em caprinos. Equinos foram afetados pela leuco-
encefalomalacia, tripanossomíase e tétano.
TERMOS DE INDEXAÇÃO: Doenças de ruminantes, doenças
de equinos, doenças do sistema nervoso, neuropatologia.
INTRODUÇÃO
O Laboratório de Patologia Veterinária (LPV) da Universi-
dade Federal de Santa Maria (UFSM) foi o laboratório de
referência do Programa Nacional de Vigilância das Ence-
falopatias Espongiformes Transmissíveis do Ministério da
Tópico de Interesse Geral
Abordagem diagnóstica das principais doenças do
sistema nervoso de ruminantes e equinos no Brasil1
Daniel R. Rissi2, Felipe Pierezan2, José C. Oliveira-Filho2, Ricardo B.
Lucena2, Priscila M.S. Carmo2 e Claudio S.L. Barros3*
ABSTRACT.- Rissi D.R, Pierezan F., Oliveira-Filho J.C., Lucena R.B., Carmo P.M.S. &
Barros C.S.L. 2010. [Diagnostic approaches for the main neurological diseases of
ruminants and horses in Brazil.] Abordagem diagnóstica das principais doenças do
sistema nervoso de ruminantes e equinos no Brasil. Pesquisa Veterinária Brasileira
30(11):958-967. Departamento de Patologia, Universidade Federal de Santa Maria, Camobi,
Santa Maria, RS 97105-900, Brazil. E-mail: claudioslbarros@uol.com.br
The epidemiological, clinical, and pathological hallmarks of neurological diseases of
ruminants and horses diagnosed in the Laboratory of Veterinary Pathology (LVP) of the
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) are herein described. This paper is intended
to work as a compiled database for practitioners or veterinarians working in diagnostic
laboratories. Data was gathered from papers published by the LVP-UFSM faculty and
staff or retrieved from the laboratory archives. The most important neurological diseases
of cattle included rabies, hepatic encephalopathy due to ingestion of Senecio spp.,
meningoencephalitis by bovine herpesvirus, cerebral babesiosis, poisoning by Solanum
fastigiatum, malignant catarrhal fever, and polioencephalomalacia. Sheep were affected
mostly by coenurosis, meningoencephalitis by Listeria monocytogenes, tetanus, encephalic
or vertebral abscesses, and rabies. Goats were affected by meningoencephalitis by L.
monocytogenes. Leukoencephalomalacia, trypanosomiasis by Trypanosoma evansi, and
tetanus were important neurological diseases of horses.
INDEX TERMS: Diseases of ruminants, diseases of horses, diseases of the nervous system,
neuropathology.
1 Recebido em 27de abril de 2010.
Aceito para publicação em 18 de maio de 2010.
Trabalho inteiramente financiado com verba de projeto Universal
do CNPq (Proc.478779/2007-0).
2 Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária, área de
concentração em Patologia Veterinária, Centro de Ciências Rurais
(CCR), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Camobi, Santa
Maria, RS 97105-900, Brasil.
3 Departamento de Patologia, CCR, UFSM, Santa Maria, RS. *Autor
para correspondência: claudioslbarros@uol.com.br
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Abordagem diagnóstica das principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e equinos no Brasil 959
Agricultura, Pecuária e Abastecimento durante sete anos
(2000-2007). Nesse período, muito esforço foi realizado
com o objetivo de gerar informações relevantes sobre as
doenças do sistema nervoso (SN) de ruminantes que pu-
dessem contribuir no diagnóstico dessas doenças. Duran-
te a vigilância da encefalopatia espongiforme bovina (BSE)
e da scrapie, o exame dos encéfalos de ruminantes tornou
possível que várias outras doenças fossem estudadas (já
que nenhum diagnóstico dessas encefalopatias espongi-
formes transmissíveis foi realizado). Além disso, esses
estudos abriram portas para que os métodos de avaliação
do encéfalo fossem aplicados sistematicamente a outras
espécies (como por exemplo, equinos). Toda essa organi-
zação na avaliação do material remetido ao LPV-UFSM
gerou um grande número de trabalhos científicos relacio-
nados às doenças do SN dessas espécies.
O objetivo deste trabalho foi compilar e organizar as
informações geradas a partir do serviço de diagnóstico das
doenças do SN de ruminantes e equinos no LPV-UFSM.
Para isso serão discutidos os métodos de avaliação e de
remessa das amostras ao laboratório e os aspectos epide-
miológicos e clínico-patológicos das principais doenças do
SN diagnosticadas em bovinos, ovinos, caprinos e equi-
nos. Os dados aqui gerados destinam-se a servir como
orientação aos veterinários de campo que trabalham com
diagnóstico de doenças de animais de produção e tam-
bém como uma contribuição aos veterinários ou técnicos
de laboratórios de diagnóstico. Não serão apresentados
os dados detalhados de cada doença e essas informa-
ções devem ser consultadas nas publicações referenciadas
durante a discussão.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram compilados os dados de todos os trabalhos científicos
publicados pela equipe do LPV-UFSM referentes às doenças
do SN de ruminantes e equinos diagnosticadas pelo laborató-
rio. As informações geradas por esses trabalhos foram anali-
sadas e agrupadas de maneira sistemática para avaliação das
principais características concernentes à epidemiologia, aos
sinais clínicos, à patologia e ao diagnóstico de cada doença.
Quadro 1. Características epidemiológicas associadas às principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e
equinos diagnosticadas no Laboratório de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria
Espécies/doenças Nº de Epidemiologia
casos
Bovinos
Raiva 197 Animais de várias idades em contato com morcegos (bovinos próximos a áreas de encosta, morros ou
furnas). A maioria dos casos ocorreu na primavera e verão.
Encefalopatia hepática 122 Animais de várias idades. Os casos usualmente ocorrem entre agosto e dezembro. No Rio Grande do Sul
esses casos resultam da intoxicação por Senecio spp.
Meningoencefalite por 57 Bezerros submetidos a situações de estresse (principalmente desmame, transporte, troca de alimentação)
e agrupados (alimentação no cocho). Ocasionalmente animais adultos.
Babesiose cerebral 44 Geralmente animais de dois a oito anos. Ocasionalmente bovinos mais jovens.
Ocorre principalmente nos meses mais quentes devido ao aumento do parasitismo pelo carrapato transmis-
sor nessas épocas.
Intoxicação por 40 Animais adultos e ingerindo grandes quantidades da planta durante meses.
Solanum fastigiatum
Febre catarral maligna 21 Animais de várias idades, mas geralmente acima de dois anos e em contato com ovinos (principalmente na
época de parição dos cordeiros).
Polioencefalomalacia 20 Animais jovens até aproximadamente três anos. A causa quase sempre não pode ser determinada, mas
fontes de chumbo e enxofre devem ser pesquisadas.
