Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
FASC – FACULDADE SANTA CECÍLIA DE PINDAMONHANGABA – Apostila de Prof.ª Jaqueline Bigaton Porto O MÚSICO Sabe-se que existe um grande paralelo entre a atuação dos profissionais formados em cursos de bacharelados e licenciaturas. O primeiro é mais focado na formação técnica, ao uso da música de forma atuante. Enquanto o segundo se atenta mais às propostas pedagógicas. Existe o conceito de que os estudantes de bacharelado são mais talentosos que os de licenciatura, a diferença é que para o músico o objetivo é a música, e para o professor é ensinar música. A formação acadêmica está longe da realidade prática que exige uma formação pedagógica aberta às relações sociais além das habilidades musicais específicas. As escolas de formação de professores preparam o estudante para os problemas e exigências do mundo real das salas de aula. No caso da formação de professores a música, está clara a distância entre o conhecimento musical e pedagógico. Poucos professores tiveram formação didático-pedagógica, dado que em muitas regiões mesmo havendo professores licenciados, bacharéis ou músicos com as mais variadas formações atuam como educadores musicais. A maioria tem a ideia em comum de que é fundamental que todos tenham formação pedagógica, pois o fato de serem bons músicos não os torna bons professores, pois como indica Del-Bem (2003), “para ensinar música [...] não é suficiente somente saber música ou somente saber ensinar. Conhecimentos pedagógicos e musicológicos são igualmente necessários, não sendo possível priorizar um em detrimento do outro.”. Não se pode esquecer que, uma parte da aprendizagem da profissão docente só ocorre e só se inicia em exercício. Em outras palavras, o exercício da profissão é condição para consolidar o processo de tornar-se professor. O raciocínio de muitos é considerarem-se bons professores pelo fato de serem bons músicos e julgarem ter facilidade em lecionar aulas de música pelos seus anos de experiência em educação musical. MUSICALIZAÇÃO Segundo Jannibelli (1971) musicalizar consiste em transformar as pessoas (no caso crianças e adultos) em indivíduos que: usam, consomem, apreciam música, fazem e criam música, sentem e expandem por meio da música. O indivíduo de um grupo social civilizado mergulha, logo após nascer em um ambiente de sons, e muitos deles são musicais. A musicalização é atitude ou comportamento adquirido, o que é inato é a estrutura orgânica e psicológica que permite essa aquisição. O que chamaríamos de aptidão musical, seria a existência desse dispositivo que dá margem e facilita ao menor estímulo (às vezes imperceptível ao observador e ao próprio indivíduo). Em termos específicos, é tornar um indivíduo receptível e sensível ao fenômeno sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo, resposta de índole musical. Em termos práticos, é a pré- escola da música. É a música agindo pela música. Com a reunião e o desenvolvimento dos métodos é que buscamos atender musicalmente as vivências das crianças, através de sua participação criadora, acionando aqui uma potente ferramenta de educação voltada para o desenvolvimento global da criança e jovem. Pelo aproveitamento desse dom é que se consegue ingressá-los não só na atividade musical, e na forma de expressão, mas também na aprendizagem musical de aquisição de conhecimentos básicos. Efetua-se dessa forma, a musicalização através da atividade intuitiva, que cria um estado mental intelectual favorável à aquisição de conhecimentos musicais. Musicalização também é um processo cognitivo e sensorial que envolve o contato com o mundo sonoro e as percepções rítmicas, melódicas e harmônicas. Ela pode ocorrer intuitivamente ou por intermédio da orientação de um profissional. Embora o incentivo familiar e a iniciação na infância sejam positivos, não são essências na formação musical. Quanto maior a musicalidade, mais rápido será seu desenvolvimento. Talento e desenvolvimento caminham sempre juntos e um depende do outro. Quanto maior o talento mais fácil se torna o conhecimento. Quando maior o conhecimento, mais se desenvolve o talento. Músicos não nascem prontos. Nascem com talento e adquirem formação para se tornarem os músicos que desejam ser. O trabalho com a musicalização auxilia o desenvolvimento e aperfeiçoamento da: socialização; alfabetização; inteligência; capacidade inventiva; expressividade; coordenação motora; percepção sonora; percepção espacial; raciocínio lógico e matemático. Segundo Jannibelli (1971) na escola, a música é um dos meios mais eficazes de se atingir o maior número de crianças e jovens e também a massa indiferenciada de alunos, sem propósito específico de selecionar os dotados musicalmente. Em algumas escolas onde existe a musicalização, os que têm vocação musical se adestram na prática instrumental. Por vezes, o aluno aprende a tocar sem estar aprendendo música por lhe faltar o desenvolvimento prévio do instinto e do ouvido musical, isto é, sem estar devidamente