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31 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 CROMOSSOMOS, GENES E DNA As atividades vitais da cØlula viva sªo coor- denadas por entidades denominadas genes, que codificam os caracteres hereditÆrios ou genØti- cos do indivíduo, como, por exemplo, tipo de sangue, altura, peso, cor de olho e cabelo, sensi- bilidade a certas drogas, etc. O meio ambiente pode ter influŒncia decisiva na expressªo dos genes, de maneira que dizemos que a interaçªo dos genes (genótipo) com o meio ambiente re- sulta no fenótipo do indivíduo. Um fenótipo pode ser resultante da expressªo de um par de genes (por exemplo, grupo sangüíneo ABO) ou de vÆ- rios genes (por exemplo, altura). Os genes estªo presentes em todas as cØlulas do organismo, com exceçªo daquelas que perde- ram o nœcleo durante a diferenciaçªo celular, como Ø o caso das hemÆcias. PorØm, nem todos os genes sªo expressos igualmente em todas as cØlulas. Na verdade, cada tipo celular caracteriza-se pela ex- pressªo de determinados tipos de genes. Altera- çıes nos genes podem levar a mudanças dramÆticas na fisiologia celular, como, por exemplo, a trans- formaçªo de uma cØlula normal em maligna. Os genes estªo localizados em estruturas filamentosas, longas, localizadas no interior Princípios da Biologia Molecular do Gene do nœcleo celular denominadas cromossomos (Fig. 2.1). No cromossomo, os genes estªo dispostos linearmente, isto Ø, um ao lado do outro, enfileirados tal como as contas de um colar. Os dados disponíveis indicam que o cromossomo corresponde a uma enorme molØcula de DNA. As bactØrias e os vírus pos- suem apenas um cromossomo que geralmente Ø circular, isto Ø, as extremidades da molØcula de DNA estªo ligadas entre si. Nos demais organismos (protozoÆrios, fungos, metazoÆ- rios), normalmente existem mais de um cro- mossomo por nœcleo. As cØlulas humanas possuem 23 cromossomos, os quais estªo dis- tribuídos aos pares nas cØlulas germinativas e somÆticas. Por este motivo, estas cØlulas sªo conhecidas como cØlulas diplóides e designa- das por 2n = 46. Por outro lado, os gametas sªo haplóides (n = 23), isto Ø, o gameta possui uma cópia de cada cromossomo. Com a fusªo do óvulo (n = 23) e espermatozóide (n = 23) res- taura-se o estado diplóide no zigoto (2n = 46). Na divisªo celular, os cromossomos sªo du- plicados e distribuídos às cØlulas-filhas. Na mi- tose, as cØlulas parentais (cØlulas-mªes) e as filhas apresentam o mesmo nœmero de cro- JosØ Franco da Silveira MÆrcia R. Machado dos Santos 32 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 Fig. 2.1 A relaçªo entre o cromossomo e a molØcula de DNA. Cromossomo metafÆsico mostrando a participaçªo da molØcula de DNA na sua constituiçªo. Na figura estÆ representada apenas a molØcula de DNA constituinte de uma das cromÆtides homólogas. 30nm DNA Proteínas Histonas 200nm 30nm mossomos, logo, a mitose Ø uma divisªo eqüita- tiva. Na meiose, as cØlulas-filhas recebem ape- nas uma cópia de cada cromossomo, logo, a meiose Ø uma divisªo reducional. Ela ocorre nas cØlulas germinativas gerando os gametas (óvulo e espermatozóide). Na meiose ocorre a recom- binaçªo genØtica (crossing-over ou permutaçªo), evento fundamental para a manutençªo da va- riabilidade genØtica das espØcies. O conjunto de genes de um organismo cons- titui o seu patrimônio hereditÆrio ou genØtico e Ø denominado genoma. No caso da espØcie hu- mana, o genoma corresponde ao conjunto com- pleto de cromossomos haplóides que contØm toda a informaçªo genØtica de um indivíduo. ESTRUTURA DO DNA E REPLICA˙ˆO DO DNA Quimicamente, o gene Ø constituído pelo Æcido desoxirribonuclØico (DNA). O DNA Ø um polímero formado por monômeros denomina- dos nucleotídeos (Fig. 2.2). O nucleotídeo apre- senta na sua constituiçªo um grupamento fosfórico (P~P~P), um açœcar do tipo pentose (desoxirribose) e uma base nitrogenada. A base nitrogenada pode ser uma purina (adenina ou guanina) ou uma pirimidina (timina ou citosi- na). As bases nitrogenadas sªo designadas abre- viadamente por A (adenina), T (timina), C (citosina) e G (guanina). Na molØcula de DNA, P P P P P P P P A A O O C5’ 3’ T 3’ O 5’C C5’ 3’ G C 3’ O 5’C C5’ O 3’ C G 3’ O 5’C C5’ O 3’ T 3’ O 5’C 33 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 Fig. 2.2 Estrutura do nucleotídeo. Nucleotídeos componentes da molØcula de DNA. Abaixo estªo representadas as bases nitrogenadas encontradas nos Æcidos nuclØicos. Notar que timina e uracila encontram-se no DNA e no RNA, respec- tivamente. os nucleotídeos estªo ligados entre si atravØs da ligaçªo fosfodiØster (Fig. 2.3) que envolve o grupo fosfórico situado no carbono 5 da pen- tose de um nucleotídeo com a hidroxila situada no carbono 3 da pentose do nucleotídeo vizi- nho. Na cadeia do DNA, encontramos duas ex- tremidades denominadas extremidades 5 e 3. O nucleotídeo presente na extremidade 5 ca- racteriza-se pela presença de um grupo fosfó- rico (P~P~P) livre, isto Ø, o grupo fosfórico presente no carbono 5 nªo participa da ligaçªo fosfodiØster. Na extremidade oposta ou extre- midade 3, a hidroxila (OH) do carbono 3 do œltimo nucleotídeo estÆ livre, isto Ø, ela nªo estÆ comprometida com a ligaçªo fosfodiØs- ter, portanto, um novo nucleotídeo só pode ser adicionado na posiçªo 3. Durante a sínte- se da cadeia de DNA, a enzima DNA polime- rase sempre adiciona um novo nucleotídeo na posiçªo 3 (Fig. 2.4). Desta maneira, dizemos que a síntese do DNA ocorre sempre no sentido de 5 para 3 (5 fi 3). O C CH3 C C O HN CH N Base nitrogenada OO Desoxiribose C 1 OCH2 5 Fosfato 4 C 3 C C 2 HOH H Uracila HC N C N NH2 CH C C N N HAdenina Guanina H2N HN C C C C CH N N H Timina Citosina CH3 O N NH2 N H CH CHN C O CH HN N H C C O C O CH CH C C N H H N O O C O O O O P 34 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 A molØcula de DNA consiste em duas ca- deias (fitas) complementares do DNA, unidas lado a lado pelas pontes de hidrogŒnio (ligaçıes fracas direcionadas) entre as bases nitrogena- das formando uma dupla hØlice (Fig. 2.5). De maneira simplista, pode-se dizer que a molØ- cula seria comparÆvel a uma escada, onde cada degrau seria constituído por um par de bases nitrogenadas (A-T ou G-C) e o corrimªo for- mado por desoxirriboses (açœcar) e fosfatos. Deve-se salientar que as cadeias sªo comple- mentares (elas nªo sªo iguais), isto Ø, a adeni- na de uma cadeia pareia com a timina da cadeia complementar e a guanina com citosina. Na interaçªo entre guanina e citosina participam trŒs pontes de hidrogŒnio, enquanto entre ti- mina e adenina existem duas pontes de hidro- gŒnio. Pode-se tambØm notar que as cadeias estªo dispostas em sentido antiparalelo, isto Ø, uma cadeia corre no sentido de 5 para 3, en- quanto a outra corre no sentido de 3 para 5. As cadeias sªo mantidas unidas entre si por pon- tes de hidrogŒnio entre as bases nitrogenadas. Como mostrado na Fig. 2.5, as cadeias com- plementares do DNA formam uma dupla hØli- ce regular. A duplicaçªo da molØcula de DNA Ø catali- sada por uma enzima denominada DNA poli- merase. Na síntese do DNA, ocorre a separaçªo das duas cadeias da dupla hØlice (desnaturaçªo) e cada uma das cadeias serve de molde