Outras causas importantes incluem intoxicação por sal, privação de água e infecção por herpevírus bovino.
Ovinos
Cenurose15 Animais de várias idades. Contato com fezes de cães.
Meningoencefalite por 9 Animais de várias idades. Contato com outros animais, alimento contaminado.
Listeria monocytogenes Listeriose relacionada ao consumo de silagem contaminada foi um achado inconsistente e não comprova-
do na maioria dos casos.
Tétano 8 Animais submetidos a processos invasivos (principalmente castração e tosquia) e após o parto.
Abscessos no sistema 7 Animais jovens com onfaloflebite ou feridas de castração ou caudectomia contaminadas.
nervoso central
Raiva 2 Contato com morcegos (ovinos próximos a áreas de encosta, morros ou furnas).
Caprinos
Meningoencefalite por 3 Contato com outros animais e alimento contaminado.
Listeria monocytogenes
Equinos
Leucoencefalomalacia 8 Animais de várias idades alimentados com milho mofado. Ocorre usualmente nos meses mais frios e úmi-
dos. Ocorre principalmente de junho a setembro.
Tripanossomíase 7 Presença de animais reservatórios (cães e capivaras). A transmissão ocorre pela picada de insetos hema-
tófagos ou carrapatos ou ainda de um equino a outro por meio de agulhas contaminadas.
Tétano 4 Animais submetidos a processos invasivos (principalmente castração e parto) e com feridas perfurantes
(principalmente na sola do casco).
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Daniel R. Rissi et al.960
Q
u
ad
ro
 2
. C
ar
ac
te
rí
st
ic
as
 c
lín
ic
o
-p
at
o
ló
g
ic
as
 d
as
 p
ri
n
ci
p
ai
s 
d
o
en
ça
s 
d
o
 s
is
te
m
a 
n
er
vo
so
 d
e 
b
o
vi
n
o
s 
d
ia
g
n
o
st
ic
ad
as
 n
o
L
ab
o
ra
tó
ri
o
 d
e 
P
at
o
lo
g
ia
 V
et
er
in
ár
ia
 d
a 
U
n
iv
er
si
d
ad
e 
F
ed
er
al
 d
e 
S
an
ta
 M
ar
ia
D
o
e
n
ça
s
P
rin
ci
pa
is
 s
in
ai
s 
cl
ín
ic
os
P
at
ol
og
ia
R
ai
va
In
co
or
de
na
çã
o,
 f
eb
re
, 
si
al
or
ré
ia
, 
fra
qu
ez
a,
 o
lh
ar
 a
le
rta
 e
 f
i-
M
ac
ro
: 
hi
pe
re
m
ia
 d
os
 v
as
os
 le
pt
om
en
ín
ge
os
 e
m
 a
pr
ox
im
ad
am
en
te
 5
0%
 d
os
 c
as
os
.
xo
, 
pa
ra
lis
ia
 f
lá
ci
da
 d
os
 m
em
br
os
, 
qu
ed
as
, 
op
is
tó
to
no
, 
hi
-
M
ic
ro
: 
m
en
in
go
en
ce
fa
lit
e 
nã
o-
su
pu
ra
tiv
a 
pr
in
ci
pa
lm
en
te
 n
o 
tr
on
co
 e
nc
ef
ál
ic
o.
 E
m
 a
pr
ox
im
ad
am
en
-
pe
re
xc
ita
bi
lid
ad
e,
 t
re
m
or
es
, 
di
fic
ul
da
de
 d
e 
ap
re
en
sã
o 
do
s
te
 8
5%
 d
os
 c
as
os
 f
or
am
 o
bs
er
va
da
s 
in
cl
us
õe
s 
eo
si
no
fíl
ic
as
 i
nt
ra
ci
to
pl
as
m
át
ic
as
 e
m
 n
eu
rô
ni
o 
(c
or
-
al
im
en
to
s,
 a
ta
xi
a,
 c
eg
ue
ira
, 
co
nv
ul
sõ
es
, 
di
sp
né
ia
, 
de
cú
-
pú
sc
ul
os
 d
e 
N
eg
ri)
. 
 G
an
gl
io
ne
ur
ite
 n
ão
-s
up
ur
at
iv
a 
do
 g
ân
gl
io
 d
e 
G
as
se
r,
 c
om
 n
ec
ro
se
 n
eu
ro
na
l 
e
bi
to
, 
m
ov
im
en
to
s 
de
 p
ed
al
ag
em
, 
pa
ra
lis
ia
 f
lá
ci
da
 d
a 
ca
ud
a.
ne
ur
on
of
ag
ia
, 
fo
i 
ob
se
rv
ad
a 
em
 9
0%
 d
os
 c
as
os
. 
In
cl
us
õe
s 
fo
ra
m
 o
bs
er
va
da
s 
em
 q
ua
se
 1
00
%
 d
os
gâ
ng
lio
s.
E
nc
ef
al
op
at
ia
A
gr
es
si
vi
da
de
, 
em
ag
re
ci
m
en
to
 p
ro
gr
es
si
vo
, 
di
ar
re
ia
 e
s-
M
ac
ro
: 
fíg
ad
o 
br
an
co
-a
ci
nz
en
ta
do
 e
 f
irm
e,
 e
de
m
a 
da
s 
pr
eg
as
 d
o 
ab
om
as
o 
e 
do
 m
es
en
té
rio
, 
di
st
en
-
he
pá
tic
a
cu
ra
, 
te
ne
sm
o 
e 
pr
ol
ap
so
 r
et
al
, 
ap
at
ia
, 
in
co
or
de
na
çã
o,
sã
o 
e 
ed
em
a 
da
 v
es
íc
ul
a 
bi
lia
r 
(c
om
 n
ód
ul
os
 n
a 
m
uc
os
a)
, 
em
ac
ia
çã
o,
 e
de
m
a 
su
bc
ut
ân
eo
 v
en
tr
al
 e
tr
em
or
es
 m
us
cu
la
re
s,
 s
al
iv
aç
ão
 e
 c
eg
ue
ira
. 
E
vo
lu
çã
o 
de
as
ci
te
.
po
uc
os
 d
ia
s 
at
é 
um
 a
no
. 
A
pó
s 
o 
in
ic
io
 d
os
 s
in
ai
s 
ne
ur
o-
M
ic
ro
: 
fib
ro
se
 h
ep
át
ic
a 
co
m
 h
ep
at
om
eg
al
oc
ito
se
 e
 p
ro
lif
er
aç
ão
 d
e 
de
 d
uc
to
s 
bi
lia
re
s.
