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Apostila Sociologia Juridica Prof Guilherme Andrade [2015 02] Copia

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Sociologia Jurídica 
[01] Conceito Sociológico do Direito 
(1) Sociologia Jurídica: Direito & Sociedade 
Sem decidir de forma taxativa, podemos nos contentar com uma definição simples e geral da sociologia jurídica, que exprime a relação "interativa" entre o social e o jurídico: 
.A sociologia jurídica examina a influência dos fatores sociais sobre o direito e as incidências deste último na sociedade, ou seja, os elementos de interdependência entre o social e o jurídico, realizando uma leitura externa do sistema jurídico. 
Em outras palavras, a sociologia jurídica examina as causas (sociais) e os efeitos (sociais) das normas jurídicas. Objeto de análise é a "realidade jurídica", na tentativa de responder três questões fundamentais: 
- Por que se cria uma norma ou um inteiro sistema jurídico? 
- Quais são as consequências do direito na vida social? 
- Quais são as causas sociais da "decadência" do direito, que se manifesta por meio do desuso e da abolição de certas normas ou mesmo mediante a extinção de determinado sistema jurídico? 
Portanto, o jurista sociólogo examina as relações entre o direito e a sociedade em três momentos: a produção, a aplicação e a decadência da norma. 
Desta definição resulta que o jurista-sociólogo observa o direito "de fora" (uma leitura externa), examinando as relações entre direito e sociedade. Seu objeto de análise é o modo de atuação do direito na sociedade, ou seja, o exame das relações recíprocas entre o sistema social global e o subsistema jurídico. Ele analisa o relacionamento do direito com o meio social, para conhecer as funções do direito dentro da sociedade. 
Olhar o direito "de fora", não significa que o pesquisador seja livre ou neutro e que se encontre desvinculado de qualquer instituição e sistema teórico. Quando se diz que a abordagem sociológica observa o direito "de fora", isto quer dizer que o pesquisador procura olhar o direito, abandonando por um momento a ótica do jurista, e colocando-se numa outra perspectiva, que pode ser a política, a econômica, a social, dependendo do tipo de análise que ele está fazendo. 
Desta forma, o jurista-sociólogo desvincula-se da dogmática jurídica, apesar de permanecer ligado ao direito. A diferença está no fato que a sociologia do direito utiliza conceitos próprios da sociologia, fazendo uma diferente leitura do sistema jurídico. O jurista-sociólogo interessa-se por interpretar as relações das normas jurídicas com a estrutura social. O intérprete do direito objetiva, ao contrário, interpretar o sentido das normas de per si e busca soluções de casos concretos (concretização da norma jurídica). 
(2) A Tridimensionalidade do Direito 
O nosso exemplo nos permite tirar duas conclusões com relação ao papel da sociologia jurídica e do seu campo de ação. Em primeiro lugar, a sociologia jurídica não se interessa pelo estudo da justificação do direito. A análise de seus fundamentos (razão, idéia de justiça, moral, vontade da classe dominante, racionalização) é pertinente à filosofia do direito. 
Em segundo lugar, a sociologia jurídica não realiza análises normativas, isto é, não se ocupa do problema da validade e da interpretação do direito. A validade é objeto de análise dos teóricos do direito positivo, que elaboram os critérios da norma válida (como é o caso de Kelsen). Estes teóricos examinam também o tema da interpretação jurídica, que interessa particularmente aos assim chamados operadores do direito (também denominados de atores jurídicos ou agentes do direito). 
Pode-se afirmar que o sistema jurídico tem três dimensões, ou que pode ser abordado sob três pontos de vista: o da justiça, o da validade, o da eficácia. Trata-se da teoria "tridimensional" do direito (desenvolvida, entre outros, pelo jurista Miguel Reale) 
A questão da justiça interessa aos filósofos do direito, que examinam a assim chamada idealidade do direito: a justificação do sistema jurídico atual, a busca dos melhores princípios de organização social, as relações entre direito e moral, as relações e entre normas positivas e normas ideais de justiça, as relações entre o direito e a "verdade". 
A análise das normas formalmente válidas, ou seja, o estudo "interno" do direito positivo, interessa ao "dogmático" ou intérprete do direito: identificar as normas válidas, buscar o sentido de cada elemento do ordenamento jurídico, solucionar os problemas de conflito entre normas, bem como adaptá-las aos problemas concretos. Neste caso, o objeto do conhecimento é a normatividade do direito. 
A terceira dimensão refere-se à eficácia das normas jurídicas e corresponde ao campo de análise do sociólogo do direito. Tomando como objeto de conhecimento a vida jurídica, este examina a facticidade do direito, isto é, a "realidade social do direito". A sociologia jurídica elabora uma teoria sociológica dos fenômenos jurídicos, sem interessar-se pelas questões técnicas da interpretação do direito nem pelos "ideais jurídicos". 
Assim, podemos entender porque a sociologia jurídica considera o direito como fato social e porque a perspectiva do sociólogo é diferente daquela do filósofo e do intérprete do direito. Somente a sociologia jurídica examina sistematicamente a aplicação prática, ou seja, a eficácia do direito. Isto constitui o principal traço distintivo do seu trabalho. 
Contudo, não podemos esquecer que estas três dimensões do conhecimento jurídico estão relacionadas entre si. Por exemplo, se a sociedade considera que uma lei é injusta, esta provavelmente será revogada. Ou, em todo caso, permanecerá sem efeitos práticos, será ineficaz. Desta forma, o intérprete do direito não pode ignorar que a falta de legitimação de uma lei em vigor pode levar à sua revogação ou à sua ineficácia. Nesse sentido, um exemplo concreto constitui a abolição do delito de adultério em 2005. Por outro lado, o sociólogo e o filósofo do direito não são indiferentes ao tema da interpretação do direito positivo, já que devem conhecer o conteúdo das normas em vigor para poder analisar a realidade e a idealidade do direito. Assim sendo, o sociólogo do direito não trabalha ignorando as análises dos filósofos e dos intérpretes do direito. Podemos mesmo falar de uma complementaridade das três dimensões do conhecimento jurídico. 
Recapitulando: depois de estabelecido o fundamento e o conteúdo de cada sistema normativo, entra em ação a terceira dimensão do direito, a sociologia jurídica, que analisa o impacto do sistema normativo na sociedade. Tomem-se, como exemplo, as leis sobre a família que se encontram no Código Civil. O intérprete trabalhará com as normas, indicando, por exemplo, quais são as condições para contrair matrimônio, segundo o Código Civil. O filósofo do direito analisará a justificação e as conseqüências morais e políticas da instituição do matrimônio. Neste contexto, tentará oferecer uma avaliação do significado do matrimônio, tal como é configurado pelo direito em vigor. O sociólogo do direito vai examinar o impacto social das previsões legais com relação ao casamento, podendo dedicar-se, por exemplo, à análise do grau de conhecimento e de aceitação destas normas pela população. O jurista-sociólogo percebe que a lei tem a capacidade de influenciar, condicionar e inclusive transformar o comportamento da população. Neste sentido, a sociologia jurídica concede, como já vimos, uma particular atenção ao tema da eficácia e dos efeitos sociais do direito. 
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(3) As Normas Jurídicas 
O direito é fato social que se manifesta como uma das realidades observáveis na sociedade. É fenômeno social, assim como a linguagem, a religião, a cultura. O direito tem origem na própria sociedade, nas inter-relações sociais que se destinam a satisfazer necessidades sociais. O direito se faz amplamente presente no meio social, está entrosado com quase tudo que se passa na sociedade, participando das mais simples às mais complexas relações sociais. É difícil praticarmos um ato que nãotenha repercussão no mundo do direito. O direito invade e domina a vida social desde as mais humildes às mais solenes manifestações, quer se trate de relações entre indivíduos, quer entre o indivíduo e o grupo social, como a família e o Estado, quer se trate ainda de relações entre os próprios grupos. 
O conceito de direito apresenta vários sentidos. A etimologia, aqui, pouco nos auxiliará. A palavra "direito", em francês (como em inglês, right; em alemão, Recht; em italiano, diritto, etc.), liga-se a uma metáfora na qual uma figura geométrica assumiu um sentido moral e depois jurídico: o direito é a linha reta, que se opõe à curva, ou à oblíqua, e aparenta-se às noções de retidão, de franqueza, de lealdade nas relações humanas. Vê-se imediatamente que essa acepção não nos pode oferecer mais que uma idéia muito aproximada do conceito. Melhor será examinar o emprego que dele se faz. 
O direito está ligado às idéias de conduta individual e organização social. Ele deve ser entendido como um conjunto de normas de conduta que disciplinam as relações sociais. O mundo do direito é o mundo das relações entre os homens, pois na conjugação desses dois elementos - a sociedade e o indivíduo - encontramos a sua razão de ser. Não somente as relações que se travam entre o indivíduo e outro indivíduo são objeto do direito, mas também aquelas que se realizam entre o indivíduo versus o grupo, o grupo versus o indivíduo e o grupo versus outro grupo. 
A partir desta visão, podemos tentar formular uma definição sintética do direito. O direito seria então um conjunto de normas de conduta, universais, abstratas, obrigatórias e mutáveis, impostas pelo grupo social, destinadas a disciplinar as relações externas do indivíduo, objetivando prevenir e compor conflitos. Trata-se de normas universais porque se destinam a todos; abstratas porque são elaboradas para casos hipoteticamente considerados; obrigatórias porque são de observância necessária, coercitiva; mutáveis porque sujeitas a constantes transformações; impostas pelo grupo e não somente pelo Estado. 
