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Direito Constitucional II (p1) - Profº Thiago Bastos

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DIREITO CONSTITUCIONAL II 
CADERNO 
 
Ingrid Grandini 
Professor: Thiago Bastos 
 
Baseado no livro de Ingo Sarlet e nas transcrições do noturno 2016.1 
 
1. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais 
1.1 Aspectos terminológicos 
● direitos (e deveres) individuais e coletivos, 
● os direitos sociais (incluindo os direitos dos trabalhadores), 
● os direitos de nacionalidade e 
● os direitos políticos. 
 
Há necessidade de se adotar uma terminologia (e de um correspondente conceito) 
única e, além disso, constitucionalmente adequada, no caso, a de direitos (e garantias) 
fundamentais, visto que “direitos humanos”, “direitos do homem”, “direitos subjetivos 
públicos”, “liberdades públicas”, “direitos individuais”, “liberdades fundamentais” e “direitos 
humanos fundamentais” possuem significados diferentes. 
1.1.2 Direitos Fundamentais X Direitos Humanos 
direitos fundamentais ​se aplica àqueles direitos (em geral atribuídos à pessoa 
humana) reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de 
determinado Estado. Possuem sentido mais preciso e restrito, na medida em que constituem o 
conjunto de direitos e liberdades institucionalmente reconhecidos e garantidos pelo direito 
positivo de determinado Estado, tratando-se, portanto, de direitos delimitados espacial e 
temporalmente 
 
direitos humanos ​guarda relação com os documentos de direito internacional, por 
referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, 
independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, 
1 
portanto, aspiram à validade universal, para todos os povos e em todos os lugares, de tal sorte 
que revelam um caráter supranacional (internacional) e universal. 
 
1.2 Os direitos fundamentais em perspectiva histórico-evolutiva 
 
A história dos direitos fundamentais, de certa forma (e em parte, poderíamos 
acrescentar), é também a história da limitação do poder, ainda mais se considerarmos o 
vínculo dos direitos fundamentais com a história do constitucionalismo e do que passou a ser 
designado de Estado Constitucional (Estado Moderno). 
Além disso, importa considerar que a positivação dos direitos fundamentais é o 
produto de uma dialética constante entre o progressivo desenvolvimento das técnicas de seu 
reconhecimento na esfera do direito positivo e a paulatina afirmação, no terreno ideológico, 
das ideias da liberdade e da dignidade humana. 
1.2.3 A “pré-história” e “história” dos direitos fundamentais 
...dos primórdios à noção de direitos naturais (inatos e inalienáveis) do homem. 
 
Para Álvaro Ricardo de Souza Cruz, A existência de gerações de direitos, tal qual 
concebida originalmente por Karel Vasak, “não passa de uma forma acadêmica de facilitar a 
reconstrução histórica da luta pela concretização dos direitos fundamentais”. 
 
O contexto é Basicamente do século XVIII. Revoluções liberais ou revoluções 
constitucionais. Revolução Americana(1776) e Revolução Francesa (1789). Elas marcam o 
fim do antigo regime na lógica ocidental, início do estado de direito que mais para a frente 
vai evoluir e se transformar no estado democrático de direito. 
 
● O ​estado de direito é o estado regulado pelo direito. O estado democrático de 
direito é o estado regulado pelo direito que fortalece os prefeitos de 
democracia direta, ou seja, todos votam. “Somos todos iguais, mas alguns 
não”. Aqui nesses todos iguais você tem tantas exceções que não são todos 
iguais. 
2 
 
 Vai ter a ruptura por que a gente vai acabar com o antigo regime. Havia no período 
feudal uma insegurança jurídica (vários feudos e cada um com uma norma diferente, cada um 
com uma regra, uma forma de pensar diferente). Eles queriam segurança e normatização do 
direito na cidade. A burguesia se associa com a nobreza e surge o absolutismo. 
 Normatização para facilitar as trocas comerciais. 
A nobreza começou a agir de forma arbitrária e isso traz insegurança. o que não é bom 
para negócios. Então surgiram as Revoluções Constitucionalistas onde a burguesia vai trazer 
o anseio máximo dela que é igualdade formal, pois ela já tinha o poder econômico. 
 
1. o que é o Terceiro Estado sem a burguesia? Nada 
2. o que é o Terceiro Estado sob a ótica econômica? Tudo, o Estado depende deles 
3. O que o Terceiro Estado quer vir a ser? Alguma coisa, porque eu banco tudo e não 
sou nada, quero ser alguma coisa 
 
Esse é o nosso revolucionário de quebra a soberania que existe no povo, cria um 
Estado e a partir disso eu tenho igualdade formal. Se eu tenho poder econômico e igualdade 
eu consigo controlar as dinâmicas de força de poder e eu consigo me projetar. Isso foi o que 
aconteceu no período liberal. 
Surge então as Teorias Marxistas, Socialistas e etc porque o povo estava por baixo. E 
ocorre a Revolução Social como um pedido de mudança e depois o Estado de bem-estar 
social, ou seja, a “humanização” do capitalismo. Esse Estado vai pautar a igualdade material, 
que é a o Estado fornecendo serviço para que você tenha as mesmas condições por meio da 
meritocracia de chegar lá. 
Esse é, em síntese, o contexto do surgimento dos Direitos Fundamentais, pois eu tinha 
o arbítrio e quero a segurança jurídica, direitos, uma forma de impedir que o Estado me 
domine. Então surgem os DF, os direitos mínimos de todos: propriedade, vida, etc. 
Os direitos fundamentais eles vão servir de freio. Eu posso ir ao judiciário, para o 
judiciário repelir a ação do Estado. Política de “freios e contrapesos” devido a formação dos 
três poderes: legislativo, executivo e judiciário. Cada poder tem sua função típica e um 
fiscaliza o outro para impedir que um aja com arbítrio em face do cidadão, assim um 
consegue controlar o outro. 
3 
A pré-história é a parte anterior às revoluções citadas, ou seja, anterior à história 
vários direitos fundamentais que nós temos hoje, tem origens na ordem histórica, são coisas 
que começam a ser debatidas e que no Estado Moderno deságua em forma de direitos 
fundamentais. Eles vão surgir como direitos fundamentais quando forem positivados numa 
norma fundamental. 
Dessa forma eles se tornam cláusula pétrea, ou seja, podem ser alterados, porém não 
excluídos. A fossilização do Df não é vantajosa, porque o tempo muda e com as mudanças os 
direitos fundamentais podem ser alterados para se reajustarem, ou seja, se você avançou em 
alguma política social, não se pode mais tirar, mas nada impede que isso seja alterado por 
outra coisa. 
 
PRÉ-HISTÓRIA: a antiguidade é um berço para as ideias que originaram os direitos 
fundamentais. Na ​Grécia Antiga temos a lógica do homem livre, tem a Ágora onde as 
pessoas vão e debatem, participam da vida política, votam e elegem representantes e isso foi 
evoluindo até chegar, por exemplo, em direitos civis e políticos e participação direta em 
democracia. ​Religião na lógica judaica-cristã há o homem a imagem semelhança de Deussendo assim, o homem tem dignidade que a evolução é a dignidade da pessoa humana. 
Magna Carta (1215) que trouxe direitos para os nobres: “O rei não pode mais pegar a minha 
propriedade”, “ O rei não pode mandar me prender sem o devido processo penal”. Privilégio 
não é compatível com Estado moderno, pois este é pautado, em tese, na igualdade, assim, os 
privilégios caem. Nada impede que eu te trate diferente, mas se eu te tratar diferente não é 
porque eu quero te dar privilégios, é lógica de isonomia: ​”tratados iguais e de forma igual e 
de forma diferente na medida de sua desigualdade”​. A Carta Magna positiva direitos, traz 
o rol dos privilégios e previu coisas que usamos ainda hoje como o habeas corpus e direito a 
propriedade. 
Após a ​Revolução Gloriosa (1689), surge a ​Bill of Rights que é a Carta de Direitos 
no contexto da Inglaterra: a monarquia perdeu o poder, porém continuou vigente com poderes 
limitados. Quando o poder da monarquia foi limitado, a Revolução atingiu seu objetivo, 
acessando o arbítrio, interesse fundamental da burguesia trazendo segurança e estabilidade 
econômica, fazendo com que a tropas comerciais ficassem mais fluidas e impedindo que o 
Estado “fosse em cima” por qualquer motivo torpe, permitindo o acesso da burguesia à classe 
política e se tornando relevante, algo que só foi conquistado na França após a Revolução 
4 
Francesa. E a partir desse momento, do surgimento do capitalismo e da revolução industrial, 
que a Inglaterra dispara na frente de outras nações acerca desse aspecto. Porém junto com o 
desenvolvimento, há também uma mazela social absurda na Inglaterra, com extensas jornadas 
de trabalho, trabalho infantil, ambientes insalubre, basicamente como a escravidão, os 
direitos fundamentais eram direitos legais, pois ainda não estamos no Estado Moderno. 
Depois das revoluções constitucionais, o acento passa a ser constitucional pois a 
Constituição é suprema, ela é um pressuposto, quando você tem um direito pressuposto, o 
que está no poder não é questionado, porque não há nada após ele. A norma fundamental é 
válida por si só, diferente da lei que você pode questionar. 
​Direitos nunca são dados, direitos são conquistados e não é porque um direito foi 
conquistado que ele será mantido. Se não houver ações para que esse direito seja mantido. 
Existem mecanismos constitucionais, períodos sociais, períodos históricos que direitos 
tendem a ser derrubados. 
 
