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aula 03. teoria geral do direito do trabalho 2012

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AULA Nº 03 TEORIA GERAL DO DIREITO DO TRABALHO
PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO
Princípios não são normas? Para a sua aplicação no caso concreto é necessário dar-lhes força normativa, sem a qual não terão como ser aplicados. Logo, o estudo dos princípios deve ser feito em conjunto com o das normas. O artigo 8º da CLT atribuiu ao princípio a função de integrar as lacunas da lei ao dispor que as decisões das autoridades, à falta de lei, devem ser fundadas nos princípios, com o que não lhes deu a função retificadora dos efeitos indesejáveis da aplicação de algumas normas. Não há unanimidade no estudo dos princípios e as divergências de posições dos doutrinadores são conceituais porque a concepção a respeito do significado ontológico dos princípios comporta discussões. São teleológicas porque divergem sobre as funções dos princípios no ordenamento jurídico, e são causais porque existem posições diferentes quanto às fontes dos princípios, o que basta para que o estudo do tema tenha de ser desenvolvido com o maior cuidado possível.
Que são princípios? São proposições que se colocam na base das ciências, informando-as (Cretella Jr.). São o que contém, em si, a razão de alguma outra coisa (Christian Wolf). São “verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis” (Miguel Reale). Os princípios, segundo a concepção jusnaturalista, são metajurídicos, situam-se acima do direito positivo, sobre o qual exercem uma função corretiva e prioritária, de modo que prevalecem sobre as leis que os contrariam, expressando valores que não podem ser contrariados pelas leis positivas, uma vez que são regras de direito natural. Para o positivismo jurídico os princípios estão situados no ordenamento jurídico, nas leis em que são plasmados, cumprindo uma função integrativa das lacunas, e são descobertos de modo indutivo, partindo das leis para atingir as regras mais gerais que delas derivam, restrito, portanto, aos parâmetros do conjunto de normas vigentes, modificáveis na medida em que os seus fundamentos de direito positivo são alterados. Independente da posição do intérprete é possível um ponto no qual princípios e normas coincidem. São, como mostra Bobbio (Teoria generale del diritto), normas como todas as outras. Se não o fossem, completo eu, não haveria como aplicá-los, embora houvesse como declará-los. O que caracteriza a norma é a efetividade. Para adquiri-la, os princípios, necessariamente, terão um aspecto normativo. 
Qual a função dos princípios? De modo geral, a sua função é interpretativa da qual são um elemento de apoio; todavia, saber qual é sua exata função em nosso ordenamento é tema controvertido diante do disposto no artigo 8° da CLT, que os equipara a um meio de integração das lacunas da lei, o que diverge do entendimento que dá aos princípios a função retificadora da lei. Principal é a função dos princípios na aplicação do direito na medida em que servem de base para o juiz sentenciar. Não há dúvida, contudo, que são, para o operador do direito, uma técnica de integração do direito. Porém, são mais que isso. Inserem-se na dialética que dinamiza o direito na história. As alterações do sistema legal, quando assumem uma dimensão relevante, devem atuar como base fundamental que se reflita sobre o raciocínio dogmático. Devem ser pensados também em função da nova realidade legislativa que se põe diante do doutrinador, solução que nos parece, na perspectiva do direito positivo, coerente, a menos que se admita um abismo entre o sistema legal e o sistema dogmático. Sob essa perspectiva, e ao contrário da posição da nossa lei (artigo 8º da CLT) que os reduz a uma técnica para suprir lacunas, os princípios devem assumir uma função diretiva do sistema. Em conclusão, se os princípios não tem força normativa, não podem ser aplicados na solução dos casos concretos e é evidente a necessidade da sua aplicação, que não deve limitar-se aos casos de lacunas. A necessidade de atuação dos princípios é um imperativo de efetividade do ordenamento jurídico, razão pelas qual não é razoável retirar o caráter normativo da sua estrutura molecular. Assim, princípios são normas jurídicas que atuam no ordenamento como as demais normas e com hierarquia superior, salvo quando pelo teor da sua proposição for impossível a sua aplicação ou quando a sua origem for meramente doutrinária de hipótese interpretativa.