(3.1) Características da Norma Jurídica 
São características das normas jurídicas: 
(A) Caráter extrínseco - O direito é uma relação inteiramente determinada pela coexistência humana e que se exaure de homem para homem. Cuida pois o direito da disciplina das relações extrínsecas (externas) do homem, cabendo à moral a disciplina de suas relações intrínsecas. 
(B) Caráter universal -Trata-se de normas de conduta que se destinam a todos, aplicáveis a todas as relações abrangíveis pelo seu escopo. Por isso são chamadas normas universais. 
(C) Caráter abstrato - São também abstratas porque não se referem a casos concretos quando de sua elaboração, mas sim a casos hipoteticamente considerados. Assim, quando a norma do Código Penal incrimina a ação de matar, não objetiva concretamente o caso de A matar B, mas sim qualquer hipótese de homicídio. 
(D) Caráter mutável - Para os defensores do direito natural, o direito é um conjunto de princípios permanentes, estáveis e imutáveis (com origem na Divindade ou fruto da razão). Tal concepção, entretanto, não se ajusta ao ponto de vista sociológico, que o considera produto social. Se o direito emana do grupo social, não pode ter maior estabilidade que o grupo. E o grupo, como é sabido, sofre constantes modificações. Se pudéssemos isolar um grupo por um período de dez ou vinte anos, mesmo assim haveríamos de constatar, no fim desse tempo, que o grupo social havia sofrido profundas modificações: os adultos envelheceram, os jovens tomaram-se adultos, as crianças tomaram-se jovens, com concepções e visões diferentes da vida. 
O direito está sujeito a transformações contínuas. O simples confronto com os diferentes sistemas jurídicos do passado ou dos países estrangeiros basta para dar idéia da prodigiosa diversidade das normas de direito aplicadas na superfície do globo. Nas sociedades modernas há uma constante troca de influências recíprocas possibilitada em razão dos modernos meios de transporte e comunicação. Mal um fato ocorre aqui, o outro lado do mundo toma conhecimento quase imediatamente, e vice-versa. O mesmo acontece com hábitos, costumes, moda etc. Evidentemente, as mudanças nos grupos modernos são bem mais rápidas e constantes do que nos grupos primitivos. 
Como pode o direito, sendo originário do grupo, permanecer imutável, quando esse mesmo grupo se modifica constantemente? Mudando o grupo, mudam-se também as normas de direito, razão pela qual, do ponto de vista sociológico, não tem o direito caráter estável ou perpétuo, mas sim essencialmente provisório, sujeito a constantes modificações. 
(E) Caráter obrigatório - Em regra são normas obrigatórias, isto é, de observância necessária. E nem poderia ser diferente, sob pena de o direito não atingir os seus objetivos. Claro está que, se a observância das normas jurídicas fosse facultativa, totalmente inócua se tornaria a disciplina por elas imposta. Seria um tiro sem bala. 
A obrigação é, portanto, elemento fundamental do direito, embora à primeira vista possa parecer paradoxal. Para o público em geral, a palavra direito dá idéia de privilégio, faculdade, regalia, liberdade, ou seja, tudo que é oposto à obrigação. Dizemos "eu tenho direito a isso ou aquilo" para indicar algo· que nos favoreça, e não uma obrigação. Esquecemo-nos entretanto que, na exata medida em que o direito nos confere um benefício, vantagem ou poder, cria uma obrigação ou dever para outrem, e vice-versa. 
Então, a noção do direito está intimamente ligada à noção de obrigação. Até mesmo no campo do direito contratual, onde muitos autores acreditam reinar a "autonomia da vontade" a coisa não é bem assim, pois na realidade também ali essa autonomia move-se dentro de limites extremamente reduzidos. 
Não percebemos que o direito é sobretudo obrigação porque estamos habituados a obedecer a suas normas, a tal ponto que não lhe sentimos quase o peso, da mesma forma que não sentimos certas imposições físicas, como a gravidade. Ocorre também que, em geral e por definição, essas normas correspondem à nossa maneira de pensar e sentir, talo nosso condicionamento social. No momento em que transgredimos qualquer dessas normas, entretanto, tomamos logo consciência da sua obrigatoriedade pois temos então que responder pelas conseqüências. 
(3.2) Direito e Sanção 
O direito dirige-se a seres dotados de liberdade, que agem comandados pela vontade. Como podem as pessoas inobservá-lo, tornou-se necessário estabelecer uma sanção, o meio mais eficaz encontrado pela sociedade para tomar a norma jurídica de observância necessária. A obrigação não pode existir sem sanção. Por isso alguns teóricos chegam a definir o direito como um sistema de sanções. 
Sanção é a ameaça de punição para o transgressor da norma. É a promessa de um mal, consistente em perda ou restrição de determinados bens, assim como na obrigação de reparar o dano causado, para todo aquele que descumprir uma norma de direito. É· a possibilidade de coação da qual a norma é acompanhada. 
Há uma diferença entre sanção e pena. Sanção é a ameaça de castigo para o transgressor da norma e pena já é o próprio castigo imposto. Sanção é a pena abstratamente considerada e pena é a sanção concretizada. A sanção é cominada pelo legislador e a pena é fixada pelo juiz. A sanção exerce uma coerção psicológica sobre os indivíduos, ao passo que a pena exerce uma coação física ou material. 
Essa coerção psicológica, geradora do temor à pena, faz com que a maioria se conduza dentro dos limites do direito. É a chamada prevenção geral, através da qual consegue o direito evitar a ocorrência de inumeráveis conflitos. Tal coação é uma espécie de "força psíquica" do direito, que se dirige à vontade, exercendo constrangimento sobre a consciência. 
Para uma minoria não basta a coação psicológica, acabando por transgredir as normas, na esperança de não ser punida. Para esses destina-se a coaçãofísica ou material. A autoridade pública aplica a pena, empregando o poder coercitivo de que dispõe para punir o responsável pelo ilícito. É o remédio extremo usado contra uma minoria que não observa as normas, no empenho de levá-la a respeitar o direito, livrando a sociedade de sua conduta perniciosa. É a chamada prevenção especial. 
(4) Funções Sociais do Direito 
Partindo-se da natureza essencialmente contextual do direito e das interações necessárias entre os sistemas jurídicos e os diferentes elementos e subsistemas existentes na sociedade, surge uma pergunta: quais são, então, as tarefas que o direito executa para a sociedade? Dito de outro modo, para que serve o direito? Que funções o direito cumpre na sociedade? 
Em última instância, essas perguntas podem levar a um conhecimento mais profundo do que é, de fato, o Direito. A análise funcional do direito é uma forma ou um método de conhecimento do direito. Ela consiste no estudo do direito e de suas instituições por meio de funções que eles cumprem ou deveriam cumprir com relação à sociedade. Esse tipo de análise foi, normalmente, um eixo principal da sociologia do direito. 
Podemos Identificar e analisar algumas funções sociais básicas do Direito: as funções de regulação social, de controle social, de legitimação social, de transformação social e de composição de conflitos. 
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[02] Direito e Composição de Conflitos 
O conflito gera o litígio e este, por sua vez, quebra o equilíbrio e a paz social. A sociedade não tolera o estado litigioso porque necessita de ordem, tranqüilidade, equilíbrio em suas relações. Por isso, tudo faz para evitar ou prevenir o conflito. O direito assume então a função social de prevenir conflitos: efetuando, tanto quanto possível, uma composição dos interesses conflitantes. 
Do ponto de vista do funcionalismo clássico (Parsons) essa função do direito é interpretada estritamente no sentido de resolução do conflito. Isto significa que o direito identifica, organiza e resolve os conflitos que poderiam perturbar o equilíbrio e a ordem social. Se o que caracteriza o sistema social é a coesão social em torno de um determinado número de valores básicos, então o direito tem como missão restabelecer a paz social e o equilíbrio, quando os conflitos de interesse os perturbam. Assim, o conflito existe, mas é sempre produzido sob o controle do sistema jurídico. 
Hoje é possível interpretar diferentemente a função de resolução dos conflitos. Parte-se da premissa de que na sociedade o conflito é permanente, isto é, que a interação social é inerentemente conflituosa. É preciso, então, admitir que o direito não resolve os conflitos (no sentido funcionalista, fazendo o conflito desaparecer do contexto social). A única coisa a que o direito pode aspirar é dar um tratamento jurídico aos possíveis conflitos de interesses antagônicos. Exerce uma função de tratamento de conflitos declarados. O direito oferece ou impõe regras, isto é, modelos de comportamento inerentes à decisão que o conflito sugere e às modalidades segundo as quais essa decisão pode ser adotada. 
O direito na sua função de composição de conflitos age, então, quando a capacidade persuasiva de suas normas reguladoras de comportamento (sua função reguladora) não produz os efeitos esperados. Neste caso, os interesses antagônicos concluíram que não podem chegar a um acordo por si mesmos. Neste caso, o direito propõe normas para conter os conflitos. Ele não busca fazer, radicalmente, que o conflito desapareça, mas faz seu o conflito e propõe um tratamento possível, sempre mantendo-o sob seu controle. 