1.2.3 Dimensões dos Direitos Fundamentais 
Evolução conceitual dos direitos fundamentais. Alguns livros chamam de gerações, 
mas não é muito bom, porque quando se fala em primeira geração, segunda geração, etc. vem 
a ideia, automaticamente, que a segunda geração superou a primeira e que a terceira superou 
a segunda, assim por diante. Só que os direitos fundamentais não funcionam assim, não se 
trata de uma geração que superou a outra. Por isso se torna mais adequado falar em 
dimensões, pois quando se fala em dimensões você pode pensar em uma massa que tem 
tentáculos que se expandem para áreas que ainda não atingiram. Essas dimensões atingem 
algumas perspectivas históricas e dimensional, como veremos agora. 
​São três dimensões e estas estão associadas ao lema da Revolução Francesa: 
igualdade, fraternidade e liberdade: ​Veremos que a ​primeira dimensão mexe com direitos 
da liberdade, a segunda dimensão com direitos de igualdade e a terceira com direitos de 
fraternidade. 
O lema é uma coisa só, mas a forma como esses direitos fundamentais vão ser 
implementados e postos em práticas acontecem em momentos diferentes. O lema da 
Revolução Francesa é basicamente o centro do que são os direitos fundamentais, são direitos 
5 
que começam a evoluir a partir do contexto histórico. No primeiro momento, é natural que 
não tenha só verdade, depois existe uma interação social que começa a clamar por igualdade, 
pois não pode ser uma lógica só de igualdade formal, mas também uma igualdade material, 
puxando uma segunda dimensão. E assim começamos a perceber que há direitos que não tem 
um titular específico é a lógica de fraternidade, solidariedade. 
 
● Primeira Dimensão: possui um contexto liberal, será associada com a lógica da 
liberdade. São eminentemente negativos, pois você pode associar a uma ideia de 
direito de defesa ou direito de resistência. Exemplo: o Estado te garante uma série de 
direitos civis e políticos e caso o Estado venha a transgredir , você tem direito a se 
‘defender’ ou a resistir. Ex: Eu vou te garantir direitos civis e políticos, e caso, eu, 
Estado, venha a transgredir, você tem direito a se “defender” ou a resistir. Como? No 
Judiciário. O Estado que vai começar a ser limitado pela lei para garantir direitos civis 
e políticos. 
Há uma abstenção, em regra, porque muitos que defendem premissa liberal vão dizer 
que o Estado Liberal não faz nada, logo ele não tem custo nenhum, sendo mais barato, 
por isso que eu posso debitar pouco. Não é isso também, porque se você tiver direito 
de propriedade: (1) impede que, eu, Estado, tome, mas também impõe que, eu, Estado 
assegure a sua propriedade caso alguém tente tomar. 
 
● Segunda Dimensão: a ideia de Estado Social, lógica de igualdade. A lógica eram 
somente direitos civis e políticos e não importava os demais. Essa lógica começa a 
aumentar a distância de quem está no topo social e de quem está embaixo, isso vai 
aumentando cada vez mais porque o Estado não está agindo para garantir igualdade. 
Qual é a premissa das revoluções liberais, das revoluções constitucionais? Se propõe a 
entregar liberdade e igualdade, mas não entrega para todo mundo, limitado a um 
nicho específico. ​Tem início do século XX, se efetivando no pós-guerra. Você 
começa em uma lógica liberal, vai para uma lógica de bem estar social (século XX já) 
e no pós-guerra em diante começa a ter uma efetivação do Estado Bem Estar Social. 
Você vai ter efetivação dos direitos sociais e ao mesmo tempo você começa a discutir 
a questão do meio ambiente, de paz, por estar no pós-guerra. O contexto vai ser o 
Estado o pós-liberal porque você vai ter contrastar, tiveram problemas sociais que 
6 
demandavam que o Estado fizesse algo. Quando você tem uma opressão muito forte 
de uma classe maior em relação a outra, você vai ter tensão social, e é isso que gera 
mudança, principalmente, por parte do Estado. ​Direitos positivos eu vou ter um 
dever de agir do Estado. Lógica de efetivação das promessas: liberdade e igualdade 
a partir de preceitos de uma justiça social que fomente a lógica de bem estar. Capítulo 
II, ​“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a 
moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à 
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma destaConstituição. ​(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)​”. Então, 
no Brasil, nossos direitos fundamentais de segunda dimensão estão positivados e, na 
aula de hoje, a gente vai ver que eles estão positivados no artigo sexto, mas não se 
restringe ao artigo sexto. 
 
● Terceira Dimensão: fraternidade - lógica transindividual. São os direitos 
metaindividuais, ou seja, aqueles que você não consegue dizer de quem é o direito. O 
direito pertence a todos. Você não titulariza de forma especificada como você 
consegue fazer com os de primeira e segunda dimensões. Primeiro, eles vão tá 
associados a essa ideia de solidariedade, de fraternidade, que é uma lógica que, é um 
direito que não compete somente a mim, compete a mim e ao outro, à lógica de 
sociedade como um todo. Quem tem direito a um meio ambiente ecologicamente 
equilibrado? Todos. Quem tem direito à manutenção do patrimônio histórico-cultural? 
Todos. Quem é o titular daquele patrimônio histórico-cultural? Não sei, a 
coletividade. Ah, o Paço Imperial é tombado. É patrimônio histórico-cultural. De 
quem é aquilo? De todo mundo. Não é meu, não é seu, é da coletividade. 
 
1.3 O conceito de direitos fundamentais na constituição brasileira 
 
Direitos fundamentais são posições jurídicas reconhecidas e protegidas na perspectiva 
do direito constitucional interno dos Estados, o que gera a especial dignidade e proteção aos 
direitos num sentido formal e num sentido material. 
Todas as posições jurídicas concernentes às pessoas (naturais ou jurídicas, 
consideradas na perspectiva individual ou transindividual) que, do ponto de vista do direito 
7 
constitucional positivo, foram, expressa ou implicitamente, integradas à constituição e 
retiradas da esfera de disponibilidade dos poderes constituídos, bem como todas as posições 
jurídicas que, por seu conteúdo e significado, possam lhes ser equiparadas, tendo, ou não, 
assento na constituição formal. 
 
FORMAL: direito constitucional positivo. Um regime jurídico definido a partir da 
própria constituição, seja de forma expressa, seja de forma implícita. “aquilo que está 
consagrada no catálogo positivo de direitos fundamentais. 
 
● parte integrante da constituição escrita: os DF estão situados no ápice de todo 
ordenamento jurídico, gozando da supremacia hierárquica das normas constitucionais. 
● normas constitucionais: submetidos aos limites formais (procedimento agravado) e 
materiais (cláusulas pétreas) da reforma constitucional ​art. 60, CF​. 
● diretamente aplicáveis e vinculam de forma imediata as entidades públicas e, 
mediante as necessárias ressalvas e ajustes, os atores privados ​art. 5º § 1º, CF 
 
MATERIAL: análise do conteúdo dos direitos, isto é, da circunstância que conterem, ou 
não, decisões fundamentais sobre a estrutura do Estado e da sociedade. de modo especial, 
porém, no que diz com a posição nestes ocupada pela pessoa humana. “a importância pode 
ser equiparada aos direitos formalmente fundamentais” 
1.3.1 Noções preliminares 
A norma no ​art. 5º § 2 CF ​afirma que além do conceito formal, há o conceito 
material. Essa distinção pode ser realizada, segundo Jorge Miranda, pois os DF não se 
encontram necessariamente na dependência do constituinte e tem respaldo na ideia dominante 
de constituição e no senso jurídico coletivo 
 
1.3.1.1 Classificação dos direitos fundamentais com base no critério da abertura 
material do catálogo constitucional 
 
Expressamente Positivados: 
8 
a) os previstos no Título II da CF: direitos e garantias fundamentais 
b) os sediados em outras partes do texto constitucional 
c) os expressamente consagrados em tratados internacionais de direitos humanos 
d) os sediados na legislação infraconstitucional ( TEM QUE TER CAUTELA PARA 
AFIRMAR ISSO, pois ao legislador infraconstitucional cabe o papel de concretizar e 
regulamentar os direitos fundamentais previstos na CF, mas a tradição do nosso 
direito constitucional aponta a exclusão dessa categoria, uma vez que nunca houve 
dispositivo para a abertura desta) 
 
Implicitamente Positivados: ​abrange a previsão expressa de uma abertura a direitos não 
enumerados e a dedução de posições jusfundamentais por meio da delimitação do âmbito de 
proteção dos direitos fundamentais. É aquilo que está subentendido, está envolvido, mas não 
de modo claro. “dedução de um novo direito fundamental”. Uma extensão, mediante 
hermenêutica, do âmbito de proteção de determinado DF expressamente positivado. 
 