para a síntese das novas cadeias pela enzima DNA po- limerase (Fig. 2.6). A cadeia recØm-sintetiza- da serÆ complementar à cadeia molde. Este modelo de replicaçªo foi demonstrado expe- rimentalmente e Ø conhecido como replicaçªo semiconservativa do DNA. Para o início da replicaçªo Ø necessÆrio que a fita molde contenha uma pequena regiªode dupla fita conhecida como primer ou iniciador. O primeiro nucleotídeo da cadeia a ser sinteti- zada serÆ adicionado na posiçªo 3 do primer ocorrendo entªo a extensªo da cadeia de DNA pela adiçªo de outros nucleotídeos. Como foi discutido acima, a DNA polimerase adiciona um novo nucleotídeo na posiçªo 3 do nucleotídeo da cadeia que estÆ sendo sintetizada (Fig. 2.4). Desta maneira, voltamos a insistir no conceito de que a cadeia de DNA Ø sintetizada no senti- do 5 fi 3 de maneira que o ultimo nucleotídeo adicionado à cadeia terÆ a hidroxila na posiçªo 3 livre. Fig. 2.3 Ligaçªo fosfodiØster. Esquema mostrando a ligaçªo entre dois nucleotídeos atravØs da ligaçªo fosfodiØster. A ligaçªo ocorre entre o grupo fosfórico (P~P~P) do carbono 5 da desoxirribose de um nucleotídeo com a hidroxila (OH) do outro nucleotídeo. Ligação fosfodiéster 3’ OH 3’ OH 3’ OH 5’ P O A T O P O + 5’ P P P O C 5’ P C P P P P C O 5’ O 3’ O T O O P A + 35 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 Fig. 2.4 Síntese de DNA pela enzima DNA polimerase. Notar que a cadeia tem duas extremidades: a extremidade 5 na qual encontra-se um grupamento fosfórico (P~P~P) e a extremidade 3 onde hÆ uma hidroxila (OH). É importante salientar que a DNA polime- rase tambØm possui a capacidade de reconhecer os seus próprios erros e corrigi-los. Quando um nucleotídeo Ø adicionado na posiçªo errada (por exemplo, um T onde deveria estar um G), ela percebe o erro, remove o nucleotídeo e adiciona o nucleotídeo correto. Desta maneira, a DNA polimerase, alØm da atividade biossintØtica (po- limerase), tem tambØm atividade de exonuclea- se, isto Ø, que permite a remoçªo do nucleotídeo incorreto na cadeia. O FLUXO DA INFORMA˙ˆO GENÉTICA NA CÉLULA: CÓDIGO GENÉTICO, RNAS E PROTE˝NAS A informaçªo genØtica estÆ contida nas se- qüŒncias de nucleotídeos da molØcula de DNA, o que significa dizer que cada gene possui uma seqüŒncia de nucleotídeos própria e específica. Desta maneira, dois genes diferentes apresen- tam seqüŒncias de nucleotídeos diferentes. Em uma família gŒnica, como, por exemplo, no caso dos genes que codificam a globina, os diferentes membros da família apresentam uma razoÆvel homologia entre si no nível da seqüŒncia de nu- cleotídeos. A mensagem contida no gene (DNA) Ø trans- mitida ao citoplasma da cØlula atravØs do RNA mensageiro (RNAm) em um processo conheci- do como transcriçªo. Nos ribossomos, a men- sagem contida no RNAm Ø decodificada, ou seja, traduzida, originando uma proteína específica. Esta etapa Ø denominada traduçªo. Desta ma- neira, o fluxo da informaçªo genØtica segue o caminho indicado abaixo: gene (DNA) fi RNAm fi Proteína O RNAm Ø sintetizado por uma enzima de- nominada RNA polimerase que utiliza como molde uma das fitas do DNA em um processo denominado transcriçªo gŒnica. Notar que ape- nas uma das cadeias do DNA serve como molde para a síntese do RNA (Fig. 2.7). Portanto, o RNA Ø exatamente igual a uma das cadeias do DNA, excetuando-se a timina que Ø substituída por uracila no RNA. A cadeia ou fita de DNA que contØm a informaçªo Ø denominada cadeia ou fita codificadora (Fig. 2.7). A seqüŒncia de nucleotídeos do DNA e conseqüentemente do RNAm contØm a infor- maçªo necessÆria para a síntese de uma proteí- Base Açúcar DNA Polimerase Ligação Fosfodiéster Pirofosfato Adição de um novo nucleotídeo na extremidade 3’ da cadeia 5’ P O O O O 3’ OH 5’ 5’ O O O O 3’ OH 36 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 Fig. 2.5 Estrutura do DNA: a dupla hØlice. (A) A dupla hØlice, segundo o modelo de Watson & Crick. (B) Esquema mostrando que os degraus sªo constituídos por bases nitrogenadas e os corrimıes por açœcar (desoxirribose) e fosfato. (C) Pontes de hidrogŒnio entre as bases nitrogenadas. na. As proteínas sªo constituídas por unidades conhecidas como aminoÆcidos, existindo 20 ti- pos diferentes de aminoÆcidos que podem ser encontrados em uma proteína. A cadeia polipep- tídica Ø formada por uma seqüŒncia linear de aminoÆcidos. O RNAm contØm a informaçªo ge- nØtica que determina a ordem e os tipos dos ami- noÆcidos presentes em uma dada proteína. A informaçªo genØtica estÆ contida no chamado código genØtico (Tabela 2.1). O código genØtico Ø o alfabeto usado pelos seres vivos para codifi- car e transmitir as informaçıes contidas nos ge- nes. O código genØtico Ø formado de quatro letras compostas pelas bases nitrogenadas presentes no DNA (A, T, G, C). No código genØtico as pala- vras sªo formadas pela combinaçªo de trŒs bases nitrogenadas, existindo, portanto, 16 combina- çıes possíveis. Desta maneira, os aminoÆcidos presentes nas proteínas sªo codificados por uma combinaçªo de trŒs bases nitrogenadas. Cada A) B) C) V o l t a C o m p l e t a Cavidade maior Corrimão Açúcar/Fosfato Cavidade menor Eixo central Citosina AdeninaGuanina Timina Desoxi- ribose Desoxi- ribose Desoxi- ribose Desoxi- ribose 20A 34A H N-H-----O (+) (–) (–) (+) N-----H-N (–) (+) O-----H-N H NO N N N O (–) (+) O N O ON N N (+) (–) N-H----N CH3 O----H-N H 3’ OH 5’ C O C GO P P O G CO P P O3’ 3’5’ 5’ O T T A A P T A P P P O O P AT O P O O O P CG 5’ C 3’ OH 3,4A 37 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 Fig. 2.6 A replicaçªo do DNA. As cadeias da molØcu- la-mªe (em cinza claro) se separam e serve de molde (tem- plate) para a síntese da nova cadeia (em cinza escuro). Notar que a fita recØm-sintetizada (em cinza escuro) Ø com- plementar à fita molde. Fig. 2.7 Transcriçªo gŒnica (síntese de RNA). Notar que a fita superior do DNA Ø a fita codificadora. A composiçªo de bases do RNA Ø exatamente igual a da fita superior do DNA, substituindo-se timina (T) por uracila (U) no RNA. À medida que a síntese progride, a molØcula de RNA separa-se do DNA. do. Existem alguns códons que nªo codificam nenhum aminoÆcido, mas, pelo contrÆrio, indi- cam o fim da mensagem. Eles sªo conhecidos como códons de terminaçªo (stop codon). Em todas as mensagens, o primeiro códon (ATG) codifica o aminoÆcido metionina e Ø designado como códon de iniciaçªo. No RNAm maduro, podemos definir uma regiªo denominada fase de leitura aberta (ORF= open reading frame) que codifica um polipeptí- deo específico. A ORF Ø definida pela presença de um códon ATG no seu início, finalizando com um códon de terminaçªo (Fig. 2.8). Deve-se no- tar que o RNAm contØm regiıes que nªo sªo codificadoras, ou seja, nªo sªo traduzidas. A regiªo situada na porçªo 5 do RNAm a mon- tante (upstream) do códon de iniciaçªo e a re- giªo situada na porçªo 3 do RNAm a justante (downstream) ao códon de terminaçªo nªo sªo codificadoras. Estas regiıes sªo conhecidas como regiıes nªo traduzidas (UTR = untrans- lated region). AlØm disso, nos RNAm dos euca- riotos existe a adiçªo de uma cauda de adenina na porçªo 3 do RNAm (cauda poli A). O CONCEITO DE GENE (GENOMA, PROJETO GENOMA) De maneira geral, pode-se