Em suma, ao jurisdicionar o conflito, o direito oferece àqueles que se encontram numa relação conflituosa, certas possibilidades ou certas perspectivas. Por exemplo, nas relações de trabalho, o direito canaliza o "conflito do trabalho" e assegura sua regulação de maneira particular. O "conflito" em si, entretanto, não desaparece da estrutura social. O direito dele se apropria, no momento em que propõe um "tratamento" possível. O direito não constitui uma ordem de paz, mas vive do e no "conflito". Se os conflitos sociais desaparecessem totalmente, o direito desapareceria também. 
Do ponto de vista sociológico, enfim, deve-se ressaltar como surgiram, nas últimas décadas, instâncias ou sujeitos extra-jurídicos que intervêem na composição da interação conflituosa. Trata-se das chamadas formas "alternativas" de resolução de conflitos, isto é, sujeitos e órgãos que funcionam paralelamente aos órgãos e aos sujeitos que o direito formalmente designou para a resolução jurídica dos conflitos. 
(1) Atividades Cooperativas e Concorrenciais 
As atividades sociais assumem formas múltiplas, econômicas ou não, mas todas elas podem ser reduzidas a dois tipos: atividades de cooperação e atividades de concorrência. 
As atividades de cooperação caracterizam-se pela convergência de interesses. Envolvem fins ou objetivos comuns. Um indivíduo desenvolve uma atividade qualquer, de que o outro diretamente se aproveita, e à medida que se empenha na realização dos seus interesses, coopera na realização dos interesses dos outros. Exemplo de atividade de cooperação é a do vendedor e a do comprador: o vendedor tem mercadorias para vender e o comprador tem interesse em adquiri-las, necessita delas. Os interesses dos dois convergem para um ponto comum, cooperando assim cada qual na realização do interesse do outro. 
O mesmo se diga do indivíduo que tem um prédio e, não precisando usá-lo para sua própria moradia ou instalação, propõe-se a ceder seu uso ti outrem, mediante o pagamento de aluguel. Outro indivíduo, por sua vez, necessitando de um prédio para morar, já que não o possui, propõe-se a pagar o aluguel pretendido pelo locador. Há reciprocidade de interesses entre o locador e o locatário, de sorte que, à medida que cada qual desenvolve sua atividade, coopera na realização do interesse do outro. O médico, o advogado e outros profissionais liberais desenvolvem este tipo de atividade em relação aos seus clientes. 
Há paralelismo nas atividades de concorrência, pois não convergem para um interesse comum. Nelas, dois indivíduos, embora tenham objetivos idênticos, desenvolvem atividades independentes, paralelas, que os colocam, um em relação ao outro, em posição de competidor ou concorrente. Dois comerciantes, estabelecidos na mesma rua e no mesmo ramo de comércio, dão-nos um exemplo de atividade de concorrência: eles poderão explorar seu comércio indefinidamente sem entrar em choque, ainda que concorram entre si. Outro exemplo encontramos em dois proprietários de prédios vizinhos: cada um pode usar sua propriedade como quiser, sem a interferência ou colaboração do outro. São concorrentes, no sentido de que perseguem, independentemente, fins semelhantes. 
Tanto nas atividades de cooperação como nas de concorrência podem ocorrer conflitos de interesses. Na atividade de cooperação, por exemplo, após pagar o preço e receber a mercadoria, verifica o comprador que há algum defeito que impede ou prejudica seu uso. Procura então o vendedor para devolver o material e receber de volta o valor pago, ou para obter outra mercadoria em perfeito estado, mas este se recusa a atendê-lo. Nesse momento rompe-se o perfeito equilíbrio que deveria haver na atividade de cooperação, e surge o conflito. 
Pensemos agora no caso do inquilino que, após firmar contrato de locação e alojar-se no imóvel, recusa-se apagar os aluguéis convencionados, a despeito de insistentemente procurado pelo locador. Estará rompida a convergência de interesses existente no momento da celebração do contrato e, a partir de então, ambos estarão em conflito. 
Conflitos surgem igualmente nas atividades de concorrência, quando as partes vão além daquilo que lhes é lícito fazer no campo do seu próprio interesse. Aqueles dois comerciantes, estabelecidos na mesma rua com o mesmo gênero de comércio, enquanto não transpuserem os limites daqui 10 que lhes é lícito,apesar de concorrentes, continuarão em harmonia. Pode um deles até vender mais barato que o outro, ou oferecer melhores produtos, e com isso ganhar a clientela do outro. No momento porém em que o comerciante A resolver fazer uma concorrência indevida ou desleal ao comerciante B, dizendo, por exemplo, que seus produtos são de baixa qualidade, que a sua honestidade é questionável etc., estaremos diante de um conflito de atividades de concorrência. 
Lembram-se dos proprietários de prédios vizinhos? Vimos que cada um pode usar seu imóvel como melhor lhe parecer: residir nele, alugá-lo, instalar-se comercialmente etc. Suponhamos por exemplo que o proprietário do imóvel A nele instale uma fábrica que solta fumaça e fuligem, e o proprietário do imóvel B aí se estabeleça com uma lavanderia. Entre esses dois estabelecimentos comerciais, ambos situados num bairro industrial e exercendo atividades lícitas, surge um conflito. Se o proprietário do imóvel A mantiver em funcionamento sua fábrica, a lavanderia do imóvel B não poderá funcionar. 
Consideremos, por último, o caso de dois condôminos residentes no mesmo prédio, um no andar imediatamente superior ao do outro (p.ex., apartamentos 204 e 304). Cada qual poderá também usar seu imóvel como bem lhe convier. Um belo dia, entretanto, o imóvel do andar superior começa a apresentar vazamento no imóvel inferior: umedece as paredes, danifica os móveis, prejudica o conforto dos que nele residem. O condômino prejudicado procura o proprietário do imóvel superior por várias vezes, coloca-o a par da situação, solicita-lhe uma providência, mas este, embora prometa resolver o problema, na verdade nada faz. Este tipo de conflito, muito constante nas grandes cidades, onde há uma infinidade de condomínios, é característico da atividade de concorrência. 
Todos os conflitos que podem surgir na vida social são redutíveis a um desses tipos: conflitos de cooperação, os que ocorrem na atividade de cooperação, e conflitos de concorrência, os que se verificam na atividade de concorrência. O que determina a natureza do conflito é a natureza da atividade. 
(2) A Função Compositiva do Direito 
A observância das normas previne muitas ocorrências. Porém o conflito, lamentavelmente, é inevitável, porque nem todos na sociedade submetem-se à disciplina imposta pelo direito. Aqui é um vendedor que recebe o preço mas não quer entregar a coisa, acolá, um locatário que não quer pagar o aluguel e assim por diante. Até mesmo na família, vejam só, o menor e mais forte grupo social, os membros ligados por vínculos de afeição, de sangue, com inúmeras normas de direito disciplinando as relações dos cônjuges, pais, filhos, etc., todas objetivando prevenir conflitos, estes acabam por ocorrer. E como ocorrem! Basta entrar numa Vara de Família para se ter consciência dos conflitos que estão ocorrendo no lar. 
Pois bem: surgindo o conflito, há que solucioná-lo. A sociedade reclama que as coisas sejam repostas num ponto de equilíbrio em que possam permanecer. Intermediando o conflito de interesses surge o direito em sua função social de composição de conflitos. Não se trata de fazer desaparecer o conflito, porque isso, como já vimos, é impossível. Não se pode evitar o conflito, por mais que se procure preveni-lo. A maneira de solucionar o conflito é, então, colocar os dois interesses em antagonismo na balança, e determinar qual o que deve prevalecer e qual o que deve ser reprimido. Esse é o sentido de toda composição. 
(2.1) A Composição Voluntária 
O critério da composição voluntária é aquele que se estabelece pelo mútuo acordo das partes. Em surgindo o conflito, as partes discutem entre si e o resolvem da melhor maneira possível, quase sempre atentando para os próprios deveres e obrigações estatuídos pelas normas do direito. a estudante, por exemplo, entra numa livraria e compra um livro. Ao chegar em casa observa que faltam-lhe algumas páginas; volta à livraria, reclama ao vendedor e este, imediatamente, substitui o livro defeituoso por outro perfeito. Houve um conflito de interesses - resolvido por meio da composição voluntária. 
(2.2) A Composição Autoritária 
Por esse critério, cabe ao chefe do grupo (Rei, Cacique, Senhor) o poder de compor os conflitos de interesses que ocorrem entre os indivíduos que se encontram sob sua autoridade. Normalmente a autoridade lança mão do seu foro íntimo, do próprio senso de Justiça, daquilo que a consciência lhe inspira, para desempenhar a tarefa de compor conflitos. 
Muito difundido nas sociedades antigas, alguns casos de composição segundo este critério tomaram-se famosos. É o caso da famosa justiça salomônica e na célebre fórmula usada pelo Rei para resolver um conflito entre duas mulheres que disputavam a mesma criança. Ambas reclamavam-na como filho. O Rei Salomão mandou trazer uma espada com a qual, disse, iria cortar a criança ao meio, dando uma metade para cada mulher. Assim pôde constatar qual era a mãe verdadeira - aquela que imediatamente se opôs à idéia, preferindo que seu filho, vivo, fosse entregue à falsa mãe. Foi uma solução tirada por Salomão do seu foro íntimo e que, no caso, bem solucionou o conflito. 
Na sociedade de hoje o critério autoritário é ainda utilizado no meio familiar. O chefe da família muitas vezes tem de resolver os conflitos de interesses que surgem entre os seus membros, filhos, parentes, empregados, etc., lançando mão de soluções que vai buscar em seu foro íntimo. 