Ex: Identidade genética da pessoa humana, direito à identidade pessoal, sigilo fiscal, 
reinserção na sociedade. 
 
1.3.1.2 Direitos previstos no Título II da CF 
 
A maioria da doutrina defende todos os direitos que integram o Título II da CF são DF, 
porém há quem discorde afirmando que estar no Título II não o classifica como DF, pois 
estar-se-ia adotando conceito eminentemente formal de direitos fundamentais. Por outro lado, 
argumenta-se que a nota da fundamentalidade está vinculada ao conteúdo, ou seja, de 
relevância do bem jurídico tutelado, de tal que os DF seriam materialmente fundamentais, 
como o caso dos direitos sociais, aqueles diretamente relacionados ao mínimo existencial. 
 
1.3.1.3 Direitos fundamentais dispersos no texto constitucional 
 
Os direitos dispersos recorrem a critérios materiais para demonstrar que se trata de 
direitos fundamentais. É necessário que esteja presente na identificação o critério de 
importância , cuja a avaliação dependerá da sensibilidade do intérprete. 
9 
 
● Compartilham o regime jurídico constitucional pleno dos DF? 
É possível recorrer a um critério geral, segundo o qual os direitos fundamentais fora do 
catálogo somente poderão ser os que, por seu conteúdo e importância, possam 
ser equiparados aos presentes no Título II da CF. 
 
● Estão protegidos ao poder de reforma constitucional? 
 
 
● As normas que os asseguram são diretamente aplicáveis? 
 
1.3.1.4 Direitos sediados nos tratados internacionais de direitos humanos 
1.3.1.4.1 Generalidades 
Se trata do aspecto central para a compreensão das relações entre os direitos humanos 
(de matriz internacional) e os direitos fundamentais constitucionais 
Os dois mais importantes problemas jurídico-constitucionais no que diz com a relação 
dos tratados internacionais de direitos humanos e a ordem constitucional interna brasileira, 
quais sejam: 
(a) a forma pela qual se dá a incorporação dos tratados ao direito interno; 
(b) a força normativa (hierarquia) dos tratados de direitos humanos no Brasil. 
1.3.1.4.2 O procedimento de incorporação dos tratados de direitos humanos na 
perspectiva da Constituição Federal 
Inexiste de preceito expresso na CF um dispositivo favorável à recepção automática 
dos tratados de direitos humanos. Há necessidade de procedimentos formais de incorporação 
resultado da interação entre P. Executivo e P. Legislativo. 
No ​art. 5º, § 2º, CF ​“tratados internacionais em que a RFb seja parte” verifica-se que 
a incorporação de um tratado internacional pressupõea sua ratificação. 
 
1º. Assinatura pelo Presidente da República 
2º Envio ao Congresso Nacional 
10 
3º Aprovação pelo Congresso Nacional 
4º Ratificação pelo Presidente da República 
 
​Art, 5º § 3 (inserido pela EC 45/04) “os tratados e convenções internacionais sobre 
direitos humanos que forem aprovados em 2 turnos com ⅗ dos votos serão equivalentes às 
emendas constitucionais”. 
O STF assegurou, mesmo aos tratados incorporados até dezembro de 2004, 
hierarquia supralegal, mas não status equivalente a RC. 
​No art. 60, § 2.º​, da CF (votação em dois turnos, nas duas Casas do Congresso, com 
maioria de 3/5 em cada Casa e turno de votação) para que o tratado seja considerado 
equivalente a uma emenda constitucional. 
Os tratados de direitos humanos poderão ser aprovados por meio de um EC 
convencional, isto é, que siga o rito do art. art. 60, § 2.º, da CF ou mediante a outra figura 
legislativa, como previsto no art. 5º § 3º 
1.3.1.4.3 O problema da hierarquia dos tratados de direitos fundamentais na ordem 
jurídica interna brasileira: direitos fundamentais sem hierarquia constitucional? 
Duas correntes: Tem os que sustentam a supremacia do direito internacional e os que 
adotam a teoria da paridade entre as normas internacionais e a legislação interna. se 
seguirmos o § 3 do art. 5º podemos considerar que tais tratados estão fundamentados 
materialmente, por isso o ​status equivalente. Caso assim não fosse, o § 2º também seria 
desvirtuado e então não haveria diferença entre uma regra qualquer do direito internacional 
incorporada ao direito nacional e os direitos fundamentais ao homem consagrados nos textos 
internacionais. 
No que diz respeito à função do § 3.o do art. 5.o da CF/1988, neste contexto, é preciso 
verificar se a equivalência em relação às emendas constitucionais nele assegurada, 
evidentemente apenas para os tratados aprovados na forma do citado dispositivo, corresponde 
ao critério da supralegalidade aprovado pelo STF para todos os tratados de direitos humanos 
ratificados antes da entrada em vigor da EC 45/2004, ou se a hierarquia de emenda 
constitucional representa uma condição normativa distinta, eventualmente reforçada, o que, 
ao que tudo indica, corresponde à posição atualmente dominante no STF, que não assegurou 
força de emenda aos tratados anteriores, e, portanto, aceita um regime distinto. 
11 
Sempre deveria prevalecer a disposição mais benéfica para o indivíduo, apurada 
mediante os critérios da proporcionalidade e no âmbito de uma ponderação, também é correto 
que vislumbramos no dispositivo ora analisado um potencial positivo, no sentido de viabilizar 
alguns avanços concretos em relação à práxis ora vigente entre nós. Que uma posterior 
alteração do próprio § 3.o, por força de nova emenda constitucional, resta sempre aberta, 
ainda mais se for para reforçar a proteção dos direitos fundamentais oriundos dos tratados 
internacionais de direitos humanos, justamente nos parece servir de estímulo para um esforço 
hermenêutico construtivo também nesta seara. 
 
a) Os tratados internacionais de direitos humanos dependem de ratificação pelo Brasil, 
sendo incorporados mediante um processo complexo de atribuição do Presidente da 
República e do Congresso Nacional. 
 
b) A aprovação pelo Congresso Nacional de um tratado de direitos humanos em 
obediência ao rito estabelecido no art. 5.o, § 3.o, da CF não dispensa a ratificação do tratado. 
 
c) A hierarquia dos tratados de direitos humanos na ordem jurídica interna brasileira, de 
acordo com a atual orientação do STF, é diferenciada de acordo com a forma de 
incorporação. Com efeito, os tratados incorporados antes da inserção do § 3.o no art. 5.o da 
CF possuem hierarquia supralegal, prevalecendo, portanto, sobre toda e qualquer norma 
infraconstitucional interna, mas cedendo em face da CF. Por sua vez, os tratados aprovados 
pelo Congresso Nacional na forma do art. 5.o, § 3.o,da CF possuem hierarquia e força 
normativa equivalentes às emendas constitucionais. 
 
d) Os demais tratados internacionais, que não versam sobre direitos humanos, salvo 
exceções expressamente estabelecidas (como é o caso dos tratados em matéria tributária), 
seguem tendo hierarquia de lei ordinária. 
 
e) Um tratado de direitos humanos – quando contemplar expressamente a possibilidade 
de denúncia – não poderá – de acordo com importante doutrina – ser denunciado pelo 
Presidente da República sem prévia autorização pelo Congresso e sem que se faça um 
controle rigoroso no que diz com a piora em termos de proteção dos direitos humanos. 
12 
Todavia, se tal entendimento também será o majoritário no STF ainda pende de decisão por 
parte de nossa Suprema Corte, ao passo que na doutrina encontram-se defensores da tese de 
que, uma vez aprovado na forma do art. 5.o, § 3.o, da CF, um tratado não mais poderá ser 
denunciado, nem mesmo mediante aprovação prévia pelo Congresso Nacional. 
 