 E
nc
ef
al
op
at
ia
ló
gi
co
s,
 n
o 
en
ta
nt
o,
 a
 e
vo
lu
çã
o 
é 
m
ai
s 
rá
pi
da
.
he
pá
tic
a 
(d
eg
en
er
aç
ão
 e
sp
on
jo
sa
 d
a 
su
bs
tâ
nc
ia
 b
ra
nc
a 
do
 e
nc
éf
al
o)
 é
 q
ua
se
 s
em
pr
e 
ob
se
rv
ad
a
.
M
en
in
go
en
ce
fa
lit
e
D
ep
re
ss
ão
, 
co
rr
im
en
to
 n
as
al
 e
 o
cu
la
r 
se
ro
so
 o
u 
m
uc
o-
M
ac
ro
: 
hi
pe
re
m
ia
 d
os
 v
as
os
 l
ep
to
m
en
ín
ge
os
, 
tu
m
ef
aç
ão
 e
 a
ch
at
am
en
to
 d
as
 c
irc
un
vo
lu
çõ
es
 d
as
po
r 
he
rp
es
 v
ír
us
pu
ru
le
nt
o,
 e
m
ag
re
ci
m
en
to
, 
fe
br
e,
 r
an
ge
r 
de
 d
en
te
s,
 t
re
m
o-
po
rç
õe
s 
ro
st
ra
is
 d
o 
te
le
nc
éf
al
o,
 c
om
 á
re
as
 m
ar
ro
m
-a
m
ar
el
ad
as
 e
 a
m
ol
ec
id
as
 (
m
al
ac
ia
).
bo
vi
no
re
s,
 c
eg
ue
ira
, 
an
da
r 
em
 c
ír
cu
lo
s,
 i
nc
oo
rd
en
aç
ão
, 
pr
es
sã
o
M
ic
ro
: 
m
en
in
go
en
ce
fa
lit
e 
nã
o-
su
pu
ra
tiv
a 
e 
ne
cr
os
an
te
 (
em
 o
rd
em
 d
ec
re
sc
en
te
 d
e 
in
te
ns
id
ad
e:
 c
ór
-
da
 c
ab
eç
a 
co
nt
ra
 o
bj
et
os
, 
ni
st
ag
m
o,
 q
ue
da
s,
 m
ov
im
en
-
te
x 
te
le
nc
ef
ál
ic
o 
fr
on
ta
l, 
nú
cl
eo
s 
da
 b
as
e,
 t
ál
am
o,
 t
ro
nc
o 
en
ce
fá
lic
o,
 c
ór
te
x 
pa
rie
ta
l, 
có
rt
ex
 o
cc
ip
i-
to
s 
de
 p
ed
al
ag
em
, 
op
is
tó
to
no
 e
 c
on
vu
ls
õe
s.
 
E
vo
lu
çã
o
ta
l e
 c
er
eb
el
o)
, 
gl
io
se
, 
ed
em
a,
 n
ec
ro
se
 n
eu
ro
na
l 
(n
eu
rô
ni
o 
ve
rm
el
ho
), 
in
cl
us
õe
s 
ba
so
fíl
ic
as
 i
nt
ra
nu
cl
e-
de
 1
-1
0 
di
as
.
ar
es
 e
m
 a
st
ró
ci
to
s 
e 
ne
ur
ôn
io
s 
(2
1,
05
%
 d
os
 c
as
os
) 
e 
ne
ur
on
of
ag
ia
. 
N
as
 á
re
as
 a
m
ol
ec
id
as
 h
av
ia
 n
e-
cr
os
e 
do
 c
om
po
ne
nt
e 
ne
ur
oe
ct
od
ér
m
ic
o 
e 
m
an
ut
en
çã
o 
da
s 
es
tr
ut
ur
as
 m
es
en
qu
im
ai
s 
(v
asos
 e
 m
i-
cr
óg
lia
),
 c
om
 i
nf
ilt
ra
do
 d
e 
cé
lu
la
s 
gi
tte
r.
 N
os
 c
as
os
 c
rô
ni
co
s 
ap
en
as
 e
st
ru
tu
ra
s 
va
sc
ul
ar
es
 e
 p
ou
-
ca
s 
cé
lu
la
s 
gi
tte
r 
pe
rm
an
ec
ia
m
 (
le
sã
o 
re
si
du
al
).
 C
as
os
 h
ip
er
ag
ud
os
 s
em
 a
lte
ra
çõ
es
 m
ac
ro
 e
 m
i-
cr
os
có
pi
ca
s 
sã
o 
co
m
un
s.
B
ab
es
io
se
In
co
or
de
na
çã
o,
 o
pi
st
ót
on
o,
 c
eg
ue
ira
, 
tre
m
or
es
, 
hi
pe
rm
et
ria
,
M
ac
ro
: 
co
lo
ra
çã
o 
ve
rm
el
ho
-c
er
ej
a 
de
 t
od
a 
a 
su
bs
tâ
nc
ia
 c
in
ze
nt
a 
do
 e
nc
éf
al
o,
 i
ct
er
íc
ia
, 
ur
in
a 
e 
rin
s
ce
re
br
al
pa
ra
lis
ia
 d
os
 m
em
br
os
 p
él
vi
co
s,
 m
ov
im
en
to
s 
de
 p
ed
al
a-
ve
rm
el
ho
-e
sc
ur
os
, 
fíg
ad
o 
ve
rm
el
ho
-a
la
ra
nj
ad
o 
e 
co
m
 a
um
en
to
 d
e 
vo
lu
m
e,
 h
em
or
ra
gi
as
 n
o 
ep
ic
ár
di
o
ge
m
, 
pr
es
sã
o 
da
 c
ab
eç
a 
co
nt
ra
 o
bj
et
os
, 
an
da
r 
em
 c
ír
-
e 
en
do
cá
rd
io
 e
 e
m
be
bi
çã
o 
he
m
og
lo
bí
ni
ca
 n
as
 s
er
os
as
. 
N
o 
es
fr
eg
aç
o 
de
 e
nc
éf
al
o 
se
 o
bs
er
va
m
 c
a-
cu
lo
s 
e 
ag
re
ss
iv
id
ad
e.
 H
em
og
lo
bi
nú
ria
 é
 o
bs
er
va
da
 n
a
pi
la
re
s 
re
pl
et
os
 d
e 
er
itr
óc
ito
s 
pa
ra
si
ta
do
s 
po
r 
B
. 
bo
vi
s.
m
ai
or
ia
 d
os
 c
as
os
.
M
ic
ro
: 
co
ng
es
tã
o 
e 
ed
em
a 
pe
riv
as
cu
la
r 
e 
pe
rin
eu
ro
na
l, 
ne
fr
os
e 
he
m
og
lo
bi
nú
ric
a,
 n
ec
ro
se
 h
ep
át
i-
ca
 c
en
tr
ol
ob
ul
ar
 e
 b
ile
st
as
e 
ca
na
lic
ul
ar
.