Estes dois critérios, entretanto, são imperfeitos e insuficientes para resolver conflitos de interesses que surgem nas sociedades complexas. É aí que se apresenta o terceiro critério de composição, justamente aquele que mais nos interessa. 
(2.3) A Composição Jurídica 
A composição jurídica é sempre feita mediante um critério elaborado e enunciado anteriormente, e aplicável a todos os casos que ocorrerem a partir de então. São pois características do critério jurídico a anterioridade, a publicidade e a universalidade. 
(a) A anterioridade - É o traço característico e fundamental da composição jurídica, e implica em dizer que o critério aplicado preexiste ao conflito. Deve ter sido elaborado antes para poder ser aplicado ao conflito que ocorrer depois. Graças à anterioridade, saímos do domínio do puro autoritarismo e entramos no domínio do direito. 
(B) A publicidade - Não basta, na composição jurídica, que o critério tenha sido elaborado antes do conflito. É preciso também que o critério tenha sido anunciado, revelado, declarado pela autoridade que o elaborou; é necessário que se dê conhecimento do critério antes ele sua aplicação. É jurídica somente a composição que obedece a um critério anteriormente elaborado e também previamente dado à publicidade, tornando-o conhecido. 
(c) A universalidade - Entende-se que o critério jurídico nunca pode ser cominado apenas para um determinado caso concreto, mas sim para todos os casos que se apresentarem com o mesmo tipo. Quer isto dizer que todos os conflitos idênticos que surgirem após a elaboração e divulgação do critério deverão se compor pelo mesmo critério, pois isto implica a universalidade. Alguns autores preferem falar em generalidade em lugar de universalidade, muito embora este último termo seja mais usado. 
Em suma, para que a composição seja jurídica, tem que ser realizada através de um critério anteriormente estabelecido e perfeitamente enunciado para conhecimento de todos, que atenda à universalidade dos casos que se apresentarem dentro do mesmo tipo. 
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[03] Direito e Regulação Social 
(1) A Função de Regulação Social 
A função de regulação social pode ser considerada uma função de tipo organizacional, já que sua finalidade última é, precisamente, a organização da vida social. Nesta função, o princípio organizador do direito estimula o comportamento jurídico, influenciando os hábitos dos indivíduos, suas atitudes e suas expectativas, e com isso evitando os conflitos. Ele orienta seu comportamentono sentido proposto pelos modelos normativos do sistema jurídico. 
A possibilidade de regulação social deriva diretamente do caráter persuasivo das normas jurídicas. Estas têm o poder de influenciar, condicional e persuadir os membros de um grupo social. Esta função permite conduzir uma multidão de pessoas relativamente independentes em direção à execução de um certo número de modelos de comportamento relativamente coerentes e universais. Modelos capazes de sugerir decisões quanto a todo dilema de comportamento que possa se apresentar ao longo da interação social. Nessa função, o direito estrutura-se como instrumento de persuasão e consenso social. 
A função de orientação social é exercitada por meio de modelos normativos gerais, abstratos, universais e coerentes. Para o cumprimento dessa função, o direito assegura a estabilidade nos modelos normativos. Oferece segurança jurídica, na medida em que os atores sociais podem conhecer e prever os efeitos de seu próprio comportamento e do comportamento dos outros, e planejar, assim, sua interação social. Trata-se da possibilidade de "calcular e prever" que o sistema jurídico fornece aos indivíduos em sua ação social. Em sua ação reguladora o direito corporifica quatro princípios formais da justiça, a saber: a idéia de reciprocidade, a idéia de duração, a idéia de definição dos papéis sociais e a idéia do equilíbrio dos interesses. 
Muita gente acredita que o direito tem um caráter essencialmente repressivo, mas na realidade assim não é. O direito existe muito mais para prevenir do que para corrigir, muito mais para evitar que os conflitos ocorram do que para compô-los. O direito previne conflitos através de um conveniente disciplinamento social, estabelecendo regras de conduta na sociedade. À medida que cada um respeitar o disciplinamento estabelecido pelo direito, evitará entrar em conflito com outrem na sociedade. 
As normas jurídicas atendem a uma importante necessidade social. Sem essas normas de conduta, os conflitos seriam tão freqüentes de modo a tornar impossível a vida em coletividade. Se o indivíduo vivesse só, isolado, não necessitaria de regras de conduta, pois poderia viver e fazer o que bem entendesse. Vivendo porém em grupo precisa limitar-se, comportar-se, respeitar direitos e interesses dos outros. Quanto maior o relacionamento, quanto mais complexas as relações sociais, maior será a possibilidade de conflito, e, portanto, maior também a necessidade de disciplina e organização. 
(2) A Eficácia do Direito 
O tema da eficácia do direito constitui um dos principais objetos da sociologia jurídica. Sobre a definição e as dimensões da eficácia da lei constatam-se grandes controvérsias entre os sociólogos do direito, existindo inclusive variações terminológicas. Fala-se assim em "eficácia", "eficácia social", "efetividade" e "eficiência" do direito, dando a estes termos variadas definições, que indicam as diferentes concepções do fenômeno. Resumidamente, podemos adotar três perspectivas na análise das repercussões sociais de uma norma jurídica. 
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(2.1) A Eficácia da Norma 
A eficácia é o grau de cumprimento da norma dentro da prática social. Uma norma é considerada socialmente eficaz quando é respeitada por seus destinatários ou quando a sua violação é efetivamente punida pelo Estado. Nos dois casos a previsão normativa é respeitada: seja de forma espontânea, seja através de uma intervenção coercitiva ou punitiva do Estado. 
Podemos denominar a eficácia que resulta do respeito espontâneo da norma de eficácia do preceito (ou primária). A eficácia que resulta da intervenção repressiva do Estado pode ser qualificada como eficácia da sanção (ou secundária). Suponha, por exemplo, que 30% dos condutores não respeita o limite de velocidade nas estradas brasileiras. Se todos estes forem identificados e punidos, é possível afirmar que a norma que limita a velocidade é plenamente eficaz: o preceito teve eficácia para 70% dos motoristas, enquanto a sanção teve eficácia para 30% deles. 
Entende-se facilmente que, na realidade, as normas jurídicas nunca são plenamente eficazes. Por mais que as autoridades de um Estado se empenhem em descobrir e punir todas as violações de normas, sempre há casos de transgressão que permanecem impunes. A eficácia indica a distância entre o direito "nos livros", estabelecido na norma legal (o dever ser jurídico), e o direito "em ação" (o grau de cumprimento do direito na realidade social). 
(2.2) A Adequação Interna da Norma 
A adequação interna é a capacidade da norma em atingir a finalidade social estabelecida pelo legislador. Uma norma jurídica é considerada internamente adequada quando as suas conseqüências práticas alcançam os fins objetivados pelo legislador. 
Exemplo: uma norma proíbe a quem foi condenado por crime falimentar exercer o comércio. Os empresários condenados por tais crimes voltam a exercer atividades comerciais, utilizando o nome de suas esposas e filhos. Aqui a lei é contornada. A finalidade do legislador de excluir do comércio pessoas que potencialmente criam perigo para os negócios não é atingida. 
Outro exemplo: a lei que prevê a responsabilidade do empregador em caso de acidente de trabalho na França. Naquele país, o empregador deve sempre indenizar os empregados vítimas de tais acidentes (responsabilidade objetiva). Para prevenir-se de eventuais gastos muitos empresários estabelecem contratos com seguradoras. Os prêmios pagos são revertidos ao consumidor, pois são incorporados no valor final da mercadoria. Assim sendo, o objetivo do legislador não é alcançado: não é o empregador e sim o consumidor que arca com os custos dos acidentes trabalhistas. 
Denominamos esta adequação de "interna" porque se refere à relação entre os objetivos pretendidos pelo legislador, quando ele edita a norma, e os resultados alcançados pela aplicação da mesma. Trata-se assim de uma avaliação interna ao sistema jurídico, que responde à pergunta se o meio empregado (norma) permite atingir os objetivos do legislador. Tais objetivos podem ser, em geral, identificados na exposição de motivos, a qual precede vários textos legais, e nas discussões parlamentares sobre os projetos de lei. 
(2.3) Os Efeitos Sociais da Norma 
Qualquer repercussão social ocasionada por uma norma constitui um efeito social da mesma. Exemplo: a proibição do uso de amianto, produto que contém substâncias cancerígenas. À parte o efeito desejado (fim da contaminação por amianto), esta norma possui outros efeitos sociais (desemprego na indústria de amianto, surgimento de empresas de reciclagem de amianto, indústria de processos indenizatórios). 
Para terminar, tomemos um exemplo que permite compreender melhor a aplicação destes três conceitos (eficácia, adequação interna e efeito da norma). Pense-se na norma que estabelece o rodízio de carros no centro da cidade de São Paulo. A eficácia é o grau de cumprimento da norma por parte dos motoristas e o controle da sua aplicação pela polícia. Se a norma em questão não possui nenhuma eficácia, então se fala em "letra morta" ou em "direito no papel" (Papierrecht). A adequação interna da norma nos indica se o respeito à mesma é suficiente para alcançar os objetivos do legislador. Exemplo: o legislador queria diminuir a poluição na cidade, os proprietários respeitam a norma de rodízio. Mas todos compram um segundo veículo, desta forma a finalidade da lei não é atingida. Ou seja, mesmo sendo cumprida, a lei não conseguiu alcançar os seus fins. A lei revela-se imprópria em relação à sua finalidade social (diminuição da poluição)�. O efeito da norma pode ser qualquer comportamento social causado pela mesma, tais como, debates televisivos sobre o tema, notícias veiculadas pelo jornal ou manifestações contra a sua vigência. 