1.4 A dupla dimensão objetiva e subjetiva, a multifuncionalidade e a classificação 
dos direitos e garantias fundamentais 
 
1.4.1 Os direitos fundamentais e sua dimensão subjetiva 
Quando nos referimos aos direitos fundamentais como direitos subjetivos, temos em 
mente a noção de que ao titular de um direito fundamental é aberta a possibilidade de impor 
judicialmente seus interesses juridicamente tutelados perante o destinatário (obrigado). Desde 
logo, transparece a ideia de que o direito subjetivo consagrado por uma norma de direito 
fundamental se manifesta por meio de uma relação trilateral, formada entre o titular, o objeto 
e o destinatário do direito. 
 
“à proteção de uma determinada esfera de autorregulamentação ou de um espaço de 
decisão individual; tal como é associado a um certo poder de exigir ou 
pretender comportamentos ou de produzir autonomamente efeitos jurídicos” - 
Vieira de Andrade 
 
É possível afirmar que este espectro de variações no que concerne ao objeto do direito 
subjetivo (fundamental) se encontra vinculado aos seguintes fatores: 
 
(a) o espaço de liberdade da pessoa individual não se encontra garantido de maneira 
uniforme; 
 
(b) a existência de inequívocas distinções no que tange ao grau de exigibilidade dos 
direitos individualmente considerados, de modo especial, considerando-se os 
direitos a prestações sociais materiais; 
13 
 
(c) os direitos fundamentais constituem posições jurídicas complexas, no sentido de 
poderem conter direitos, liberdades, pretensões e poderes da mais diversa 
natureza e até mesmo pelo fato de poderem dirigir-se contra diferentes 
destinatários. 
 
 Pode integrar um direito fundamental na condição de direito subjetivo: 
 
(a) direitos a qualquer coisa (que englobariam os direitos a ações negativas e positivas do 
Estado e/ou particulares e, portanto, os clássicos direitos de defesa e os 
direitos a prestações); 
 
(b) liberdades (no sentido de negaçãode exigências e proibições); e 
 
© poderes (competências ou autorizações). 
1.4.2 A assim chamada dimensão objetiva dos direitos fundamentais 
A função dos direitos fundamentais não se limita a serem direitos subjetivos, já que 
também representam decisões valorativas de natureza jurídico-objetiva da Constituição, que 
se projetam em todo o ordenamento jurídico. Em outras palavras, os direitos fundamentais 
passaram a apresentar-se, no âmbito da ordem constitucional, como um conjunto de valores 
objetivos básicos e fins diretivos da ação positiva dos poderes públicos, e não apenas 
garantias negativas (e positivas) dos interesses individuais. 
Em termos gerais, a dimensão objetiva dos direitos fundamentais significa que às 
normas que preveem direitos subjetivos é outorgada função autônoma, que transcende a 
perspectiva subjetiva, implicando, além disso, o reconhecimento de conteúdos normativos e, 
portanto, de funções distintas aos direitos fundamentais. 
A função que tem sido reconduzida à dimensão objetiva está vinculada ao 
reconhecimento de que os direitos fundamentais implicam deveres de proteção do Estado, 
impondo aos órgãos estatais a obrigação permanente de, inclusive preventivamente, zelar pela 
proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos, não somente contra os poderes públicos, 
14 
mas também contra agressões por parte de particulares e até mesmo por parte de outros 
Estados. 
Por força dos deveres de proteção, aos órgãos estatais incumbe assegurar níveis 
eficientes de proteção para os diversos bens fundamentais, o que implica não apenas a 
vedação de omissões, mas também a proibição de uma proteção manifestamente insuficiente, 
tudo sujeito a controle por parte dos órgãos estatais, inclusive por parte do Poder Judiciário. 
Assim, os deveres de proteção implicam deveres de atuação (prestação) do Estado e, no plano 
da dimensão subjetiva – na condição de direitos à proteção –, inserem-se no conceito de 
direitos a prestações (direitos à proteção) estatais. 
Uma terceira função, igualmente vinculada à dimensão objetiva, e que, além disso, 
demonstra que todas as funções dos direitos fundamentais, tanto na perspectiva 
jurídico-objetiva quanto na dimensão subjetiva, guardam direta conexão entre si e se 
complementam reciprocamente (embora a existência de conflitos), pode ser genericamente 
designada de função organizatória e procedimental. Neste sentido, sustenta-se que a partir do 
conteúdo das normas de direitos fundamentais é possível extrair consequências para a 
aplicação e interpretação das normas procedimentais, mas também para uma formatação do 
direito organizacional e procedimental que auxilie na efetivação da proteção aos direitos 
fundamentais, evitando-se os riscos de uma redução do seu significado e conteúdo material. 
 
1.4.3 Multifuncionalidade e classificação dos direitos fundamentais na ordem 
constitucional 
Os direitos fundamentais não correspondem a uma teoria de base, não se podendo 
falar, pelo menos não em termos gerais e tomando como parâmetro a maioria dos países, em 
uma concepção estritamente liberal, socialista ou institucional (para além de outras 
concepções que poderiam ser invocadas) dos direitos fundamentais. 
 
Os Estados de Jellinek 
1. status passivo (status subjectionis)​: o indivíduo estaria subordinado aos poderes 
estatais, sendo, neste contexto, meramente detentor de deveres, de modo que o Estado 
15 
possui a competência de vincular o cidadão juridicamente por meio de mandamentos 
e proibições. 
 
2. status negativus: ​consiste numa esfera individual de liberdade imune ao jus imperii do 
Estado, que, na verdade, é poder juridicamente limitado. 
 
3. status positivus (ou status civitatis)​: ao indivíduo é assegurada juridicamente a 
possibilidade de utilizar-se das instituições estatais e de exigir do Estado determinadas 
ações positiva. 
 
4. status activus: o cidadão passa a ser considerado titular de competências que lhe 
garantem a possibilidade de participar ativamente da formação da vontade estatal, 
como, por exemplo, pelo direito de voto. 
 
 Os direitos fundamentais podem ser classificados em: 
 
1. direitos de defesa (direitos negativos): proibições de intervenção (exigências de 
abstenção/omissão); 
 
2. direitos a prestações (direitos positivos): direitos a ações positivas, que exigem do 
destinatário uma atuação em nível de prestações fáticas (materiais) ou normativas (jurídicas), 
incluindo, neste caso, o dever de emitir normas de proteção, organização e procedimento. 
 
1.5 A titularidade dos direitos e garantias fundamentais: quem é o sujeito dos 
direitos? 
1.5.1 Considerações gerais 
Titular do direito é o sujeito do direito, ou seja, é quem figura como sujeito ativo da 
relação de direito subjetivo, ao passo que destinatário do direito é a pessoa (física ou mesmo 
jurídica ou ente despersonalizado) em face da qual o titular pode exigir o respeito, a proteção 
ou a promoção do seu direito. 
16 
 
1.5.2 A pessoa natural como titular de direitos fundamentais: a titularidade 
universal e sua interpretação na Constituição Federal 
De acordo com o princípio da universalidade, todas as pessoas, pelo fato de serem 
pessoas, são titulares de direitos e deveres fundamentais, o que, por sua vez, não significa que 
não possa haver diferenças a serem consideradas, inclusive, em alguns casos, por força do 
próprio princípio da igualdade, além de exceções expressamente estabelecidas pela 
Constituição, como dá conta a distinção entre brasileiro nato e naturalizado, algumas 
distinções relativas aos estrangeiros, entre outras. 
É preciso enfatizar, por outro lado, que o princípio da universalidade não é 
incompatível com o fato de que nem mesmo os brasileiros e os estrangeiros residentes no 
País são titulares de todos os direitos sem qualquer distinção, já que direitos há que são 
atribuídos apenas a determinadas categorias de pessoas. Assim ocorre, por exemplo, com os 
direitos dos cônjuges, dos pais, dos filhos, dos trabalhadores, dos apenados, dos 
consumidores, tudo a demonstrar que há diversos fatores, permanentes ou vinculados a 
determinadas situações ou circunstâncias (como é o caso da situação familiar, da condição 
econômica, das condições físicas ou mentais, da idade etc.) que determinam a definição de 
cada uma dessas categorias. Em suma, o que importa para efeitos de aplicação do princípio da 
universalidade é que toda e qualquer pessoa que se encontre inserida em cada uma dessas 
categorias seja, em princípio, titular dos respectivos direitos. 
 