In
to
xi
ca
çã
o 
po
r 
S
o-
E
m
ag
re
ci
m
en
to
 p
ro
gr
es
si
vo
, 
hi
pe
rm
et
ria
, 
in
co
or
de
çã
o,
 q
ue
-
M
ac
ro
: 
he
m
or
ra
gi
as
 n
o 
en
cé
fa
lo
 (
se
cu
nd
ár
ia
s 
a 
tr
au
m
at
is
m
o)
. 
A
tr
of
ia
 c
er
eb
el
ar
 é
 r
ar
am
en
te
 o
b-
la
nu
m
 f
as
tig
ia
tu
m
da
s,
 t
re
m
o
re
s 
m
us
cu
la
re
s,
 c
on
vu
ls
õe
s.
 O
s 
si
na
is
 a
pa
-
se
rv
a
d
a
.
re
ci
am
 q
ua
nd
o 
os
 b
ov
in
os
 e
ra
m
 m
ov
im
en
ta
do
s.
 
A
lg
un
s
M
ic
ro
: 
de
ge
ne
ra
çã
o 
e 
pe
rd
a 
do
s 
ne
ur
ôn
io
s 
de
 P
ur
ki
nj
e 
(fi
na
 v
ac
uo
liz
aç
ão
 d
o 
pe
ric
ár
io
, 
co
m
 p
er
da
 d
a
bo
vi
no
s 
er
am
 p
os
iti
vo
s 
no
 h
ea
d 
ra
is
in
g 
te
st
 (
ap
re
se
nt
a-
su
bs
tâ
nc
ia
 d
e 
N
is
sl
 e
 e
os
in
of
ili
a 
ci
to
pl
as
m
át
ic
a)
, 
pr
ol
ife
ra
çã
o 
do
s 
as
tr
óc
ito
s 
de
 B
er
gm
an
n,
 e
sf
er
ói
-
va
m
 c
on
vu
ls
õe
s 
ap
ós
 t
er
em
 a
 c
ab
eç
a 
er
gu
id
a 
du
ra
nt
e 
um
fe
ró
id
es
 a
xo
na
is
 (
na
 c
am
ad
a 
de
 c
él
ul
as
 g
ra
nu
la
re
s 
e 
na
 s
ub
st
ân
ci
a 
br
an
ca
 d
o 
ce
re
be
lo
).
m
in
ut
o 
e 
so
lta
 e
m
 s
eg
ui
da
).
 A
pó
s 
as
 c
ris
es
, 
al
gu
ns
 b
o-
pe
rm
an
ec
ia
m
 c
om
 o
s 
m
em
br
os
 e
m
 p
os
iç
ão
 d
e 
ba
se
 a
m
-
pl
a,
 p
ar
a 
te
nt
ar
 m
an
te
r 
o 
eq
ui
líb
rio
. 
A
 m
or
te
 o
co
rr
e 
us
ua
l-
m
en
te
 p
or
 t
ra
um
as
 a
pó
s 
as
 c
ris
es
.
F
eb
re
 c
at
ar
ra
l
Fe
br
e,
 c
or
rim
en
to
 n
as
al
 e
 o
cu
la
r 
se
ro
so
 q
ue
 n
or
m
al
m
en
te
M
ac
ro
: 
le
sõ
es
 e
ro
si
vo
-u
lc
er
at
iv
as
 n
as
 m
uc
os
as
 n
as
al
 e
 d
o 
tr
at
o 
al
im
en
ta
r 
(c
om
 n
ec
ro
se
 d
as
 p
a-
m
al
ig
na
ev
ol
ui
 p
ar
a 
m
uc
o-
pu
ru
le
nt
o,
 o
pa
ci
da
de
 d
a 
có
rn
ea
, 
co
nj
un
ti-
pi
la
s 
ru
m
in
ai
s)
, 
úl
ce
ra
s 
na
 t
ra
qu
éi
a,
 a
um
en
to
 d
e 
vo
lu
m
e 
de
 l
in
fo
no
do
s.
vi
te
, 
si
al
or
ré
ia
, 
ne
cr
os
e 
da
s 
pa
pi
la
s 
bu
ca
is
, 
úl
ce
ra
s 
na
 c
a-
M
ic
ro
: 
va
sc
ul
ite
 e
 n
ec
ro
se
 f
ib
rin
oi
de
 d
a 
pa
re
de
 d
e 
pe
qu
en
as
 a
rt
ér
ia
s 
e 
ar
te
rio
la
s 
as
so
ci
ad
as
 a
 i
n-
vi
da
de
 o
ra
l, 
lin
fa
de
no
pa
tia
 e
 d
ia
rr
éi
a.
 S
in
ai
s 
ne
rv
os
os
 i
n-
fil
tr
ad
o 
in
fla
m
at
ór
io
 l
in
fo
-h
is
tio
pl
as
m
oc
itá
rio
, 
pr
in
ci
pa
lm
en
te
 n
a 
re
te
 m
ira
bi
le
 c
ar
ot
íd
ea
, 
si
st
em
a 
ne
r-
cl
ue
m
 i
nc
oo
rd
en
aç
ão
, 
hi
pe
rm
et
ria
, 
ap
at
ia
, 
tre
m
or
es
, 
ag
re
s-
vo
so
 c
en
tr
al
 e
 r
im
. 
N
ec
ro
se
 e
pi
te
lia
l a
ss
oc
ia
da
 a
 in
fil
tr
ad
o 
in
fla
m
at
ór
io
 m
on
on
uc
le
ar
 n
a 
 lâ
m
in
a 
pr
ó-
si
vi
da
de
, 
qu
ed
as
, 
op
is
tó
to
no
, 
m
ov
im
en
to
s 
de
 p
ed
al
ag
em
pr
ia
 d
a 
m
uc
os
a 
de
 v
ár
io
s 
ór
gã
os
 (
es
pe
ci
al
m
en
te
 d
os
 t
ra
to
s 
al
im
en
ta
r 
e 
re
sp
ira
tó
rio
) 
e 
hi
pe
rp
la
si
a
e 
co
nv
ul
sõ
es
.
lin
fo
id
e 
em
 li
nf
on
od
os
.
P
ol
io
en
ce
fa
lo
m
al
ac
ia
In
co
or
de
na
çã
o,
 d
ec
úb
ito
, 
ce
gu
ei
ra
, 
op
is
tó
to
no
, 
m
ov
im
en
-
M
ac
ro
: 
tu
m
ef
aç
ão
 c
om
 a
ch
at
am
en
to
 d
as
 c
irc
un
vo
lu
çõ
es
 t
el
en
ce
fá
lic
as
, 
ár
ea
s 
am
ol
ec
id
as
 e
 a
m
a-
to
s 
de
 p
ed
al
ag
em
, 
an
da
r 
em
 c
írc
ul
os
, 
at
ax
ia
, 
qu
ed
as
, 
ra
n-
re
la
s,
 
fo
co
s 
de
 h
em
or
ra
gi
a 
e 
he
rn
ia
çã
o 
ce
re
be
la
r.
ge
r 
de
 d
en
te
s,
 s
ia
lo
rr
ei
a 
e 
ni
st
ag
m
o.