musicalizado. As vocações de qualquer tipo, geralmente se cristalizam na adolescência e, embora a aptidão musical seja tida como a mais precoce de todas as aptidões pode, contudo, ser evidenciada na infância. REFLEXÕES SOBRE A EDUCAÇÃO MUSICAL TEXTO DE Berenice de Almeida e Gabriel Levy Tirado do livro “O Livro de Brincadeiras Musicais da PALAVRA CANTADA” Ao longo da história do istema educacional brasileiro, o ensino da música nem sempre teve a valorização e a continuidade necessárias para que o panorama da educação musical apresentasse, em dimensões nacionais, uma reflexão pedagógica mais avançada, um corpo de profissionais com boa formação em número suficiente para abarcar todo o território nacional e escolas equipadas, minimamente, para o desenvolvimento de um trablaho musical de boa qualidade. Durante todos esses anos, muitas iniciativas isoladas e trabalhos musicais de qualidade têm sido realizados em diversas instituições pelo Brasil afora e poderiam servir de referência para as tentativas de ampliação da abrangência da educação musical. Sem dúvida, cada nova atitude responsável que busque essa ampliação e democratização do ensino musical deve ser aplaudida e aprofundada, porque é uma vitória não apenas para nós, músicos e educadores musicais, mas para toda a sociedade. A certeza de que a música é uma das linguagens expressivas do ser humano e que, portanto, deve fazer parte da educação de toda criança é o que vem conduzindo nossa prática musical, dentro e fora da sala de aula, há muitos anos. O fato de a maioria das escolas não ter mantido a música no currículo oficial teve por consequência o surgimento de uma lacuna na formação de diversas gerações de brasileiros. E hoje, diante de nós, apresenta-se o enorme desafio de recomeçarmos a estruturar a educação musical no Brasil. Ao lado de preencher esse vazio musical de tanto tempo, surgem inúmeras questões, reflexões e debates. É possível pensar a música para um país de tão grandes dimensões e distintas realidades? Como fazer? Qual (is) música (s) deve (m) soar nas salas de aula? De que maneira? Como devem ser preparados os profissionais? E nós, educadores, o que desejamos? Muitas são as questões, e se fazem necessárias uma profunda reflexão e uma ação consistente e contínua. Acreditamos que temos muito a fazer e que, se conseguirmos estruturar uma educação musical de qualidade, poderemos, em médio prazo, adquirir uma respeitabilidade que faça com que o ensino musical não seja mais vítima do humor dos políticos e da flata de conscientização e mobilização da própria sociedade, de gestores públicos, e sim, consideradosverdadeiramente indispensáveis para a formação integral de qualquer indivíduo. Não acreditamos em fórmulas especiais e mágicas que deem conta de todas as realidades encontradas pelos professores nas muitas e muitas salas de aula. Acreditamos, fundamentalmente, nas crianças, na importância da música na vida das pessoas, no professor, e na relação significativa que pode ser contruída no espaço da sala de aula entre professor, alunos e música. Temos consciência, também, de que é muito difícil para os educadores musicias principiantes e, mais ainda, para aqueles que não têm formação específica, mas que querem incluir a música como uma de suas possibilidades de trabalho, realizar as pontes entre o querer, o saber, o pensar e o fazer. Gostaríamos, então, de compartilhar com você, professor, alguas idéias sobre música, educação musical e crianças. A música tem sido uma das manifestações fundamentais em todas as culturas, ao longo da história da humanidade. Mesmo sem a função ritualística que exercia nos primórdios da civilização e ainda hoje exerce em diversas culturas, como poderia um elemento cultural tão onipresente em nossa vida ser ignorado por um círculo escolar? Não precisamos ir longe na história ou buscar referências em outras culturas, basta lançarmos um breve olhar para nosso dia a dia para constatar a presença marcante da música: o despertador pode nos acordar com música; muitas pessoas cantam no banho ou cozinhando; o rádio do carro toda os últimos sucessos da temporada; crianças participam de brincadeiras cantadas; professores usam música para ensinar conteúdos; aprende-se um instrumento sem querer se profissionalizar; videogames utilizam trilhas sonoras e efeitos musicais o tempo todo; escuta-se música e assiste-se a clipes no computador, em iPods ou em DVDs; a música conduz as tramas nas novelas; produzem-se especiais de TV sobre cantores e compositores; existem canais de TV especialmente voltados para a música; ouve-se música para relaxar antes de dormir ou em terapias... Como ser passivo diante desse bombardeio de informações musicais que poderíamos degustar estéticamente, mas que apenas absorvemos, sem apurar nossa percepção e compreensão? Fazer e ouvir música, estudar como é construído, conhecer seus recursos, saber como se estrutura, perceber, ouvir, fazer... são conhecimentos fundamentais para simplesmente, nutrir nossa relação com o