1.5.3 O problema da titularidade de direitos fundamentais por parte dos 
estrangeiros e a relevância da distinção entre estrangeiro residente e não residente 
Uma primeira alternativa de interpretação mais extensiva guarda relação com a 
definição de estrangeiro residente e não residente, de tal sorte que, em homenagem aos 
princípios da dignidade da pessoa humana, isonomia e universalidade(fundamento aqui 
adotado), seja adotada a interpretação mais favorável ao indivíduo. Assim, estrangeiros 
residentes são considerados todos os que, não sendo brasileiros natos ou naturalizados, se 
17 
encontram, pelo menos temporariamente, no País, guardando, portanto, algum vínculo com 
certa duração. 
Hipótese distinta é a da extensão da titularidade de direitos fundamentais a qualquer 
estrangeiro, ainda que não residente, mesmo nos casos em que tal não decorre diretamente de 
disposição constitucional expressa. Neste contexto, há que invocar o princípio da 
universalidade, que, fortemente ancorado no princípio da dignidade da pessoa humana e no 
âmbito de sua assim designada função interpretativa, na dúvida, implica uma presunção de 
que a titularidade de um direito fundamental é atribuída a todas as pessoas. 
Critérios que podem ser atribuídos aos estrangeiros não residentes no Brasil: 
 
a) por força do princípio da universalidade, combinado com o princípio da dignidade da 
pessoa humana, todos os direitos que guardam relação direta com a dignidade da pessoa 
humana, no sentido de constituírem exigência desta mesma dignidade (isto é, direitos cuja 
violação e supressão implicam também violação da dignidade da pessoa humana), são 
necessariamente direitos de todos, brasileiros e estrangeiros, sejam eles residentes, ou não; 
 
b) a própria Constituição Federal, ao enunciar os direitos fundamentais, em diversos 
casos faz referência expressa (textual) a um alargamento da titularidade, apontando para uma 
exceção à regra do art. 5.º, caput, ainda mais quando tal critério for complementar em relação 
ao parâmetro da universalidade e dignidade da pessoa humana. Para ilustrar tal afirmação, 
tome-se, por exemplo, o caso do art. 5.º, III, segundo o qual “ninguém será submetido a 
tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. A expressão “ninguém”, ainda mais no 
caso em exame, dificilmente poderia ser interpretada como excluindo do âmbito de proteção 
da norma (no caso, uma regra que densifica o princípio da dignidade da pessoa humana) os 
estrangeiros não residentes. Assim, quando a Constituição Federal expressamente se refere a 
“ninguém”, “todos” etc., em homenagem ao princípio da universalidade, a titularidade deve 
ser interpretada como sendo de todos; 
 
c) um terceiro critério poderia ser utilizado, no caso, recorrendo-se à noção de abertura 
material do catálogo de direitos fundamentais consagrada no art. 5.º, § 2.º, da CF, quando este 
faz referência a direitos previstos nos tratados internacionais dos quais o Brasil seja parte. 
Com efeito, tal dispositivo, somado ao critério da universalidade e ao princípio da 
18 
prevalência dos direitos humanos (art. 4.º, II, da CF), indica que, quando se tratar de direitos 
consagrados em tratados ratificados pelo Brasil, ainda mais (mas não necessariamente apenas 
neste caso) quando também constantes do texto constitucional, tais direitos devem ter sua 
titularidade atribuída, em princípio, a qualquer pessoa, ressalvadas hipóteses excepcionais, 
em que incidem outros critérios de matriz jurídico- -constitucional ou mesmo oriundas do 
direito internacional dos direitos humanos. O critério ora esboçado encontra-se, por certo, 
sujeito a controvérsia, como, por exemplo, a discussão em torno da hierarquia dos tratados no 
direito interno. Cuidando-se apenas de hierarquia supralegal (como atualmente sustentado no 
STF), tais direitos (e, portanto, sua titularidade) estariam em plano diverso dos direitos 
previstos na Constituição, e sempre alguém poderia argumentar que a regra do art. 5.º, caput, 
da CF deveria prevalecer. Mas isso, todavia, apenas seria uma objeção em tese oponível aos 
direitos dos tratados que simultaneamente não constem, expressa ou implicitamente, na CF, 
pois quanto a esses – precisamente por já estarem constitucionalizados – o argumento da 
extensão aos estrangeiros não residentes acima vertido se aplica sem exceção. De qualquer 
modo, cuida-se de tópico a merecer maior reflexão e que, considerando a necessidade de 
maior integração na esfera innternacional, bem como uma interpretação sistemática da 
Constituição Federal, poderia ser adotado em caráter pelo menos complementar aos dois 
critérios anteriores. 
1.5.4 O problema da titularidade de direitos fundamentais nos limites da vida 
No caso dos embriões (e fetos) em fase gestacional, com vida uterina, nítida é a 
titularidade de direitos fundamentais, especialmente no que concerne à proteção da 
conservação de suas vidas, e onde já se pode, inclusive, reconhecer como imanentes os 
direitos da personalidade, assim como, em alguns casos, direitos de natureza patrimonial, 
embora tais aspectos sigam sendo discutidos em várias esferas. 
Por outro lado, segue intenso o debate sobre os limites da proteção da vida antes do 
nascimento, como dá conta, entre nós, a controvérsia a respeito da interrupção da gravidez 
nos casos de anencefalia (já apreciada pelo STF), assim como a discussão – igualmente 
travada no STF – a respeito da legislação sobre biotecnologia, designadamente naquilo em 
que está em causa a determinação do início da vida humana e da sua necessária proteção. 
Para os embriões que ainda não se encontram em fase gestacional, portanto, com vida extra 
19 
uterina, caso, por exemplo, dos embriões excedentes, dos pré-implantados ou concepturos, a 
questão é mais delicada e merece especial reflexão. 
A possível titularidade post mortem dos direitos fundamentais, especialmente 
considerando os efeitos daí decorrentes, sejam individuais ou patrimoniais, inclusive quanto 
aos reflexos em universalidades de direito, como é o caso da sucessão. Neste contexto, 
situam-se, por exemplo, os direitos ao bom nome, à privacidade, à honra, bem como o dever 
(e direito) de respeito ao cadáver, a discussão sobre a possibilidade de disposição de órgãos, 
entre outros. 
1.5.5 Pessoas jurídicas como titulares de direitos fundamentais 
Diversamente de outras Constituições, como é o caso da Lei Fundamental da 
Alemanha (art. 19, III) e da Constituição da República Portuguesa de 1976 (art. 12.2), a 
Constituição Federal não contém cláusula expressa assegurando a titularidade de direitos 
fundamentais às pessoas jurídicas (ou entes coletivos, como preferem alguns), o que, todavia, 
não impediu doutrina e jurisprudência de reconhecerem, de forma tranquila, tal possibilidade, 
ressalvada alguma discussão pontual sobre determinadas hipóteses e eventuais limitações 
decorrentes da condição de pessoa jurídica. Com efeito, como bem pontua Walter Claudius 
Rothenburg, “as pessoas jurídicas são sujeitos de direitos fundamentais, pois são projeções de 
pessoas físicas, ainda que coletivamente consideradas: as pessoas físicas constituem (fazem 
parte da estrutura das) pessoas jurídicas, e atingir estas implica atingir necessariamente 
também os indivíduos que a compõem”. 
Da mesma forma, foirecepcionada no direito constitucional brasileiro a tese de que as 
pessoas jurídicas, ao contrário das pessoas naturais (físicas ou singulares), não são titulares de 
todos os direitos, mas apenas daqueles direitos que lhes são aplicáveis por serem compatíveis 
com a sua natureza peculiar de pessoa jurídica, além de relacionados aos fins da pessoa 
jurídica, o que, todavia, há de ser verificado caso a caso. 
Neste particular, também ao direito constitucional brasileiro é aplicável, segundo o 
entendimento aqui adotado, a lição de Jorge Miranda, no sentido da inexistência de uma 
equiparação entre pessoas jurídicas e naturais, visto que se trata, em verdade, de uma espécie 
de cláusula (no caso brasileiro, de uma cláusula implícita) de limitação, designadamente de 
limitação da titularidade aos direitos compatíveis com a condição de pessoa jurídica. 
20 
Questão bem mais controversa diz com a atribuição de titularidade às pessoas 
jurídicas de direito público, visto que, em regra, consideradas destinatárias da vinculação dos 
direitos fundamentais, na condição de sujeitos passivos da obrigação de tutela e promoção 
dos direitos fundamentais, de tal sorte que, em termos gerais, as pessoas jurídicas de direito 
público têm tido recusada a condição de titulares de direitos fundamentais. Todavia, 
considerando, especialmente quando se trata de um Estado Democrático de Direito, tal qual 
consagrado pela nossa Constituição, que o Estado e a sociedade não são setores isolados da 
existência sociojurídica, sendo precisamente no amplo espaço do público que o indivíduo 
logra desenvolver livremente sua personalidade, designadamente por meio de sua 
participação comunitária, viabilizada em especial por meio dos direitos políticos e dos 
direitos de comunicação e expressão, não há como deixar de reconhecer às pessoas jurídicas 
de direito público, evidentemente consideradas as peculiaridades do caso, a titularidade de 
determinados direitos fundamentais. 
 