Os princípios no direito do trabalho. A primeira grande construção jurídica dos princípios do direito do trabalho é do jurista uruguaio Américo Plá Rodriguez, publicada no seu livro Los princípios del derecho del trabajo, de 1975, onde sustenta que no direito do trabalho há um princípio maior, o protetor, diante da sua finalidade de origem, que é a proteção jurídica do trabalhador, compensadora da inferioridade em que se encontra no contrato de trabalho, pela sua posição econômica de dependência ao empregador e de subordinação às suas ordens de serviço. O princípio protetor, para Plá Rodriguez, é subdividido em três outros princípios: in dúbio pro operário, a prevalência da norma favorável ao trabalhador e a preservação da condição mais benéfica. O primeiro, o in dúbio pro operário, é princípio de interpretação do direito do trabalho, significando que, diante de um texto jurídico que possa oferecer dúvidas a respeito do seu verdadeiro sentido e alcance, o intérprete deverá pender, entre as hipóteses interpretativas cabíveis, para a mais benéfica ao trabalhador. O segundo, a prevalência da norma favorável ao trabalhador, é princípio de hierarquia para dar solução ao problema da aplicação do direito do trabalho no caso concreto quando duas ou mais normas dispuserem sobre o mesmo tipo de direito, caso em que prioritária será a que favorecer o trabalhador. O terceiro, o princípio da condição mais benéfica, tem a função de solucionar o problema da aplicação da norma no tempo para resguardar as vantagens que o trabalhador tem nos casos de transformações prejudiciais que poderiam afetá-lo, sendo, portanto, a aplicação, no direito do trabalho, do princípio do direito adquirido do direito comum.
Américo Plá Rodriguez relaciona também outros subprincípios: o princípio da realidade, da razoabilidade e da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas. O princípio da realidade visa à priorização da verdade real diante da verdade formal. Entre os documentos sobre a relação de emprego e o modo efetivo como, concretamente, os fatos ocorreram, devem-se reconhecer estes em detrimento dos papéis. Mario de la Cueva, em seu Derecho mexicano del trabajo, de 1946, foi o autor da célebre frase “o contrato de trabalho é um contrato realidade”. O princípio da razoabilidade evidencia que na interpretação dos fatos e das normas deve-se agir com bom senso. O jusfilósofo mexicano Recaséns Siches, em sua obra Nueva filosofia de la interpretación del derecho, de 1950, já ensinara que a lógica do direito é a lógica do razoável. O princípio da irrenunciabilidade dos direitos pelo trabalhador tem a função de fortalecer a manutenção dos seus direitos com a substituição da vontade do trabalhador, exposta às fragilidades da sua posição perante o empregador, pela da lei, impeditiva e invalidante da sua alienação.
Hoje, na sociedade pós-industrial, como a consideram Alain Touraine em Lê société post-industrial, de 1969, Domenico de Mais em A sociedade pós-industrial, de 1999 e outros, como Krishan Kumar, ao explicar as teorias sobre o mundo contemporâneo em Sociedade Pós-moderna (Da sociedade pós-industrial à pós-moderna), uma diversidade muito grande de fatos que não existiam passou a ter influência no processo de produção que se deslocou da indústria para outros setores produtivos. O capital não se identificou com uma mesma pessoa – ex. fundos de investimentos -, os detentores do conhecimento e da informação multiplicados pela internet ganharam novasposições no mercado de trabalho, transformaram-se os conceitos de classe e de luta de classes, a globalização da economia e a insuficiência do Estado para fazer frente aos gastos com a proteção social e o controle do mercado financeiro influíram na questão do trabalho. Os modelos trabalhistas tradicionais vão sofrendo modificações impostas pela realidade dos tipos de profissões e de atividades produtivas. Não podem ser configurados com base nos critérios clássicos com os quais o direito os classifica. Seria inadequado para o direito do trabalho falar em modelo romano-germânico, em modelo anglo-saxônico dos países do common law casuístico, não codificado como direito, como a decisão do juiz, com influência na Inglaterra, Irlanda e Estados Unidos, ou em direito-religião como o muçulmano, para o qual uma ordem social para ser justa deve ser fundada na religião. Os modelos foram outros: o corporativista, o socialista e o liberalista ou fordismo, taylorismo e toyotismo na medida em que a produção em massa robotiza-se, com o que no presente toda classificação que tenha a pretensão de se aproximar da realidade deve abandonar esses conceitos e tomar como ponto de partida uma noção essencialmente jurídica que se presta a todo e qualquer sistema de produção ou espécie de trabalho, a noção do tipo de norma preponderante: a) o modelo legislado que é o latino-americano; b) o modelo negociado que é o norte-americano; c) e o modelo comunitário que é o europeu, este estudo, com amplitude, por Luisa Galantino, em Lineamenti di diritto comunitário del lavaro, de 1997. Esses, como se vê, não são direitos fundamentais do trabalhador. São características sobre modelos de relações de trabalho.