Ainda dentro do tema da eficácia do direito devemos lembrar das normas simbólicas. Uma norma pode ser ineficaz ou inadequada e ainda assim ter grande relevância social. Muitas vezes o legisladorcria normas que dificilmente encontrarão sua aplicação na prática. Ou seja, normas cuja baixa eficácia é prevista já no momento da sua elaboração ("ineficácia pré-programada"). 
Tais normas são colocadas em vigor para dar uma mensagem sobre as intenções políticas do legislador, para satisfazer os anseios de uma parte da população ou para exercer uma função pedagógica, destacando determinados valores e sensibilizando a sociedade. Nestes casos, a norma tem como objetivo produzir efeitos simbólicos ("legislação simbólica" ou "lei-manifesto"). Exemplo: a penalização do assédio sexual (art. 216-A do Código Penal). É muito difícil que tais condutas sejam denunciadas e punidas. O próprio legislador está ciente das poucas chances de eficácia da norma, mas decide criá-la para dar uma mensagem à sociedade, para educar a população e para satisfazer reivindicações de grupos de mulheres. A legislação simbólica é muitas vezes criticada com o argumento de que as normas jurídicas devem regulamentar as relações sociais e não fazer propaganda moral ou marketing político. 
(3) Fatores de Eficácia da Norma no Direito Moderno 
Os fatores de eficácia de uma norma diferenciam-se em função das características e das finalidades de cada sistema jurídico. Apresentaremos aqui os fatores de eficácia no direito moderno. Há uma regra geral: quanto mais forte é a presença destes fatores, maiores serão as chances de eficácia da norma jurídica. Se a influência destes fatores é fraca, é provável que se verifique a ineficácia da norma. 
(3.1) Fatores Instrumentais 
Estes fatores dependem da atuação dos órgãos de elaboração e de aplicação do direito. 
(A) A divulgação do conteúdo da norma na população e o conhecimento efetivo da norma por parte de seus destinatários, A divulgação deve ser feita pelos meios adequados, empregando métodos educacionais e alguns dos meios de propaganda política e comercial. Exemplo: propaganda que orienta os eleitores para o uso de urna eletrônica. O conhecimento efetivo será influenciado pelo nível de instrução da população. 
(B) A perfeição técnica da norma: clareza na redação, brevidade, precisão do conteúdo, sistematicidade. Estes são elementos que devem ser observados durante a elaboração da lei, e que repercutem no seu processo de efetivação. 
(C) A elaboração de estudos preparatórios sobre o tema que se objetiva legislar: aqui entram o trabalho das comissões de preparação de anteprojetos, as estatísticas, as pesquisas de institutos especializados sobre necessidades e conteúdos de uma intervenção legislativa, e os estudos sobre os custos e a infra-estrutura necessária para a aplicação de determinadas normas jurídicas. 
(D) A adequada preparação dos operadores do direito responsáveis pela aplicação da norma. 
(E) As conseqüências jurídicas (Rechtsfolgen�) adaptadas à situação e socialmente aceitas. Trata-se da elaboração de regras que estimulam a adesão dos cidadãos à norma em questão, tanto pelo oferecimento de uma vantagem, como pela imposição de uma sanção não tradicional. Exemplos: desconto para quem paga impostos com antecedência; diminuição da pena para os presos que estudam; substituição da pena de multa pela suspensão da carteira de motorista ou pela obrigação de freqüentar curso de habilitação. 
(F) A expectativa de conseqüências negativas. Se as pessoas, com base nas experiências anteriores, esperam que as sanções enunciadas pela lei sejam efetivamente aplicadas na prática, obviamente serão mais propícias a respeitar a lei. Se ao contrário, é conhecido que os operadores do direito não fiscalizam e nem sancionam um determinado comportamento, então o número de infrações será provavelmente maior. Exemplo: se os cidadãos sabem que por muitos anos os funcionários da Receita Federal não perseguem a sonegação fiscal ou que um determinado município raramente cobra as multas por infrações de trânsito, sentir-se-ão "encorajados" a cometer infrações e não serão intimidados por uma reforma legal que ameaça com maiores penas os infratores destas categorias. 
(3.2) Fatores Sociais 
São fatores ligados às condições de vida da sociedade em determinado momento. O sistema de relações sociais e a atitude do poder político diante da sociedade civil influenciam as chances de aplicação (a quota de eficácia) das normas vigentes. Podemos distinguir quatro fatores. 
(A) Participação dos cidadãos no processo de elaboração e aplicação das normas - Uma reforma legal que atende reivindicações da maioria da população possui, logicamente, mais possibilidades de aplicação do que uma norma decidida de forma autoritária. Aqui encontramos a importância das formas democráticas de exercício do poder. Se o povo participa ativamente na tomada de decisões políticas e se o sistema político oferece espaço às iniciativas de auto-organização das várias comunidades (democracia direta), ocorrerá uma maior "adesão" popular às metas políticas do Estado, aumentando assim o grau de obediência ao direito. Exemplo: Uma política de segurança que se fundamenta nos resultados obtidos em consultas populares, que se preocupa em adequar as medidas a serem tomadas com a realidade de cada bairro e que incentiva a participação popular no policiamento comunitário, pode ser muito mais eficaz do que uma política fundamentada no aumento de penas e na simples atuação repressiva da polícia. 
O caso da Constituição "cidadã" de 1988, que foi elaborada com forte participação das diferentes camadas da população e levou em consideração as mais diversas preocupações e reivindicações sociais, indica que a participação popular nem sempre garante uma maior eficácia das normas jurídicas. A razão encontra-se na divergência de interesses existentes nas sociedades divididas em classes e grupos. A tentativa de conciliar os interesses de todos os grupos para alcançar uma ampla aceitação de um texto legal pode conduzir à criação de normas contraditórias. E isto dificulta particularmente o processo de aplicação do direito, tal como se observa no caso da Constituição Federal de 1988. 
(B) Coesão social - Quanto menos conflitos existam em uma sociedade, em determinado momento, e quanto mais consenso haja entre os cidadãos com relação à política do Estado, mais forte será o grau de eficácia das normas vigentes. Este fator indica a forte relação que se estabelece entre legitimidade do Estado e cumprimento das normas por parte da população. 
Um típico exemplo é a legislação brasileira sobre a questão agrária. As enormes discrepâncias na distribuição da terra, que criam uma polarização entre os proprietários de milhões de hectares e uma grande massa de "sem-terra", inviabiliza os projetos de reforma agrária e de exploração dos recursos agrários. Fatalmente, cada projeto desagrada a uma das partes, acirrando o conflito. Em países onde foi alcançado um equilíbrio (e uma maior eqüidade) na distribuição da terra, os interesses são mais homogêneos e as chances de aplicação da legislação agrária são maiores. 
(C) Adequação da norma à situação política e às relações de força dominantes. A situação sócio-econômica de um país e as forças políticas que se encontram no poder influem sobre a eficácia das normas jurídicas. Uma norma que corresponde à realidade política e social possui mais chances de ser cumprida. 
As "aventuras" dos direitos sociais refletem este fator de eficácia. Um exemplo interessante é oferecido pelos países da Europa ocidental. Estes conheceram, após o final da Segunda Guerra Mundial, a construção de um "Estado de bem-estar social" que garantia aos trabalhadores uma forte proteção (salário-desemprego, aposentadorias, seguro-saúde). A crise econômica e o enfraquecimento do movimento operário desde o final dos anos 70 levaram ao progressivo abandono das políticas públicas favoráveis aos trabalhadores e, de conseqüência, ao descumprimento dos imperativos constitucionais relativos aos direitos sociais. 
(D) Contemporaneidade das normas com a sociedade. Em geral, nãose tornam eficazes normas que exprimem idéias antigas ou inovadoras. As dificuldades que encontra, na sua efetivação, a legislação brasileira sobre a proteção do meio ambiente, constituem um exemplo das dificuldades práticas de legislações inovadoras. Em uma sociedade culturalmente pouco "sensibilizada" para questões ambientais, não existe ainda por parte da população, e mesmo das autoridades fiscalizadoras, a consciência da gravidade da situação e das conseqüências funestas para as gerações futuras da contínua destruição dos recursos naturais. 
Exemplo: quem indo ao supermercado se preocupa em levar consigo o carrinho de feira ou uma bolsa de compras de material reciclável com a finalidade de evitar o uso excessivo de bolsas de plástico? Este banal exemplo indica o quanto a consciência da população ainda se mantém distante da problemática ambiental. Obviamente sempre se poderá retrucar que em países onde não existe uma efetivação dos direitos humanos e sociais fundamentais as pretensões desta natureza parecem ingênuas e irrisórias. Porém, isto nos indica que faltam as condições econômicas e culturais para viabilizar o desenvolvimento de um projeto de educação ambiental. Por outro lado, a ausência de uma consciência ambiental constitui um dos maiores entraves para a implementação da legislação ambiental brasileira, que é uma das mais avançadas do mundo. 