1.6 A aplicabilidade imediata das normas de direitos e garantias fundamentais: 
significado e alcance do art. 5.º, § 1.º, da CF 
 
No que diz com a origem do referido dispositivo, verifica-se que, nas Constituições 
brasileiras anteriores, não houve previsão de dispositivo similar, cuidando-se de inovação 
trazida pela Constituição Federal de 1988. Todavia, já no anteprojeto elaborado pela 
Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, a assim designada Comissão Afonso 
Arinos, a questão da força normativa dos direitos fundamentais foi contemplada, visto que o 
art. 10 (do anteprojeto) dispunha que “os direitos e garantias constantes desta Constituição 
têm aplicação imediata”, teor que praticamente corresponde ao adotado pela atual 
Constituição, com a ressalva de que esta se refere aos direitos e garantias fundamentais. 
A despeito de alguma divergência, a doutrina e a jurisprudência reconhecem, em 
termos gerais, que o mandamento da imediata aplicabilidade alcança todas as normas de 
direitos fundamentais, independentemente de sua localização no texto constitucional, o que, 
além disso, guarda sintonia com o teor literal do art. 5.º, § 1.º, da CF, visto que este 
expressamente faz referência às normas definidoras de direitos e garantias fundamentais e 
não apenas aos direitos individuais constantes do art. 5.º. A Constituição Federal não 
estabeleceu, neste ponto, distinção expressa entre os direitos de liberdade (os assim chamados 
21 
direitos civis e políticos) e os direitos sociais, como, por exemplo, fez o constituinte 
português, notadamente ao traçar um regime jurídico em parte (visto que existe um regime 
em parte comum) distinto para os direitos, liberdades e garantias, de um lado, e os direitos 
sociais, econômicos e culturais, de outro. 
O fato de todas as normas de direitos e garantias fundamentais terem reconhecida sua 
direta aplicabilidade não corresponde a afirmar que a eficácia jurídica (que não se confunde 
com a eficácia social ou efetividade) de tais normas seja idêntica – a multifuncionalidade dos 
direitos fundamentais e o fato de estes abrangerem um conjunto heterogêneo e complexo de 
normas e posições jurídicas, por si só, já sustenta esta afirmativa.[1033] Além disso, há que 
levar em conta ser diverso o âmbito de proteção dos direitos fundamentais, assim como 
diversos os limites aos quais estão sujeitos, tudo a interferir na determinação dos efeitos 
jurídicos e da sua exata extensão. De outra parte, se é correto afirmar que a aplicabilidade 
direta afirmada pelo art. 5.º, § 1.º, da CF afasta, em geral, a necessidade de uma interposição 
legislativa, pelo menos naquilo em que tal intervenção possa ser considerada um obstáculo à 
aplicação judicial das normas de direitos fundamentais, também é certo que, mesmo se 
tratando de normas de eficácia plena e de aplicabilidade direta, as normas de direitos 
fundamentais estão sujeitas a regulamentação, assim como estão expostas a eventuais 
restrições e limitações. Com efeito, crucial relevar que a aplicabilidade imediata não significa 
em hipótese alguma relevância da legislação infraconstitucional,[1034] que, aliás, dá vida e 
concretude aos direitos fundamentais, mas sim, como já frisado, que a ausência eventual de 
lei não pode servir de obstáculo absoluto à aplicação da norma de direito fundamental e da 
extração de efeitos úteis, cuja extensão, sobretudo no que diz com a dedução de posições 
subjetivas, irá depender de qual é o direito em causa e de seus limites fáticos e jurídicos. 
Verifica-se, portanto, que, a partir do disposto no art. 5.º, § 1.º, da CF, é possível 
sustentar a existência – ao lado de um dever de aplicação imediata – de um dever, por parte 
dos órgãos estatais (mas com ênfase nos órgãos jurisdicionais, a que incumbe inclusive a 
revisão dos atos dos demais entes estatais nos casos de violação da Constituição), de 
atribuição da máxima eficácia e efetividade possível às normas de direitos fundamentais. 
 
a) Do disposto no art. 5.º, § 1.º, da CF, é possível extrair tanto um dever de maximização 
(otimização) da eficácia e efetividade das normas de direitos fundamentais quanto 
22 
uma regra impositiva de um dever de aplicação imediata de tais normas, dimensões 
que não se excluem. 
 
b) Daí decorre também uma exclusão do caráter meramente programático das normas de 
direitos fundamentais, que não podem ser reduzidas à condição de normas não 
autoaplicáveis, no sentido de normas destituídas de qualquer eficácia ou 
aplicabilidade. 
 
c) Assim, quando se afirma que em favor das normas de direitos fundamentais é possível 
estabelecer uma presunção de que se trata, de acordo com a terminologia mais 
difundida no Brasil, de normas de eficácia plena, o que se pretende é enfatizar que a 
ausência de lei não poderá, em regra, operar como elemento impeditivo da aplicação 
da norma de direito fundamental, pena de esvaziar a condição dos direitosfundamentais como “trunfos contra a maioria”, ou seja, a condição de normas 
subtraídas à plena disposição por parte dos poderes constituídos. 
 
d) A eficácia e a aplicabilidade que de fato cada norma de direito fundamental apresenta 
irão depender do exame de cada direito fundamental e das diversas posições jurídicas 
que o integram, sejam de cunho negativo (defensivo), sejam de cunho positivo 
(prestacional). 
 
e) O fato de o dever de aplicação imediata não excluir, de plano, qualquer tipo de direito 
fundamental, pois todas as normas de direitos fundamentais estão abrangidas já por 
força da literalidade do texto do art. 5.º, § 1.º, não significa que não haja diferenças 
importantes entre as normas de direitos fundamentais e mesmo exceções previstas na 
própria Constituição Federal, exceções que, todavia, não implicam – como já frisado 
– ausência de qualquer possibilidade de aplicação e extração de efeitos, ainda que 
seja, como ocorre com as demais normas constitucionais, para efeitos de declarar a 
inconstitucionalidade de atos estatais contrários e reconhecer a inconstitucionalidade 
por omissão. 
 