mundo, com as pessoas e com nós mesmos. O ser humano é um ser musical, a música é uma das maneiras de ele se colocar no mundo, e, portanto, é indispensável que a linguagem musical seja valorizada em qualquer processo educacional. A apropriação dessa linguagem amplia horizontes, auxilia o desenvolvimento da pessoa como um todo e, socialmente, aumenta a possibilidade de não nos tornarmos alienados, meros consumidores passivos dos produtos vendidos pela indústria cultural. Por fim, a motivação primeira para levar a música à sala de aula tem de ser a certeza de quando ela se faz necessária na formação de cada indivíduo. É partir do princípio, como diz a pedagoga musical argentina Violeta Hemsy de Gainzá, de que “a música é um direito humano, e essa é a primeira razão pela qual deve ser necessariamente, ensinada na escola”. Trata-se de uma linguagem básica para a qual viemos preparados de fábrica: não somente estamos programados para falar e caminhar, mas também para fazer música. UM BREVE OLHAR SOBRE A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL BRASILEIRA É interessante para nós, professores, percebermos que grande parte de nossa prática em sala de aula é fruto de uma longa história, que foi sendo construída durante séculos e transformando o pensamento e a prática musical de muitas gerações de profissionais. O começo de tudo Antes da colonização do Brasil, havia a cultura de transmissão oral e informal dos povos indígenas, que supomos seja similar ao processo que muitas tribos utilizam até hoje, de aprendizagem por imitação e pela convivência com os mais velhos. Com a chegada dos europeus, estabeleceram-se diversas escolas dirigidas por missionários jesuítas, que atuavam também como professores. Durante dois séculos, os jesuítas utilizaram a música como eficiente instrumento de catequização dos índios. Eles estabeleceram um padrão musical europeizado de instrumentos musicais (alaúdes, violas etc.) e de estética (montagens de autos ou pequenas óperas no estilo barroco sobre temas bíblicos, por exemplo). Paralelamente ao ensino musical dos colégios, foi se formando uma música fora da Igreja, por meio da integração da música dos escravos negros e dos indígenas com as tradições populares dos colonos europeus. Era o nascimento da música popular brasileira, que acontecia de forma espontânea, sem o ensino sistematizado que se via nos colégios ligados à Igreja. O século XIX O século XIX trouxe mudanças na vida cultural brasileira, especialmente na música, começando com a chegada de D. João VI e toda a sua corte. Alguns dos acontecimentos musicais da época: promoção de muitos concertos; criação de orquestras e bandas; aumento do número de professores particulares de instrumento (sobretudo o piano); fundação de escolas especializadas em música, como o Conservatório de Música e o Instituto Nacional de Música, no Rio de Janeiro, e o Conservatório Dramático e Musical, em São Paulo; oficialização do ensino de música no recém-criado sistema de escolas públicas; instituição da música como disciplina em curso de formação de professores; exigência de formação especializada do professor de música. Apesar da importância dessas ações na história da educação musical brasileira e na vida em sociedade, o ensino de música nas escolas públicas não sofreu mudanças reais em relação à sua filosofia e a sua prática em sala de aula. O quadro da educação musical no Brasil, no final do século XIX, apresentava-se da seguinte maneira: As escolas especializadas em música tinham como objetivo principal a profissionalização e como procedimento pedagógico a valorização do desenvolvimento técnico, com foco nas pessoas que possuíam uma “vocação” ou um “dom” especial para a música (2), as práticas musicais nas escolas públicas continuavam a ser norteadas pelo pensamento musical dos séculos passados, como aquisição do conhecimento musical pela compreensão intelectual, utilização do repertório da música erudita europeia e uso de estratégias de repetiçaõ e memorização. O século XX Chegamos ao século XX e muitos acontecimentos e transformações vão marcar a história da educação musical tanto na Europa como no Brasil, mesmo que em tempos diferentes. Na educação, as idéias do filósofo e pedagogo norte-americano John Dewey, com o movimento da Escola Nova, estavam em franca expansão por toda a Europa. A grande mudança de foco no ensino, que influenciou também as idéias de educação musical, era que todo ser humano possuía um potencial musical que deveria ser desenvolvido com as outras potencialidades básicas para completar a sua formação integral. Essas ideias foram trazidas para o Brasil por alguns educadores, entre eles Anísio Teixeira. Nesse novo quadro de valores, surgiu a chamada primeira geração de educadores musicais, cada um com filosofias e métodos próprios, mas com o mesmo princípio, o de que a música é para todos e não somente para os “talentosos”. Os que mais destacaram foram Jacques Dalcroze, Edgar Willems, Carl Orff e Zoltán Kodály, com propostas que podem ser resumidas em quatro pilares: 1. O aprendizado deve ser acessível a todos, pois os elementos fundamentais da atividade musical são comuns a todo ser humano. 