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metade da década de 1960, o primeiro deles nos quadros da Commonwealth. 68 agressão em relação à Coréia do Norte, no que foi apoiada pelos países europeus ocidentais. Com isso não evitou, entretanto, o agra- vamento do descontentamento das delegações da Hungria, da Polô- nia e da Tchecoslováquia, seguido do anúncio, em 1952, da retirada desses países da organização. Nesse contexto, e enquanto prossegue a discussão sobre a estatização do Conselho Executivo, a UNESCO vai construindo as bases mundiais de sua atuação. Ao fazer isso, ela, longe de empre- ender a síntese dos contrários (Pompei, 1972), certamente busca conciliar seus objetivos práticos com seu ideal ético-moral. E, ao mesmo tempo, a UNESCO cuida de articular o consenso possível, em meio às posições divergentes relativas às condições de expansão ocidental e do desenvolvimento capitalista, desigual e combinado em sua essência e, portanto, visceralmente beligerante. Essa interpretação permite compreender a afirmação de René Maheu (1972, p. 325) de que a UNESCO é essencialmente um sistema de comunicação intelectual e uma empresa de diálogo e de compreensão entre os povos, não como um dado, mas como um ideal buscado desde seus primeiros anos de existência, visto ser este um meio necessário à realização dos interesses contraditórios do capital em planetarização, num mundo que aprendera como impera- tivo o propósito de evitar para si um novo conflito bélico. Facilitar a comunicação entre as nações, nos diferentes con- tinentes geográficos, mediante suas áreas de atuação e os ele- mentos de sustentação da ocidentalização do mundo filosofia, ciência e arte , constitui-se, de fato, numa meta da UNESCO e num recurso fundamental à abertura de fronteiras ao progresso. O alvo postulado é a humanidade, cuja universalidade já habita e alimenta o pensamento dos clássicos da ilustração e do liberalis- mo desde o século XVIII. Construindo uma rede mundial de comunicação e entendimento dos povos Na construção das condições para sua atuação, a UNESCO vale-se da experiência do extinto Instituto Internacional de 69 Cooperação Intelectual (IICI),6 associando-se, em 1947, ao Conselho Internacional das Uniões Científicas (Icius), criado em 1919. Do acordo então firmado, resultam a abertura de um escritório na sede da organização e a criação da União Internacional para a História da Ciência e de uniões internacionais em outras áreas como cristalografia, mecânica teórica e aplicada, assim como a realização de estudos para a criação de uniões científicas em campos como geologia, matemática, fisiologia e ciências da nutrição. Ainda nesse domínio de atuação a UNESCO cria, até 1948, quatro postos de cooperação: um no Cairo, outro em Nova Delhi,7 o terceiro em Nanquim e o quarto no Rio de Janeiro, onde se instala, 6 Organismo de cooperação intelectual criado em 1924 pela Liga das Nações, graças à iniciativa francesa e a contragosto dos governos anglo-saxônicos que o percebiam como um serviço aos objetivos de expansão cultural da França. Constituindo-se como foro de intelectuais ligados às diversas áreas do conhecimento, da literatura e das artes, o IICI, que exerce suas atividades até 1940, tinha como característica fundamental a independência em relação ao poder do Estado. A respeito da cooperação intelectual em períodos anteriores ao pós- 45, ver La pre-histoire de la cooperation intellectuelle 1789-1919 e Lorganisation de cooperation intellectuelle (OCI) 1920-1940. In: BEKRI, Chikh. LUNESCO: Une entreprise erronée? Paris: Éditions Publisud, 1991. 