dizer que um dado gene corresponde a um trecho de uma molØcula de DNA que codifica uma proteína ou um RNA (RNA ribossômico, transporta- dor etc.). AlØm das regiıes UTR jÆ citadas, muitos genes dos organismos eucarióticos sªo Nova MoldeMolde Fitas complementares de DNA Fita de RNA uma destas combinaçıes Ø conhecida como có- don. Por exemplo, o códon AGG codifica o ami- noÆcido arginina. Pode ocorrer de um mesmo aminoÆcido ser codificado por códons diferen- tes, por isto, o código genØtico Ø dito degenera- A--T C--G T--A G-C T--A A--T C-G C--G A T G A--T C---G C A T C-GA--TT--A G-C T--A C--G A--TC-G C-G A--TC-G T--A T--A C-G 5’ 5’ 5’ 3’ 3’ T G C C A A T G G C T T A T T T 3’ C C C T A A TG U C C U A A GG C UU A U U C G A A T A A A G G G A T T--A 38 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 Tabela 2.1 O Código GenØtico. A Combinaçªo de TrŒs Nucleotídeos (Códon) Codifica um AminoÆcido ou Sinaliza o Fim da Síntese de Cadeia Polipeptídica 2a base 1a 3a base U C A G base UUU Phe UCU UAU Tyr UGU Cys U U UUC UCC Ser UAC UGC CUUA Leo UCA UAA Fim UGA Fim A UUG UCG UAG Fim UGG Trp G CUU CCU CAU His CGU U C CUC Leo CCC Pro CAC CGC Arg CCUA CCA CAA Gin CGA A CUG CCG CAG CGG G AUU ACU AAU Asn AGU Ser U A `UC Ile ACC Thr AAC AGC CAUA ACA AAA Lys AGA Arg A AUG Met ACG AAG AGG G GUU GCU GAU Asp CGU U G GUC Val GCC Ala GAC GGC Gly CGUA GCA GAA Glu GGA A GUG GCG GAG GG G interrompidos por seqüŒncias nªo codificado- ras denominadas introns. É importante salientar que existem no ge- noma muitas seqüŒncias de DNA que nªo sªo propriamente seqüŒncias codificadoras, como, por exemplo, as regiıes intergŒnicas e as seqüŒn- cias repetidas (micro- e minissatØlites, retro- tranposons, retroposons etc.). No homem, somente cerca de 8% do genoma Ø constituído por genes tal como definido acima. O restante do genoma humano Ø constituído por seqüŒn- cias de DNA correspondentes aos introns, regi- ıes intergŒnicas, cópias de retrovírus e seqüŒncias repetidas de funçªo desconhecida. Na realidade o conceito de gene nªo Ø defi- nitivo, adaptando-se às novas informaçıes so- bre a estrutura e organizaçªo do genoma. Mas de toda maneira, o gene sempre corresponde a um trecho de uma molØcula de DNA e ele Ø ca- racterizado pela seqüŒncia de nucleotídeos des- te trecho. O tamanho de uma seqüŒncia de DNA ou de um gene pode ser expresso em nœmero de pares de bases (pb), pois, como foi visto, o DNA Ø constituído por repetiçıes de bases nitrogena- das (nucleotídeos). O tamanho de um gene estÆ relacionado com o produto por ele codificado (proteína ou RNA estrutural), como pode tam- bØm estar relacionado com o tipo de processa- mento ao qual o seu transcrito Ø submetido. Assim, pode-se encontrar genes constituídos por 150pb ou genes com mais de 50.000pb. O tamanho ou complexidade do genoma de um organismo tambØm pode ser expresso em nœmero de pares de bases. A bactØria Escherichia coli possui um œnico cromossomo constituído por 4.639.221pb, um genoma relativamente peque- no e simples quando comparado com o dos ma- RNAm 5’ CAUGG...UCG AUG AAC AAA GAU AGU UUU AGG CUA UAA GGCA... AAA(n) 3’ Proteína Met Asn Lys Asp Ser Phe Arg Leu Fim UTR UTR Fig. 2.8 Estrutura do RNAm. As regiıes 5 e 3 nªo-traduzidas (UTR = Untranslated Region), a fase de leitura aberta (ORF = Open Reading Frame), os códons de iniciaçªo (ATG) e terminaçªo (TGA) e a cauda poli-A estªo indicados. ORF 39 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 míferos. O genoma haplóide humano Ø constitu- ído por 3 bilhıes pb que formam os 23 cromos- somos. Por exemplo, os cromossomos 1 e 21 do homem sªo constituídos por 300 milhıes pb e 50 milhıes pb, respectivamente. A seqüŒncia com- pleta de nucleotídeos do genoma de alguns vírus e microorganismos (vÆrias bactØrias, levedura) foi determinada e estÆ à disposiçªo em banco de da- dos (GenBank, National Center for Biotechnolo- gy Information, http://www.ncbi.nlm.nih.gov), assim como a maior parte dos genes seqüencia- dos de diferentes organismos. A seguir serªo discutidos as tØcnicas e os procedimentos de clonagem gŒnica, ou seja, do isolamento dos genes de um dado organismo. O conjunto das tØcnicas de clonagem gŒnica e de outros tipos de manipulaçªo do material genØti- co tem sido denominado tecnologia do DNA re- combinante ou tambØm de Engenharia GenØtica. CLONAGEM G˚NICA: PRINC˝PIOS, ESTRATÉGIAS E FERRAMENTAS Princípios e EstratØgias Entende-se por clonagem gŒnica, o isola- mento, amplificaçªo e purificaçªo de um gene ou de genes, a partir do material genØtico de um dado organismo. Isolar um gene presente em poucas cópias no genoma humano Ø, sem dœvi- da alguma, uma tarefa colossal. Procura-se uma seqüŒncia de DNA em um universo formado por 3 bilhıes pb. Uma gota de Ægua no oceano! Po- rØm, esta tarefa foi simplificada e, atØ certo pon- to, banalizada pelo advento da tecnologia do DNA recombinante. A clonagem gŒnica envolve basicamente trŒs etapas distintas. A primeira etapa consiste na escolha do DNA a ser usado no processo de clonagem. O DNA pode ser isolado diretamen- te dos cromossomos do organismo de interesse, nesse caso, ele Ø designado como DNA genô- mico. Outra possibilidade Ø utilizar molØculas de DNA copiadas a partir molØculas de RNA mensageiro, atravØs de uma enzima denomina- da transcriptase reversa. As molØculas obtidas desta maneira sªo conhecidas como cDNA (DNA complementar). A escolha do tipo de DNA a ser usado, genô- mico ou cDNA, depende da finalidade do estudo. Por exemplo, se o pesquisador estÆ interessado em estudar a seqüŒncias de aminoÆcidos de uma dada proteína ou obtŒ-la em quantidades sufi- cientes para estudos imunológicos, clínicos etc., Ø recomendÆvel utilizar o cDNA. Por outro lado, se o pesquisador estÆ interessado em estudar as regiıes regulatórias de um dado gene ou mapea- mento do mesmo no cromossomo, Ø recomendÆ- vel o uso do DNA genômico. A segunda etapa consiste na ligaçªo das molØculas de DNA em um vetor apropriado e introduçªo em uma cØlula hospedeira. Nesta fase do processo, tem-se em mªos uma populaçªo de molØculas de DNA, na qual supostamente estÆ incluído o gene de interesse. Na maioria dos casos, o gene de interesse estÆ presente em quantidades diminutas, insuficientes para sua de- tecçªo. Portanto, Ø necessÆrio que as molØculas de DNA sejam amplificadas, para que o gene de interesse possa ser identificado pelos mØtodos disponíveis. Em geral, o material a ser clonado Ø amplifi- cado em bactØrias, as quais sªo organismos de fÆcil cultivo e manipulaçªo, que se multiplicam a cada 30 minutos. O artifício usado Ø fazer com que a bactØria, ao duplicar seu próprio material genØtico tambØm duplique o DNA introduzido. Para tanto, os fragmentos de DNA a serem clo- nados sªo inseridos nos chamados vetores, os quais sªo molØculas de DNA capazes de invadir e propagar-se dentro das bactØrias. Como serÆ discutido mais adiante, os ve- tores mais comuns sªo os plasmídeos e vírus bacterianos (bacteriófagos). Nesta etapa do pro- cesso, o pesquisador deve escolher o vetor mais apropriado para as suas finalidades. Os fragmen- tos de DNA sªo introduzidos e duplicados na cØlula hospedeira pelo veículo de clonagem, ou seja, o vetor. Ao final desta etapa tem-se uma populaçªo de bactØrias recombinantes, cada uma delas contendo um fragmento de DNA exóge- no, oriundo do organismo em estudo. A essa coleçªo de bactØrias recombinantes portadoras de genes de um dado organismo dÆ-se a deno- minaçªo genoteca ou biblioteca. A terceira etapa consiste no isolamento do gene de interesse atravØs de um arsenal de tØc- nicas genØticas, bioquímicas e imunológicas. Novamente, cabe ao pesquisador a escolha do mØtodo de seleçªo mais adequado para o iso- lamento do gene de interesse. 