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[04] Direito e Controle Social 
(1) Comportamento Social de Desvio 
O direito é um subsistema social a que se dá a tarefa de gerar e de exercer os meios de controle social pelos quais se comunicam aos usuários do sistema as regras de comportamento que devem ser seguidas. O controle social visa sobretudo a correção dos "comportamentos de desvio". 
A questão que surge, então, é a de estabelecer o que é um "comportamento de desvio" e como o direito opera em relação a esse comportamento. Esquematicamente, pode-se assinalar três grandes tipos de explicação sociológica do comportamento de desvio. Todos os três situam a origem desse tipo de comportamento na sociedade, e não no indivíduo. 
(1.1) Desvio Social Conjuntural 
Há, inicialmente, a explicação ligada à concepção funcionalista da sociedade (Parsons) e inspirada na teoria da anomia de Durkheim, que explica o "desvio social" como sendo uma violação da norma ou das regras de comportamento esperado. O controle social aparece, nesse caso, como uma reação ex post diante da violação da norma. Consequentemente, o controle social que exerce o direito é um tipo de controle coercitivo e a posteriori, pelo qual se permite a reafirmação dos valores protegidos pelo sistema, que são os que mantêm, realmente, a coesão e a ordem social. 
A função de integração começa com o processo de "socialização", por meio do qual se transmite aos indivíduos as regras de conduta a serem seguidas no seu comportamento social. Os indivíduos, por sua vez, delas se apoderam e as interiorizam. Eventualmente há falhas no processo de "socialização", caso em que os indivíduos não interiorizam as normas e, conseqüentemente, não adaptam seu comportamento às exigências sociais. Neste caso, produz-se uma "anomia", um vazio normativo, e um conseqüente comportamento de "desvio". 
É nessa segunda etapa que os mecanismos jurídico-formais de controle social são postos em prática, para corrigir e para atenuar os efeitos dos comportamentos de desvio. Neste caso, o desvio social é algo de conjuntural e de ocasional. Esse desvio pressupõe a existência de um consenso generalizado no conjunto dos indivíduos em relação aos valores culturais e às exigências de comportamento que eles devem interiorizar no processo da "socialização". O "desvio" se produz se houver uma falha nesse processo, mas ele é corrigido ou atenuado pelos mecanismos jurídico-formais de controle social. 
(1.2) Desvio Social Estrutural 
Numa outra concepção funcionalista da sociedade (Merton), é possível enxergar no "desvio social" o resultado de um erro "estrutural". Mais precisamente, como o resultado de uma estruturação insuficiente das expectativas sociais. Isso significa que não se trata apenas de um erro no processo de "socialização" (Parsons), e, conseqüentemente, de uma situação excepcional. 
Aqui o desvio é conseqüência das características estruturais do sistema social. Essas características carregam uma forte tensão, onde há uma falta de correlação entre os objetivos sociais, culturalmente definidos (riqueza, status social, sucesso profissional etc.) e os meios legítimos pelos quais se pode atingir esses objetivos. A tensão surge porque os objetivos são definidos para todos os indivíduos, ao passo que os meios legítimos para atingi-los não estão igualmente ao alcance de todos, nem são tampouco compartilhados por todos os indivíduos. 
O "comportamento de desvio" aparece, então, como resposta do indivíduo a essa tensão, isto é, como resposta diante da má estruturação das expectativas sociais. Conseqüentemente, o "comportamento de desvio" não é excepcional, mas é uma situação permanente no sistema social. Ele resulta da ausência de correspondência entre os desejos sociais dos indivíduos e as possibilidades de que cada um dispõe para satisfazê-los. 
(1.3) Desvio Social como Estigmação 
A terceira maneira de explicar o comportamento de desvio (Beckert) consiste em entender o "desvio" como resultado de um processo social de rotulação ou de estigmatização social ("labelling"). Segundo Essa visão o desvio é uma resposta ao próprio controle social. É justamente o controle social que engendra ex ante um comportamento de desvio e o marca, então, a priori, como tal. 
A atenção já não é centrada no indivíduo e em seu comportamento, mas nos próprios órgãos de controle social. Já não se considera, então, a norma para definir o que é um "comportamento de desvio". Ele agora surge como conseqüência de um processo de "estigmatização" realizado por órgãos encarregados de exercer o controle social (policiais, juízes, funcionários de penitenciárias, assistentes sociais etc.). 
Neste caso o desvio não é uma qualidade do ato que a pessoa executa. O desvio é aquele ao qual se impôs, com êxito, a marca. O comportamento de desvio é aquele que as pessoas definem como de desvio. O desvio social é, portanto, resultado de um processo de reação social não-neutro, que efetuam os diferentes órgãos jurídico-formais de controle social. Em suma, ao desconsiderarem a norma, para definir o "ato de desvio", os teóricos da "rotulação social" adotam o conceito de "papel" de desvio, atribuído ao longo de um processo de controle social ou, até, assumido pelo próprio indivíduo ao longo de um processo mais geral de reação social. 
Em síntese, qualquer que seja a posição adotada para explicar a origem dos atos de desvio, é certo que o direito, ao ser considerado como em sua função controle social, cumpre um papel de integração, auxiliando na manutenção da ordem e da coesão social. 
(2) Controle Social através do Direito 
O direito é a forma específica de controle social nas sociedades complexas. Trata-se de um controle formal, determinado por normas de conduta, que apresentam três características. Estas normas são: 
(A) Explícitas, indicando à população de forma exata e clara aquilo que não deve fazer; 
(B) Protegidas pelo uso de sanções; 
(C) Interpretadas e aplicadas por agentes oficiais. 
Um elemento específico das normas jurídicas é o fato de serem associadas à aplicação de sanções em caso de não cumprimento. Em comparação com outros sistemas de normas sociais, os sistemas jurídicos caracterizam-se pela formalização da ameaça de coerção, através do estabelecimento de sanções concretas, de procedimentos e instituições que são competentes para a sua aplicação. 
Quem ignora o aniversário de um irmão, pode sofrer sanções de caráter social. Porém, estas dependem de uma decisão da pessoa "ofendida", ou seja, não são preestabelecidas. O irmão pode ficar magoado e optar pela ruptura darelação, mas pode, também, aceitar as nossas desculpas ou simplesmente não reagir. 
As sanções informais são, em todo caso, diferentes daquelas jurídicas. O sistema jurídico estabelece uma sanção determinada, um órgão competente, um procedimento de aplicação. Neste âmbito é também prevista uma série de garantias para o possível infrator da norma, que objetiva protegê-lo da arbitrariedade. Tais garantias são inexistentes no caso das sanções informais. Em geral, a "juridificação" ou "juridicização"� da coerção estatal é ausente em outros sistemas de controle social (pense no caso de quem não paga os impostos e de quem não dá uma contribuição à Igreja) ou encontra-se com uma intensidade muito menor (exemplo: o estatuto de um clube esportivo). 
(2.1) Tipos de Sanções Jurídicas 
O elemento principal de exercício do controle social através do direito é a sanção. A sanção jurídica define-se como uma conseqüência, positiva ou negativa, que decorre do cumprimento ou não cumprimento de uma norma jurídica. A definição da sanção indica que a distinção principal refere-se ao caráter positivo ou negativo da mesma. 
(A) As sanções positivas (ou promocionais) oferecem uma vantagem ou um prêmio a quem cumpre a norma. Exemplo: os universitários com o melhor desempenho no exame nacional unificado ganham uma bolsa de estudos de pós-graduação. Objetivo da norma é incentivar os estudantes a melhorarem seu desempenho. 
(B) As sanções negativas (ou repressivas) impõem uma conseqüência desfavorável (pena), no caso de descumprimento de uma norma. Consistem na privação ou restrição de um direito do infrator: sua liberdade de locomoção, sua liberdade de profissão, seus bens pecuniários. 
As sanções negativas dividem-se em duas categorias. 
(A) As sanções preventivas objetivam evitar a violação de normas, aplicando a determinados indivíduos formas de controle relacionadas com conseqüências negativas. O Estado de direito não aceita, em geral, as sanções preventivas. Várias medidas de fiscalização podem, porém, ser consideradas como preventivas, em vista do efeito prático das mesmas (medo, incômodo). Exemplo: a blitz da polícia que submete os motoristas ou os pedestres a controles de identidade, revistas etc. 
(B). As sanções reparatórias aplicam-se contra o autor de um dano, provocado pela violação de normas jurídicas. Objetivam restaurar, na medida do possível, a situação anterior ou, pelo menos, restabelecer a ordem lesada e a confiança dos indivíduos no sistema jurídico. 
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[05] Direito e Legitimação Social 
"O mais forte nunca é suficientemente forte para ser sempre o senhor, 
senão transformando sua força em direito e a obediência em dever" 
J.J. Rousseau 
(1) Autoridade e Legitimidade 
O que se entende por legitimidade? A legitimidade é decorrente do sentimento expresso por uma comunidade de que determinada conduta é justa, correta. Daí dizer-se que esta implica sempre reconhecimento. Assim, a legitimidade pode ser definida como um amplo consenso, no seio da sociedade, de que uma autoridade adquire e exerce o poder de modo adequado. 
O termo legitimidade utiliza-se mais especificamente para referir-se ao poder político, ao governo, ao Estado. Temos um poder legítimo, se a população reconhece que as ordens emanadas das autoridades são justas e que existe a obrigação de cumpri-las (dever de obediência). Em outras palavras, a população obedece ao poder legítimo não somente por temer a aplicação de eventuais sanções, mas também por convicção. Neste caso, a ordem política encontra um amplo reconhecimento e consegue facilmente aplicar o direito. 