2. O ensino musical tem de partir da atividade prática e chega à abstração do conhecimento teórico. 3. Valorização do desenvolvimentoda percepção auditiva. 4. Utilização do corpo nas atividades musicais. A partir da década de 1920, o quadro da educação musical brasielria teve figuras muito importantes, como Mário de Andrade e Heitor Villa-Lobos. O escritor Mário de Andrade, um dos expoentes do movimento modernista, realizou pesquisas folclóricas e foi um dos principais estimuladores da busca de uma linguagem artística com identidade brasileira, influenciando diversas gerações de compositores e educadores. Em 1932, o músico e compositor Villa-Lobos assumiu a Superintendência de Educação Musical e Artística (Sema) do Distrito Federal e, inspirado no trabalho de Kodály na Hungria, instituiu o canto orfeônico, o maior movimento de educação musical de massas já ocorrido no Braisl. Com grandes grupos corais entoando canções folclóricas ou nacionalistas, afinou-se com o patriotismo do governo populista de Getúlio Vargas. Até hoje, a ligação do canto orfeônico com a era Vargas é alvo de muitas críticas, mas também é possível notar a preocupação de Villa – Lobos com temas ainda atuais, como metodologia, materiais didáticos, formação dos profissionais, continuidade etc. Dois outros educadores musicais abriram uma nova possibilidade de contato lúdico com a música: Liddy Chiaffarelli e Sá Pereira, cujo curso de iniciação musical buscava promover o conhecimento musical por meio de jogos sonoros e atividades corporais. A sáida de Villa-lobos da direção da Sema , em 1944, e a de Getúlio Vargas do governo, em 1945, bem como outros motivos relacionados à formação de profissionais foram determinantes para que o canto orfeônico nas escolas fosse desaparecendo gradativamente até 1964, quando foi substituído pela educação musical. A educação criativa Outro marco da educação musical naquela época foi a criação da Escolinha de Artes do Brasil, em 1948, no Rio de Janeiro. Em uma década, outras dezenove escolas nos mesmos moldes se espalharam pelo país. O artísta plástico Augusto Rodrigues foi o grande expoente da Escolinha, que tinha como princípios básicos: Todo ser humano possui um otencial de criatividade. A atividade artística é fundamental na formação da personalidade da criança. Valorização da liberdade de expressão do aluno. Nesse panorama, mais umanpersonalidade se destacou: Hans-Joachim Koellreutter, que se tornou um dos mestres de várias gerações de músicos e educadores. Músico alemão, radicado no Brasil desde 1937, com formação musical impecável, na qual unia o conhecimento musical da tradição europeia à prática e conceitos da música nova da primeira metade do século XX e também da música do Oriente (Índia, Japão), sua contribuição para o pensamento pedagógico no Brasil foi muito importante. É difícil resumir um pesamento tão amplo em poucas palavras, mas emprestamos do livro Koellreutter Educador de Teca Alencar de Brito, algumas frases muito significants, que podem dar uma pequena ideia de seu pensamento pedagógico: “A música é, em primeiro lugar, uma contribuição para o alargamento da consciência e para a modificação do homem e da sociedade”. “O objetivo maior da educação musical: o ser humano”. “O relacionamento e a interdependência entre a música, as demais artes, a ciência e a vida cotidiana”. “A criação como elemento prioritário em qualquer projeto de educação”. Enquanto todos esses diversos pensamentos e práticas aconteciam simultaneamente no Brasil, surgiam, no exterior, alguns nomes da chamada segunda geração de educadores musicais, dentre os quais dois tiveram bastante influência na educação musical brasileira: Schafer e Paynter. Os livros do compositor e educador musical canadense Murray Schafer tornaram-se referência mesmo antes de publicados no Brasil. Dois deles foram editados pela Unesp e traduzidos sob a coordenação da professora e educadora musical Marisa Fonterrada, uma das importantes divulgadoras do seu trabalho: O Ouvido Pensante, que propõe diversas atividades estimuladoras de que ele mesmo chama de “limpeza de ouvidos” para desenvolver um uvir cada vez mais ativo, e A Afinação do Mundo, que trata das paisagens sonoras (soundscapes) do mundo atual e das possibilidades de interferência nesse processo cada vez mais complexo de “ecologia acústica”. Schafer já esteve no Brasil várias vezes, ministrando cursos para músicos e educadores. O foco do trabalho do inglês John Paynter, defensor da música contemporânea nas escolas regulares, é a criação musical e a exploração do som e do silêncio como matéria-prima da linguagem musical. Assim, ele organizou diversas propostas de trabalho criativo para o professor utilizar em sala de aula. Por fim, é muito importante destacar uma das principais “cabeças pensantes” da atualidade, que influenciou e ainda influencia