A compreensão dos princípios do direito do trabalho na época contemporânea: no período contemporâneo o princípio protetor, antes absoluto, passa a ser relativo na medida em que cede em algumas situações nas quais a razoabilidade o excepciona. Para o jurista português Bernardo da Gama Lobo Xavier, em sua obra Curso de direito do trabalho, “O Direito do Trabalho de hoje não tem apenas em atenção a justiça e equilíbrio do relacionamento entre os sujeitos do contrato individual do trabalho – patrões e trabalhadores – ou as suas organizações de classe. O Direito do Trabalho atual está profundamente inspirado pelos interesses gerais, pois define afinal a expressão do fator trabalho no mundo sociopolítico, na economia e na organização da empresa. Pois não é verdade que as normas laborais influenciam determinadamente as condições de vida da política ativa, a funcionalidade da gestão e a solidez das empresas, a produção, a distribuição de rendimentos e a paz social? Ora, estes valores são dificilmente ponderáveis por um critérios interpretativo desintegrador e acanhado como o do favor laboratoris. Daí que se tenda cada vez mais para uma visão do Direito do Trabalho como estatuto comum da população ativa, determinado pelo interesse público (marcadamente o da política de emprego) e não como uma mera fórmula de composição de interesse individuais das partes (dos patrões e trabalhadores enquanto contraentes). Não ficará assim muito lugar para um favor laboratoris como critério interpretativo. Parece-nos, pois, que se aplicam às normas de trabalho as regras gerais relativas à interpretação das normas jurídicas”.
Outra versão dos princípios do direito do trabalho é a de Maria do Rosário Palma Ramalho exposta na sua dissertação de doutorado defendida perante a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e publicada com o título Da autonomia dogmática do direito do trabalho, de 2000. Para Maria do rosário, princípios são “as valorizações culturais ou éticas mais importantes reveladas pelas normas por elas validadas como seu fundamento justificativo”, e que, no caso português, são três, com desdobramentos ou subprincípios: o princípio da compensação da posição debitória complexa das partes no vínculo laboral, o princípio do coletivo e o princípio da autotulela laboral. A singularidade dessas proposições passa a ser mostrada. O princípio da compensação é decorrência “da complexidade estrutural da relação e da posição que o trabalhador e o empregador nela ocupam, concretizando-se em dois princípios menores, que se referem, respectivamente, a cada uma das partes: o princípio da proteção ao trabalhador, que acode uma das partes: o princípio da proteção do trabalhador, que acode às necessidades de tutela da sua pessoa e do seu patrimônio perante o vínculo laboral; e o princípio da salvaguarda dos interesses de gestão do empregador, que lhe assegura as condições necessárias ao cumprimento das suas obrigações contratuais e, indiretamente, viabiliza o contrato de trabalho”. O princípio do coletivo “evidencia a orientação geral do direito do trabalho a valorizar uma componente coletiva ou de grupo nos fenômenos laborais coletivos e no vínculo de trabalho, justificando que o trabalhador e o empregador sejam considerados não tanto como indivíduos, mas, sobretudo, enquanto membros dos grupos com os quais se relacionam, por efeito do contrato de trabalho ou da qualidade de trabalhador subordinado e da qualidade de empregador”. O princípio da autotutela laboral assegura a proteção dos interesses do empregador e do trabalhador, bem como dos seus institutos fundamentais, o contrato de trabalho e a greve, mediante o poder disciplinar e o direito de greve. 
Comparadas as duas construções teóricas, a de Plá Rodriguez, fundamental para os estudos do tema, e a dos críticos comtemporâneos, verifica-se que naquela construção há uma concepção universalista e unilateralista nem sempre coincidente com a realidade do direito positivo de um país em determinado momento, enquanto as proposições dos autores portugueses mostram uma concepção dialética e multilateral, vendo no sistema legal a base do suporte dogmático dos princípios.O estudo dos princípios atinge, na época contemporânea, um prestígio que supera o de outras épocas. Tratar do tema no período contemporâneo é um desafio dos mais instigantes para quem deseja compreender em toda a sua complexidade o mundo das idéias fundantes do direito do trabalho. Uma nova visão do tema está surgindo, adequada aos imperativos da época que atravessamos e às crises econômicas que caminham na história com o direito do trabalho.