23 
1.7 Destinatários dos direitos e garantias fundamentais 
Destinatários dos direitos e garantias fundamentais são, em contraposição aos 
titulares, os sujeitos passivos da relação jurídica, em outras palavras, as pessoas físicas ou 
jurídicas (de direito público ou privado) que estão vinculadas pelas normas de direitos 
fundamentais. Embora se trate de temática também relacionada à eficácia e aplicabilidade das 
normas de direitos fundamentais, é aqui que serão delineadas algumas considerações a 
respeito do tema. Na medida em que o mandamento da aplicação imediata (art. 5.º, § 1.º, da 
CF) diz respeito, em princípio, a todas as normas de direitos fundamentais, 
independentemente de sua função (direitos a prestações ou direitos de defesa) e da forma de 
sua positivação, o problema da eficácia vinculativa será abordado de forma genérica, 
considerando-se, todavia, as especificidades das diversas categorias de direitos fundamentais. 
De outra parte, em que pese uma série de convergências, seguir-se-á a convencional distinção 
entre o Poder Público e os particulares na condição de destinatários dos direitos 
fundamentais. 
No concernente aos órgãos legislativos, notadamente em função da substituição da 
plena soberania do Parlamento pela soberania da Constituição, verifica-se, desde logo, que a 
vinculação aos direitos fundamentais significa para o legislador uma limitação material de 
sua liberdade de conformação no que diz com sua tarefa de regulamentar e concretizar a 
Constituição,[1048] especialmente gerando uma limitação das possibilidades de intervenção 
restritiva no âmbito de proteção dos direitos fundamentais. 
Também a vinculação dos órgãos da administração estatal aos direitos fundamentais é 
reconhecida entre nós, registrando-se, contudo, falta de consenso no tocante a determinados 
aspectos, especialmente no que concerne à forma e ao alcance da vinculação, a exemplo, 
aliás, do que ocorre no direito alienígena, questões que aqui não serão desenvolvidas. 
Esclareça-se, desde logo, que destinatárias dos direitos fundamentais não são apenas as 
pessoas jurídicas de direito público, mas também as pessoas jurídicas de direito privado que, 
nas suas relações com os particulares, dispõem de atribuições de natureza pública, assim 
como pessoas jurídicas de direito público que atuam na esfera privada, o que revela 
importante ponto de contato entre a vinculação do Poder Público e a vinculação dos 
particulares aos direitos fundamentais. O que se pretende com esta interpretação ampliada é 
justamente evitar que os órgãos da administração venham a se furtar à vinculação aos direitos 
fundamentais por meio de uma atuação nas formas do direito privado, resultando naquilo que 
24 
os autores alemães costumam denominar uma fuga para o direito privado (Flucht in das 
Privatrecht). 
A vinculação dos órgãos judiciais aos direitos fundamentais, de acordo com a lição de 
Gomes Canotilho, manifesta-se, por um lado, por intermédio de uma constitucionalização da 
própria organização dos tribunais e do procedimento judicial, que, além de deverem ser 
compreendidos à luz dos direitos fundamentais, por estes são influenciados, expressando-se, 
de outra parte, na vinculação do conteúdo dos atos jurisdicionais aos direitos fundamentais, 
que, neste sentido, atuam como autênticas medidas de decisão material, determinando e 
direcionando as decisões judiciais. No que diz com sua amplitude, também aqui é de se 
enfatizar que a totalidade dos órgãos jurisdicionais estatais, bem como os atos por estes 
praticados no exercício de suas funções, assume a condição de destinatária dos direitos 
fundamentais. De outra parte, há que ressaltar a particular relevância da função exercida pelos 
órgãos do Poder Judiciário, na medida em que não apenas se encontram, eles próprios, 
também vinculados à Constituição e aos direitos fundamentais, mas exercem, para além disso 
(e em função disso), o controle da constitucionalidade dos atos dos demais órgãos estatais, de 
tal sorte que os tribunais dispõem – consoante já se assinalou em outro contexto – 
simultaneamente do poder e do dever de não aplicar os atos contrários à Constituição, de 
modo especial os ofensivos aos direitos fundamentais, inclusive declarando-lhes a 
inconstitucionalidade. 
 
1.8 Particulares como destinatários dos direitos fundamentais: o problema da 
eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas 
 
Os particulares, na condição de destinatários, estão sujeitos à força vinculante dos 
direitos fundamentais, temática habitualmente versada sob o rótulo da constitucionalização 
do direito privado ou, de modo mais preciso, da eficácia dos direitos fundamentais na esfera 
das relações privadas. Diversamente do direito constitucional português, no qual existe 
referência expressa à vinculação das entidades privadas aos direitos fundamentais, na 
CF/1988, a exemplo do que ocorreu com o Poder Público, o texto constitucional nada dispôs 
sobre os particulares como destinatários dos direitos fundamentais. Mesmo assim, tanto na 
doutrina quanto na jurisprudência, tal possibilidade – de os particulares serem também 
destinatários dos direitos – nunca foi, como tal, seriamente questionada. Todavia – e a 
25 
evolução doutrinária nos últimos anos bem o atesta –, a problemática dos limites e 
possibilidades de uma eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas passou a 
ocupar um lugar de destaque na agenda acadêmica brasileira.[1061] Com efeito, ainda que 
não se questione, pelo menos não em termos gerais (ressalva feita a posições isoladas na 
doutrina),[1062] a possibilidade em si de os particulares serem destinatários dos direitos 
fundamentais, quanto ao modo pelo qual se opera tal vinculação, assim como em relação aosefeitos daí decorrentes, também no Brasil registra-se alguma controvérsia. 
Ainda neste contexto, sustentou-se, acertadamente, que, em qualquer caso e 
independentemente do modo pelo qual se dá a vinculação dos particulares aos direitos 
fundamentais (isto é, se de forma imediata ou mediata), se verifica, entre as normas 
constitucionais e o direito privado não o estabelecimento de um abismo, mas uma relação 
pautada por um contínuo fluir, de tal sorte que, ao aplicar-se uma norma de direito privado, 
também se está a aplicar a própria Constituição. É justamente por esta razão que, para muitos, 
o problema da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais constitui, em verdade, 
mais propriamente um problema relativo à conciliação dos direitos fundamentais com os 
princípios basilares do direito privado. 
De qualquer modo, para além dessas e de outras considerações que aqui poderiam ser 
tecidas, constata-se que no direito constitucional brasileiro tem prevalecido a tese de que, em 
princípio, os direitos fundamentais geram uma eficácia direta prima facie na esfera das 
relações privadas, sem se deixar de reconhecer, todavia, que o modo pelo qual se opera a 
aplicação dos direitos fundamentais às relações jurídicas entre particulares não é uniforme, 
reclamando soluções diferenciadas. 
Aliás, cada vez mais é preciso admitir que o problema da vinculação dos particulares 
e da eficácia dos direitos fundamentais na esfera das relações privadas acaba alcançando, em 
termos gerais, alguma relevância, seja qual for o direito fundamental em causa, ainda que, 
consoante já frisado, se deva avaliar como se dá tal eficácia em cada caso. 
 
1.9 Limites e restrições de direitos fundamentais 
 
26 
1.9.1 Considerações introdutórias 
Características comuns dotadas de especial importância para a realização normativa 
dos direitos fundamentais: âmbito de proteção, limites e limites aos limites dos direitos 
fundamentais. 
1.9.2 Âmbito de proteção 
Trata-se, com outras palavras, do bem jurídico protegido, ou seja, do objeto tutelado, 
que nem sempre se afigura de fácil identificação, especialmente em decorrência das 
indeterminações semânticas invariavelmente presentes nos textos que contemplam direitos 
fundamentais. Por outro lado, considerando que nenhuma ordem jurídica pode proteger os 
direitos fundamentais de maneira ilimitada, a ideia de que os direitos fundamentais não são 
absolutos não tem oferecido maiores dificuldades e tem sido amplamente aceita no direito 
constitucional contemporâneo. Posto de outro modo, direitos fundamentais são – de regra – 
direitos submetidos a limites e suscetíveis de serem restringidos. 
 
● Teoria Interna: ​um direito fundamental existe desde sempre com seu conteúdo 
determinado, afirmando-se mesmo que o direito já “nasce” com os seus limites. Neste 
sentido, fala-se na existência de “limites imanentes”, que consistem em fronteiras 
implícitas, de natureza apriorística, que não se deixam confundir com autênticas 
restrições, pois estas são, em geral, compreendidas (para a teoria externa) como 
“desvantagens” normativas impostas externamente a estes direitos, inadmitidas pela 
teoria interna, visto que para esta o direito tem o seu alcance definido de antemão, de 
tal sorte que sua restrição se revela desnecessária e até mesmo impossível do ponto de 
vista lógico. 
 