muitos educadores musicais brasileiros : Violeta Hemsy de Gainza. Pedagoga musical argentina reconhecida internacionalmente, autora de mais de quarenta títulos, Gainzá é uma das principais referências da educação musical da América Latina e da Península Ibérica. Sempre dinâmica e conectada com o pensamento filosófico da atualidade, soube beber das fontes dos grandes mestres da educação musical, difundindo na América Latina suas principais ideias e transformando-as, ao pensar sobre a música no tempo e no espaço com o olhar voltado para a realidade dos países latino-americanos. Essa multiplicidade de educadores e pensamentos sobre educação musical formou o panorama da segunda medtade do século XX, principalmente nos núcleos especializados em música. A educação artística Em 1971, durante o regime militar, uma nova lei foi sancionada. Em meio a diversas diretrizes para o primeiro e o segundo grau (atuais Ensino Fundamental e Médio), a lei determinava a criação de uma nova disciplina que englobava música, artes plásticas e teatro: a educação artística. O professor de educação artística seria polivalente, com formação para atuar nas diversas linguagens. Em geral, porém, essa formação era insuficiente para uma atuação múltipla. A maioria dos professores de educação artística, mesmo os com especialização em musica, acabava por optar apenas por uma das linguagens, em geral artes visuais, principalmente pela falta de formação consistente, que a universidade não oferecia nos cursos de educação artística, e de salas específicas, material didático, instrumentos musicais e ambientes acústico adequados. Teoricamente, o principal objetivo da educação artística era desenvolver a sensibilidade pelas artes e o gosto pelas manifestações artístico-estéticas. As diretrizes que conduziam a atuação dos professores em sala de aula eram: sensibilizar os alunos para as linguagens artísticas, estimular a livre expressão, valorizar a criação, enfocar o processo e não o produto e proporcionar a integração das linguagens artísticas. Em tese, essas orientações estavam em sintonia com as idéias educacionais do século XX, mas na prática o que houve foi um equívoco entre integração de linguagens e polivalência, entre experimentação e falta de planejamento, entre livre expressão e “vale-tudo”. Na década de 1990, iniciou-se um questionamento sobre a polivalência e as licenciaturas em educação artístia, e a LDB de 1996 apontava para uma mudança em relação ao ensino da área de artes, que passou a constituir componente curricular obrigatório nos diversos níveis da educação básica. Mesmo com um texto um tanto amplo, abria a possibilidade da presença das diferentes linguagens artísticas no currículo, além de reconhecer a área de artes como disciplina da mesma importância que as outras. Em 1997, os Parâmetros Curriculares Nacionais reforçaram esse novo olhar para a área de artes, determinando a necessidade de essas linguagens comporem o currículo eindicando princípios norteadores para as quatro linguagens : teatro, artes visuais, dança e música.É fato que, após tantos anos sem música na grade curricular das escolas,mesmo com esses novos impulsos, a situação da educação musical no Brasil não se resolveu na última década do século XX.Em 2008, porém, foi promulgada a Lei nº 11.769, instituindo a música como conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, da área de artes em todas as escolas brasileiras. Comemorada por músicos, educadores, artistas e outros segmentos da sociedade, a nova lei coloca um grande desafio ao governo: traduzir, em investimentos financeiros, projetos de implantação da música cuidadosamente pensados por uma equipe de educadores musicais, ações educativas que considerem as diversasa realidades brasileiras e que assim possam sustentar uma verdadeira transformação do vazio musical atual. Às comunidades ligadas à educação e à música, o desafio é uma reflexão profunda sobre que música será levada para dentro das escolas brasileiras, transformando-se em ações significativas. QUE MÚSICA QUEREMOS? O Brasil é um país de grandes dimensões e enorme riqueza de manifestações musicais. De norte a sul são tantos os ritmos, os estilos, as danças que é impossível pensar em uma única música. Ao mesmo tempo, não estamos isolados do mundo. Ao contrário, vivemos em um mundo cada vez mais integrado, em consequência da globalização. Podemos ouvir um canto dos pigmeus da África Central, uma paresentação de taikos (os famosos tambores japoneses), uma orquestra sinfônica alemã, uma orquestra de marimbas da Guatemala, um grupo de rock inglÊs, um spiritual americano, cantos e danças dos índios guaranis ou ainda “Garota de Ipanema”, de Tom Jobim, cantada em inglês... É impossível pensar em uma única música.Aproximar as crianças da diversidade musical brasileira ao lado das muitas músicas do mundo pode ser a semente de um ouvido adulto “aberto”. Desenvolver uma relação com a música livre de preconceitos possibilita uma atitude baseada em critérios de