O princípio protetor não cedeu nem deve ceder lugar, mas é visível o contraste entre sua força inicial e o desamparo de grande parte da população. Com maior amplitude, vê-se na atualidade a aplicação do princípio da valorização da dignidade da pessoa humana. No Brasil tem a vantagem, o que não acontece com o princípio protetor, de ter nível legal constitucional (artigo 1º, III, da CF). O quadro atual provoca a procura de soluções. O problema maior está no modelo de relações de trabalho e na abertura tipológica dos contratos individuais de trabalho em dimensões que a aproximem das multivariadas situações que o mundo real apresenta.
O princípio da valorização da dignidade do trabalho: o princípio dos princípios do ordenamento jurídico brasileiro é a proteção da dignidade do ser humano (artigo 1º, III, da CF). Reordena e amplia a tutela econômica para transformá-la em tutela também moral do trabalhador. O artigo 1º, III, da CF declara que nosso Estado Democrático de Direito tem como fundamento, entre outros valores, a dignidade da pessoa humana. A dignidade é um valor subjacente a numerosas regras de direito. A proibição de toda à dignidade da pessoa é questão de respeito ao ser humano, o que leva o direito positivo a protegê-la, a garanti-la e a vedar atos que podem de algum modo levar à sua violação, inclusive na esfera dos direitos sociais. Antes mesmo da CF do Brasil, da dignidade da pessoa humana já se ocupava a Carta das Nações Unidas , de 1945, que proclamava a sua “fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana”, bem como A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, a qual proclama que “o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da famíliahumana e dos seus direitos iguais e inalináveis constituem o fundamento da liberdade, da justiça e da paz mundial” e que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”. Além da CF do Brasil, outras Constituições também acolhem o mesmo princípio: a Constituição da Alemanha de 1949, a qual menciona que “a dignidade do homem é intangível”, a Constituição da Espanha de 1978, que assegura que “a dignidade da pessoa, os direitos invioláveis que lhe são inerentes, o livre desenvolvimento da personalidade (...) são o fundamento da ordem política e da paz social”; a Constituição da Itália, de 1947, que declara que “todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”, a Constituição de Portugal, que dispõe que “a República é fundada sobre a dignidade da pessoa humana e a vontade popular”, e a Constituição da Bélgica, a qual menciona que “cada um tem o direito de ter uma vida conforme a dignidade humana”.
Em que consiste a valorização da dignidade? Não há, em nosso ordenamento jurídico, a indicação dos meios que levem à sua efetivação. Essa lacuna dá margem a insegurança jurídica. Nem sempre o princípio é aplicável adequadamente. Tudo depende dos fatos e das configurações jurídicas que se apresentem no caso concreto. As normas infraconstitucionais deveriam explicitar o seu campo de atuação. Esse campo deve ser o dos direitos de personalidade e da tutela contra danos morais, da proibição do trabalho da criança e da proteção do trabalho precário do adolescente e do trabalhador rural, e da proibição da discriminação. A idéia da proteção dos direitos da personalidade surgiu na França no âmbito do direito civil para a defesa de todo cidadão. A legislação trabalhista de Portugal ganha destaque neste aspecto por meio de diversos dispositivos que asseguram normas de proteção aos direitos de personalidade, de não discriminação, segurança, saúde, trabalho da mulher, da criança e do adolescente; o trabalhador e o empregador devem respeitar os direitos de personalidade da contraparte, cabendo-lhes guardar sigilo quanto à intimidade da vida privada; o direito à reserva da intimidade da vida privada abrange quer o acesso quer a divulgação de aspectos atinentes à esfera íntima e pessoal das partes, principalmente os relacionamentos com a vida familiar, afetiva e sexual, ao estado de saúde e às convicções políticas e religiosas, salvo se necessárias ao exercício da atividade. A lei de Portugal é um bom exemplo de como podemos aperfeiçoar a nossa legislação num sentido de modernidade, o que nos parece absolutamente necessário em nosso país e suficiente para mostrar que a CLT deve ser aperfeiçoada e que modificações como essas não têm sentido precarizante do trabalho.
Os princípios do direito do trabalho brasileiro: o artigo 8° da CLT, ao dispor que “as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente de direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”, enuncia um único princípio, o princípio da prevalência do bem comum, e embora faça uma referência aos princípios o faz para dizer que devem ter função.