● Teoria Externa: ​distingue os direitos fundamentais das restrições a eles 
eventualmente impostas, daí a necessidade de uma precisa identificação dos contornos 
de cada direito. Recorrendo novamente à didática formulação de Virgílio Afonso da 
Silva, “ao contrário da teoria interna, que pressupõe a existência de apenas um objeto, 
o direito e seus limites (imanentes), a teoria externa divide este objeto em dois: há, em 
27 
primeiro lugar, o direito em si, e, destacadas dele, as suas restrições”. Assim, de 
acordo com a teoria externa, existe inicialmente um direito em si, ilimitado,que, 
mediante a imposição de eventuais restrições, se converte em um direito limitado. 
1.9.3 Os limites dos direitos fundamentais 
Constitui condição para que se possa controlar o seu desenvolvimento normativo, 
partilhado com o legislador ordinário. A ideia de que existem limites ou restrições a um 
direito, que com este não se confundem, embora possa parecer trivial à primeira vista, oculta, 
todavia, uma série de problemas, resultantes, por um lado, da determinação do significado 
destes limites, por outro, da distinção do que sejam uma limitação e outras atividades 
normativas. 
Limites aos direitos fundamentais, em termos sumários, podem ser definidos como 
ações ou omissões dos poderes públicos (Legislativo, Executivo e Judiciário) ou de 
particulares que 
dificultem, reduzam ou eliminem o acesso ao bem jurídico protegido, afetando o seu 
exercício (aspecto subjetivo) e/ou diminuindo deveres estatais de garantia e promoção 
(aspecto objetivo) que resultem dos direitos fundamentais. Todavia, como é cediço, nem toda 
a disciplina normativa dos direitos fundamentais pode ser caracterizada como constituindo 
uma limitação. Muitas vezes as normas legais se limitam a detalhar tais direitos a fim de 
possibilitar o seu exercício, situações que correspondem aos termos configurar, conformar, 
completar, regular, densificar ou concretizar, habitualmente utilizados para caracterizar este 
fenômeno. Algo distinto, contudo, se dá com as limitações de direitos fundamentais, que, 
como visto, reduzem o alcance de conteúdos prima facie conferidos a posições de direitos 
fundamentais mediante a imposição de “cargas coativas”. Além disso, há que distinguir as 
normas que limitam bens jurídicos protegidos prima facie das que fundamentam a 
competência estatal para realizar essas limitações. 
1.9.4 Limites aos limites dos direitos fundamentais 
1.9.4.1 Noções Preliminares 
Até meados do século XX, por conta de uma tradição fortemente vinculada à postura 
reverencial em relação ao legislador, os direitos fundamentais não raras vezes tinham sua 
28 
eficácia esvaziada pela atuação erosiva dos poderes constituídos. Ao longo da evolução 
dogmática e jurisprudencial, todavia, especialmente a partir do labor da doutrina e da 
jurisprudência constitucional germânica, foi desenvolvida uma série de instrumentos, 
destinados a controlar as ingerências exercidas sobre os direitos fundamentais, evitando ao 
máximo a sua fragilização. 
Em síntese, o que importa destacar, nesta quadra, é que eventuais limitações dos 
direitos fundamentais somente serão tidas como justificadas se guardarem compatibilidade 
formal e material com a Constituição. Sob perspectiva formal, parte-se da posição de 
primazia ocupada pela Constituição na estrutura do ordenamento jurídico, no sentido de que 
suas normas, na qualidade de decisões do poder constituinte, representam atos de 
autovinculação fundamental-democrática que encabeçam a hierarquia normativa imanente ao 
sistema.No que diz com a perspectiva material, parte-se da premissa de que a Constituição 
não se restringe a regulamentar formalmente uma série de competências, mas estabelece, 
paralelamente, uma ordem de princípios substanciais, calcados essencialmente nos valores da 
dignidade da pessoa humana e na proteção dos direitos fundamentais que lhe são inerentes. 
O controle da constitucionalidade formal e material dos limites aos direitos 
fundamentais implica, no plano formal, a investigação da competência, do procedimento e da 
forma adotados pela autoridade estatal. Já o controle material diz essencialmente com a 
observância da proteção do núcleo (ou conteúdo) essencial destes direitos, bem como com o 
atendimento das exigências da proporcionalidade e da razoabilidade, mas também do que se 
tem convencionado designar de proibição de retrocesso, categorias que, neste sentido, 
assumem a função de limites aos limites dos direitos fundamentais. Os limites aos limites dos 
direitos fundamentais, portanto, funcionam como verdadeiras barreiras à restringibilidade 
destes direitos, sendo, nesta perspectiva, garantes da eficácia dos direitos fundamentais nas 
suas múltiplas dimensões e funções. 
 
1.9.4.2 Proporcionalidade e razoabilidade como limites dos limites 
 
29 
a) Do princípio da proporcionalidade e sua dupla função como proibição de excesso e 
proibição de proteção insuficiente: 
Embora as ideias de proporção e de razoabilidade, vinculadas à própria noção de 
justiça e equidade, sempre tenham estado presentes no âmbito do fenômeno jurídico, 
permeando, em termos gerais, o direito contemporâneo, nem todas as manifestações 
suscitadas pela ideia de proporção dizem respeito ao princípio da proporcionalidade em seu 
sentido técnico-jurídico, tal qual desenvolvido no direito público alemão. Da mesma forma, 
segue existindo acirrada controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre o conteúdo jurídico e 
o significado da proporcionalidade e da razoabilidade. 
No plano da legislação infraconstitucional, por sua vez, os princípios da 
proporcionalidade e da razoabilidade foram positivados em vários momentos, destacando-se 
o art. 2.º da Lei 9.784/1999, que regulamenta o processo administrativo no âmbito da 
Administração Federal direta e indireta. É bom frisar, contudo, que, independentemente de 
sua expressa previsão em textos constitucionais ou legais, o que importa é a constatação, 
amplamente difundida, de que a aplicabilidade dos princípios da proporcionalidade e da 
razoabilidade não está excluída de qualquer matéria jurídica. 
O princípio da proporcionalidade, que constitui um dos pilares do Estado 
Democrático de Direito brasileiro, desponta como instrumento metódico de controle dos atos 
– tanto comissivos quanto omissivos – dos poderes públicos, sem prejuízo de sua eventual 
aplicação a atos de sujeitos privados. Neste contexto, assume relevância a conhecida e já 
referida distinção entre as dimensões negativa e positiva dos direitos fundamentais, com 
destaque para a atuação dos direitos fundamentais como deveres de proteção ou imperativos 
de tutela, implicando uma atuação positiva do Estado, obrigando-o a intervir, tanto 
preventiva, quanto repressivamente, inclusive quando se trata de agressões oriundas de 
particulares. 
O princípio da proporcionalidade atua aqui, no plano da proibição de excesso, como 
um dos principais limites às limitações dos direitos fundamentais. Por outro lado, poderá o 
Estado frustrar seus deveres de proteção atuando de modo insuficiente, isto é, ficando aquém 
dos níveis mínimos de proteção constitucionalmente exigidos ou mesmo deixando de atuar – 
hipótese, por sua vez, vinculada (ao menos em boa parte) à problemática das omissões 
inconstitucionais. 
30 
 
O princípio da proporcionalidade costuma ser desdobrado em três elementos: 
 
(a) adequação ou conformidade, no sentido de um controle da viabilidade (isto é, da 
idoneidade técnica) de que seja em princípio possível alcançar o fim almejado por 
aquele(s) determinado(s) meio(s), muito embora, para alguns, para que seja atendido o 
critério, bastaria que o Poder Público (mediante a ação restritiva) cumprisse com o 
dever de fomentar o fim almejado; 
 
(b) necessidade ou exigibilidade, em outras palavras, a opção pelo meio restritivo menos 
gravoso para o direito objeto da restrição, exame que envolve duas etapas de 
investigação: o exame da igualdade de adequação dos meios (a fim de verificar se os 
meios alternativos promovem igualmente o fim) e, em segundo lugar, o exame do 
meio menos restritivo (com vista a verificar se os meios alternativos restringem em 
menor medida os direitos fundamentais afetados); 
 
(c) proporcionalidade em sentido estrito (que exige a manutenção de um equilíbrio 
(proporção) e, portanto, de uma análise comparativa) entre os meios utilizados e os 
fins colimados, no sentido do que por muitos tem sido também chamado de 
razoabilidade ou justa medida, já que mesmo uma medida adequada e necessária 
poderá ser desproporcional. 
 
 
A aplicação da proporcionalidade como proibição de proteção insuficiente (ou deficiente, 
como preferem outros) utiliza-se, em termos gerais, da mesma análise trifásica: 
 
(a) no que diz com o exame da adequação ou idoneidade, é necessário verificar se a(s) 
medida(s) – e a própria concepção de proteção – adotada(s) ou mesmo prevista(s) para 
a tutela do direito fundamental é(são) apta(s) a proteger de modo eficaz o bem 
protegido; 
 
31 
(b) em sendo afirmativa a primeira resposta, cuida-se de averiguar se existe uma 
concepção de segurança (proteção) mais eficaz, sem que com isso se esteja a intervir 
de modo mais rigoroso em bens fundamentais de terceiros ou interesses da 
coletividade. Em outras palavras, existem meios de proteção mais eficientes, mas pelo 
menos tão pouco interventivos em bens de terceiros? Ainda neste contexto, anota o 
autor referido que se torna possível controlar medidas isoladas no âmbito de uma 
concepção mais abrangente de proteção, por exemplo, quando esta envolve uma 
política pública ou um conjunto de políticas públicas; 
 
(c) no âmbito da terceira etapa (que corresponde ao exame da proporcionalidade em 
sentido estrito ou razoabilidade, como preferem alguns), é preciso investigar se o 
impacto das ameaças e riscos remanescentes após a efetivação das medidas de 
proteção é de ser tolerado em face de uma ponderação com a necessidade de preservar 
outros direitos e bens fundamentais pessoais ou coletivos. 
 
b) Da relação entre proporcionalidade e razoabilidade e da possível distinção entre ambas 
Retomando a controvérsia a respeito da relação entre proporcionalidade e 
razoabilidade, convém lembrar que, no campo da proporcionalidade em sentido estrito, 
exige-se a comparação entre a importância da realização do fim e a intensidade da restrição 
aos direitos fundamentais, examinando, em síntese, se as vantagens produzidas

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