escolha próprios e não moldada em padrões musicais impostos pelas várias mídias da atualidade. COMO FAZER MÚSICA COM CRIANÇAS? A música é uma linguagem que utiliza sons e silêncios para expressar e comunicar e, por ser linguagem, possui uma estrutura, uma ordenação de elementos. Tomando de empréstimo uma definição mais poética do que a nossa, muito usada por Teca Alencar de Brito: “A música é um jogo expressivo com sons e silêncios, no tempo/espaço”. Pensar a música como um jogo que tem regras e que se estrutura a partir dos sons e silêncos pode ajudar a desmitificar essa linguagem um tanto abstrata. Sem dúvida, a música se esvai no tempo. Não podemos tocá-la com as mãos como fazemos com uma escultura; ela entra por nossos ouvidos, provoca sensações e depois se cla, deixando lembranças. Essas reflexões podem nos indicar alguns caminhos. A matéria-prima sonora Um primeiro caminho é considerar a matéria-prima som/silêncio um material a ser explorado como as crianças fazem, naturalmente, com um brinquedo novo ou um pedaço de argila. O som é um fenômeno sonoro que deve ser descoberto em suas intensidades, timbres, durações e alturas. Utilizando fontes sonoras diversas, como a voz, sons do corpo, sons da natureza, objetos, brinquedos e instrumentos musicais, é possível planejar muitas atividades que tenham como objetivo sensibilizar a criança para o fenômeno sonoro e desenvolver nela uma escuta mais ativa. Atividades de imitação, identificação, comparação, classificação dos mais variados sons têm de fazer parte da rotina, enfocando os parâmetros sonoros. É adequado iniciar o trabalho pela percepção dos contrastes – forte/fraco (intensidade), grave/agudo (altura), curto/longo (duração), timbres bem contrastantes – e, gradualmente diminuir as distâncias entre os extremos, exigindo assim maior aguçamento da percepção auditiva. É importante que você, professor, ao lado das atividades planejadas, aproveite também momentos espontâneos nos quais a atenção dos alunos possa se direcionar para essa escuta mais ativa. Enfim, tenha em mente que, segundo Gainzá, “o ouvido é a porta da entrada, o que presencia e controla a música que é absrvida. Por isso, deixá-lo sensível, sutil, inteligênte, criativo é a melhor garantia de uma boa educação musical”. Ouvindo música As atividades de apreciação musical, ou seja, de escuta, devem buscar o envolvimento e a compreensão da linguagem musical em um contexto significativo para os alunos. Para proporcionar uma escuta atenta, prepare o ambiente adequado e escolha momentos específicos. Três objetivos devem nortear essas atividades: estimular o hábito de ouvir música com prazer, desenvolver a percepção de elementos estruturais da obra musical e provocar debates e reflexões sobre o contexto histórico e sociocultural nos quais as músicas estão inseridas, ampliando a própria percepção musical do aluno. A compreensão da linguagem musical amplia o próprio ouvir. Perceber e identificar motivos, frases musicais, formas, estilos, gêneros, instrumentos musicais, texturas e arranjos são possibilidades de ampliação do conhecimento da linguagem musical. A diversidade de gêneros, estilos, épocas, culturas e a qualidade musical como critérios para a escolha do repertório, aliadas a uma reflexão sempre presente no processo de aula, podem colaborar na formação de um adulto mais criterioso em relação à produção musical a que estamos expostos todos os dias. Produzindo música É possível produzir música inventando, por meio da improvisação e composição, e reproduzindo as músicas de outros, pela interpretação. Em seu planejamento, procure equilibrar as atividades entre o criar e o reproduzir. Por muito tempo, a educação musical traçou seus alicerces sobre a interpretação, a aquisição da leitura musical e os conhecimentos teóricos musicais. Para realizar atividaddes de criação, partia-se do pressuposto de que só se poderia criar após muito tempo de estudo e acúmulo de conhecimentos. Na prática, o que ocorria era um bloqueio do impulso criador, que acabava criando um bloqueio da capacidade de improvisa e compor. Logo nas primeiras aulas é possível realizar atividades de criação, mesmo que partindo de materiais muito simples que tenham sido explorados. Cantar uma música com acompanhamento de sons corporais, criar uma “conversa” entre diversos instrumetnos musicais, inventar uma música sem texto, só com sons da voz, sonorizar uma história utilizando os sons de objetos explorados anteriormente... são muitas as possibilidades. Basta você também lançar de corpo e alma no jogo de criação musical. Cantar Articulamos a linguagem musical por meio do cantar e do tocar, seja criando, seja interpretando. O canto é, talvez, a manifestação musical do ser humano mais primitiva e esteve e está presente em todas as culturas. Hoje, sobretudo nas sociedades essencialmente urbanas, o cantar é uma atividade que se concentra em locais e momentos cada vez mais específicos. O canto como expressão humana, pertencente a todos, inserido na vida das