40 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 As etapas descritas aqui serªo discutidas com mais detalhes nos itens a seguir. Ferramentas do DNA Recombinante: Enzimas Modificadoras do DNA, Vetores e CØlulas Hospedeiras Enzimas Modificadoras do DNA Sabe-se atravØs de mensuraçıes físico-quí- micas e figuras de microscopia eletrônica que a molØcula de DNA Ø longa, fina e razoavelmen- te retilínea, lembrandoum longo filamento. A estrutura linear e filamentosa facilita a mani- pulaçªo da molØcula de DNA, permitindo o iso- lamento de fragmentos da molØcula atravØs do uso de enzimas específicas ou quebra com agente físico (ultra-som, luz ultravioleta etc.). Atualmente, a disponibilidade de enzimas modificadoras do DNA permite que as molØcu- las de DNA sejam manipuladas e alteradas no tubo ensaio, criando-se novas molØculas de DNA. Fragmentos de DNA, de mesma ou dife- rente origem, podem ser ligados entre si atravØs enzimas específicas originando novas molØculas de DNA, as quais sªo denominadas molØculas recombinantes. A tecnologia que permite que estas molØculas recombinantes sejam criadas, modificadas, replicadas e expandidas, recebeu a denominaçªo tecnologia do DNA recombinan- te. O conjunto de tØcnicas e procedimentos que permite essa manipulaçªo tambØm Ø conhecido como Engenharia GenØtica. No metabolismo do DNA (síntese e degra- daçªo) estªo envolvidos um grande nœmero de enzimas, com diferentes especificidades e fun- çıes. Estas enzimas constituem ferramentas va- liosas da tecnologia do DNA recombinante. Entre as enzimas de uso corrente na clonagem gŒnica pode-se citar as: a) nucleases (exonucleases e en- donucleases de restriçªo), b) polimerases, c) li- gases, d) quinases e fosfatases, e) metilases, etc. O mecanismo de açªo destas enzimas estÆ es- quematizado na Fig. 2.9. Como foi discutido anteriormente, a síntese do DNA Ø catalisada por uma enzima denomi- nada DNA polimerase. Esta enzima sintetiza uma nova fita de DNA utilizando como molde (tem- plate) a fita complementar da molØcula existen- te (Figs. 2.4 e 2.9). Para que ocorra a síntese, a molØcula de DNA deve ser desnaturada, ou seja, as fitas devem ser separadas atravØs do rompi- mento das ligaçıes que mantŒm a dupla hØlice. A desnaturaçªo Ø feita atravØs de aquecimento (90oC) ou tratamento alcalino das molØculas de DNA, originando assim uma preparaçªo de DNA contendo molØculas simples fita. Ambas as fitas podem servir de molde para a síntese de novas molØculas. AlØm da fita mol- de, Ø necessÆria a presença de um iniciador ou primer, ou seja, um pequeno fragmento de DNA simples fita complementar à fita molde. Nas manipulaçıes in vitro, os iniciadores podem ser criados pela açªo de uma dada enzima (por exemplo, RNase H), ou produzidos em mÆquinas de síntese de oligonucleotídeos e adi- cionados ao tubo de reaçªo. A produçªo de ini- ciadores por RNase H serÆ discutida na síntese de cDNA e a dos iniciadores sintØticos no arti- go sobre PCR. O crescimento da cadeia de DNA sempre se faz no sentido 5 para 3, ou seja, um novo nu- cleotídeo Ø adicionado à cadeia atravØs da liga- çªo do seu grupo fosfórico, presente no carbono 5 da desoxirribose, com a hidroxila do carbono 3da desoxirribose do ultimo nucleotídeo pre- sente na cadeia em crescimento. A transcriptase reversa Ø um tipo de DNA polimerase capaz de sintetizar uma nova fita de DNA utilizando como molde um RNA mensa- geiro, portanto, trata-se de uma DNA polimera- se RNA dependente (Fig. 2.14). Como qualquer DNA polimerase, ela necessita de um iniciador e adiciona nucleotídeos na posiçªo 3 do nucle- otídeo remanescente na cadeia. Como anterior- mente citado, a cadeia de DNA simples fita sintetizada a partir do molde de RNA Ø denomi- nada cDNA (DNA complementar). As endonucleases de restriçªo, tambØm co- nhecidas como enzimas de restriçªo, tiveram um papel fundamental no desenvolvimento da tec- nologia do DNA recombinante. Estas enzimas sªo nucleases que reconhecem seqüŒncias espe- cíficas de nucleotídeos, cortando a molØcula de DNA em regiıes específicas (Fig. 2.10, Tabela 2.2). A denominaçªo endonucleases de restri- çªo origina-se do fato de a atividade da enzima estar restrita apenas à regiªo da molØcula que contØm a seqüŒncia de nucleotídeos por ela re- conhecida. A maioria das enzimas de restriçªo foi isolada de bactØrias e sªo denominadas com as abreviaçıes das espØcies das quais foram 41 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 Fig. 2.9 Enzimas modificadoras do DNA. Esquema mostrando o mecanismo de açªo de algumas enzimas modificado- ras do DNA utilizadas em Engenharia GenØtica. Em negro estªo representadas as bases nitrogenadas; em verde estªo representados a desoxirribose e o fosfato, unidos entre si pelas ligaçıes fosfodiØster. isoladas, por exemplo, EcoRI (Escherichia coli), HindIII (Haemophilus influenzae). As enzimas de restriçªo disponíveis reconhe- cem seqüŒncias de quatro, seis ou oito nucleotí- deos. De maneira geral, em uma dada molØcula de DNA a probabilidade de encontrar-se sítios contendo uma dada seqüŒncia de quatro nucleo- tídeos (um sítio a cada 256 nucleotídeos) Ø maior do que a probabilidade de encontrar-se sítios con- tendo uma seqüŒncia de seis nucleotídeos (um sítio a cada 4.096 nucleotídeos) ou oito nucleotí- deos. Desta maneira, o nœmero de fragmentos obtidos após digestªo do DNA com HaeIII (sítio de reconhecimento composto por quatro nucleo- tídeos) serÆ bem maior daquele obtido na diges- tªo com EcoRI (seis nucleotídeos). Uma outra característica das enzimas de res- triçªo Ø o fato de elas cortarem a molØcula de DNA gerando extremidades coesivas ou extremi- dades cegas (blunt ends) (Fig. 2.10). Fragmen- tos de DNA contendo extremidades coesivas compatíveis podem ser ligados entre si gerando novos fragmentos. Fragmentos obtidos pela di- gestªo com BamHI podem ser ligados a outros fragmentos digeridos pela mesma enzima ou com fragmentos obtidos com a enzima Sau3AI Endonuclease Exonuclease Quinase DNA polimerase Ligase Fosfatase “primer” Fita molde 5’ 3’ 5’ 3’ P– –OH –POH– 3’ 5’ OH– –OH 5’ 3’ OH– –OH 5’3’ p p3’5’ OH– OH– –OH –OH 5’ 5’ 3’ –OH 5’3’ OH– –P 42 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 Fig. 2.10 MolØculas de DNA recombinante. Diagrama esquemÆtico mostrando a geraçªo de molØculas de DNA recom- binante in vitro, após digestªo com enzimas de restriçªo compatíveis e ligaçªo das molØculas resultantes com a enzima DNA ligase. Notar que foi incluída no esquema a ligaçªo entre fragmentos de DNA digeridos com enzimas de restriçªo (HaeIII, SmaI) que originam extremidades blunt-ends. Tabela 2.2 Enzimas de Restriçªo Origem Enzima Sítio de