 E
vo
lu
çã
o 
de
 2
-8
 d
ia
s.
M
ic
ro
: 
ne
cr
os
e 
ne
ur
on
al
 l
am
in
ar
 s
eg
m
en
ta
r, 
co
m
 e
sp
on
gi
os
e,
 t
um
ef
aç
ão
 do 
nú
cl
eo
 d
as
 c
él
ul
as
 e
n-
do
te
lia
is
, 
as
tr
óc
ito
s 
A
lz
he
im
er
 t
ip
o 
II 
e 
in
fil
tr
aç
ão
 d
e 
cé
lu
la
s 
gi
tte
r.
 C
as
os
 c
om
 i
nf
ilt
ra
do
 l
in
fo
-h
is
tio
-
ci
tá
rio
, 
ne
ut
ro
fíl
ic
o 
ou
 e
os
in
of
íli
co
 t
am
bé
m
oc
or
re
m
. 
E
ss
as
 l
es
õe
s 
oc
or
re
m
 p
rin
ci
pa
lm
en
te
 n
o 
có
r-
te
x 
te
le
nc
ef
ál
ic
o 
oc
ci
pi
ta
l, 
pa
rie
ta
l e
 f
ro
nt
al
 e
 m
en
os
 f
re
qu
en
te
m
en
te
 n
o 
hi
po
ca
m
po
, 
nú
cl
eo
s 
ba
sa
is
,
tá
la
m
o,
 m
es
en
cé
fa
lo
 e
 c
er
eb
el
o.
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Abordagem diagnóstica das principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e equinos no Brasil 961
Quadro 4. Características clínico-patológicas das principais doenças do sistema nervoso de equinos diagnosticadas no
Laboratório de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria
Doenças Principais sinais clínicos Patologia
Leucoencefalomalacia Anorexia, incoordenação, depressão, andar Macro: áreas multifocais ou focalmente extensas de amolecimento e
em círculos, pressão da cabeça contra ob- amarelamento da substância branca subcortical do telencéfalo e tronco
jetos, cegueira, hiperexcitação, quedas e mo- encefálico.
vimentos de pedalagem. Micro: tumefação endotelial, com áreas de hemorragia e/ou edema peri-
vascular e necrose do parênquima com infiltração de células gitter.
Tripanossomíase Emagrecimento progressivo, letargia, inco- Macro: edema e malacia da substância branca e cinzenta do encéfalo,
ordenação, instabilidade dos membros pél- esplenomegalia, linfadenomegalia, hiperplasia linfoide e atrofia muscu-
vicos, atrofia muscular nos membros pélvi- lar.
cos, fraqueza e palidez de mucosas. Micro: panencefalite não-supurativa (com grande número de células
de Mott), com marcado edema. A medula espinhal também pode ser
afetada. Trypanosoma evansi é detectado em seções de encéfalo pe-
la imuno-histoquímica.
Tétano Hiperexcitabilidade, posição de cavalete e Usualmente não há alterações macroscópicas ou histológicas, mas
prolapso de terceira pálpebra. alguns cavalos podem desenvolver hemorragia no músculo psoas.
Quadro 3. Características clínico-patológicas das principais doenças do sistema nervoso de ovinos e caprinos
diagnosticadas no Laboratório de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria
Espécies/doenças Principais sinais clínicos Patologia
Ovinos
Cenurose Depressão, isolamento do rebanho, andar Macro: achatamento das circunvoluções do telencéfalo, herniação sub-
cambaleante, cegueira, desvio da cabeça, tentorial ou cerebelar e atrofia do parênquima adjacente secundaria-
incoordenação, movimentos de pedalagem, mente à presença de cistos revestidos por fina cápsula transparente e
quedas, andar em círculos, deficiência pro- repletos por líquido translúcido. Estruturas brancas e levemente alonga-
prioceptiva nos membros torácicos e pél- das de 1mm (escólices) são observadas aderidas à face interna da
vicos, estrabismo, midríase, opistótono, tre- cápsula.
mores e rigidez dos membros. Micro: cistos compostos por duas membranas eosinofílicas com nume-
rosos escólices esféricos evaginados da membrana interna. Os cistos
eram revestidos por áreas de necrose, infiltrado granulomatoso e áreas de
mineralização. Mais externamente havia infiltrado linfo-histioplasmoci-
tário perivascular em meio a fibroblastos e vasos.
Meningoencefalite por Desvio da cabeça, andar em círculos, de- Macro: usualmente não há alterações.
Listeria monocytogenes cúbito, cegueira, taquipneia, febre e sialor- Micro: meningoencefalite não-supurativa (predominantemente no tronco
reia. encefálico e cerebelo), com microabscessos e/ou infiltração de células
gitter ou infiltrado piogranulomatoso.
Tétano Andar rígido, opistótono, rigidez muscular, Usualmente não há alterações macroscópicas ou microscópicas.
posição em base ampla, sialorreia, decúbi-
to, movimentos de pedalagem, hiperexcita-
bilidade e ranger de dentes.
Abscessos no sistema Paresia dos membros pélvicos (abscessos Macro: nos abscessos medulares pode haver também osteomielite
nervoso central medulares), desvio lateral da cabeça, andar purulenta do corpo da vértebra. No encéfalo havia abscessos preen-
em círculos, movimentos de pedalagem, ran- chidos por material purulento.
ger de dentes, cegueira, opistótono e decú- Micro: áreas de necrose de liquefação preenchidas por neutrófilos dege-
bito (abscessos encefálicos). nerados, agregados bacterianos e focos de mineralização.
Essas áreas eram circundadas por uma cápsula de tecido fibrovascular
e infiltrado inflamatório linfo-histioplasmocitário.
Raiva Incoordenação, decúbito, convulsões, opis- Macro: usualmente não há alterações.
tótono e febre. Micro: meningoencefalomielite e ganglionite (gânglio de Gasser) não-
supurativa com inclusões eosinofílicas intracitoplasmáticas em neurô-
nios (corpúsculos de Negri).
Caprinos
Meningoencefalite por Anorexia, desvio lateral da cabeça, incoor- Macro: usualmente não há alterações.
Listeria monocytogenes denação, quedas, decúbito e movimentos Micro: meningoencefalite não-supurativa (predominantemente no tronco
de pedalagem. encefálico e cerebelo), com microabscessos e/ou infiltração de células
gitter ou infiltrado piogranulomatoso.