pessoas, nos encontros espontâneos, nos cantos de trabalho, nas brincadeiras das crianças, nas festas e nas danças, tem sido cada vez mais reduzido. A escola pode colaborar na volta desse bem comum. Se a criança, desde os primeiros anos de escola, cantar muito, com um repertório de qualidade e diversificado, não oferecerá tanta resistência com a que vemos hoje entre os adolescentes. O canto encontra-se nos fundamentos de diversos métodos de educação musical. A voz é nosso primeiro instrumento musical, que, em princípio, deveria nos acompanhar e se desenvolver por toda a vida, mas é possível constatarmos um número elevado de pessoas que não se permitem cantar por considerarque cantam mal ou são desafinadas. No entanto, muitas dessas impressões sobre a própria voz são consequências da falta de um processo contínuo de desenvolvimento vocal, seja na escola, seja na família ou nos encontos sociais. É importante que você, educador, esteja atento a essa realidade e também possa desenvolver as próprias possibilidades vocais, cuidando de sua saúde vocal e buscando um aprimoramento de sua finação e expressividade.Pode-se pensar o trabalho vocal em diversas atividades, como: jogos de exploração da voz, improvisações vocais, canções tradicionais brasileiras, brincadeiras cantadas, canções de outros povos, canções da MPB, canções compostas para o público infantil, canções do repertório de música erudita, criação de letra para melodias conhecidas, criação de canções com base em um tema significativo para o grupo etc. Vale destacar o cuidado na escolha do repertório, procurando sempre a qualidade musical, sobretudo nas canções compostas especialmente para as crianças e mesmo na música popular brasileira, em que encontramos material de qualidade duvidosa, muitas vezes de apelo meramente mercadológico. Outro aspecto do trablaho é a forma de cantar. Existem inúmeras formas de cantar, características de cada lugar, cultura, estilo. É interessante que tanto você como os alunos ouçam músicas do mesmo gênero para que a forma de articulação e o timbre vocal sejam o mais próximo possível do original. É diferente cantar, por exemplo, uma melodia indígena caiapó, em que se utiliza um timbre mais anasalado, e uma melodia de Mozart, em que se usam um timbre mais “claro” e uma articulação mais definida. Após um trabalho bem consistente com canções em uníssono, você também pode lançar alguns desafios, como cânones e, mais tarde, canções a duas ou três vozes. Como última recomendação, é aconselhável o cuidado com as tessituras das canções, que muitas vezes se encontram em uma região grave para as crianças, prejudicando o resultado sonoro. O canto é essencial em um trabalho de educação musical, principalmente quando há grupos numerosos em escolas pouco equipadas. Tocar Utilizar instrumentos para se expressar musicalmente faz parte da história da humanidade, e, sobretudo as crianças tem verdadeiro fascínio diante dos instrumentos. Desse modo, tocar um instrumento deveria ser uma experiência prazerosa e excitante. Por muito tempo, na educação musical, confundiu-se fazer música com ler música, como se fosse impossível cantar ou tocar sem o domínio desse código, colocando até mesmo a aquisição da escrita e leitura musical acima da produção musical. Com isso, muitos professores se esmeram em técnicas para que os alunos leiam música, mas se esquecem de fazer música com eles. É claro que decifrar esse conjunto de signos utilizados na escrita musical faz parte do trabalho de educação musical e não se deve privar as crianças do acesso à escrita musical. Mas é importante fazer música com ou sem ela. Você pode planejar diversas propostas para que os lunos toquem instrumentos musicais convencionais e também os confeccionados por eles, além de explorar objetos sonoros e o próprio corpo.É interessante sempre realizar atividades de experimentação sonora dos instrumentos, objetos ou partes do corpo. Ampliar as possibilidades de produção sonora desses meios, através de jogos e brincadeiras de exploração do som, só enriquecerá as outras atividades instrumentais. A partir dos eixos musicais criação e reprodução, diversas atividades podem ser realizadas com o objetivo de que as crianças toquem música: sonorizações de histórias; conjuntos instrumentais para acompanhar canções do repertório vocal do grupo; aprendizado de ritmos brasileiros tradicionais de norte a sul do Braisl; improvisções baseadas em roteiros extramusicais (a paisagem sonora de um amanhecer no campo ou na cidade, um roteiro de suspense etc.); improvisações a partir dos parâmetros sonoros (por exemplo, contrastes de altura do som, sons curtos e longos, som e silêncio). A aproximação com grupos instrumentais da região, independentemente de sua formação, costuma ser muito interessante para os alunos. Várias manifestações musicais populares, apesar de não estarem presentes na grande mídia, ainda estão vivas, e proporcionar uma visita desses grupos à escola, para tocar e mostrar de perto seus instrumentos e