Reconhecimento Extremidades Escherichia coli Eco RI 5-GAATTC - 3 Coesivas -CTTAAG- Eco RV 5-GATATC- 3 Blunt ends Bacillus Bam HI 5 -GGATCC- 3 Coesivas anyloliquefaciens H -CGTAGG- Haemophilus aegytius Hae III 5 -ggcc- 3 Blunt ends Staphylococcus aureus Sau 3AI 5 -GATC- 3 Coesivas Nocardia Not I 5 -GCGGCCGC- 3 Coesivas otitids-caviarium -CGCCGGCG- (Fig. 2.10). A figura mostra que Sau3AI reco- nhece uma seqüŒncia de quatro nucleotídeos que estÆ contida dentro da seqüŒncia de seis nucleotí- deos reconhecida pela BamHI, logo, as extremi- dades geradas com Sau3AI sªo compatíveis com as de BamHI. As seqüŒncias reconhecidas pelas enzimas BamHI e Sau3AI sªo isoesquizômeros. Fragmentos com extremidades cegas po- dem ser ligados entre si, mesmo que tenham sido gerados por diferentes enzimas de restriçªo, como, por exemplo, EcoRV e HaeIII. Assim, sªo muitas as maneiras disponíveis de fragmen- tar-se o DNA e reconstruir novas molØculas (Fig. 2.10). A uniªo de dois fragmentos de DNA Vetor Inserto Vetor Inserto Vetor Inserto Ligase Ligase Ligase Eco RI Eco RI Bam HI Sau 3AI Hae III Sma I 5’ 5’3’ 3’ C G A A T T T C T A A G 5’3’ G A A T T C C T T A A G 3’ 5’ C T T A A G 3’5’ 3’ 5’ 5’ 3’ A A T T C G 3’ 5’ 5’ 3’ A A T T CG C T T A A G 3’ 5’ C G A T C C 3’5’ 3’ 5’ G C T A G G 3’ 5’3’ 5’ G A T C C T G G 5’ 5’ 3’ 3’ C G C T A G G AT C 5’ 3’ 5’ 3’ G A T CC G C T A G 3’ 5’ G G C C 3’5’ CC G G 3’ 5’ 5’ 3’ C C C G G G G G G C C C 3’ 5’ 5’ 5’ 5’ 5’ 3’ 3’ 3’ 3’ G G C C C C C G G G 5’ 3’ G G C C C G G GC C 3’ 5’ 43 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 ocorre atravØs da formaçªo de ligaçıes fosfodi- Øster entre as extremidades dos mesmos, catali- sadas por enzimas denominadas DNA ligases. A T4 DNA ligase, codificada por um gene presen- te no bacteriófago T4, Ø uma das ligases mais utilizadas na rotina dos laboratórios. Uma situaçªo muito comum na clonagem de genes Ø aquela em que fragmentos de DNA de um dado organismo, obtidos por digestªo com uma enzima de restriçªo (por exemplo, EcoRI), devem ser ligados ao DNA de um plasmídeo bac- teriano, o qual tambØm foi digerido com EcoRI. Como a ligase nªo distingue os fragmentos, ha- verÆ sempre uma fraçªo considerÆvel de produ- tos de reaçªo contendo fragmentos resultantes da ligaçªo de plasmídeos entre si ou fragmentos resultantes da ligaçªo de fragmentos de DNA do organismo em questªo. A ligaçªo indesejÆvel entre estes fragmentos pode ser evitada, tratan- do-se previamente um dos fragmentos com uma enzima denominada fosfatase, que remove es- pecificamente os grupamentos fosfóricos das ex- tremidades do DNA. Os fragmentos destituídos de grupamentos fosfóricos (fragmentos defosfo- rilados) sªo incapazes de ligar-se entre si, em- bora sejam capazes de ligar-se aos fragmentos fosforilados presentes na reaçªo. Este artifício Ø largamente usado na clonagem de genes. Como citado no início deste item existe uma grande variedade de enzimas modificadoras do DNA, que possuem diferentes especificidades e mecanismos de açªo. Apesar da enorme utilida- de destas enzimas na tecnologia do DNA recom- binante, apenas foram abordadas as enzimas comumente utilizadas na construçªo de biblio- tecas ou genotecas. Vetores e CØlulas Hospedeiras Os vetores sªo os veículos de clonagem que permitem que os fragmentos de DNA a serem clonados sejam introduzidos e propagados em uma cØlula hospedeira adequada. As cØlulas hos- pedeiras ou receptoras devem permitir a entrada e propagaçªo do vetor, sem causar alteraçıes no DNA que estÆ sendo clonado. As cØlulas hos- pedeiras devem ser cØlulas de fÆcil manipulaçªo, crescimento rÆpido e constituiçªo genØtica bem conhecida. Neste perfil enquadram-se determi- nadas linhagens de bactØrias, leveduras, cØlulas de cultura de tecido de mamíferos e insetos. Deve-se salientar que muitos genes, inicialmen- te, sªo clonados em bactØrias e, posteriormente, transferidos para um outro hospedeiro. Os vetores mais utilizados sªo os plasmídeos e os vírus de bactØrias e de cØlulas eucarióticas. O plasmídeo Ø uma molØcula de DNA, em geral pequena (menos de 10.000 pb) e circular, por- tadora de uma regiªo denominada origem de re- plicaçªo, a qual permite sua replicaçªo dentro da cØlula hospedeira (Fig. 2.11). Em um plas- mídeo existem algumas regiıes que sªo impor- tantes no processo de clonagem: origem de replicaçªo, sítio de clonagem, marcas de resis- tŒncia a antibióticos, regiıes homólogas aos pri- mers de seqüenciamento etc. Os plasmídeos de clonagem possuem uma origem de replicaçªo que permite a sua replica- çªo e propagaçªo em bactØrias. Existem plasmí- deos que tŒm diferentes origens de replicaçªo, podendo ser propagados tanto em bactØrias como em um outro tipo celular, como, por exem- plo, levedura, cØlulas de cultura de tecido de mamíferos ou insetos, ou mesmo em tecidos de mamíferos. Os sítios de clonagem sªo as regiıes onde se pode inserir os fragmentos de DNA exógeno. O sítio de clonagem possui seqüŒncias reconheci- das pelas enzimas de restriçªo mais usuais. Quando se tem vÆrios sítios de restriçªo à dis- posiçªo para a clonagem, diz-se que o vetor Ø portador de um polylinker. Em muitos plasmí- deos a inserçªo de um fragmento de DNA exó- geno leva a uma alteraçªo do fenótipo da cØlula, o qual pode ser facilmente detectado e Ø um in- dicativo da inserçªo de um fragmento de DNA no sítio de clonagem. Por exemplo, em alguns plasmídeos o sítio de clonagem fica no interior do gene que codifica uma enzima, de modo que a inserçªo de DNA exógeno anula a atividade enzimÆtica. Os plasmídeos carregam genes que codifi- cam resistŒncia a antibióticos, o que Ø funda- mental para a manutençªo dos mesmos na cØlula hospedeira. As marcas de resistŒncia a antibióti- cos sªo extremamente œteis na identificaçªo, se- leçªo e manipulaçªo em geral dos plasmídeos recombinantes. De maneira geral, os plasmíde- os acomodam com facilidade fragmentos com menos de 10.000 pb. Cabe ao investigador es- colher o plasmídeo mais adequado a sua finali- dade. 44 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 Fig. 2.11 Vetores típicos de clonagem. (A) plasmídio pUC18, mostrando sítios de clonagem (polylinker), origem de replicaçªo (ori), gene de resistŒncia ao antibiótico ampicilina (Amp R) e o promotor lac. (B) Fago lambda gt10 (vetor de inserçªo), mostrando o œnico sítio de clonagem EcoRI. O plasmídeo Ø introduzido na cØlula hos- pedeira submetendo-se a bactØria a um cho- que tØrmico na presença de fosfato e cÆlcio. Este processo Ø conhecido como transformaçªo (Fig. 2.12). A transformaçªo tambØm pode ser realizada submetendo-se as bactØrias a um cam- po elØtrico que promove o aparecimento de po- ros temporÆrios na membrana celular, por onde penetram as molØculas de DNA. Este processo Ø conhecido como eletroporaçªo. Após a trans- formaçªo as bactØrias sªo plaqueadas em agar sólido contendo meio nutritivo e antibióticos. As colônias contendo plasmídeo sªo recuperadas e analisadas. O bacteriófago ou fago lambda Ø um vírus de bactØrias que tem sido largamente utilizado em clonagem gŒnica. O genoma do fago lambda Ø constituído por uma œnica molØcula de DNA com cerca de 40.000 pb. Existem duas maneiras de se inserir um fragmento