7 Desde 1947, o governo indiano solicita à UNESCO a criação de uma rede de institutos tecnológicos nos moldes dos institutos da Europa e dos EUA. Além do Instituto deNovaDelhi, outros foram instalados emKharagpur, Kampur eMadras inseridos num programa de cooperação internacional que prosseguirá nas décadas seguintes e se estenderá a outros países asiáticos e africanos. Os institutos ou centros objetivam a formação de bacharéis nas áreas de química, engenharia civil, eletricidade, mecânica e metalurgia e a realização de pesquisas relativas ao aproveitamento de água salobra, às terras áridas, entre outras. Os recursos utilizados nesses programas são, desde 1949, do ProgramaAmpliado deAssistência Técnica (Peat), proposto por Truman à ONU, além dos recursos locais. Para a Índia, a UNESCOconcluiu acordo, em1955, permitindo alocar para o Instituto deBombaim uma contribuição em rublos repassados pela URSS ao Peat. Ver a respeito: BEHRMAN, Daniel. Réseaux du progrés: quelques aspects de laction scientifique de lUNESCO. Paris: UNESCO, 1964; BATISSE, Michel. No começo, o deserto. In:OCorreio da UNESCO. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, mar. 1994, p. 29-33. Os dois autores identificam nesses centros a origem dos projetos da UNESCO, da década de 1960, sobre o meio ambiente, o que evidencia, segundoBatisse, uma tendência de antecipação daUNESCOem relação aos problemas mundiais, constantes da pauta das Nações Unidas na 70 em 1947, o Instituto Internacional da Hiléia Amazônica.8 Entre os objetivos dos postos de cooperação científica consta o de facilitar a comunicação internacional de cientistas e estudiosos, cujas desco- bertas devem ser postas a serviço da comunidade mundial e, cer- tamente, articulá-los, assim como as diferentes regiões e seus recur- sos, às necessidades internacionais de desenvolvimento do capital. No domínio da educação de base, a UNESCO reúne, sistemati- za, completa e difunde, por intermédio do Centro de Informação, liga- do ao seu Departamento de Educação, informações sobre as experi- ências em curso, tanto as referentes aos aspectos metodológicos como as relativas ao uso dos recursos tecnológicos existentes, estabelecen- do, assim, a comunicação entre especialistas da área de várias regi- ões do mundo. Cria, ainda, em acordo com os governos, Centros Regionais de Educação de Base para a América Latina, Ásia, África e Estados Árabes. Promove também reuniões, em 1947, com as em- presas internacionais privadas e cria o Conselho Temporário para a década de 1990. Não é demais lembrar que esses problemas resultam da força incontrolável do capital, para cuja expansão aUNESCO concorre, desde a segunda metade da década de 1940. Sobre a criação de institutos internacionais e regionais de pesquisa entre 1948 e 1952, ver UNESCO. Rapport aux Nations Unis: 1949- 1950, Paris, 1950 b, p. 36-37. 8 Esse instituto, devido às resistências de parlamentares brasileiros, é transferido no ano seguinte para Montevidéu (zona neutra?!). A respeito do projeto de pesquisa ligado a esse instituto, a UNESCO realizou, em 1947, uma reunião em Iquitos, no Peru, e outra, em colaboração com o governo francês, na qual se discutiu a criação daUnião Internacional para a Proteção daNatureza. Cf. BEKRI, 1991, p. 168. Os interesses do capital internacional bem como a inter-relação dos campos de atuação da UNESCO, na realização desses interesses, podem ser percebidos nos objetivos do instituto, entre os quais constam: organizar explorações botânicas que cubram de maneira progressiva e sistemática a totalidade da Hiléia Amazônica, com o fim de coligir plantas de interesse econômico (...); estudar a possibilidade de utilizar, para a educação das populações amazônicas, caravanas compostas de sanitaristas, etnólogos, agrônomos e professores, aparelhados com recursos modernos de projeções fixas e móveis, de discos, rádios etc; (...) estudar os elementos folclóricos e lingüísticos dos diversos grupos indígenas (...). Cf. CARNEIRO, Paulo E. Berredo. O Instituto Internacional da Hiléia Amazônica. Razões e objetivos de sua Criação, 1951, p.27. 71 Reconstrução da Educação (Ticer),9 visando à coordenação e à arti- culação, nos âmbitos nacionais e internacional, do programa de re- construção educacional nos países devastados pela guerra. No curto período de seus três primeiros