Em sua função de legitimação social, o direito tem o poder de conferir legitimidade às decisões daqueles que têm a capacidade e o poder de tomá-las. Esses atores sociais (indivíduos e instituições) buscam, no direito, a justificação, a aceitação e o consenso em torno dessas decisões. O sistema jurídico recebe do sistema político finalidades e objetivos, bem como a possibilidade de utilizar a força física. Por outro lado, lhe fornece a legitimação. Atribuindo competências e estabelecendo procedimentos para a tomada de decisão, a regra jurídica executa uma função de legitimação. O poder, por elas intermediado, transforma-se em direito. 
A função de legitimação social pode ainda ser interpretada de modo mais abrangente, envolvendo de um modo geral toda autoridade. Toda pessoa tendo, num dado momento, uma capacidade de decisão (não apenas as autoridades e os órgãos jurisdicionais, mas também os indivíduos), pode apelar para o direito, a fim de, ali, buscar a aceitação, a legitimidade e o consenso para suas ações e para suas decisões. Para legitimar e para justificar nossas próprias ações e decisões, podemos usar sistemas normativos diferentes. Um deles, naturalmente, é o direito. 
Podemos diferenciar dois momentos de desenvolvimento dessa função de legitimação do poder social. 
(A) a legitimação dos agentes sociais que emitem as mensagens jurídicas (instituições), obtidas por meio de normas de competência e de normas de procedimento. O direito cumpre a função de legitimação das estruturas e dos órgãos do grupo social; 
(B) a legitimação das ações dos agentes sociais destinatários das mensagens jurídicas (indivíduos). Nesse caso, o direito é um argumento de que se serve o autor para obter uma situação vantajosa, mediante o consenso que sua ação lhe proporciona. Por exemplo, aquele que intervém num processo utiliza o argumento jurídico como auto-legitimação. 
Ao analisarmos a relação entre legitimidade e Estado, podemos apontar como marco histórico o discurso filosófico sobre o contrato social. Ao final do século XVIII e início do século XIX, a idéia de legitimidade, que estará na base do nascimento dos primeiros Estados, se relacionava a um consenso inicial de todos os cidadãos, onde se configurava a idéia de adesão ao contrato social, para a fundação de um Estado: os cidadãos iguais e livres decidem organizar a sociedade através de um contrato social, cujas regras fundamentais são fixadas na Constituição. 
Atualmente pode-se falar de um consenso funcional e permanente, que consiste na participação dos cidadãos no processo de tomada de decisões. A comunidade política se converte em protagonista do exercício do poder: os súditos tornam-se, pelo menos formalmente, cidadãos, detentores da soberania, e legitimam o poder através da eleição dos governantes e da participação cotidiana nos processos políticos (debates, protestos, greves etc.). 
(2) Direito e Legitimação do Poder 
Não é difícil constatar que o direito tem uma importância particularmente grande para o processo de legitimação do poder político. O direito dá ao poder, o que o constitucionalista alemão Carl Schmitt chamou de "mais-valia política". O que significa isto? Através do direito é possível criar legitimidade para um governo, que passa a usufruir as vantagens que oferece a aceitação popular (estabilidade social, diminuição dos conflitos, obediência espontânea). 
O direito é um instrumento que permite legitimar o poder por duas razões. 
(A) Em primeiro lugar, a existência de um sistema jurídico está ligada à idéia de justiça. Se as leis são respeitadas por todos, as pessoas acreditarão que a justiça prevalece, que as autoridades do Estado não exercem o poder arbitrariamente, mas se restringem a aplicar as regras previamente estabelecidas. 
(B) Em segundo lugar, a existência do direito e o respeito a ele oferecem ao cidadão uma sensação de segurança. O direito lhe permite saber o que deve fazer e o que pode esperar dos outros, ou seja, lhe permite organizar a sua vida e conseguir uma estabilidade. 
De tal forma, mesmo sendo julgados principalmente com base em suas decisões políticas, os detentores do poder ganham um "bônus" de legitimidade devido ao funcionamento do sistema jurídico. Esta é a "mais-valia política" da qual se apropriam os detentores do poder legal. 
(3) LegitimidadeMaterial e Legitimidade Formal 
Para conseguir legitimidade, o poder político deve atuar em conformidade com as características e exigências de cada sociedade. Nos sistemas capitalistas, a legitimidade é de tipo formal-legal. Os cidadãos aceitam submeter-se somente a ordens que emanam de normas jurídicas estabelecidas segundo procedimentos previstos na Constituição. Acreditam na legalidade, considerando-a como um elemento necessário para o bom funcionamento da sociedade. Como apontava Max Weber, "a forma de legitimidade hoje mais corrente é a crença na legalidade: a submissão a estatutos estabelecidos pelo procedimento habitual e formalmente correto". 
O poder político moderno não se legitima somente por tomar decisões justas, como acontecia com os "bons reis" na Idade Media. A legitimação passa pelo respeito às regras e aos procedimentos definidos pelo direito escrito: "obedece-se à ordem impessoal, objetiva e legalmente estatuída" (Weber) e não a determinadas pessoas. Dentro do sistema de legitimidade formal, o exercício da violência física é considerado legítimo, somente quando praticado dentro dos limites da legalidade. Assim sendo, falar-se do monopólio da violência legítima nos sistemas capitalistas significa falar da violência legal. 
Para Weber, o direito moderno é caracterizado pela racionalidade e pela formalidade. O direito é claro, sistemático e estabelece regras gerais, aplicáveis em vastas categorias da população. Isto permite a previsão e o controle das decisões, que não dependem do poder mágico de um juiz ou da vontade de um rei, mas sim da aplicação rigorosa de normas que são preestabelecidas e conhecidas por todos. 
A moderna prevalência da legitimidade formal explica-se pelas características de uma sociedade capitalista. Para o funcionamento de um sistema fundado na troca de mercadorias entre pessoas livres e iguais, é absolutamente necessário que se respeitem normas preestabelecidas e uniformes. É o que geralmente é denominado "segurança jurídica". O cidadão pode prever as decisões do governo e o comportamento dos outros cidadãos, sendo grande a probabilidade de que todos obedecerão ao direito. O governo que garante a segurança jurídica permite o bom funcionamento de uma sociedade capitalista. Por esta razão, goza de consenso. 
Neste sentido, podemos dizer que a eficácia do direito é uma condição importante da legitimidade formal. Um governo que não consegue aplicar o direito e não respeita as normas constitucionais na sua atuação, perde a sua legitimidade, a sua posição de garantidor de uma ordem. O resultado é a criação de uma situação social anômica. 
Um governo democrático, ao ser eleito, encontra-se com um sistema jurídico em funcionamento. Se este governo implementar corretamente este sistema, isto gerará consenso, coesão social, sendo que as pessoas acreditarão no governo, sentindo-se "seguras". Assim, se hoje no Brasil toda a legislação penal fosse cumprida, teríamos uma diminuição do sentimento de insegurança com o qual convive o cidadão. E não seria estranho se aumentasse a legitimidade (aceitação popular) do governo. O mesmo aconteceria se o governo decidisse implementar os direitos sociais, econômicos e culturais proclamados na Constituição Federal de 1988. 
A legitimidade formal, fundamentada no respeito da legalidade é necessária nos sistemas capitalistas. Não é, porém, suficiente. Existem também exigências de legitimidade material. A maior parte dos conflitos políticos giram em torno da questão de se as decisões do poder político são materialmente justas, isto é, conforme ao "interesse comum", aos ideais de liberdade, igualdade e solidariedade. O que diferencia a nossa atual sociedade das anteriores é a necessidade de que a legitimidade material (justiça) deve sempre pressupor a legitimidade formal, ou seja, o respeito às normas do direito. Não é possível uma legitimidade material que não respeite a legitimidade formal. 
Em todo caso, o fundamental para a legitimidade material é o convencimento de que, em último caso, a decisão deverá ser popular e é o povo que tem o poder de exigir o cumprimento de promessas de justiça social. Exemplo: Até 1995 o governo alemão do Chanceler Helmut Kohl usufruía grande aceitação popular. Havia um consenso tão forte, que este governante ficou no poder por mais de quinze anos. O vertiginoso aumento do desemprego e a diminuição dos benefícios sociais causaram a perda de legitimidade de seu governo, que foi derrotado nas eleições de 1998, ganhas pela coligação de oposição social-democrata e verde. 
Algo muito freqüente nas sociedades modernas são as pesquisas de opinião pública, feitas com o intuito de averiguar o grau de aprovação social que possui um determinado governo. Assim, quando o instituto de pesquisas sai às ruas e pergunta: "Você está satisfeito com o governo?", o que se quer constatar é justamente o grau de legitimidade deste governo. 
O grau de legitimidade se relaciona com o consenso. Quando um governo é considerado legítimo, isto significa que há um maior consenso e coesão em tomo das políticas e das metas sociais definidas pelos políticos. 
Como conclusão podemos estabelecer dois fatos: 
(A) O direito em vigor, ao ser aplicado, propicia o processo de legitimação do Estado. Hoje é predominante a legitimidade formal, que decorre do respeito às normas do direito escrito, estabelecido pelos órgãos competentes. 
(B) O direito impõe condutas e promove valores. Com o tempo se produz um condicionamento da opinião pública, gerando a crença de que aquilo que o direito ordena é justo. 