de DNA exógeno no fago. Uma de- las consiste em substituir um trecho do DNA do fago por um fragmento de DNA exógeno, cujo tamanho pode variar de 9.000pb a 23.000pb. Neste caso, elimina-se uma regiªo do DNA do fago nªo-essencial à sua sobrevi- vŒncia na cØlula hospedeira, sendo o vetor co- nhecido como vetor de substituiçªo. A outra opçªo consiste em adicionar ao DNA do fago o fragmento de DNA (menor que 8.000 pb) que se deseja clonar. Neste caso, o vetor Ø conheci- do como vetor de inserçªo. As molØculas de DNA fÆgico recombinantes sªo utilizadas para construir partículas virais in vitro em uma reaçªo conhecida como encapsi- daçªo in vitro (Fig. 2.15). Em œltima anÆlise, partículas virais sªo geradas no tubo de ensaio e, a seguir, utilizadas para infectar bactØrias. A infecçªo de bactØrias com fagos costuma ser um processo mais eficiente do que a transformaçªo quando se leva em conta o nœmero de recombi- nantes obtidos. O plasmídeo e o fago lambda sªo os vetores mais apropriados para o isolamento e estudo de um gene em particular e construçªo de ge- notecas ou bibliotecas de um dado organismo. PorØm, com o rÆpido desenvolvimento da tec- nologia do DNA recombinante, outros vetores com finalidades diversas foram construídos e aperfeiçoados, como, por exemplo, o fago fila- mentoso M13, os cosmídeos, os YACs, BACs e vetores derivados de vírus de cØlulas eucarióti- cas. No presente artigo, serÆ abordada a clona- gem em plasmídeos e fago lambda. Contudo, Ø importante salientar que o racional e estratØgias utilizadas na clonagem nestes vetores podem ser aplicados aos outros vetores. Para que uma cØlula seja utilizada como cØ- lula hospedeira ou receptora em clonagem gŒni- ca ela deve preencher uma sØrie de requisitos: A) B) Hi nd II Sp h I Pu l I So l I Xi ba I Bo m HI Sm al Kp nl Sa c I Ec oR I IacZ’ AmpR ori Mapa genético do bacterófago l 2,69 kb Mapa do vetor plasmídio pUC 18 Genesdo capsídeo Genes da cauda Recombinação Lisogenia Síntese de DNA Lise Sítio cosSítiocos 48kb att int xis a b l cBi N cl cro dl O P Q S R 45 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 crescimento rÆpido (tempo de geraçªo curto), fÆcil manipulaçªo, estrutura genØtica bem conhecida. As cØlulas hospedeiras, em geral, possuem uma sØrie de mutaçıes no seu sistema de recombina- çªo genØtica que garantem a propagaçªo e a es- tabilidade do vetor. Existem cØlulas hospedeiras que permitem que os genes clonados sejam expressos, garan- tindo a recuperaçªo em larga escala dos produ- tos destes genes, por exemplo, proteínas. As bactØrias sªo as cØlulas hospedeiras mais utili- zadas em Engenharia GenØtica. PorØm, existem à disposiçªo dos pesquisadores outros hospedei- ros, como cØlulas de cultura de tecido de mamí- feros e insetos, leveduras etc.). A escolha da cØlula hospedeira vai depender dos objetivos do trabalho. Geralmente, a clonagem de um dado gene Ø feita em bactØria e, posteriormente, se- gundo as necessidades o gene clonado Ø trans- ferido para um outro hospedeiro. CONSTRU˙ˆO DE BIBLIOTECAS OU GENOTECAS Biblioteca ou genoteca Ø uma coleçªo de frag- mentos de DNA de um dado organismo, clona- dos e propagados em um hospedeiro adequado (bactØria, levedura, cØlula de cultura de tecido). Para que uma biblioteca seja representativa, qual- quer gene do organismo estudado deve estar re- Fig. 2.12 Clonagem de DNA genômico em plasmídio (construçªo de biblioteca genômica). Digestªo do plasmídio e DNA genômico com enzimas compatíveis (EcoRI), ligaçªo com a enzima DNA ligase, transformaçªo de bactØrias compe- tentes, seleçªo com o antibiótico tetraciclina, identificaçªo e amplificaçªo dos clones recombinantes. DNA genômico Vetor plasmídio Eco RI Eco RI TeiR ori Ec o RI Ec o RI Ligação Transformação em E. coli E. coli contendo plasmídio recombinante Seleção com antibióticos Seleção de recombinantesE. coli contendo plasmídio selvagem 46 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 Fig. 2.13 Isolamento e purificaçªo do RNAm poliadeni- lado (RNAm poli-A) atravØs de cromatografia de afinidade em coluna de oligo (dT) celulose. O RNA total extraído do organismo de interesse (tecido, cØlulas em cultura) Ø aplica- do em colunas de oligo (dT) celulose. A cauda poli A (resí- duos de adenina) do RNAm hibridam com os resíduos de timina presentes na resina (oligo dT celulose). O RNAm poli- A Ø eluído com soluçªo apropriada. presentado na genoteca. Em outras palavras, a probabilidade de se encontrar um dado gene deve ser igual ou superior a 99%. Desta maneira, conhecendo-se a complexi- dade do genoma e o tamanho dos fragmentos clonados pode-se estimar o nœmero de clones recombinantes necessÆrios para que uma biblio- teca seja representativa. De acordo com a ori- gem do DNA, as bibliotecas sªo denominadas a) genômica, se o DNA clonado for o DNA nu- clear ou cromossômico; b) cDNA, se o DNA clo- nado for copiado do RNAm pela transcriptase reversa. Bibliotecas Genômicas O DNA extraído do nœcleo das cØlulas Ø de- nominado DNA genômico ou cromossômico. O DNA genômico pode ser obtido rompendo-se as cØlulas na presença de detergentes, seguin- do-se extraçªo com solventes orgânicos (fenol, clorofórmio). Em geral, o DNA Ø digerido com enzimas de restriçªo ou com Dnase I, escolhidas pelo pes- quisador levando-se sempre em conta os objeti- vos do trabalho e os sítios de clonagem existentes no vetor (Fig. 2.12). A digestªo com enzimas de restriçªo pode ser total ou parcial, variando-se o tempo de incubaçªo com a enzima. Os fragmen- tos a serem inseridos no vetor podem ser purifi- cados atravØs de eletroforese em gel de agarose, escolhendo-se apenas os fragmentos de tama- nho adequado ao vetor escolhido. Fragmentos de tamanho igual ou inferior a 23.000 pb podem ser clonados em fago lambda. Os plasmídeos e o fago filamentoso M13 aco- modam com facilidade fragmentos menores que 10.000pb. Como serÆ discutido em outro capí- tulo, fragmentos com tamanho igual ou supe- rior a 40.000 pb devem ser clonados em vetores especialmente desenvolvidos para acomodar grandes fragmentos de DNA como os YACs (ye- ast artificial chromosome), BACs (Bacterial Ar- tificial Chromosome) e cosmídeos. É muito comum na construçªo de biblio- tecas submeter-se o DNA genômico a uma di- gestªo parcial com uma enzima que corta freqüentemente o DNA, como, por exemplo, a Sau3AI. Este procedimento aumenta a proba- bilidade de um dado gene estar presente nos Oligo (dT) celulose T T T T T T T T T T T T T T T RNA total A A A A A A A A A A A A A A A A A A A A T T T T T A A A A ARNAm Pdi (A) hibridiza com oligo (dT) A A A A A T T T T T NaCL 100mM Eluição de RNAr e RNAt A A A A A Tris 10mM EDTA 1mM A A A A A A A A A AA A A A A A A A A A A A A A A A A A A AA A A A A Eluição do RNAm Poli (A) 47 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 fragmentos a serem inseridos no vetor. Por exemplo, se um dado gene estiver contido em fragmento EcoRI de 30.000pb, ele nªo pode- rÆ ser clonado em fago lambda (tamanho mÆxi- mo 23.000pb). Certamente, dentro deste fragmento existem muitos sítios para Sau3AI, que podem ser utilizados para gerar fragmentos de tamanho adequado para clonagem em fago lambda atravØs de digestªo parcial com