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Daniel R. Rissi et al.962
Todas as informações julgadas importantes e necessárias para
o diagnóstico de cada doença em cada espécie foram resumi-
damente agrupadas nos Quadros 1-5.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A lista das principais doenças do sistema nervoso de ru-
minantes e equinos diagnosticadas no LPV-UFSM entre
1964 e 2008 está no Quadro 1. Os principais dados epide-
miológicos e clínico-patológicos dessas doenças estão nos
Quadros 1-4 e nas Figuras 1-18. Para uma descrição deta-
lhada de cada doença o leitor pode acessar as publica-
ções correspondentes às doenças de bovinos (Sanches
et al. 2000, Langohr et al. 2003, Garmatz et al. 2004, Rech
et al. 2004, 2006a,b,c, Rodrigues et al. 2005a, Rissi et al.
2006a, 2007, 2008b, Sant’Ana et al. 2009a,b, Lucena et al.
2010), ovinos (Rissi et al. 2008a,c, 2010a,b), caprinos (Rissi
et al. 2006b) e equinos (Barros et al. 1984, Rodrigues et al.
2005b, 2009, Pierezan et al. 2007, 2009).
Como ocorre em qualquer sistema, para o diagnóstico
das doenças do SN é necessário um histórico epidemioló-
gico e clínico completo e, quando for o caso, uma comple-
ta descrição dos achados macroscópicos. Além disso, o
material enviado deve ser adequadamente preservado e
acondicionado (em formol a 10% e/ou gelo). Com base
nessas informações o patologista poderá manter parte do
material para possíveis exames adicionais (microbiológi-
co ou molecular) e realizar os testes necessários de acor-
do com a suspeita clínica. Não é incomum que materiais
Quadro 5. Métodos de diagnóstico das principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e equinos diagnosticadas
no Laboratório de Patologia Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria
Espécies/doenças Diagnóstico
Bovinos
Raiva As inclusões intracitoplasmáticas eosinofílicas (corpúsculos de Negri) em neurônios são diagnós-
ticas, mas na sua ausência é necessária a confirmação pela imunofluorescência indireta, inocu-
lação em camundongos (material resfriado ou congelado) ou por imuno-histoquímica (em material fi-
xado em formol e/ou emblocado).
Encefalopatia hepática Correlação da degeneração esponjosa com as alterações de insuficiência hepática (no Brasil, prin-
cipalmente fibrose hepática decorrente de intoxicação poralcaloides pirrolizidínicos). A microscopia
eletrônica demonstra o edema intramielínico, mas esse exame não é necessário para o diagnóstico.
Meningoencefalite por herpesvírus bovino A histopatologia é sugestiva e as inclusões eosinofílicas intranucleares em astrócitos e raramente
em neurônios confirmam a infecção por herpesvírus bovino. A reação em cadeia da polimerase (PCR)
em material resfriado ou congelado (detecção do gene da glicoproteína B) confirma a infecção. A
partir de cultivo e isolamento viral a tipificação do vírus (1 ou 5) é realizada pela PCR e amplificação
de uma região da glicoproteína C específica para cada um dos tipos. A imuno-histoquímica não
parece ser satisfatória.
Babesiose cerebral A coloração vermelho-cereja da substância cinzenta encefálica observada macroscopicamente é
diagnóstica para a condição causada por B. bovis. Em alguns casos essa alteração pode não ser
observada (a fixação em formol também prejudica a observação). Nesses casos, o diagnóstico é
confirmado pelos achados macroscópicos e microscópicos (esfregaço de córtex encefálico e
histo-patologia).
Intoxicação por Solanum fastigiatum Alterações histopatológicas associadas à presença de grande quantidade da planta na pastagem.
Febre catarral maligna Epidemiologia, achados clínico-patológicos (principalmente histopatologia). A confirmação é rea-
lizada pela detecção de herpesvírus ovino-2 na PCR.
Polioencefalomalacia Alterações características no encéfalo. Deve ser feito o diagnóstico diferencial de infecção por her-
pesvírus bovino. A causa especifica não é definida na maioria dos casos de polioencefalomalacia.
Ovinos
Cenurose Os achados macroscópicos são diagnósticos.
Meningoencefalite por Listeria Os achados histopatológicos são característicos (porém casos atípicos podem ser observados). A
monocytogenes confirmação pode ser feita por cultivo (material resfriado), imuno-histoquímica (mais indicada) ou PCR.
Tétano A ausência de alterações macroscópicas e histopatológicas associada aos achados epidemioló-
gicos e clínicos é sugestiva e, na maioria dos casos, o diagnóstico é feito dessa maneira. A con-
firmação é realizada por inoculação de líquido cefalorraquidiano em camundongos. Também pode
ser realizada imunofluorescência e cultura (em esfregaços de baço ou da ferida).
Abscessos no sistema nervoso central Os achados macroscópicos são diagnósticos. O cultivo bacteriano de conteúdo resfriado do absces-
so revelará o agente envolvido.
Raiva O mesmo que para bovinos.
Caprinos
Meningoencefalite por Listeria O mesmo que para ovinos.
monocytogenes
Equinos
Leucoencefalomalacia Os achados macroscópicos e histopatológicos são diagnósticos. Pode ser realizada a detecção
da toxina fumonisina B1 de Fusarium verticillioides em amostras do milho.
Tripanossomíase Os achados epidemiológicos e clínico-patológicos são sugestivos. A confirmação é feita pela imuno-
histoquímica em cortes de encéfalo e detecção do agente na neurópila.
Tétano O mesmo que para bovinos.
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Abordagem diagnóstica das principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e equinos no Brasil 963
Fig.1. Neurônio com quatro inclusões eosinofílicas intracito-
plasmáticas (corpúsculos de Negri) em bovino afetado pela
raiva. HE, obj.100x.
Fig.3. Encéfalo de bovino afetado por meningoencefalite por
herpesvírus bovino. Há marcada hiperemia leptomeníngea
e hemorragia subpial. As porções deprimidas distribuídas
pelo córtex telencefálico (principalmente nas porções
rostrais) correspondem a áreas de malacia características
dessa infecção.
Fig.5. Seção de córtex telencefálico de bovino afetado por
meningoencefalite por herpesvírus bovino (lesão mais avan-
çada que a demonstrada na Fig.4). Observe o infiltrado
linfoplasmocitário perivascular, a fragmentação da neuró-
pila e a infiltração de macrófagos espumosos (células gitter).
HE, obj.10x.
Fig.2. Junção da substância branca e cinzenta telencefálica
de bovino com encefalopatia hepática (intoxicação por
Senecio sp.). Note os vacúolos característicos que corres-
pondem a áreas de edema intramielínico. HE, obj.40x.