ritmos, pode se transformar em uma atividade riquíssima para as crianças. O som e a música no papel Mesopotâmia, Grécia, Europa medieval, Índia... Diversas culturas, em diferentes épocas, desenvolveram um sistema para registrar a música. As primeiras formas de notação musical surgiram da necessidade de perpetuação dessa expressão humana que se dissipa no tempo e no espaço e, também, como auxílio à memória. Sem dúvida, a aquisição de um sistema de escrita que dá ao indivíduo a autonomia de entoar ou tocar música sem precisar que o ensinem oralmente é um grande legado. Entretanto, é bom lembrar que, ao lado dessa música veiculada pela escrita, existem muitas outras no mundo todo cujo meio de aprendizado é a transmissão oral. Assim como aprendemos a falar e depois a escrever, é razoável que se aprenda primeiro a fazer música e não à escrevê-la. Utilizar formas de registro, do impreciso, possibilitando às crianças a descoberta da própria função do registro, pode ser um caminho a ser trilhado nesse processo musical. Em toda notação imprecisa, surge um espaço para maior liberdade do intérprete, participando e alterando o resultado sonoro final da música. Segundo Teca Alencar de Brito, “em sua origem, os sinais apenas sugeriam o movimento sonoro, ao passo que no século XX passaram a serem utilizadas novamente notações imprecisas, nas quais sinais gráficos (pontos, linhas, manchas) sugerem o gesto, o impulso sonoro, numa concepção estética aberta, em que o intérprete é coautor, participante da composição musical”. Existem inúmeras possibilidades de registro. Muitas partem das próprias crianças, e você pode usá-las na sala de aula, como: o simples desenho dos instrumentos que estão soando; o registro onomatopaico, que utiliza sílabas, palavras e até frases que imitam o som (por exemplo, TUM, TEC, TUM TCHI CA BUM, TUM DUM, TECO TECOCOTECOTELECO); símbolos; nomes das notas; sinais gráficos (trços pequenos e grandes, pontos, linhas que sobem e descem e tantos outros que é possível inventar). É interessante planejar propostas nas quais cada criança fará seu registro individualmente, da forma que mais lhe satisfazer. Em seguida, comparar as diversas maneiras de registrar o som, percebendo as características de cada uma. Outra etapa pode ser a eleição de um código comum ao grupo, talvez uma mistura dos diferentes registros, de modo que todos da classe possam compartilhar essa escrita, percebendo sua dupla função, de expressão e comunicação. A partir daí, o aprendizado da escrita tradicional com certeza se tornará mais significativo. Construindo intrumentos A construção de instrumentos musicais e objetos sonoros se tornou uma atividade comum em diversos contextos educacionais e bastante valorizada no processo de educação musical. Além de agradar muito às crianças, que são naturalmente curiosas e gostam de construir coisas, essa atividade propicia diversos aprendizados valiosos, entre eles: o despertar para as experimentações sonoras; o desenvolvimento da imaginação e criatividade; a possibilidade de imaginar, projetar e concretizar uma ideia; a aproximação das crianças aos princípios básicos da acústica; a compreensão do funcionamento e dos critérios de classificação dos instrumentos musicais.Vale ressaltar que professores e alunos devem buscar sempre a melhor sonoridade na construção dos instrumentos. É claro que a ideia e o projeto são importantes, mas, se o resultado sonoro for ruim, com certeza as crianças ficarãofrustradas e o objetivo de desenvolver nelas uma audição mais apurada e sensibilizá-las para a qualidade sonora também não será alcançado. Outra ressalva importante é em relação ao planejamento das atividades de construção de instrumentos, que devem incluir a preparação da sala e dos materiais a ser utilizada, a pesquisa em livros específicos, o projeto a ser realizado pelas crianças, a própria construção dos instrumentos e propostas de sua utilização em um contexto musical, isto é, concluir todas as etapas fazendo música com eles. Lembramos, ainda, que as atividades de construção de instrumentos não diminuem a importância de fazer música com os instrumentos musicais construídos por profissionais. REFERÊNCIAS 1 -GAINZA, Violeta H. De. Pedagogia Musical: Das décadas de pensamiento y acción educativa. Buenos Aires: Lumen, 2002. 2- LOUREIRO, Alícia M. A. O Ensino da Música na Escola Fundamental: Um estudo exploratório. Belo Horizonte: Mestrado em Educação da PUC/ Minas, 2001. 3- FONTERRADA, Marisa T. O. De Tramas e Fios: Ensaio sobre música e educação. São Paulo: Editora da UNESP, 2005. 4-BRITO, Teca A. De. Koellreutter Educador: O humano como objetivo da educação musical. São Paulo: Peirópolis, 2001. 5-BRITO, Teca A. De. “Música e educação: alinças sensíveis”. No Tom, revista da CAEM – Central de Apoio às Escolas de Música, São Paulo, ano 4, n. 19, 2009. 6-GAINZA, Violeta H. De, op. cit. 7-BRITO, Teca A. De. “Música na Educação Infantil: propostas para a formação integral da criança”, São Paulo: Peirópolis, 2003.
Compartilhar