Sau3AI. Após a inserçªo dos fragmentos de DNA em um vetor apropriado, o material a ser clonado Ø introduzido e propagado em bactØrias ou em le- veduras no caso dos YACs. Como foi discutido anteriormente, a introduçªo do material a ser clo- nado Ø uma etapa crucial na construçªo de geno- tecas de um dado organismo, existindo vÆrios protocolos de transformaçªo (plasmídeos, BACs, YACs, fago filamentoso M13) e encapsidaçªo in vitro (fago lambda, cosmídeo) que permitem a constituiçªo de genotecas representativas. Para que uma genoteca de DNA genômico de um dado mamífero (por exemplo, o homem) construída em fago lambda seja representativa sªo necessÆrios 810.000 fagos recombinantes contendo fragmentos de DNA humano de cer- ca de 17.000pb. Em uma genoteca deste porte, a probabilidade de se detectar um gene qual- quer Ø maior que 99%. Os fagos citados aqui podem ser estocados em um pequeno tubo de ensaio em um volume menor do que 0,5ml. De certa maneira, o DNA recombinante permite que o patrimônio hereditÆrio do homem seja estocado em um tubo de ensaio, o qual pode ser conservado por muitos anos na geladeira. Construçªo de Bibliotecas de cDNA As bibliotecas de cDNA contŒm fragmentos de DNA copiados pela transcriptase reversa ten- do como molde as molØculas de RNAm. Desta maneira, em uma genoteca de cDNA estªo re- presentados apenas os genes que codificam para proteínas e que estªo sendo expressos na cØlula ou tecido do qual o RNAm foi extraído. A geno- teca de cDNA pode ser a opçªo mais correta quando se quer clonar um gene que codifica uma dada proteína, visando estudar-se a seqüŒncia de aminoÆcidos desta proteína, seus efeitos bio- lógicos, produçªo em larga escala etc. A primeira etapa da construçªo de uma ge- noteca de cDNA consiste na extraçªo do RNAm da cØlula ou do tecido desejado, utilizando-se mØtodos em que o material biológico Ø lisado na presença de substâncias denaturantes de proteí- nas, como fenol, clorofórmio, isotiocianato de guanidina, detergentes, etc. A seguir, o RNAm Ø separado dos outros RNAs (tRNA, rRNA, etc.) atravØs de cromatografia em uma coluna de oli- go (dT)-celulose, ou seja, uma resina contendo celulose acoplada a resíduos de oligo (dT) (nu- cleotídeo desoxi-timidina) (Fig. 2.13). Os RNAm possuem na extremidade 3’ uma cauda conten- do muitos resíduos do nucleotídeo adenina, a qual Ø denominada cauda poli-A. Desta manei- ra, quando o RNA celular Ø cromatografadona resina de oligo (dT), as caudas de poli-A pre- sentes nos RNAm hibridam-se com os resíduos de T, separando os RNAm dos outros RNAs ce- lulares. Os RNAm sªo eluídos da coluna, cons- tituindo uma fraçªo enriquecida em RNAm denominada RNA poliadenilado. As etapas de síntese e clonagem do cDNA estªo esquematizadas nas Figs. 2.13 a 2.15. A preparaçªo contendo o RNA poliadenilado (RNAm) Ø usada para a síntese do cDNA sim- ples fita em uma reaçªo catalasida pela trans- criptase reversa. Oligonuclucleotídeos sintØticos contendo resíduos de timina [oligo (dT)] sªo utilizados como iniciadores ou primers para a síntese do cDNA simples fita (Fig. 2.14). Eles hibridam com os resíduos da cauda poli-A dos RNAm, servindo como primer para a açªo da enzima transcriptase reversa. O cDNA simples fita mantØm-se ligado à molØcula de RNAm origi- nando um híbrido RNAm/cDNA. Esse híbrido Ø o substrato de uma enzima denominada RNase H, a qual digere especificamente o RNAm. A RNa- se H nªo digere totalmente o RNAm, deixando pequenas regiıes intactas, as quais servirªo de primers para a síntese da segunda fita de cDNA. A segunda fita do cDNA Ø catalisada pela DNA polimerase, utilizando os primers origina- dos acima. Deve-se salientar que existem outras alternativas de geraçªo de primers para a síntese da segunda fita, como a utilizaçªo de uma mis- tura de hexanucleotídeos aleatórios (contendo todas as combinaçıes possíveis entre os nucleo- tídeos) ou a utilizaçªo regiªo de dupla fita em forma de grampo situada na extremidade da fita de cDNA. A segunda fita tambØm pode ser sin- tetizada via PCR, utilizando-se a Taq DNA po- 48 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 limerase e oligonucleotídeos. Essa alternativa Ø utilizada para fins específicos e serÆ discutida no final deste capítulo. O cDNA dupla fita Ø incubado com enzi- mas que reparam as suas extremidades (por exemplo, T4 DNA polimerase) e, a seguir, adi- ciona-se às suas extremidades oligonucleotídeos sintØticos contendo sítios de enzimas de restri- çªo compatíveis com os sítios de restriçªo exis- tentes no vetor (plasmídeo ou fago) a ser utilizado na clonagem. Estes oligonucleotídeos podem ser de dois tipos: linkers ou adaptadores. Os adaptadores nªo necessitam ser digeridos com enzimas de restriçªo, pois jÆ apresentam extre- midades coesivas. Na etapa seguinte, as molØculas de cDNA sªo inseridas no sítio de clonagem do vetor (plasmídeo ou fago) e propagadas em bactØrias (Fig. 2.15), como visto no item anterior. O iso- lamento dos clones recombinantes serÆ descrito no item a seguir. Isolamento de Clones Recombinantes em Bibliotecas de cDNA ou Genômicas As estratØgias de isolamento de clones re- combinantes sªo essencialmente as mesmas, quer tratar-se de uma biblioteca de cDNA ou genô- mica. Algumas delas serªo discutidas a seguir. Isolamento de Clones Recombinantes com Sondas Radioativas atravØs de Hibridaçªo de `cidos NuclØicos Entende-se por sonda uma seqüŒncia de DNA ou um oligonucleotídeo utilizado para o isolamento de um gene de interesse (Fig. 2.16A). Se existe alguma informaçªo sobre a seqüŒncia de nucleotídeos do gene de interesse, pode-se sintetizar oligonucleotídeos com base na seqüŒn- cia de nucleotídeos conhecida e utilizar esses oli- gonucleotídeos marcados radioativamente no rastreamento das genotecas. Como muitos ge- nes sªo razoavelmente conservados na escala evolutiva, pode-se isolar um dado gene de uma espØcie conhecendo-se a seqüŒncia de nucleotí- deos do gene homólogo de outra espØcie. Existem situaçıes em que se dispıe da pro- teína purificada, mas nada se sabe sobre a se- qüŒncia de nucleotídeos do gene que a codifica. A seqüŒncia de aminoÆcidos de alguns fragmen- tos desta proteína pode ser obtida atravØs das tØcnicas de microsseqüenciamento. Conhecida a seqüŒncia de aminoÆcidos pode-se predizer a seqüŒncia de nucleotídeos que codifica esses ami- noÆcidos e, conseqüentemente, sintetizar os oli- gonucleotídeos correspondentes. As genotecas sªo plaqueadas em placas de Petri contendo agar sólido nutritivo. As colônias (no caso dos plasmídeos, cosmídeos, fagos M13, YACs, BACs) ou placas de lise (fago lambda) presentes na placa de Petri sªo utilizadas para gerar rØplicas em filtros de nitrocelulose ou nÆi- lon. Os filtros, por sua vez, sªo tratados com soluçıes adequadas e hibridados com a sonda radioativa. Após a hibridaçªo, os filtros sªo expostos em filmes de raios X e revelados. Os clones recombinantes contendo seqüŒncias ho- mólogas à sonda utilizada vªo formar híbridos radioativos, os quais vªo originar um sinal posi- tivo no filme de raios X, permitindo sua identifi- caçªo e isolamento (Fig. 2.16A). O Gene de Interesse Expressa uma Proteína Contra a Qual se Tem Anticorpos ou uma