Qual é a função dos princípios pela nossa lei trabalhista? É a integração das lacunas. Nos casos de ausência de leis, de jurisprudência, de regras contratuais os princípios devem servir de critério de solução das controvérsias. É um papel muito acanhado dado aos princípios pela CLT. Jurisprudência não é princípio, mas conjunto de decisões do Pode judiciário em determinado sentido de modo a fixar uma diretriz. Analogia e equidade também não são princípios. São técnicas de integração do sistema de normas diante de lacunas. Logo, não podem ser equiparados, como fez a CLT, a outros princípios e normas gerais do direito, principalmente do direito do trabalho. Por outro lado, ao nivelar os princípios do direito do trabalho com as técnicas de integração do direito na falta de disposições legais ou contratuais, deu aos princípios uma finalidade que é importante, mas não é a única, ao lado da analogia e da equidade, cobrir os vazios do espaço normativo, mas não lhes atribuiu função retificadora das injustiças da lei. Diante desse quadro não é possível ficar no âmbito restrito do direito do trabalho, impondo-se ir além para melhor equacionamento do tema com uma construção dogmática dos princípios o quanto possível mais próxima do nosso sistema normativo e constitucional. A ordem jurídica deve preservar os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (artigo 1º, IV, da CF), a dignidade da pessoa (artigo 1º, III, da CF), a igualdade de todos perante a lei (artigo 5º da CF), a inviolabilidade da honra, da intimidade e da vida privada da pessoa (artigo 5º, X, da CF), o direito a indenização nos casos de dano material ou moral (artigo 1º, V, da CF), a liberdade de trabalho (artigo 5º, VIII, da CF), o direito ao acesso à informação (artigo 1º, XIV, da CF), a proibição de interferência e intervenção do Poder Público na organização sindical, com exceções (artigo 8º da CF), o reconhecimento das convenções e acordos coletivos (artigo 7º, XXVI, da CF), a boa-fé objetiva (artigos 187 e 422 do CC) e a função social do contrato (artigo 421 do CC). Nas relações coletivas de trabalho, o princípio da autonomia coletiva dos particulares é o fundamento do poder negocial do qual resultam os contratos coletivos de trabalho fruto da negociação coletiva.�
Princípios mencionados por outros doutrinadores: Sergio Pinto Martins menciona o princípio da continuidade da relação de emprego, onde presume-se que o contrato de trabalho terá validade por tempo indeterminado, ou seja, haverá a continuidade da relação de emprego. A exceção à regra são os contratos por prazo determinado, inclusive o contrato de trabalho temporário. A idéia geral é a de que se deve preservar o contrato de trabalho do trabalhador com a empresa, proibindo-se, por exemplo, uma sucessão de contratos de trabalho por prazo determinado. A súmula 212 do TST adota essa idéia ao dizer que “o ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviços e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado”.� O princípio da continuidade da relação de emprego também é defendida por Rodrigo Garcia Schwarz, onde menciona ser da natureza da atividade pactuada a sua continuidade no tempo, pois não envolve prestações instantâneas, mas sucessivas e recíprocas, contínuas no tempo, até a sua extinção, mencionando inclusive que a questão da continuidade da relação de emprego foi seriamente comprometida, no Brasil, pelo sistema do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, introduzido em 1967 e universalizado pela Constituição Federal de 1988. Referido doutrinador cita ainda o princípio da imperatividade das normas trabalhistas, pois o direito do trabalho tem por objeto a regulação do trabalho humano, intelectual ou manual, produtivo e livre, prestado de forma subordinada e por conta alheia, sendo de direito privado, já que consagra no ato e no pacto de alienação do resultado da atividade a expressão do consentimento do trabalhador livre que se sujeita contratualmente às ordens e à direção da pessoa que se aproveita dos frutos dessa atividade. O direito do trabalho não se limita à regulação supletiva das relações trabalhistas privadas, interindividuais, antes, trata-se de um direito manifestamente tutelar e intervencionista, que decorre da necessidade de intervenção estatal na ordem econômica e no mercado de trabalho, tendo a função histórica de limitar a exploração exercida sobre os trabalhadores, satisfazendo determinadas carências e interesses desses, mas também de limitar o horizonte das lutas operárias e a extensão do conflitosocial subjecente ao sistema capitalista.�
INTERPRETAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO
As idéias do direito do trabalho são fruto de tensões entre fatos, valores e normas que numa dinâmica dialética vai-se alterando. As ideais não nascem num vazio. São fortemente marcadas pelos fatos. Levam-se em conta os fatos que se desenvolvem no plano sociológico e as transformações tanto dos modos de produção como das estruturas de trabalho. Somando-se esse plano de avaliação ao das normas contemporâneas do direito do trabalho evidencia-se um aparente conflito dogmático.�
Complexidade do ordenamento: a complexidade do ordenamento jurídico trabalhista resulta da coexistência, nele, de diferentes tipos de normas produzidas por meio de fontes estatais e não estatais e da dinâmica que apresenta essa plurinormatividade, na medida da sua constante renovação e das naturais dúvidas que, em cada caso concreto, surgem na tarefa de escolher qual é a norma que deve ser aplicada. 