Fig.4. Seção de córtex telencefálico de bovino afetado por
meningoencefalite por herpesvírus bovino evidenciando
necrose neuronal, com encarquilhamento e eosinofilia ci-
toplasmático e picnose nuclear. HE, obj.10x. Detalhe: as-
trócito com inclusão eosinofílica intranuclear (centro). HE,
obj.10x.
Fig. 6. Corte sagital de encéfalo de bovino afetado por babesi-
ose cerebral. A substância cinzenta (mais evidente no
córtex) está difusamente vermelho-cereja devido ao aprisi-
onamento de eritrócitos parasitados por Babesia bovis nos
capilares.
5
3
1 2
4
6
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Daniel R. Rissi et al.964
Fig.7. Amostra de esfregaço de córtex telencefálico demons-
trando capilar sanguíneo repleto de eritrócitos parasitados
por grande número de exemplares de Babesia bovis..
Fig.9. Fina vacuolização citoplasmática de neurônios de Purkin-
je em um bovino afetado pela intoxicação por Solanum
fastigiatum. HE, obj.40x.
Fig.11. Encéfalo de ovino afetado por cenurose. Há um grande
cisto revestido por parede fina e transparente no lobo occi-
pital do hemisfério cerebral direito. Esse cisto está repleto
de líquido translúcido e numerosos escólices de Coenurus
cerebralis.
Fig.8. Artéria leptomeníngea de bovino afetado por febre
catarral maligna. A infiltração linfoplasmocitária das cama-
das adventícia e média caracteriza a vasculite tipicamente
observada nesses casos. HE, obj.40x.
Fig. 10. Telencéfalo parietal de bovino afetado por polioence-
falomalacia. Observe a fenda contínua que separa a por-
ção média da sustância cinzenta. Essa fenda está preen-
chida por líquido claro (edema) e macrófagos espumosos
(células gitter).
Fig.12. Seção de tronco encefálico (ponte) de caprino afetado
por listeriose. Há numerosos focos de aglomerados de
neutrófilos (microabscessos) que são característicos des-
sa doença. HE, obj.20x.
7
9
11 12
10
8
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Abordagem diagnóstica das principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e equinos no Brasil 965
Fig.13. Seção de tronco encefálico de caprino afetado por lis-
teriose. Abundante quantidade de antígeno de Listeria sp.
(em marrom) é marcada no interior do citoplasma de ma-
crófagos espumosos (células gitter). Imuno-histoquímica,
avidina-biotina, obj. 20.
Fig.15. Corte sagital de encéfalo de eqüino afetado por leuco-
encefalomalacia. Observe a área bem demarcada, depri-
mida e hemorrágica de malacia na substância branca do
hemisfério cerebral esquerdo.
Fig.17. Seção de encéfalo de equino afetado por tripanosso-
míase. Há marcado infiltrado inflamatório perivascular linfo-
histioplasmocitário. HE, obj.10x.
Fig.14. Bovino afetado por tétano apresentando membros es-
tendidos e rígidos e marcado opistótono.
Fig.16. Aspecto submacroscópico da mesma lesão mostrada
na Fig. 14. Grande parte da substância branca está frag-
mentada e forma uma cavidade preenchida por líquido
(edema), eritrócitos (hemorragia) e macrófagos espumo-
sos (células gitter). HE, obj.2x.
Fig.18. Numerosos exemplares de Trypanosoma evansi (em
marrom) são observados na neurópila de equino com tri-
panossomíase. Imuno-histoquímica, avidina-biotina,
obj.40x.
14
16
1817
13
13
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Daniel R. Rissi et al.966
remetidos aos laboratórios de diagnóstico sejam recebi-
dos com dados vagos e/ou equivocados ou até mesmo
sem nenhuma dessas informações. Nesses casos, a cor-
reta avaliação do caso e consequentemente o diagnóstico
serão prejudicados. Os dados conseguidos a partir de uma
boa observação dos achados epidemiológicos e clínico-
patológicos podem ser comparados aos descritos nos
Quadros 1-4.
A avaliação macroscópicado encéfalo (e, quando for o
caso, da medula espinhal ou dos nervos periféricos) pode
fornecer pistas substanciais para o diagnóstico de uma
doença neurológica. É importante que uma avaliação mi-
nuciosa seja realizada tanto pelo veterinário de campo,
que vai enviar o material ao laboratório, como pelo patolo-
gista, ao receber o material. A correta avaliação e descri-
ção das alterações pelo veterinário são importantes, pois
algumas lesões podem desaparecer após a fixação no
formol e assim passarão despercebidas pelo patologista.
Parâmetros que sempre devem ser incluídos na avaliação
macroscópica do encéfalo incluem (1) a distribuição das
lesões; (2) a cor; (3) a textura; e (4) a simetria (Barros et
al. 2006). Esses parâmetros obviamente podem ser extra-
polados para qualquer descrição macroscópica de qual-
quer outro órgão. A distribuição pode ser bilateral e simé-
trica (por ex., encefalomalacia focal simétrica em ovinos
com enterotoxemia), focal (abscessos ou neoplasmas),
multifocal (abscessos), afetando a substância branca (leu-
coencefalomalacia) ou cinzenta (meningoencefalite por
herpesvírus bovino ou polioencefalomalacia). A cor pode
indicar aspectos como maior quantidade de sangue nos
vasos leptomeníngeos (hiperemia em casos de encefalite
viral ou bacteriana), em vasos da substância cinzenta (ba-
besiose cerebral) ou em casos de hemorragias (desde
petéquias em casos de septicemia até grandes hemato-
mas por traumatismo). Adicionalmente, focos amarelos ou
marrom-amarelados no encéfalo são sugestivos de necro-
se (malacia). A textura do encéfalo também fornece evi-
dências importantes, como em focos amolecidos de mala-
cia e em coleções de pus contidas em abscessos, ou em
áreas sólidas, como no caso de inflamação granulomato-
sa ou neoplasmas. Assimetria revela que algo foi adicio-
nado (edema, neoplasmas e hemorragia) ou retirado (atrofia
ou hipoplasia) de alguma porção do órgão. Esse ítem pode
ser facilmente avaliado no encéfalo quando se toma por
base os dois hemisférios (isto é, quando há simetria, o
que há em um hemisfério deve ser repetido do outro lado,
em igual volume).
Após uma completa descrição do caso, a avaliação
histológica será mais facilmente interpretada e os exames
adicionais serão direcionados de uma forma mais precisa,
principalmente em casos onde não se observam achados
típicos que poderiam ser utilizados como ferramenta no
diagnóstico final de uma determinada doença (inclusões
virais, o próprio agente etiológico, etc). Os métodos mais
eficientes de diagnóstico de cada uma das principais do-
enças do SN de ruminantes e equinos no LPV-UFSM po-
dem ser consultados no Quadro 5.