Proteína que Possui Alguma Atividade Biológica (Enzima, Hormônio, etc.) Neste caso, a biblioteca deve ser cons- truída em um vetor de expressªo (fago lambda ou plasmídeo), o qual permite a clonagem e a expressªo do gene de interesse. O vetor de ex- pressªo possui um gene que codifica uma pro- teína, em geral bacteriana, o qual estÆ sob o controle de uma regiªo denominada promotor. A expressªo da proteína depende da ativaçªo do promotor. O artifício consiste em inserir-se o gene de interesse em um sítio localizado den- tro do gene que codifica a proteína acima. Neste caso, quando o promotor Ø ativado tem-se a produçªo de uma proteína híbrida ou de fusªo, a qual contØm parte da proteína que estava sob o comando do promotor mais a proteína que se deseja clonar e expressar. A estratØgia mais utilizada Ø gerar anticor- pos contra a proteína que se deseja clonar e utilizÆ-los em um rastreamento imunológico das 49 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 Fig. 2.14 Síntese de cDNA. Síntese de cDNA (cDNA simples fita) pela transcriptase reversa utilizando-se oligo dT como primer e o RNAm poli-A como molde. Degradaçªo do RNAm molde com Rnase H gerando primers para a síntese da segunda fita do cDNA. Síntese do cDNA dupla fita com a enzima DNA polimerase. genotecas. O procedimento Ø semelhante ao descrito no item anterior. As bibliotecas sªo pla- queadas, rØplicas de nitrocelulose contendo os clones recombinantes, sªo preparadas e incu- badas com os anticorpos dirigidos contra a pro- teína de interesse. A seguir, utilizam-se tØcnicas comuns de detecçªo de complexo antígeno-an- ticorpo, como por exemplo, conjugados liga- dos a peroxidase (Fig. 2.16B). Após a revelaçªo, as bactØrias produtoras da proteína de interes- se sªo identificadas e isoladas. Se a proteína de interesse tem alguma ativi- dade biológica, por exemplo enzimÆtica, pode- se montar um ensaio para detecçªo da atividade desta enzima tal como se procedeu no rastrea- mento imunológico. Evidentemente, existem muitas outras alternativas de isolamento de clo- nes recombinantes. As citadas nos itens anterio- res sªo as mais comuns. Isolamento de Clones Recombinantes atravØs de PCR Quando a seqüŒncia de nucleotídeos de um gene Ø parcial ou totalmente conhecida pode-se gerar oligonucleotídeos baseados nestas seqüŒn- cias, os quais serªo utilizados como primers em reaçıes de PCR (Polymerase Chain Reaction). Esta estratØgia tem sido muito utilizada no iso- lamento de recombinantes. Amostras contendo quantidades mínimas de DNA dos clones recom- binantes sªo desnaturadas, incubadas com primersespecíficos para o gene de interesse e amplificadas atravØs da Taq DNA polimerase. O material Ø analisado atravØs de eletroforese em gel de agarose e hibridaçªo. Muitas vezes, o pro- duto da reaçªo de PCR Ø clonado em um vetor apropriado e seqüenciado, para confirmar-se se realmente ele tem a seqüŒncia de nucleotídeos do gene de interesse. RNAm 5’ 3’ Anelamento oligo (dT) 3’ 5’3’ 5’ Extensão Transcriptase reversa híbrido RNA/DNA RNAm cDNA“primers” RNA Degradação do molde Rnase H cDNA cDNA Síntese da segunda fita DNA polimerase I + dNTPs + DNA ligase cDNA dupla fita AAAAAA TTTTTTTT AAAAAA TTTTTTT AAAAA TTTTTT 50 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 2 Fig. 2.15 Clonagem de cDNA em fago lambda l gt10. Linkers EcoRI sªo adicionados às extremidades das molØculas de cDNA dupla fita pela enzima DNA ligase. A seguir, as molØculas de cDNA e do vetor l gt10 sªo digeridas com a enzima de restriçªo EcoRI gerando extremidades compatíveis. Vetor e inserto sªo ligados entre si pela DNA ligase gerando uma longa molØcula de DNA (concatamero linear). No processo de encapsidaçªo (geraçªo de partículas fÆgicas), uma molØcu- la recombinante (DNA do fago + inserto) Ø introduzida em uma partícula fÆgica ou um vírus. CLONAGEM DE UM GENE ATRAVÉS DE PCR O desenvolvimento e o aprimoramento da tecnologia de PCR permitiram o desenvolvimen- to de novos protocolos de clonagem de um dado gene ou de algumas regiıes do mesmo. Para tanto Ø necessÆrio ter informaçıes sobre a se- qüŒncia de nucleotídeos do gene de interesse. Oli- gonucleotídeos correspondentes a regiıes conhecidas do gene sªo usadas no processo de amplificaçªo por PCR. Em geral, regiıes de 100pb atØ 5.000pb podem ser amplificadas por PCR. A amplificaçªo pode ser feita utilizando-se o DNA genômico ou cDNA. Amostras conten- do algumas nanogramas de DNA podem ser uti- lizadas para amplificaçªo de um gene de inte- resse. Após a reaçªo de PCR, a banda amplificada correspondente ao gene Ø clonada em um plas- mídeo ou fago filamentoso, tal como descrito nos itens anteriores. Deve-se salientar que o PCR Ø adequado para se clonar um gene especificamen- te, mas nªo para gerar genotecas representati- vas de todos os genes do organismo. É muito comum utilizar-se o PCR para iso- lar uma regiªo do gene, a qual Ø posteriormen- te utilizada como sonda para o isolamento do gene completo em uma biblioteca de cDNA ou genômica. Eco RI cDNA Eco RI metilaseMe Me DNA ligase Me Me Me Eco RI Adaptadores Eco RI Extremidades coesivas Me Adaptadores ligados Ligação Sítio cos l gt10 Eco RI Eco RI Sítio cos Sítio cos anelado Empacotamento da partícula fágica in vitro Sem inserto cDNA DNA de fago recombinante E. coli infectada Tapete bacteriano Placa de fago A T A T A T A T A T G C A T C G G C A T T A T A C G G C A T A T A T A T A T A T A T A T A T A T A T A T A T A T A T G C C G TA A T T T A A G C A T A T C G T A T A C G G C T T A A A A T T C G 51 PRINC˝PIOS DA BIOLOGIA MOLECULAR DO GENE Cap. 2 BIBLIOGRAFIA 1. Darnell J, Lodish H, Baltimore D. Molecular Cell Biology, Scientific American Books, New York, 1986. 2. Farah SB. DNA: Segredos e MistØrios. Editora Sarvier, S. Paulo, Brasil, 1997. 3. Innis MA, Gelfand DH, Sninsky JJ, White TJ. PCR Protocols: a guide to methods and applications, Academic Press, New York, 1990. 4. Lewin B. Genes V, Oxford University Press, Oxford, 1994. Fig. 2.16 Isolamento de clones recombinantes. A) Rastreamento com sondas genØticas radioativas e B) Imunosseleçªo com anticorpos específicos. 5. Maniatis T, Fritsch EF, Sambrook. Molecular Cloning: A Laboratory Manual, Cold Spring Harbor, Segunda Ediçªo, 1989. 6. Watson JD, Hopkins NH, Roberts JW, Steitz JA, Wriner AM. Molecular Biology of the Gene, 4th Edition, The Benjamin/Cummings Publishing Company, Menlo Park, California, Volumes 1 and 2, 1987. 7. Watson JD, Gilman M, Witkowski J, Zoller M. Recombinant DNA. 2nd ed. W.H. Freeman and Company, Scientific American Books, New York, 1992. 8. White BA. PCR Protocols: Current methods and application, Methods in Molecular Biology, 15:1, 1993. A) Rastreamento com sonda radioativa Genoteca (colônias de bactérias contendo diferentes fragmentos de DNA eucariótico) Sonda DNA genômico marcado com 32p Hibridação Detecção por auto-radiografia filme de Raio X Clone Isolamento do fago recombinante Placa original (mãe) B) Imuno seleçªo de fagos recombinantes Detecção de clones recombinantes com imunoglobulinas acopladas à peroxidase Carimbo da placa em filtro Rastreamento como soro contendo anticorpo de interesse
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