Unidade ou dualidade de ordenamentos: pelo fato de coexistirem leis que o Estado elabora e as normas jurídicas que são produzidas pela vontade dos grupos por meio das suas representações sindicais, há duas concepções opostas, a dualista e a integrativa, a primeira sustentando que são separados os dois sistemas, o estatal e o não estatal, e a segunda compreendendo-os como uma unidade constituída de ambos os tipos de normas, como efetivamente ocorre. Não há dois ordenamentos, mas um só, o que o Estado faz e o que o Estado reconhece; portanto, reconhecendo, integra num só ordenamento todos os existentes. O número de normas é expressivo, sendo difícil saber quantas leis, convenções e acordos coletivos, regulamentos de empresas, usos e costumes, jurisprudência estão vigentes. A tarefa do profissional do direito não é contar o número dessas normas, mas conhecer as regras que deve seguir para escolher a norma que deverá aplicar na solução de cada caso concreto.
Coerência do ordenamento: ante a multiplicidade de fontes e de normas existentes e dos problemas decorrentes é necessário manter uma coerência do sistema. A aplicação do direito segue uma hierarquia. O ordenamento jurídico, como todo sistema normativo, é um conjunto de normas de conduta, de organização, de competência, de direitos subjetivos e deveres, aspecto do qual resulta a necessidade ser estabelecida uma correlação entre as normas visando a coerência do sistema. A mais vigorosa construção jurídica destinada a encontrar uma solução para esse problema é a teoria de Kelsen, para quem as normas jurídicas são dispostas segundo uma pirâmide que tem como vértice uma norma fundamental da qual resulta o fundamento e a validade das normas inferiores de modo sucessivo e escalonado entre as mesmas, questões que são estudadas pela Teoria Geral do Direito.
Princípio da norma favorável ao trabalhador: a Constituição Federal é a norma jurídica maior que exerce essa função de pirâmide normativa do direito do trabalho, inclusive do direito comum. Há, contudo, um aspecto peculiar do direito do trabalho. A sua finalidade não é igual à do direito comum. Neste a hierarquia das normas cumpre a função política de distribuição de poderes entre a União, os Estados Federados e os Municípios. A União reserva, para si, as atribuições que considera necessárias para a manutenção da unidade político-jurídica. No direito do trabalho, o objetivo maior é social, a promoção da melhoria das condições sociais do trabalhador, daí a própria União, que tem competência para legislar sobre a matéria, permitir, salvo exceções que ressalva, que normas e condições de trabalho mais vantajosas para os assalariados, conferindo direitos acima dos que previu na Constituição. Esse aspecto influiu na formação de um princípio próprio do direito do trabalho sobre a hierarquia das suas normas. É o princípio da norma favorável ao trabalhador, segundo o qual, havendo duas ou mais normas sobre a mesma matéria, será aplicada, no caso concreto, a mais benéfica para o trabalhador. Exemplo: se a lei ordinária confere 30 dias de férias e convenção coletiva assegura férias de 60 dias, segue que as condições mais benéficas ao trabalhador são sempre prioritárias. Se a Constituição dispõe que o repouso semanal remunerado será preferencialmente aos domingos e o regulamento da empresa dispuser que o repouso remunerado será aos sábados e domingos, esta última norma será a fundamental. Se o contrato individual garantir duas indenizações e a lei ordinária uma, o contrato individual terá plena aplicação.