Como conseqüência, o direito é cumprido não exclusivamente pelo temor da sanção, mas também pela convicção de que a previsão legal deve ser obedecida. Esta é a principal vantagem que oferece o direito a um poder político legitimado. O direito é uma modalidade específica de ação social; está estritamente ligado ao exercício do poder e funciona como símbolo legitimador deste último. 
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[06] Direito e Transformação Social 
(1) Direito e Sociedade 
Parte-se de um raciocínio muito simples, mas com conseqüências importantes para a análise do tema da mudança social. Este raciocínio pode ser resumido em uma pergunta: O contexto social (sistema de produção, cultura, interesses, ideologias, forças políticas) determina o direito ou é o direito que determina a evolução social? 
Uma parte dos estudiosos entende que o direito, como manifestação social, é determinado pelo contexto sociocultural: a sociedade produz o direito que lhe convém. Dentro desta perspectiva, os autores mais críticos ,sustentam que existe apenas uma imposição de interesses por parte dos grupos que exercem o poder. Estes conseguem impor aos sujeitos mais fracos as regras de conduta que permitem reproduzir, em nível normativo, a dominação social. 
Em uma posição contrária situam-se os autores que entendem que o direito é um fator determinante dos processos sociais. Os autores que adotam esta perspectiva entendem que o direito possui a capacidade de determinar o contexto social, de atuar sobre a realidade e de mudá-la. Por exemplo, uma lei sobre um novo problema social, ou uma mudança nas normas promovida por um novo governo, poderá conseguir impor aos membros de uma comunidade novos tipos de comportamento. 
É possível pensar numa terceira posição que permita conciliar as duas supracitadas. O direito é, em geral, configurado por interesses e necessidades sociais, ou seja, é produto de um contexto sociocultural. Isto não impede que o mesmo possa influir sobre a situação social, assumindo um papel dinâmico. Em outras palavras, o direito exerce um duplo papel dentro da sociedade: ativo e passivo. Ele atua como um fator determinante da realidade social e, ao mesmo tempo, como um elemento determinado por esta realidade. Dentro deste contexto identificam-se as pressões dos grupos de poder que podem induzir tanto para que se dê a elaboração 
No âmbito da sociologia jurídica, a mudança contínuadas regras do direito constitui uma hipótese teórica fundamental. Realmente, esta hipótese constitui um elemento comum das várias abordagens da sociologia jurídica. Isto pode ser observado nas análises de Durkheim sobre a passagem do direito repressivo ao direito restitutivo, nos estudos de Marx e Engels sobre a determinação do direito pelas mudanças econômicas, nos estudos de Weber sobre a racionalidade do direito moderno e, recentemente, nas análises sobre a transformação do direito e do Estado na época da globalização. Constata-se assim uma "dinâmica" do direito. E aqui surge a pergunta: quais são as formas e as modalidades de interação entre o sistema jurídico e os outros campos de ação social no decorrer do tempo? 
(2) Sociedade no Direito 
Sem dúvida o direito muda na evolução histórica, seguindo as transformações da sociedade. A criação e difusão de novas tecnologias como, por exemplo, a formidável expansão da informática nas últimas décadas, traz consigo mudanças legislativas para conformar o sistema jurídico a novas situações. No início do século foi necessário estender o conceito da propriedade para proibir o furto de eletricidade (a energia elétrica não gozava de proteção porque não era uma "coisa"). Da mesma forma, os legisladores modernos introduziram normas para regulamentar os problemas relacionados com a informática (proteção da privacidade, garantia dos direitos dos inventores e dos usuários de programas informáticos). Temos aqui casos de adaptação do direito à realidade social. 
A mudança de valores sociais criou uma situação semelhante, no que se refere à posição da mulher. Em muitos países foram efetuadas profundas reformas legislativas, sobretudo nas áreas do direito constitucional, do direito de família, do direito do trabalho, do direito penal e do direito internacional, visando estabelecer a igualdade entre os gêneros feminino e masculino. 
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As mudanças sociais são também a causa das recentes reformas legislativas, que impõem a "desregulamentação da economia" (redução do poder fiscalizador e do papel econômico do Estado) na era neoliberal. O mesmo aconteceu com as reformas em muitos países europeus, que aboliram as normas liberais com relação ao direito de residência e de trabalho dos estrangeiros, para bloquear a entrada de trabalhadores imigrantes. 
Em todos estes casos temos mudanças tecnológicas, sociais, políticas e demográficas, que o direito tenta acompanhar. Até aqui a situação é facilmente explicável, apesar de existir a necessidade de analisar por que e como o direito acompanha cada situação de mudança social e, sobretudo, qual é a eficácia de cada intervenção legislativa. 
(3) Direito na Sociedade 
O problema coloca-se quando tentamos estudar o papel ativo do direito na mudança social. Os sociólogos do direito dividem-se entre os que entendem que o direito é um freio às mudanças sociais mais importantes e os que sustentam que o direito pode ser um importante instrumento propulsor da transformação social. 
(A) A primeira corrente (o direito impede a mudança) sustenta que o sistema jurídico é lento ao detectar as necessidades sociais e, observa os problemas sociais desde os seus fechados centros de poder, muitas vezes impedindo uma mudança. Assim sendo, o direito funciona como fator negativo perante as necessidades e reivindicações sociais (papel conservador do direito). 
Esta é a visão de autores críticos em face do sistema jurídico atual, existindo vários níveis de crítica. As mais radicais, de inspiração marxista, consideram o atual sistema jurídico como um instrumento que permite a manutenção do poder da classe dominante e reproduz as relações sociais de exploração. As críticas moderadas .sustentam que o direito desenvolve uma espécie de resistência diante de determinadas mudanças sociais. Exemplo: foi alterada, no transcorrer do século XX, uma série de valores nos países da América Latina no que se refere à moral sexual; porém os Códigos penais destes países continuam utilizando termos como "mulher honesta'" e "honra sexual", denotando uma defasagem entre lei e realidade social. 
(B) A segunda corrente identifica o direito como instrumento eficaz para a consecução de grandes mudanças sociais. Acredita-se que obtendo poder político é possível realizar mudanças através. de reformas jurídicas. Os partidários desta corrente entendem que o direito desempenha uma função educadora (papel progressista do direito). 
Esta concepção foi exprimida na Europa a finais do século XIX pelos representantes do "socialismo jurídico" que tentaram formular as reivindicações socialistas em termos jurídicos. Tratava-se de uma teoria que propunha a adoção de medidas preventivas, confiando no potencial transformador do direito. Objetivando evitar que a sociedade passasse pela experiência violenta de uma revolução, os adeptos desta teoria propunham a realização de uma extensa reforma jurídica, através da qual seria possível realizar a justiça social. 
Resumindo, encontramos aqui duas correntes antagônicas. Alguns estudiosos e políticos vêem no direito um fator que impede as mudanças da realidade social, enquanto outros o consideram como um propulsor de tais mudanças. As duas correntes são, em sua formulação absoluta, passíveis de crítica. Os trabalhos de sociologia jurídica indicam que devemos diferenciar sempre, segundo o ramo do direito, o problema concreto e a situação social, tendo em mente que a capacidade reformadora do direito é limitada. A história nos oferece exemplos em que a tentativa de mudar o comportamento das pessoas através do direito foi um completo fracasso. Um caso conhecido é a "lei seca" nos anos 20 nos EUA. Apesar da enorme mobilização dos aparelhos repressivos do Estado (750.000 pessoas foram presas por consumo ou comercialização de bebidas alcoólicas entre 1920 e 1932) esta legislação não teve resultados práticos, tendo sido abolida nos anos 30. 
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Podemos afirmar que a relação entre direito e mudança social se concretiza sob dois aspectos: 
(A) O direito é uma variável dependente, ou seja, um fenômeno social que muda historicamente em função de outros fenômenos. A relação entre os grupos e as classes sociais, definida principalmente pelo fator econômico, determina as estruturas jurídicas. O direito pode ser, então, considerado como um produto de interesses sociais, que dependem das relações de dominação em cada sociedade. 
Porém, a determinação social do direito não significa que este seja produto de um único fator social ou da vontade de uma classe. Além dos interesses econômicos, o direito é influenciado por elementos de ordem física, tais como as invenções e as tecnologias, e também por valores ético-culturais assumidos pelos povos de várias regiões do mundo (pense na diferença do direito entre países de tradição cristã e de tradição muçulmana). 
Um peso particular possui finalmente a tradição jurídica de cada país, que não muda de um dia para o outro com base nas mudanças sociais. Assim se explica a defasagem entre a evolução da moral social e a imobilidade do sistema jurídico que já constatamos no caso dos delitos sexuais. A importância da tradição jurídica explica também o fato de que países com semelhantes estruturas política e econômica possuam sistemas jurídicos totalmente diferentes, como mostra o exemplo do direito francês (fundamentado na lei escrita) confrontado com o direito inglês (fundamentado no caráter vinculante da jurisprudência). 
(B) Apesar de ser uma variável dependente da estrutura social-cultural, o direito possui uma autonomia relativa e, por conseqüência, pode induzir a mudanças sociais. Apesar de existirem controvérsias com relação aos limites da autonomia do sistema jurídico, não se coloca em dúvida que o direito tenha incentivado muitas transformações nas sociedades modernas. 
As teorias que mais insistiram na visão do direito como produto socialmente determinado, são justamente aquelas que, quando tentaram aplicar as suas idéias na prática

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