Neste trabalho foram apresentadas as principais doen-
ças do SN de ruminantes e equinos diagnosticadas pelo
LPV-UFSM. Apesar de representar a experiência de um
único laboratório de diagnóstico, não há uma grande varia-
ção nas doenças aqui mostradas e das doenças diagnos-
ticadas no restante do Brasil. Todos os aspectos de cada
doença apresentada foram descritos em publicações pré-
vias e podem ser consultados para visualização de dados
mais detalhados.
REFERÊNCIAS
Barros C.S.L., Barros S.S., Santos M.N. & Souza M.A. 1984. Leucoen-
cefalomalacia em eqüinos no Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras.
4:101-107.
Barros C.S.L., Driemeier D., Dutra I.S. & Lemos R.A.A. 2006. Doen-
ças do sistema nervoso de bovinos no Brasil. Agnes, Montes
Claros. 207p.
Garmatz S.L., Irigoyen L.F., Rech R.R., Brown C.C., Zhang J. &
Barros C.S.L. 2004. Febre catarral maligna em bovinos no Rio
Grande do Sul: transmissão experimental para bovinos e caracte-
rização do agente etiológico. Pesq. Vet. Bras. 24:93-106.
Langohr I.M., Irigoyen L.F., Lemos R.A.A. & Barros C.S.L. 2003.
Aspectos epidemiológicos, clínicos e distribuição das lesões his-
tológicas no encéfalo de bovinos com raiva. Ciência Rural 33:125-
131.
Lucena R.B., Pierezan F., Kommers G.D., Irigoyen L.F., Fighera R.A.
& Barros C.S.L. 2010. Doenças de bovinos no Sul do Brasil: 6.706
casos. Pesq. Vet. Bras. 30(5):428-434.
Pierezan F., Lemos R.A.A., Rech R.R., Rissi D.R., Kommers G.D.,
Cortada V.C.L.M., Mori A.E. & Barros C.S.L. 2007. Raiva em eqüinos.
XIII Enapave, Campo Grande, MS. (Resumo).
Pierezan F., Rissi D.R., Rech R.R., Fighera R.A., Brum J.S. & Barros
C.S.L. 2009. Achados de necropsia relacionados com a morte de
335 eqüinos: 1968-2007. Pesq. Vet. Bras. 29:275-280.
Rech R.R., Schild A.L., Driemeier D., Garmatz S.L., Oliveira F.N., Riet-
Correa F. & Barros C.S.L. 2004. Febre catarral maligna em bovinos
no Rio Grande do Sul: epidemiologia, sinais clínicos e patologia.
Pesq. Vet. Bras. 25:97-105.
Rech R.R., Rissi D.R., Pierezan F., Inkelmann M.A. & Barros C.S.L.
2006a. Raiva em herbívoros: 27 casos. Endivet, Campo Grande,
MS. (Resumo).
Rech R.R., Rissi D.R., Rodrigues A., Pierezan F., Piazer J.V.M.,
Kommers G.D. & Barros C.S.L. 2006b. Intoxicação por Solanum
fastigiatum (Solanaceae) em bovinos: históricos, sinais clínicos e
morfometria das lesões cerebelares. Pesq. Vet. Bras. 26:123-132.
Rech R.R., Rissi D.R., Silva M.C., Inkelmann M.A. & Barros C.S.L.
2006c. Histomorfologia do gânglio de Gasser, da rete mirabile
carotídea e da hipófise de bovinos: estudo de 199 casos. Pesq. Vet.
Bras. 26:105-111.
Rissi D.R., Oliveira F.N., Rech R.R., Pierezan F., Lemos R.A.A. &
Barros C.S.L. 2006a. Epidemiologia, sinais clínicos e distribuição
das lesões encefálicas em bovinos afetados por meningoencefalite
por herpesvírus bovino-5. Pesq. Vet. Bras. 26:123-132.
Rissi D.R., Pierezan F., Kommers G.D. & Barros C.S.L. 2008a. Ocor-
rência de raiva em ovinos no Rio Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras.
28:495-500.
Rissi D.R., Pierezan F., Silva M.S., Flores E.F. & Barros C.S.L. 2008b.
Neurological disease in cattle in southern Brazil associated with Bovine
herpesvirus infection. J. Vet. Diagn. Invest. 20:346-349.
Rissi D.R., Rech R.R., Pierezan F., Gabriel A.L., Trost M.E. & Barros
C.S.L. 2008c. Cenurose em ovinos no Sul do Brasil: 16 casos. Ciên-
cia Rural 38:1044-1049.
Pesq. Vet. Bras. 30(11):958-967, novembro 2010
Abordagem diagnóstica das principais doenças do sistema nervoso de ruminantes e equinos no Brasil 967
Rissi D.R., Fighera R.A., Irigoyen L.F., Kommers G.D. & Barros C.S.L.
2010a. Doenças neurológicas de ovinos na região Central do Rio
Grande do Sul. Pesq. Vet. Bras. 30:21-28.
Rissi D.R., Kommers G.D., Marcolongo-Pereira C., Schild A.L. & Bar-
ros C.S.L. 2010b. Meningoencefalite por Listeria monocytogenes
em ovinos. Pesq. Vet. Bras. 30:51-56.
Rodrigues A., Rech R.R., Barros R.R., Fighera R.A. & Barros C.S.L. 2005a.
Babesiose cerebral em bovinos: 20 casos. Ciência Rural 35:121-125.
Rodrigues A., Fighera R.A., Souza T.A., Schild A.L., Soares M.P.,
Milano J. & Barros C.S.L. 2005b. Surtos de tripanossomíase por
Trypanosoma evansi em eqüinos no Rio Grande do Sul: aspectos
epidemiológicos, clínicos, hematológicos e patológicos. Pesq. Vet.
Bras. 25:239-249.
Rodrigues A., Fighera R.A., Souza T.M., Schild A.L. & Barros C.S.L.
2009. Neuropathology of naturally occurring Trypanosoma evansi
infection of horses. Vet. Pathol. 46:251-258.
Sanches A.W.D., Langohr I.M., Stigger A.L. & Barros C.S.L. 2000.
Doenças do sistema nervoso central em bovinos no sul do Brasil.
Pesq. Vet. Bras. 20:113-118.
Sant’Ana F.J.F., Rissi D.R., Lucena R.B., Lemos R.A.A., Nogueira
A.P.A. & Barros C.S.L. 2009a. Polioencefalomalacia em bovinos:
epidemiologia, sinais clínicos e distribuição das lesões no encéfalo.
Pesq. Vet. Bras. 29:487-497.
Sant’Ana F.J.F., Lemos R.A.A., Nogueira A.P.A., Togni M., Tessele B.
& Barros C.S.L. 2009b. Polioencefalomalacia em ruminantes. Pesq.
Vet. Bras. 29:681-694.

Outros materiais