Derrogações ao princípio: o princípio da norma favorável ao trabalhador, como todo princípio, não é absoluto. Tem exceções ou derrogações resultantes de imperativos diferentes. Primeira, diante das leis proibitivas, uma vez que, se o Estado, por lei, vedar que por meio de outras normas jurídicas seja dispensado um tratamento mais benéfico para o trabalhador, será inaplicável, por contrariar a lei, uma convenção coletiva que infringir a proibição. É o que pode ocorrer quando o Estado fixa normas sobre política salarial e indexação da economia, impedindo estipulações contrárias por negociação coletiva. Segunda, diante de leis de ordem pública, ainda que não expressamente proibitivas, pela sua função de garantia maior da sociedade. A negociação coletiva pode e quase sempre atua no sentido de criar normas e condições de trabalho mais benéficas para os assalariados, acima das previstas nas leis, segundo uma sucessividade de direito que é válida, a menos que vedada pelo Estado ou contrária à ordem pública. Nada impede que a negociação venha a cumprir, excepcionalmente, o papel flexibilizador, redutor de vantagem, o que pressupõe acordo com o sindicato. A constituição Federal, em seu artigo 7°, VI, autoriza a redução de salário por acordo ou convenção coletiva.
O ato interpretativo: a interpretação das normas jurídicas precede a aplicação, uma vez que sem interpretar não é possível conhecer as intencionalidades objetiva na norma jurídica que é aplicada. O ato interpretativo opera-se em todo o direito, assim também no direito do trabalho, no qual da mesma forma é necessário escolher, entre os diversos significados possíveis da regra contida na norma jurídica, aqueles que se mostra mais consistente de acordo com a sua finalidade, a sua razão de ser e os limites impostos pelo sistema normativo. A interpretação não é um ato isolado, mas correlacionado, sem o que não haveria segurança na ordem jurídica, na medida em que cada intérprete pudesse, sem fronteiras, impor a sua opção motivada por fatores subjetivos condicionados a fatores os mais diversos, até mesmo psicológicos. A correlação se dá em função do sistema jurídico operante, limite da liberdade interpretativa. O ato interpretativo não deve ser puramente formal, sob pena de se distanciar da realidade da vida, mas não pode ser, também, exclusivamente subjetivista, sob os mesmos riscos. Há um conjunto de valores presentes nos ordenamentos jurídicos e que servem de faróis a guiar a trajetória do intérprete.
Teorias e técnicas do direito comum: as escolas tradicionais de interpretação do direito comum não atendem totalmente às necessidades do direito do trabalho, porque são destinadas a uma ordem jurídica diferente daquela que se constituiu em decorrência da Revolução Industrial do século XVIII e do liberalismo. Assim, tanto a Escola Exegética como a Escola Histórica, e, ainda, a Escola do Direito Livre, são insuficientes e inadequadas para o novo Direito. Ao intérprete direito do trabalho, o intérprete deverá, embora partindo do método gramatical e do sentido e alcance das palavras, alcançar o sentido social das leis trabalhistas e a função que exercem na sociedade empresarial. A função interpretativa encontra o seu principal agente no juiz do trabalho, porque, como ressalta Recasséns Siches, a interpretação dos advogados ou dos particulares que se dispõem a cumprir espontaneamente a norma jurídica tem natureza provisória e vale, enquanto não surgir o processo judicial, após o que, então, o órgão jurisdicionaldeterminará se a interpretação provisória é correta ou lhe dará os contornos e as direções necessárias e definitivas. Para atuar o direito, o intérprete vale-se de diferentes técnicas que de certo modo correspondem e encontram fundamentação nos princípios sustentados pelas escolas jusfilosóficas de interpretação do direito. Essas técnicas podem ser resumidas nas seguintes: A) Interpretação gramatical: consiste na verificação do sentido exato do texto gramatical das normas jurídicas, do alcance das palavras empregadas pelo legislador. Desse limite o intérprete não pode se afastar, sob pena de nulidade. B) Interpretação lógica: estabelece uma conexão entre os diferentes textos legais, supondo os meios fornecidos pela interpretação gramatical. C) Interpretação teleológica: volta-se para a procura do fim objetivado pelo legislador, elegendo-o como fonte do processo interpretativo do texto legal. D) Interpretação extensiva: também denominada ampliativa, verifica-se quando a fórmula legal é menos ampla do que a mens legislatoris deduzida. E) Interpretação restritiva: supõe que o legislador, ao elaborar a norma, usou de expressões mais amplas do que o seu pensamento. F) Interpretação autêntica: também denominada legal ou legislativa, é aquela que emana do próprio órgão que estabeleceu a norma interpretada, declarando o seu sentido e conteúdo por meio de outra norma jurídica. 
Interpretação do direito do trabalho: o direito do trabalho tem marcada função social, o que influi na sua interpretação, de modo que ao operar a norma o intérprete deve considerar os fins sociais a que aquela se destina, traço presente em todo o direito, mas que se acentua no direito do trabalho. Não foi possível ao direito do trabalho ainda elaborar uma teoria própria de interpretação, de modo que a contribuição doutrinária é restrita. Uma tentativa de teorização resulta do movimento de juizes denominado direito alternativo, propondo a interpretação livre, contra legem, de um direito insurgente que deve promover a melhor distribuição de riquezas e diminuir as desigualdades sociais. Padece, no entanto, de melhor embasamento teórico diante do problema da segurança do direito que, se promovida com a realização da justiça do caso concreto sem limites legais, fica comprometida, transferindo do legislador para a jurisdição a competência para reforma da legislação. Saber se as leis injustas devem ser cumpridas é questão não resolvida desde o tomismo. Há, no direito do trabalho, a indispensabilidade da interpretação, quando a norma não é suficientemente clara. Inicia-se pelos aspectos gramáticas, mas não fica por aí, porque a exegética não se compatibiliza com a melhor teoria interpretativa. Passa pela identificação das hipóteses interpretativas permitidas pela norma e a escolha da que se mostrar mais coerente com o sistema jurídico considerado como um todo; a interpretação sistemática, portanto.
Interpretação casuística: a interpretação do direito do trabalho, tendo em vista o seu caráter social, é, para alguns juízes, dedutiva, a partir do significado da norma para daí descer ao caso concreto, porém, para outros juízes, indutiva, a partir do caso concreto e suas características para, avaliado o seu sentido indutivamente, recorrer ao ordenamento normativo na tentativa de enquadrar, em uma de suas normas, a situação real com que o juiz se defrontou, para fundamentá-la no sistema vigente. Como se vê, diferem as duas posturas, porque uma parte do geral e abstrato para o concreto, e outra do empírico e casuístico para o normativo o que pode influir no tipo de conclusão a que cada juiz vai chegar.
Integração das lacunas: integrar significa completar, inteirar, modo que integração é o fenômeno pelo qual a plenitude da ordem jurídica é mantida sempre que inexistente uma norma jurídica prevendo o fato a ser decidido. Consiste na utilização de certas técnicas jurídicas, no caso, a analogia e a equidade. No processo de integração, o intérprete poderá aplicar, como norma jurídica, os princípios gerais e a doutrina. A analogia consiste na utilização, para solucionar determinado caso concreto, de norma jurídica destinada a caso semelhante. Trata-se, portanto, de um processo de migração de normas jurídicas. Equidade: é um processo de retificação das distorções da injustiça da lei, sob a perspectiva da igualdade segundo a idéia de que ser justo é julgar as coisas visando a um princípio de igualdade. Há vários tipos de igualdade: justiça comutativa, que pressupõe troca entre duas partes que entre si permutam coisas de igual valor; justiça distributiva que tem idéia fundamental dar a cada um segundo o seu mérito; e justiça social que é também distributiva, porém, consiste em dar a cada um não de acordo com o seu mérito, mas de acordo com a sua necessidade, quando se situar em posição inferior de exclusão no grupo social.
Eficácia da lei trabalhista: a eficácia deve ser compreendida em função de dois aspectos: a eficácia no tempo e a eficácia no espaço. A eficácia no tempo baseia-se em duas regras básicas: 1) O princípio da irretroatividade, o qual determina que a lei nova não se aplica aos contratos de trabalho já terminado, acrescentando-se que nem mesmo aos atos jurídicos já praticados nos contratos de trabalho em curso no dia do início de sua vigência. 2) O princípio do efeito imediato, quando um ato jurídico, num contrato em curso, não tiver sido ainda praticado, o será segundo as regras da lei nova, isto é, entrando em vigor, a lei se aplica, imediatamente, desde logo, às relações de emprego que se acham em desenvolvimento. A eficácia no espaço leva em conta a vigência da lei trabalhista em determinado território ou espaço geográfico, nele se aplicando tanto aos nacionais como aos estrangeiros. O princípio da territorialidade implica no reconhecimento de uma questão de soberania nacional. Aos estrangeiros que prestam serviços no Brasil, a empresas nacionais ou multinacionais, é, portanto, aplicável a legislação trabalhista.� 
� NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho, 26ª ed., Saraiva, 2011, p. 450-467.
� MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 17ª ed., Atlas, 2003, p. 79.
� SCHWARZ, Rodrigo Garcia. Direito do Trabalho. Ed. Elsevier, 2007, p. 22-23.
� NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho, 26ª ed., Saraiva, 2011, p. 473.
� NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho, 36ª ed., Ltr, 2011, p. 104-110.
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